Estudo do Livro de Êxodo

Estudo do Livro de Êxodo

Estudo do Livro de Êxodo



O livro de Êxodo, segunda seção da Tora, é chamado em hebraico de We‘ele, ou às vezes, Shemoth, nomes derivados de suas palavras iniciais “Estes são os nomes” ou, mais abreviadamente, “nomes dos", pois esta seção da Tora começou com os nomes dos patriarcas que desceram do Egito. Em português, o termo êxodo é a forma latinizada que se derivou da Septuaginta, versão grega do Antigo Testamento (ex - fora + hodos - caminho = “saídas”).

I. Composição

1. Autoria e Data. 

Semelhantemente ao que ocorre nos outros livros do Pentateuco, a questão da autoria de Êxodo divide os estudiosos em duas classes: a. a do ponto de vista conservativo e b. a da escola crítica.

a. Ponto de Vista Conservativo. 
Os conservativos reivindicam que Êxodo, tanto quanto o Pentateuco como um todo, foi escrito por Moisés. Eles admitem que talvez Moisés tenha usado fontes antigas, orais ou escritas, mas a despeito disso é o único autor dos cinco primeiros livros da Bíblia. Os que mantém essa opinião suportam seu ponto de vista com base nas seguintes passagens de Êxodo: 1. Duas vezes o livro declara que Deus falou para Moisés escrever (Ex 17.14; 34.27); 2. Uma vez o livro diz que Moisés escreveu (Ex 24.4); 3. Cristo declarou que Moisés escreveu (João 5.46,47); 4. Em Mar. 7.10, Cristo atribuiu também Êxo. 20.12 e 21.17 a Moisés; 5. Em Mar. 12.26 Jesus se refere ao “livro de Moisés”, contudo os conservadores admitem que neste trecho talvez Jesus estivesse referindo-se à tradição judaica que atribuía a Moisés a responsabilidade pelo conteúdo do livro. A autoria mosaica implicaria uma data provavelmente no século XIII A.C.

b. Ponto de Vista Crítico. 
Os críticos afirmam que Êxodo é resultado da compilação dos documentos J.E.D e P(S) (ver o artigo correspondente no Dicionário) em que cada um desses documentos consistia em uma narrativa e numa série de leis.

O documento J é constituído de narrativas judaicas antigas, e seu autor revela interesse pelo reino judaico e seus heróis (850 A.C.). A palavra Yahweh (Jeová) é usada neste documento para referir-se a Deus.

O documento E contém as antigas narrativas afraemitas originadas por volta de 750 A.C. O escritor de E demonstra interesse pelo reino do Norte de Israel e por seus heróis. Ele emprega o vocábulo Eloim em lugar de Yahweh (Jeová) para referir-se a Deus.

O documento D, também chamado Código Deuteronômico, foi encontrado no templo em 621 A.C. Esse documento aborda o fato de que o amor é a razão mesma do servir, e salienta a doutrina de um único altar.

O Código sacerdotal ou documento P(S) originou-se por volta de 500 A.C., todavia sua redação prorrogou-se até o séc. IV. A.C. Esse documento evidência uma preferência por números e genealogias, distinguindo-se dos outros também quanto a seu ponto de vista sacerdotal e ritualístico.

Os críticos esclarecem que as fontes de Êxodo, além de distintas entre si, datam de um período bastante posterior aos eventos narrados. Eles acentuam também que o livro não só revela o trabalho de diferentes indivíduos, mas de diferentes escolas de registros históricos. Cada documento tem seu ponto de vista individual, assim como cada evangelho sinótico apresenta sua própria visão da vida de Cristo. Certo erudito disse que o livro de Êxodo era como uma grande sinfonia, a qual se pensou produzir uma harmonia uníssona, mas agora tem sido demonstrado que, em virtude de seus elementos intensamente discordes entre si, a harmonia produzida pode ser ainda mais rica.

2. Relação com o Restante do Pentateuco. 

A narrativa de Êxodo está intimamente relacionada com a de Gênesis, pois continua a história dos descendentes dos patriarcas do ponto em que Gên. 50 parou, embora um tempo considerável tenha passado entre a morte de José e os primeiros eventos de Êxodo (1.7 ss.), período durante o qual o povo de Israel fora levado a posição de servidão. Depois de descrever a emigração do Egito, o livro relata a entrega da lei e da construção do tabernáculo. As regras para o sacrifício que seguem formam a primeira parte de Levítico. Êxodo não é tanto um livro independente quanto uma porção arbitrariamente definida de_ uma seção do Pentateuco que abrange três livros. A divisão entre Êxodo e Levítico é semelhante àquela entre I e II Samuel ou entre I e II Reis.

3. Ponto de Vista Literário. 

Como obra literária, Êxodo é inferior a Gênesis, embora algumas qualidades similares de estilo narrativo intenso e vigoroso estejam evidentes em certas porções. A despeito de algumas incertezas, este livro constitui valiosa fonte de história política e cultural. O conteúdo de Êxodo está dividido em partes quase iguais entre narrativa e seção legal. Os primeiros 19 capítulos são quase inteiramente narrativos, com exceção de pequenas seções legais, a saber, 12.14-27, 42-49; 13.1-16. O restante do livro trata solidamente da lei, com exceção do capítulo 24, que descreve o reconhecimento do pacto, e dos capítulos 32-34, que descrevem a rebelião do povo, a intercessão de Moisés e a renovação do pacto.

II. Historicidade

Grandes são os problemas de historicidade, rota percorrida e data do êxodo. Embora os pesquisadores não tivessem descoberto nenhuma prova contemporânea direta desse evento, uma série de evidências indiretas tem ajudado a esclarecer muitos detalhes. Os primeiros 12 capítulos descrevem principalmente as ocorrências da última parte do segundo milênio A.C. no Egito. Os eventos dos capítulos restantes aconteceram na península do Sinai. Um tratamento mais detalhado, concernente a história, localidade geográfica e cronologia é apresentado no presente artigo.

Nesta seção, limitamo-nos a apresentar um breve sumário de alguns aspectos importantes ressaltados pelos peritos no assunto:

1. Embora considerável porção reflita aspectos da vida e história, escassos são os detalhes que poderíam indicar o tempo preciso dos eventos narrados. Em nenhuma ocasião o rei do Egito é mencionado pelo nome. “Faraó” ou “rei do Egito” são as duas formas empregadas para referir-se a esse governante. Acreditava-se que a data do êxodo podería ser determinada caso fosse descoberto que o Faraó morreu afogado. Todavia, esse detalhe não tem sido esclarecido, e o texto de Êxodo nem mesmo indica que o rei necessariamente morreu afogado, mas somente que sofreu grande derrota, seus carros de guerra e sua carruagem afundaram, e seus capitães favoritos se afogaram.

2. A declaração de Êxo. 1.8, “Entrementes se levantou novo rei sobre o Egito, que não conhecera a José”, sugere fortemente que a expulsão dos hicsos ocorreu no período entre a morte de José e o nascimento de Moisés. Neste caso, seria fácil entender por que o novo rei teria uma atitude hostil em relação àqueles que ele associava aos hicsos, que também eram asiáticos e dominaram o Egito durante um considerável período de tempo.

3. A referência as cidades de Pitom e Ramessés em Êxo. 1.11 tem sido apontada como prova de que os eventos descritos não poderiam ter ocorridos até a 19a dinastia, considerando que os primeiros reis que levaram o nome Ramsés pertenciam àquela dinastia. Contudo, é possível que os nomes originais tenham sido substituídos no texto pelos nomes conhecidos posteriormente. A despeito do fato de que os Ramsés não reinaram até a 19a dinastia, poderia ter existido uma cidade com o nome Ramessés, pois o culto do deus RE ou RA alcançou proeminência em muitos períodos da história egípcia antiga e “mss” era um sufixo comum para nomes pessoais.

4. A opressão egípcia é descrita como muito severa. Comprovando este fato, abundantes evidências do período da 18a e 19a dianastia ilustram a crueldade dos egípcios em relação aos escravos e estrangeiros. O sinal hieroglífico representativo de um estrangeiro é a figura de um homem atado e com um ferimento sangrento na cabeça. Tal sinal é usado até mesmo em conexão com nomes de honrados reis estrangeiros com quais os egípcios faziam acordos. Portanto, há evidências de crueldade dos egípcios em relação aos estrangeiros, às quais ajuntam os eventos relatados no início de Êxodo. No passado pensava-se que as grandes pirâmides do Egito eram resultado do trabalho dos hebreus durante a opressão, contudo essa idéia não é pertinente: as pirâmides provavelmente foram levantadas pelo menos mil anos antes da época do êxodo.

5. Pesquisadores questionam a historicidade do êxodo e do evento do Mar Vermelho, com base no fato de que as ruínas do Egito antigo não mencionam tais ocorrências. Essa objeção, todavia, baseia-se numa concepção errônea da natureza da arqueologia egípcia. Muitos dos registros cotidianos e das ruínas das casas do Egito antigo estão debaixo da bacia de água no Delta, a região onde a maioria das pessoas viveu. Embora abundantes, as ruínas do Egito antigo consistem principalmente em sepulcros e monumentos construídos no deserto para celebrar conquistas e vitórias egípcias. Derrotas como a partida dos israelitas e o insucesso do Faraó em recapturá-los dificilmente resultariam na construção de monumentos.

6. Outras questões são levantadas em relação à historicidade do livro de Êxodo, tais quais: a. Êxo. 1.5 declara que o número de pessoas que desceu para o Egito era setenta, contudo estudiosos observam que esse é um número meramente aproximado, b. A historicidade do capítulo 1 tem sido questionada com base no fato de que uma grande multidão, tal qual a dos israelitas, requeria mais do que duas parteiras para salvar a vida dos meninos hebreus. Por outro lado, deve-se observar que a passagem não afirma que havia somente duas parteiras, c. Há algumas objeções em relação à história de Moisés narrada no capítulo 2. Alguns estudiosos sugerem que a história do salvamento de Moisés através do cesto de junco seja uma da história de Sargon que também fora salvo através de um barco. Outros observam que a história de Sargon, é de origem mesopotâmica e dificilmente teria servido de base para uma história egípcia. Além disso, para as comunidades que viviam às margens do rio, esse incidente pode ser comparado ao de uma criança sendo abandonada na porta de uma casa atualmente e a existência de histórias com esse tema podería ser perfeitamente independente, d. Aparentemente há uma contradição em relação ao nome do sacerdote de Midiã, que é chamado de Reuel em Êxo 2.18 e de Jetro em Êxo. 3.1. Segundo os críticos, esses nomes devem ter pertencido a documentos diferentes, e o uso de ambos comprova a combinação desses documentos.

III. Quatro Áreas Salientadas

1. Redenção dos Hebreus da Terra do Egito. 

O livramento dos israelitas do poder opressivo do Faraó é um dos aspectos acentuado, pois esse fato condicionou a mente dos israelitas para as eras vindouras e estabeleceu um débito permanente de gratidão para com Aquele que os livrou da escravidão. Metaforicamente esse livramento salienta a importância da redenção da escravidão do pecado na vida de todo aquele que é remido por intermédio de Cristo, representado pelo cordeiro pascal (Exô. 12.1-14).

2. Estabelecimento do Pacto. 

O pacto fundamentou-se no fato de que Deus, tendo redimido Seu povo, tinha o direito de esperar dele aliança e lealdade. (Referências à redenção, sobre a qual o pacto se baseia: 19.4-6; 20.2; 22.21; 23.9-15). Para Deus, os remidos se tornaram o povo de Seu pacto, e Ele prometeu protegê-los e dirigi-los. Em troca, eles deveriam obedecer à Sua lei.

3. A Lei. 

A declaração do pacto inicia-se com o grande sumário da lei moral dos Dez Mandamentos e apresenta a seguir várias leis importantes para a vida daqueles que são destinados a formar uma nação santa e um povo consagrado a Deus.

4. O Culto. 

Este tema é referido em Êxo. 3.5,6 e nas regras da Páscoa no capitulo 12, que estabeleceram na mente das gerações subseqüentes a natureza da redenção de Deus e a necessidade de participação individual e pessoal. A questão de reverência é tratada especialmente nos capítulos 25-31, que descrevem os preparativos para a construção do tabernáculo e a separação dos sacerdotes, e no relato da construção do tabernáculo nos capítulos 35-40.


IV. Conteúdo


A. Os Hebreus no Egito (1.1-12.36)

1. A opressão (1.1-22)

a. Os descendentes de Jacó no Egito (1.1-14)
b. Moisés nos é apresentado (1.15-22)

2. Preparação dos representantes de Deus (2.1—4.31)

a. Nascimento e educação de Moisés (2.1-10)
b. Moisés mata um egípcio e foge para Midiã (2.11-22)
c. Moisés é chamado por Deus (2.23—3.22)
d. Deus concede poderes a Moisés (4.1-17)
e. Moisés regressa ao Egito (4.18-31)

3. Tentativas de sair do Egito (5.1—7.13)

a. Moisés e Arão falam ao Faraó (5.1-5)
b. O Faraó intensifica a opressão (5.6-14)
c. Moisés, rejeitado por Israel e encorajado por Deus (5.15-6.13)
d. Genealogias de Moisés e Arão (6.14-27)
e. Moisés fala novamente ao Faraó (6.28—7.13)

4. As dez pragas (7.14-11.10)
a. As águas tornam-se sangue (7.14-25)
b. Rãs (8.1-15)
c. Piolhos (8.16-19)
d. Moscas (8.20-32)
e. Peste nos animais (9.1-7)
f. Úlceras nos homens e nos animais (9.8-12)
g. Chuva de pedras (9.13-35)
h. Gafanhotos (10.1-20)
i. Trevas (10.21-29)
j. A morte dos primogênitos é anunciada (11.1-10)

5. A instituição da Páscoa (12.1-28)

6. Realização da décima praga: morte dos primogênitos (12.29-36)


B. Os Hebreus no Deserto (12.37-18.27)

1. A saída dos israelitas do Egito (12.37-51)

a. Consagração dos primogênitos (13.1-16)
b. Deus guia o povo pelo caminho (13.17-22)

2. O Faraó tenta reconquistar Israel (14.1—15.21)

a. Perseguição contra Israel (14.1-14)
b. Travessia do mar (14.15-25)
c. Os egípcios perecem no mar (14.26-31)
d. Hino de vitória (15.1-21)

3. Experiências no deserto (15.22—18.27)

a. As águas amargas tornam-se doces (15.22-27)
b. Deus manda o Maná (16.1-36)
c. A água da rocha de Refidim (17.1-7)
d. Amaleque ataca os israelitas (17.8-16)
e. Jetro visita e aconselha a Moisés (18.1-27)

C. Os Hebreus no Monte Sinai (19.1 —40.38)

1. Estabelecimento do Pacto Divino (19.1—24.11)

a. Preparação para o Pacto (19.1-25)
b. Os Dez Mandamentos (20.1-17)
c. O temor do povo (20.18-21)
d. Leis acerca dos altares (20.22-26)
e. Leis acerca de escravos (21.1-11)
f. Leis acerca da violência (21.12-36)
g. Leis acerca da propriedade (22.1-15)
h. Leis civis e religiosas (22.16-31)
i. O testemunho falso e a injúria (23.1-5)
j. Deveres dos Juizes (23.6-9)
k. O ano de descanso (23.10-11)

l. O sábado (23.12-13)

m. As três festas (23.14-19)

2. Promessas divinas (23.20-33)

3. A aliança de Deus com Israel (24.1-11)

4. Deus dá instruções no Monte (24.12—31.18)

a. Moisés e os anciãos sobem ao monte (24.12-18)
b. Direções para a construção do tabernáculo (25.1—27.21)
c. Direções quanto ao sacerdócio (28.1—29.46)
d. Instruções suplementares (30.1—31.18)

5. Idolatria do povo (32.1—33.23)

a. O bezerro de ouro (32.1-6)
b. A ira de Deus (32.7-10)
c. Moisés intercede pelo povo (32.11-24)
d. Moisés manda matar os idólatras (32.25-29)
e. A Segunda Intercessão de Moisés (32.30-35)
f. O anjo de Deus guiará o povo (33.1-23)

6. Restabelecimento do pacto (34.1—35.3)

a. As segundas tábuas da lei (34.1-9)
b. A Lei. Desdobramento do Decálogo (34.12-28)
c. As três festas (34.18-28)
d. O rosto de Moisés resplandece (34.29-35)
e. O sábado (35.1-3)

7. Construção do tabernáculo (35.4—40.38)

a. Ofertas para o tabernáculo (35.4-29)
b. Obreiros para o tabernáculo (35.30—36.7)
c. As partes do tabernáculo (36.8—38.20)
d. O custo do tabernáculo (38.21-31)
e. As vestes dos sacerdotes (39.1-31)
f. Os utensílios do tabernáculo são terminados e apresentados (39.32-43)
g. Deus manda Moisés levantar o tabernáculo (40.1-15)
h. O tabernáculo é levantado (40.16-33)
i. Manifestação divina de aprovação (40.34-38)

V. Seção Legal

As leis do livro de Êxodo têm como objetivos principais: a. estabelecer regras detalhadas para a conduta das pessoas em muitas situações, originando ordem e justiça entre os homens; e b. regular o relacionamento dos redimidos com Deus. Outros códigos de lei têm sido descobertos, alguns bem mais antigos que o de Êxodo, a saber: Código de Hamurabi, rei da Babilônia, encontrado em 1901 (XVIII A.C.) - um código sumérico cerca de dois séculos mais antigo, e um outro babilônico mais velho ainda; o Código Hitita (XIV A.C.) e as Leis Assírias (XII). Um exame da natureza desses códigos em relação a Êxodo demonstra que uma diferença principal entre esses códigos e Êxodo é o fato de que os outros códigos são estritamente seculares, exceto quando ocasionalmente mencionam os privilégios ou responsabilidades dos sacerdotes. Êxodo, por outro lado, é pesadamente religioso: inclui regras para sacrifícios, festivais anuais e outros serviços religiosos.

Algumas semelhanças são também encontradas entre as leis de Êxodo e as de certos códigos, como por exemplo, a existência de dois tipos de lei, casuística e apodictica, nos códigos Hititas e nas leis da Ásia Menor.

As leis casuísticas, também chamadas leis de sentença, referem-se a situações específicas, e formulam uma sentença à qual o criminoso deve ser submetido em tais situações. Estas leis geralmente iniciam com a partícula “se” introduzindo a descrição geral da situação.

Ocasionalmente a partícula “se” ocorre, acrescentando detalhes mais específicos da situação e introduzindo juntamente uma declaração da pena apropriada. As leis apodícticas consistem em declarações categóricas sobre os crimes, geralmente sem se referir à pena, como nos Dez Mandamentos, mas também acrescentando-a em certas ocasiões e simplesmente terminando a declaração com a frase “ele será morto”, ou precedendo-a com a frase “amaldiçoado seja aquele que...’’. Albrecht Alt, o estudioso que sugeriu a divisão das leis do Antigo Testamento nesses dois tipos, é de opinião que as leis casuísticas do Pentateuco foram extraídas das leis cananitas, enquanto as leis apodícticas são de origem especificamente judaica. Alegando que ambos os tipos de leis são encontrados também nos tratados hititas e nas leis da Ásia Menor, Mendenhall refuta essa declaração. As porções seculares das leis indicam contatos com as leis de períodos anteriores; contudo, segundo os conservatistas, esse fato não coloca em questão a autenticidade das leis recebidas por Moisés.

As seções legais de Êxodo são extensivas e detalhadas. Os principais grupos são: 1. As leis dadas antes do Sinai. 2. Os Dez Mandamentos. 3. O Livro do Pacto. 4. Regulamentações para o tabernáculo e estabelecimento do sacerdócio. 5. O Decálogo Ritual.

1. A leis dadas antes do Sinai compreendem a lei da páscoa, a lei da consagração dos primogênitos e a lei do maná. Em Êxo 12.313 o_ Senhor deu ordens explícitas quanto à cerimônia da páscoa e em Êxo. 12.13-49 e 13.1-16 estabeleceu regras permanentes a respeito do grande festival anual e da consagração dos primogênitos. A lei do maná, em Êxo. 16.16; 23.33, estava relacionada à necessidade imediata de regular a arrecadação e o uso da comida.

2. Os Dez Mandamentos, também chamados Decálogo (em hebraico, as Dez Palavras), estão contidos em Êxo. 20.1-17, e são repetidos com pequenas diferenças em Deu. 5.6-21. O caráter especial dos Dez Mandamentos, dizem os estudiosos bíblicos, reside: a. no fato de que eles foram “escritos pelo dedo de Deus” nas tábuas de pedra (Êxo. 31.18; 32.16; Deu. 9.10) e b. no fato de que foram recitados para a nação de Israel como um todo. Isso está implícito em Êxo. 20.18,19 (ver o artigo assim intitulado no Dicionário) e é explicitamente declarado em Deu. 5.4.

Os Dez Mandamentos distinguem-se das outras seções legais quanto a seu caráter sintético e formal de apresentar as leis. Esta seção consiste em um sumário das leis éticas, com poucos detalhes explicativos. Pena nenhuma é mencionada para a infração dos mandamentos.

A questão da originalidade dos Dez Mandamentos tem sido motivo de controvérsia entre os eruditos. Wellhausen e outros críticos afirmam que os Dez Mandamentos representam uma forma desenvolvida de lei, que dificilmente teria existido até o tempo do último reino israelita. A diferença de redação entre o mandamento de Sabá em Êxo. 20.8-11, e sua contrapartida em Deu. 5.12-15, indica que o mandamento original era ou mais longo, incluindo assim ambas as formas, ou mais resumido, sendo apresentado portanto em forma de sinóptico. Os que acreditam na plena inspiração das Escrituras afirmam que os Dez Mandamentos incluem todas as palavras de ambas as passagens.

Quanto à enumeração dos mandamentos, há três formas principais: 1. a enumeração de Josefo (Antiq. Ill.c.6, sec. 5); 2. a enumeração do Talmude; e 3, a enumeração de Agostinho, A maioria das igrejas protestantes não-luteranas e a igreja grega seguem a enumeração de Josefo. A igreja católica romana e a maioria dos luteranos seguem a enumeração de Agostinho.

A disposição dos mandamentos nas tábuas tem sido motivo de polêmica:

1. Agostinho sugeriu que os três primeiros mandamentos estavam na primeira tábua, e os outros sete na segunda.

2. Calvino sugeriu que quatro estavam na primeira e seis na segunda. 

3 Filo e Josefo afirmaram explicitamente que haviam cinco mandamentos em cada tábua.

3. O Livro do Pacto corresponde à porção de Êxo. 20.22 a 23.33. Essas leis abordam uma variedade de assuntos religiosos, morais, comerciais e humanitários. O livro do Pacto inicia-se com uma reiteração da advertência contra a idolatria e segue com instruções sobre tipos de altares (Êxo. 20.24-16). Princípios humanitários proporcionam o tema para a próxima seção, na qual são tratados problemas de relacionamento entre mestre e servo, preservação de propriedade, compensação de danos pessoais e preservação de direitos de propriedade. Esta seção acrescenta ainda mandamentos específicos contra imoralidade, bestialismo, espiritismo, hostilidade ao fraco e oprimido etc.

O Livro do Pacto consiste basicamente em leis casuísticas, contudo seu propósito não é o de fornecer um conjunto completo de leis para todos os diferentes tipos de problemas que possam eventualmente surgir, e, sim, indicar o tipo de punição que deve ser efetuado em algumas situações comuns.

4. Regulamentações para o tabernáculo e o estabelecimento do sacerdócio estão contidas entre Êxo. 25.1 e 31.17. Durante os 40 dias e 40 noites que Moisés permaneceu no Monte, o Senhor deu-lhe instruções quanto ao sistema israelita de adoração. Planos para a construção do tabernáculo, bem como de sua mobília e utensílios, foram estabelecidos com precisão. Segue uma descrição do uso e da natureza dos implementos usados pelos sacerdotes, tais como: a bacia de bronze para as sagradas abluções, e a preparação do perfume e do óleo sagrados (Êxo. 30.17-38).

Depois de seguidas as instruções desses versos, homens contemplados com o espírito de Deus eram apontados para construir o tabernáculo e toda a sua mobília (31.1-2). As descrições do santuário, do sacerdócio e da forma do culto são seguidas por aquelas dos tempos e períodos sagrados (31.12 ss.). Sobre tempos sagrados há aqui referência somente ao sábado, e outros regulamentos são apresentados no que concerne às suas origens. A preparação do tabernáculo devia ter começado quando Deus entregou a Moisés as tábuas da lei, se o seu progresso não tivesse sido interrompido pelo ato de idolatria por parte do povo, e pelo seu conseqüente castigo pela ofensa, o que é o tema da narrativa nos capítulos 32-35. Contrária e em oposição a tudo o que tinha sido feito por Jeová para Israel e na presença de Israel, a terrível apostasia deste último se manifesta da maneira mais melancólica, como um ominosamente significante fato profético, que é incessantemente repetido na história de gerações subseqüentes. A narrativa disso está intimamente ligada aos relatos precedentes a misericórdia e gratuita fidelidade de Jeová de um lado, e a descarada ingratidão de Israel do outro, intimamente associadas Esta conexão forma a idéia central de toda a história da teocracia. Somente após a narrativa desse significativo evento é que o relato sobre a construção e o término do tabernáculo pode proceder (3540). Tal relato se torna mais circunstancial a medida que o assunto mesmo ganha maior importância.

Acima de tudo, é fielmente demonstrado que tudo fora executado segundo os mandamentos de Jeová. Na História descritiva de Êxodo um plano fixo de conformidade com os princípios apresentados antes, é consistente e visivelmente carregado — através de todo o livro, dando-nos assim a mais certa garantia da unidade de ambos: livro e autor.

5. O Decálogo Ritual consiste em um grupo de leis dado em Êxo. 34.10-28. Alguns dos Dez Mandamentos e algumas das ordenanças religiosas do Livro do Pacto são repetidos neste trecho, exceto as leis casuísticas. A relação do Decálogo Ritual aos textos paralelos é um assunto polêmico. A teoria de que esta passagem é mais antiga do que os Dez Mandamentos propriamente ditos é bastante aceita.

VI. Milagres

O livro de Êxodo descreve um dos grandes períodos de miraculosa intervenção divina nas Escrituras. Os milagres deste livro podem ser classificados em três grupos: 1. milagres que provaram aos israelitas que Moisés tinha sido realmente enviado por Deus; 2. o milagre das pragas que caíram sobre o Egito como castigo; 3. milagres de providência e proteção divina no deserto. O milagre da sarça ardente, primeiro incidente de ordem sobrenatural do livro de Êxodo, não pertence a nenhum desses três grupos. Nesse incidente, Deus comunicou-se particularmente com Mosés, revelando-lhe sua missão.

1. Entre os milagres que provaram a autenticidade da missão de Moisés, estão: a. a transformação da vara em serpente e vice-versa; b. o fenômeno da mão de Moisés que repentinamente se tornou leprosa e foi restaurada em seguida; c. o fenômeno da transformação da água em sangue.

2. Com exceção da décima, as pragas do Egito até certo ponto consistiram em fenômenos que poderiam ocorrer naturalmente naquela região. Contudo, quatro aspectos peculiares dessas pragas provam o caráter sobrenatural desses fenômenos, a saber: a. a intensidade - foram fenômenos extremamente severos; b. a aceleração - aconteceram num curto período de tempo; c. a especificação - a terra de Gósen não foi atingida por certas pragas; d. a predição -Moisés podia prever quando a praga ocorreria. O caráter miraculoso da décima praga consistiu na intervenção divina fornecendo instruções aos israelitas sobre como proceder para que a vida de seus primogênitos fosse poupada.

3. Entre os milagres de proteção e providência divina no deserto estão: a. a travessia do Mar Vermelho; b. a coluna de nuvem durante o dia, e a coluna de fogo à noite, que guiaram o povo de Israel no deserto; c. a provisão de água em Mara e Refidim; d. provisão de alimento: codornizes e maná; e. a entrega dos Dez Mandamentos.