Fundo Histórico do Livro de Apocalipse
O termo grego para o nome do livro é apokalypsis, que significa revelar. Os livros da literatura apocalíptica pretendem revelar os mistérios sobre o desenrolar da história e do fim do mundo. O Apocalipse surgiu em um contexto em que existiam muitos livros semelhantes. Todos eles só podem ser entendidos com base no pano de fundo da profecia do AT. Os profetas do AT recebiam aquilo que precisavam dizer por inspiração divina, e em muitos casos a sua mensagem estava relacionada com os fatos políticos, econômicos e religiosos do seu dia-a-dia. Por outro lado, recebiam também mensagens que são dirigidas aos acontecimentos do futuro. Anunciam o juízo de Deus e a salvação no fim dos tempos. Esse segundo aspecto da mensagem profética é retomado na literatura apocalíptica.
Ela se desenvolveu quando Antíoco Epifânio IV governava a Palestina (175-164 a.C.). Foi um tempo de grande opressão do povo judeu, pois Antíoco Epifânio tentou introduzir a cultura e religiosidade grega à força. Nesse tempo difícil o povo judeu se lembrou das promessas de salvação de Deus dadas pelos profetas. Deus não tinha prometido ajudar e dar vitória ao seu povo sobre todos os inimigos no final dos tempos? Por que isso não estava se cumprindo?
O objetivo dos livros da literatura apocalíptica era dar respostas ao povo judeu tão oprimido. Esses livros surgiram quase que exclusivamente na Palestina e lá foram difundidos. Os escribas judeus, no entanto, eram críticos em relação a esses livros. Hoje temos acesso a alguns desse livros apocalípticos judaicos: O livro etíope de Enoque, IV Esdras, o Apocalipse grego e siríaco de Baruque, o Apocalipse de Moisés, o Livro de Enoque eslavo e o Testamento dos 12 Patriarcas.
Para dar autoridade aos escritos, eram editados sob nomes de pessoas famosas do AT. Contêm muitas visões, figuras, sonhos e números simbólicos. A história geral do mundo é dividida em duas etapas: a época atual e a época vindoura. Essas épocas principais são, por sua vez, subdivididas em épocas menores. Também a época atual é dividida em períodos, que são descritos em detalhes. Sinais para o fim da época atual são a perseguição dos fiéis, catástrofes naturais e guerras. Eles antecedem a vinda do Messias. São denominados “as dores do Messias”. No final de toda a opressão está a vitória de Deus sobre as forças do mal, a ressurreição dos mortos e o início de uma nova época.
5. O Apocalipse de João como livro profético e apocalíptico
O nome do último livro da Bíblia já indica a sua relação com a literatura apocalíptica. O leitor percebe isso nos símbolos que aparecem no livro. As cores têm significado especial. Branco é a cor da divindade, da alegria, da vitória, do céu. Preto é a cor da morte. Vermelho é a cor do luxo.
O Apocalipse está repleto de figuras: coroa da vitória e palmeiras simbolizando a vitória. O diadema é o sinal do domínio e da soberania. O chifre é o sinal do poder. Na literatura apocalíptica os números também têm significado simbólico. Quatro é o número do mundo criado, sete é o número da perfeição e da plenititude, 12 é o número do povo eleito de Deus, 10.000 é o número da multidão ilimitada, 144.000 é o número do povo de Deus incontavelmente grande.
Assim como a literatura apocalíptica, o Apocalipse tem o objetivo de interpretar a história do mundo até o seu final (cf. Ap 1.1,19). Essa história vai trazer grande opressão sobre o povo de Deus e muitas guerras e catástrofes ecológicas para a humanidade. Mas no final está a vitória de Deus, a implantação do seu domínio sobre essa terra e a criação de um novo céu e de uma nova terra.
Por outro lado, não podemos ignorar a relação do livro com a profecia. O livro está em forma de carta, que João escreve às sete igrejas da província da Ásia (cf. 1.4; 22.21). O autor é conhecido entre as igrejas. Provavelmente é o apóstolo João, que, de acordo com a tradição da igreja antiga, viveu em Éfeso. Agora ele está escrevendo da ilha de Patmos às igrejas tudo aquilo que o Senhor vivo lhe disse e mostrou por meio de figuras e imagens. Ele quer ajudar as igrejas receptoras do seu livro a entenderem a sua própria situação. Ele quer apoiar e incentivar as igrejas a permanecerem firmes nas perseguições e a contarem com a vitória de Jesus Cristo (cf. 2.3,10; 3.8; 17.1ss; 20.4,6 e outros). Nesse aspecto, o livro de Apocalipse é um livro de consolo e exortação, como grandes partes da literatura profética do AT.
Como surgiu esse livro? João tem à sua disposição a riqueza da literatura profética. Ele faz uso das figuras e dos símbolos apocalípticos. Será que ele uniu esses dois aspectos e criou um novo tipo de livro apocalíptico? Ele mesmo sugere algo diferente (cf. 1.9-20). Na ilha de Patmos ele teve um encontro visionário com o Senhor Jesus Cristo. O que o Senhor lhe mostrou está relacionado com o AT e com a literatura apocalíptica. Nesse mundo imaginário que lhe é tão conhecido, o presente e o futuro da Igreja lhe são interpretados. Ele recebe a tarefa de escrever o conteúdo das visões.
Nessas visões está refletido o drama da perseguição dos cristãos na época de João. Com a besta que emerge do mar (13.1ss) é feita indicação do estado romano sob Domiciano; com o falso profeta se faz menção do sacerdócio do imperador. A “prostituta” (17.1ss) simboliza Roma com sua impiedade. Perseguições da igreja na Ásia Menor são citadas diretamente (cf. 2.3,10,13; 3.8). O autor antevê uma batalha decisiva vindo sobre a igreja (3.10), que deixará muitos mártires (6.9; 7.9ss; 15.2). Mas eles são os vencedores. O autor já consegue ouvir o seu louvor (12.10ss). Ele os vê reinando juntamente com Cristo (20.4,6). Todo o livro é um encorajamento para a hora do martírio. A história da igreja mostra como foi importante esse aspecto nos primeiros três séculos, nos quais ondas de perseguição caíram sobre a igreja. Não conseguiram destruir a igreja de Jesus.
Para João, no entanto, a perseguição da igreja não é o conflito principal. O conflito principal está por trás dessa perseguição, que é a batalha entre Deus e Satanás. A besta que emerge do mar é o símbolo apocalíptico para o império romano. Mas mesmo esse império romano recebe o seu poder de Satanás (13.2) e serve a Satanás (13.4ss). Que diferença em relação à avaliação que o apóstolo Paulo faz do estado romano (Rm 13.1ss)! O que levou a isso? O estado romano citado em Apocalipse não é só uma figura política. Ele exige a adoração do imperador. Com isso ele concorre com a adoração a Deus. O sacerdócio do imperador (falso profeta) exige o culto fanático ao imperador. Satanás se lança a anti-Deus. É ele que está por trás da perseguição dos cristãos (12.4,7,17). Mas Satanás está derrotado; ele tem pouco tempo para agir. Jesus Cristo é o Senhor da nova época (1.13; 5.5; 3.21; 14.14). Satanás foi lançado do céu sobre a terra (12.9). Isso leva a guerras e catástrofes ecológicas terríveis, que, no entanto, não fazem com que as pessoas se voltem a Deus (9.20s e outros).
Somente a volta de Jesus muda a história da humanidade: o poder dos reinos inimigos de Deus é destruído (19.11ss). Cristo reina na terra com os mártires por 1.000 anos, durante os quais Satanás está amarrado. Depois disso ele se levanta uma última vez e é destruído (20.7ss). Deus cria um novo céu e uma nova terra, que já não conhecem o sofrimento nem a morte.
O fato novo do Apocalipse de João é que as figuras e imagens são aplicadas coerentemente a Jesus, enquanto na literatura apocalíptica judaica o consolo estava relacionado aos patriarcas espirituais. No centro do livro de João está a ação de Deus que leva à salvação das pessoas por meio de Jesus Cristo. Diante disso, é possível ver a história com outros olhos, mesmo quando surge uma época de perseguição da igreja.
O Apocalipse de João é, portanto, um livro de consolo e encorajamento para a igreja, que em pouco tempo será levada ao martírio. Essa igreja é encorajada a permanecer fiel pela esperança do cumprimento em breve de todas as coisas por meio de Jesus Cristo.