Comentário de Albert Barnes: João 3:3

Em verdade, em verdade... Uma expressão de forte afirmação, denotando a segurança e a importância do que ele estava prestes a dizer. Jesus continua a indicar uma das doutrinas fundamentais e indispensáveis à sua religião. Pode parecer estranho que Ele deveria introduzir o assunto desta maneira, mas deve ser lembrado que Nicodemos reconheceu que Ele era um Mestre vindo de Deus, que ele deixou implícito a sua disponibilidade e desejo de receber instrução e que não é maravilhoso, portanto, que Jesus devesse iniciar-se com uma das verdades fundamentais da sua religião. Não faz parte do cristianismo esconder nada. Jesus declarou a todo homem, alto ou baixo, rico ou pobre, as verdades do Evangelho. Nada foi retido por medo de ofender os homens de riqueza ou poder, e para eles, assim como os mais pobres e humildes, foi declarada como algo a ser indispensável para a experiência, como a primeira coisa na religião, uma mudança de coração e de vida.

Exceto um homem... Esta é uma forma de expressão universal, projetada para incluir toda a humanidade. De “todos e de cada homem” é certo que, se não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus. Ele inclui, portanto, os homens de todos os tipos e nações, moral e imoral, ricos e pobres, com ofício e sem ofício, velhos e jovens, escravos e livres, o escravo e seu mestre, judeus e gentios. É claro que era a intenção de nosso Salvador transmitir a Nicodemos a ideia, também, de que “ele” deveria nascer de novo. Não era suficiente ser um judeu, ou reconhecê-lO como sendo um professor enviado por Deus, isto é, o Messias; era necessário, além disso, a experiência em sua própria alma, a grande mudança do chamado “novo nascimento” ou regeneração.

Nascer de novo... A palavra traduzida aqui “de novo” também significa “de cima”, e é assim vertida na margem. É evidente, porém, que Nicodemos não entendeu como se referindo a um nascimento “de cima”, pois, se tivesse, ele não teria feito a pergunta em João 3:4. É provável que, na linguagem que ele usou, não era a mesma ambiguidade que existe no grego. Nas versões antigas todas entenderam no sentido de “de novo”, ou uma “segunda vez”. Nosso nascimento natural apresenta-nos a luz, é o início da vida, lança-nos no meio das obras de Deus, e é o início de nossa existência, mas também introduz-nos a um mundo de pecado. Todos nós já iniciamos desviados. Todos os homens transgridem. A imaginação dos pensamentos do coração é má desde a juventude. Nós somos concebidos em pecado e em iniquidade nascemos, e não há quem faça o bem, não, não há nem sequer um. A mente carnal é inimizade contra Deus, e, por natureza, estamos mortos em nossos delitos e pecados, Gen 8:21; Sal 14:2-3; 51:5; Rom 1:29-32; 3:10-20; 8:7.

O pecado expõe todos os homens a miséria aqui e no futuro. Para escapar do pecado, para ser feliz no mundo por vir, é necessário que o homem deva ser mudado em seus princípios, seus sentimentos, e seu modo de vida. Esta mudança, ou começo dessa nova vida, é chamada de “novo nascimento”, ou “regeneração”. É assim chamado porque, em muitos aspectos, ela tem uma analogia marcante para com o nascimento natural. É o começo da vida espiritual. Introduz-nos à luz do evangelho. É o momento em que realmente começamos a viver para alguma finalidade. É o momento em que Deus se revela a nós como nosso Pai reconciliado, e somos adotados em Sua família como seus filhos. E, como todo homem é um pecador, é necessário que cada um deva experimentar essa mudança, ou ele não pode ser feliz ou salvo. Esta doutrina não era desconhecida para os judeus, e foi especialmente prevista como uma doutrina que seria ensinada nos tempos do Messias. Veja Deut 10:16; Jer 4:4; 31:33; Eze 11:19; 36:25; Sal 51:12. Essa mudança é chamada em outros lugares do Novo Testamento de “nova criação” 2Cor 5:17; Gal 6:15, e “vida dentre os mortos”, ou uma ressurreição, Ef 2:1; João 5:21, 5:24.

Ele não pode ver... Com “ver” aqui, evidentemente é colocado como significando apreciar – ou ele não pode estar habilitado para o reino e participar dele.

O reino de Deus... Seja neste mundo ou no que está por vir – ou seja, o céu . Veja as notas em Mat 3:2. O significado é que o reino que Jesus estava prestes a criar era tão puro e santo que era indispensável que todo homem devesse experimentar essa mudança, ou então não poderia participar de suas bênçãos. Isso é solenemente declarado pelo Filho de Deus por uma declaração equivalente ao um juramento, e não pode haver nenhuma possibilidade, portanto, de entrar no céu sem experimentar a mudança que o Salvador contempla pelo “novo nascimento”. E cabe a cada homem, quando na presença de um Deus santo, diante do qual ele deve comparecer em breve, perguntar se ele tem experimentado esta mudança; e se ele não tem, que não dê descanso aos seus olhos até que ele tenha procurado a misericórdia de Deus, e implorado o auxílio do Seu Espírito para que o seu coração possa ser renovado.

Fonte: Albert Barnes' Notes on the Bible, de Albert Barnes (1798-1870)