Atos dos Apóstolos — Objetivo do Livro

Atos dos Apóstolos — Objetivo do Livro

Objetivo de Atos dos Apóstolos

Por Saul K. Watson

Qual é o objetivo do autor com esse segundo livro, que ele evidentemente considera a continuação do primeiro (At 1.1)? Várias respostas foram dadas a essa pergunta. Enquanto algumas são questionáveis, outras podem ser fundamentadas no texto.

I. Descrições de objetivo duvidosas

O livro tem no grego o título “Atos dos Apóstolos” (praxei apostolon; em latim, acta apostolorum). Disso poderíamos concluir que o livro é o primeiro documento da historiografia eclesiástica, com a ênfase nos atos e vida dos apóstolos. Essa definição dos objetivos é problemática, pois dos 12 apóstolos mencionados no capítulo 1, somente três são citados pelo nome posteriormente, Tiago, João e Pedro, e só há relatos detalhados sobre Pedro. Além disso é falado de Paulo, que se denomina apóstolo, apesar de não ter sido testemunha ocular do ministério de Jesus na terra. O seu fundamento para tal atitude: o ressurreto tinha lhe aparecido de forma visível e lhe confiado o seu evangelho (1Co 15.8-11; Gl 1.11s). No entanto, sobre Paulo e Pedro há um relato de vida abrangente. Não descobrimos nada, por exemplo, sobre o martírio dos dois apóstolos. Disso concluímos que o autor não tinha como intenção escrever uma história abrangente do cristianismo primitivo, nem mesmo dos atos dos apóstolos Paulo e Pedro.

Na última parte de Atos, o aprisionamento de Paulo é relatado em detalhes. O livro termina com a viagem do preso e a sua chegada a Roma. Será que o livro foi preparado como um documento de defesa do apóstolo a ser encaminhado a uma pessoa de influência antes do processo em Roma? Isso não é de todo impossível. Mas aí teríamos de supor que o autor não estava defendendo somente a Paulo, mas tinha como objetivo informar o governo romano sobre as atividades do movimento cristão no império, pois com exceção do capítulo 9, os primeiros 12 capítulos não dizem nada que teria sido importante para o processo de Paulo. Fica aberta também a questão, se o evangelho de Lucas, como primeiro volume desta obra, teria sido necessário só para alcançar esse objetivo. Mesmo que no livro de Atos o relacionamento entre os cristãos e o império romano tem papel importante, é difícil aceitar o livro como documento de defesa do cristianismo.

Afirma-se, às vezes, que Atos dos Apóstolos é uma imagem idealizada do início da igreja. Quem lê com atenção, logo percebe que o autor não esconde os conflitos da igreja nos seus primórdios. Será que ele queria escrever um documento sobre os conflitos internos da igreja? A definição de objetivo colocada dessa maneira seria muito negativa, destoando do anúncio feito em Atos 1.8 e da conclusão em Atos 28.31. Faz parte do relato fidedigno do autor não esconder os conflitos; por outro lado, a descrição dos conflitos tampouco está no centro das atenções.

II. Descrições de Objetivo Convincentes

O objetivo principal de Atos é mostrar como a mensagem de Jesus Cristo se tornou a boa notícia para todos os povos. Já a promessa do Senhor ressurreto antes da ascensão anuncia esse aspecto (At 1.8). Foi dessa perspectiva que o autor escreveu o seu primeiro livro (Lc 24.26s).

Ao autor parece importante ressaltar que nesse caminho do evangelho houve dificuldades com as autoridades romanas, pois freqüentemente é citada a acusação de que os cristãos estariam ameaçando o império romano. O autor descreve de diversas formas que as autoridades estavam do lado do apóstolo Paulo, pois ele gozava de privilégios especiais por ser cidadão romano. Em muitas situações os romanos confirmaram a inocência de Paulo (At 16.39; 18.15s; 19.37; 23.29; 25.25; 26.32). De qualquer modo, eles não impedem Paulo de pregar o evangelho (At 28.30). Já pudemos perceber essa tendência no evangelho de Lucas. O autor mostra, mesmo que de passagem, que os cristãos — e sobretudo Paulo — não apresentavam ameaça política ao império.

Mais um objetivo parcial pode ser observado: em várias ocasiões se torna claro que Pedro e Paulo podem ser comparados. Isso é importante para aquele grupo de estudiosos que questiona o apostolado de Paulo. Os dois apóstolos ressuscitam mortos (At 9.36ss; 20.9); os dois curam um coxo (At 3.1ss; 14.8ss); os dois são aprisionados e libertados de forma miraculosa (At 5.19ss; 12.7ss; 16.26ss); os dois intermediam o dom do Espírito Santo por meio da imposição de mãos (At 8.14ss; 19.6s); os dois interrompem a ação de um mágico (At 8.18ss; 13.6s). A mensagem que deve ficar clara para os leitores é essa: Paulo é um apóstolo vocacionado por Jesus Cristo como o foi Pedro.