Fé e Sociabilidade na Carta de Tiago — Tiago 2:1-13

Fé e Sociabilidade na Carta de Tiago  — Tiago 2:1-13


No vers. 1 devemos adotar a redação “Tendes a fé em nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor da glória, em acepção de pessoas?”, sendo a inferência que, se assim fazemos, não somos realmente cristãos. Uma outra interpretação é que os crentes não devem permitir seja entravado seu progresso na vida cristã com uma indevida deferência aos ricos, e ao mesmo tempo uma falta de reconhecimento aos pobres.

Tiago figura um cidadão rico, muito bem vestido, cujas joias e vestes deslumbrantes são indício de sua opulência, a penetrar numa assembleia cristã, não necessariamente uma sinagoga judaica, se bem que muitos ainda frequentassem aqueles centros onde Moisés era lido e se davam instruções nas Escrituras. Ao mesmo tempo entra lá um pobre, com vestes amarrotadas, desbotadas e sujas (v. 2). Era fácil os crentes mostrarem consideração indevida ao rico, convidando-o a ocupar lugar de honra, enquanto o irmão andrajoso era deixado de pé, ou lhe ofereciam um lugar no soalho para se sentar (v. 3). Procedendo assim mostravam que faziam distinções antipáticas (“divididos em vossa mente”), e julgavam as pessoas com parcialidade (v. 4), “Julgavam com maus pensamentos" baseados no princípio de que as vestes custosas de uma pessoa indicavam-na como companheira desejável” (Cent. Bible). Os juízes orientais caracterizavam-se por seu favoritismo. Perdia-se com isto todo senso de irmandade cristã, ignorando-se o exemplo do Senhor Jesus, visto como todos, ricos e pobres por igual são preciosos para Deus. Na sua presença em nada importam vestes magníficas ou esfarrapadas. Considerar as pessoas por essa forma era infringir diretamente a lei de Moisés (cfr. Dt 1.17).


Lembra-lhes então Tiago que Deus é especialmente gracioso para com os pobres. Não escolheu Deus os que para o mundo são pobres, para serem ricos em fé e herdeiros do reino? (v. 5). E uma indagação surpreendente, afirmativa tanto quanto interrogativa. Embora pobres dos bens deste mundo, tinham fé em Cristo, a qual os tornava possuidores das mais primorosas bênçãos e dava-lhes direito ao reino dos céus. Eram essas, todavia, as pessoas a quem os destinatários da epístola estavam no perigo de desprezar, ao passo que cortejavam aos ricos. Não eram estes, os ricos, que se opunham ao evangelho e oprimiam os que o aceitavam, especialmente aqueles em circunstâncias menos felizes, e até os arrastavam aos tribunais, onde a administração da justiça estava miseravelmente corrompida? Perseguindo os cristãos, os perseguidores tinham o costume de blasfemar do nome e do ensino de Cristo (6-7).

Saiba mais

Tiago agora chega à conclusão a que se encaminhava o seu argumento. Se eles cumpriam a lei do reino, a lei régia, como apresentada em Lv 19.18 (cfr. também Mc 12.28-33; Rm 13.8-10; Gl 5.14), faziam bem. Mas, se se deixavam levar de respeitos humanos, cometiam pecado e eram arguidos pela lei como transgressores (9). O apóstolo então antecipa-se a uma possível objeção. Por que dar tanta importância a essa questão de acepção de pessoas? E um agravo de pouca monta, que de certo não deve ser levado tão a sério. Rebate ele o argumento assinalando que toda a lei é quebrada pela transgressão de um só ponto. A lei régia é a lei soberana de Deus como um todo, e como um todo ela demanda cumprimento. Um dos testes da guarda dessa lei é nossa atitude para com nosso próximo. Existe uma lei superior ao código de Moisés. É a lei da liberdade em Cristo (veja-se Tg 1.25), obediência espontânea do crente á vontade revelada de Deus. É por esta que seremos julgados. Daí pois “falai e procedei como devem os que esperam ser julgados pela Lei da liberdade. Porque quem não demonstra misericórdia será julgado sem misericórdia” (12-13 Wey.). Sob o governo divino colhemos o que semeamos, e com o juízo com que julgamos seremos julgados. No grande dia, embora a justiça submeta todo o mundo às últimas penalidades da lei, Deus fará que a misericórdia triunfe sobre o Juízo, levando à Sua glória os que, havendo sido perdoados estão prontos a perdoar e por Seu amor a mostrar misericórdia (cfr. Mt 6.14; Mt 25.31-46). Isto posto, passamos com naturalidade ao pensamento da seção seguinte.