Bens Que não São Usufruídos — Eclesiastes 6:1-12

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No seu estudo dos assuntos humanos, o sábio Rei Salomão não despercebeu as situações que muitas vezes tornam impossível as pessoas usufruírem o que possuem.

Sobre uma destas situações, ele escreveu: “Há uma calamidade que tenho visto debaixo do sol, e ela é freqüente entre a humanidade: um homem a quem o verdadeiro Deus dá riquezas, e bens materiais, e glória, e que, para a sua alma, não carece de nada de que se mostre almejante, contudo, o verdadeiro Deus não o habilita a comê-lo, embora o mero estrangeiro o possa comer. Isto é vaidade e é uma séria doença.” — Ecl. 6:1, 2.

O Todo-poderoso permite que qualquer use sua capacidade dada por Deus para adquirir bens e obter reconhecimento ou glória entre seus contemporâneos. Neste sentido, Salomão podia corretamente dizer que Deus ‘dava’ riquezas, bens materiais e glória a tal homem. Lamentavelmente, porém, embora alguém possa ter tudo, as circunstâncias talvez lhe impeçam usufruir esses bens.

Pode ter alimentos saborosos, contudo, por causa de algum distúrbio estomacal ou intestinal, não pode usufruí-los. O caso de Nabucodonosor fornece uma ilustração interessante. Ele obteve a posição de governante mundial, em Babilônia. Daí, Deus o humilhou por causa do seu orgulho, privando-o de sua sanidade mental. As delícias do palácio, inclusive alimentos de primeira qualidade e vinhos excelentes, não mais tinham qualquer atrativo para Nabucodonosor. Imaginando-se animal, abandonou o palácio suntuoso e se alimentou de grama, igual ao touro. Enquanto Nabucodonosor perdia assim os prazeres da vida palaciana, ‘meros estrangeiros’ tiravam proveito de suas riquezas. Deveras, o que sobreveio a Nabucodonosor foi um severo mal, “uma séria doença”, durante sete anos. — Dan. 4:28-37.

A seguir, Salomão destacou que a vida longa e uma grande família, em si mesmas, não são suficientes para se ter uma vida satisfatória e contente. Ele continuou: “Se um homem se tornasse pai cem vezes e vivesse muitos anos, ainda que se tornassem numerosos os dias dos seus anos, contudo, a sua própria alma não se fartasse de coisas boas e mesmo o sepulcro não se tornasse seu [talvez significando que ansiava o sepulcro, assim como Jó na sua aflição (Jó 3:11-22)], tenho de dizer que o nascido prematuramente é melhor do que ele. Pois este [nascido prematuramente] veio em vão e se vai em escuridão, e seu próprio nome será coberto com escuridão. Não viu nem o próprio sol, nem o conheceu. Este é que tem descanso em vez de o outro. Mesmo supondo-se que ele vivesse mil anos duas vezes e ainda assim não visse o que é bom, não é apenas para um só lugar que todos vão?” — Ecl. 6:3-6.

Realmente, quando não se pode usufruir a vida, de que valor são até mesmo uma longa vida e muitos filhos? Quer rico, quer pobre, jovem ou idoso, na morte todos vão para um só lugar — para a sepultura. Para o homem que não obtém nenhum usufruto real da vida, uma vida longa significa apenas mais problemas e dificuldades durante um período mais longo, do que para alguém que morre jovem. O nascido prematuramente, o natimorto, está em melhor situação no sentido de nunca ter de suportar todas as dificuldades duma vida vazia e frustrada.

Salomão escreveu adicionalmente: “Todo o trabalho árduo da humanidade é para a sua boca, porém, nem mesmo a sua própria alma se enche. Pois, que vantagem tem o sábio sobre o estúpido? Que tem o atribulado por saber como andar diante dos viventes? Melhor é a vista dos olhos do que as perambulações da alma. Também isto é vaidade e um esforço para alcançar o vento.” — Ecl. 6:7-9.

As pessoas trabalham arduamente para obter o necessário para se manterem vivas; trabalham “para a sua boca”. Contudo isto raras vezes satisfaz seus muitos desejos, os anseios de sua alma. O homem sábio, mas descontente, talvez procure reprimir os desejos aflitivos, ao passo que o tolo se entrega a eles, sem se refrear. Esta era evidentemente a base das perguntas de Salomão: “Pois, que vantagem tem o sábio sobre o estúpido? Que tem o atribulado por saber como andar diante dos viventes?” No sentido de que tanto o sábio como o estúpido tem anelos, o sábio não tem nenhuma vantagem. De modo similar, o atribulado talvez saiba como ocultar seus desejos perturbadores diante dos outros, mas ainda assim não os pode eliminar. Não sendo satisfeitos, continuam a afligi-lo. Ele tampouco é melhor do que o tolo. Portanto, o proceder sábio é que a pessoa esteja contente, usufruindo o que tem e o que pode ver com os olhos, em vez de ansiar outra coisa, deixando o desejo de alma privá-la da paz.

Outro fator que pode interferir no contentamento é não se reconhecer que muitas coisas simplesmente não podem ser mudadas. Salomão declarou: “O que veio a ser, seu nome já foi pronunciado, e tornou-se conhecido o que o homem é; e ele não pode pleitear a sua causa com alguém mais poderoso do que ele.” (Ecl. 6:10) Um homem pode obter riquezas e posição. Mas ele continua sendo nada mais do que se declarou que o primeiro homem era, um homem terreno, ’adhám, termo hebraico derivado duma raiz que significa “vermelho” ou “corado”. Sim, ele continua sendo terreno, mortal. Portanto, não pode fazer nenhuma negociata para se manter vivo por tempo indefinido. O salmista expressou esta idéia do seguinte modo: “Nenhum deles pode de modo algum remir até mesmo um irmão, nem dar a Deus um resgate por ele, (e o preço de redenção da alma deles é tão precioso, que cessou por tempo indefinido,) que ele ainda assim viva para sempre e não veja a cova.” — Sal. 49:7-9.

No melhor dos casos, neste sistema de coisas, a vida é muito incerta. O tempo e as circunstâncias sobrevêem a todos, aumentando a incerteza. Por este motivo, Salomão fez as seguintes perguntas: “Visto que há muitas coisas que causam muita vaidade, que vantagem tem o homem? Pois, quem é que conhece o bem que o homem tem na vida durante o número dos dias da sua vida vã, sendo que os gosta como a sombra? Pois, quem pode informar o homem sobre o que acontecerá após ele debaixo do sol?” — Ecl. 6:11, 12.

Visto que a morte acaba com todos os esforços e empenhos da pessoa, que vantagem real há nos bens materiais e no destaque que alguém possa obter? Quem pode realmente dizer com exatidão qual dos objetivos mundanos — riquezas, destaque, poder — vale a pena fazer o esforço? Quantas vezes acontece que as pessoas acham que algo é desejável, e, então, depois de obtê-lo, ficam desapontadas, talvez até mesmo amarguradas. O fato de que a vida é tão curta, ‘passando como uma sombra’, apenas aumenta o agravo. Não há maneira de se recuperar o tempo e reorientar os empenhos em prol de outro objetivo. Além disso, visto que não há maneira de se saber o que acontecerá após a morte da pessoa, o empenho por objetivos materialistas a favor dos filhos e netos, com a exclusão das coisas espirituais, tampouco leva a uma satisfação real.

Quão vigorosamente as palavras do sábio ilustram a necessidade de se estar contente’ tirando usufruto sadio da vida! Em vez de deixar que os desejos materialistas aumentem, a pessoa deveras sábia concentra-se em manter uma boa relação com Deus.