Teologia do Livro de Josué
Yahweh é poderoso
Três incidentes específicos são usados pelo autor do livro para destacar o poder de Yahweh como a causa fundamental do sucesso de Israel: a travessia do Jordão, a queda das muralhas de Jericó, e o prolongamento do dia durante a batalha de Gibeão. Cada um desses acontecimentos tem uma conotação polêmica, já que envolviam forças naturais supostamente sob controle dos deuses cananitas. O uso de estratégias claramente contrárias à lógica humana (no caso bem conhecido de Jericó e no caso da inutilização dos cavalos e carros de guerra na batalha contra Hazor, 11.6-9) ressalta o fato de que a capacidade bélica de Israel estava não em seus exércitos, mas no poder de seu Deus, que lutava por ele.
Yahweh é fiel
O livro abre com a garantia divina de que Sua fidelidade capacitaria Josué para a tarefa de substituir Moisés e conquistar a terra. Os memoriais erguidos no Jordão e as suas margens demonstravam que Israel percebia a fidelidade de Yahweh como a razão de sua chegada à Terra Prometida (4.3-9, 18). A construção do altar no monte Ebal (8.30-35) reforça tal convicção, principalmente por sua associação geográfica com o local onde Abraão primeiro recebeu a promessa de posse da terra (Gn 12.6, 7) e Jacó enterrou seus ídolos ao voltar de Padã-Arã para Canaã (Gn 33.18-20; 35.1-4).
Outros dois memoriais encontrados nesse livro indicam que Israel entendia seu triunfo como resultado da fidelidade de Yahweh: o altar das duas e meia tribos (22.24, 25) e a estela erigida por Josué (24.26, 27).
Fiel em todas suas aparições nas Escrituras, Calebe é o troféu da fidelidade de Yahweh em sua corajosa conquista da terra dos anaquins. O poder de Deus em vencer os mais temíveis inimigos (gigantes) é ressaltado no triunfo de Calebe, que tinha 85 anos ao empreender a sua conquista.
O resumo deste tema em Josué encontra-se nos capítulos 11.15, 16 e 23.14, 15, em que se enfatiza não apenas a fidelidade de Deus em realizar as bênçãos, mas também o castigo pela infidelidade da nação.
Yahweh odeia o pecado
Uma das figuras usadas para Yahweh no Pentateuco é a de um guerreiro (Êx 14.4; 15.3; Dt 3.22). No livro de Josué a figura ganha contornos ainda mais evidentes com a manifestação do שַׂר צְבָא יהוה (́śar ṣeḇāʾ ʾăḏônāy, príncipe da hoste do Senhor), que é entendido como uma cristofania (5.13; 6.5).
A atividade de Yahweh como o líder de Israel no campo de batalha precisa ser entendida como Sua vindicação da santidade divina ofendida por vários séculos devido ao estilo de vida depravado dos cananeus. O câncer moral que se instalara em Canaã nascera na tenda de Noé, após o dilúvio (Gn 9.20-27), e se perpetuara no caráter e na conduta dos descendentes de Cão (a maldição corporativa de Noé foi lançada contra o neto, porque ele haveria de reproduzir o caráter profano do pai).
Depois de séculos em que os testemunhos piedosos de Abraão e Melquisedeque foram ostensivamente rejeitados e toda sorte de maldade se tornara lugar-comum, Yahweh lançou-se à luta contra os cananeus e usou os israelitas para eliminar do mundo uma sociedade corrupta e corruptora.
A prova de que tal tratamento não era cruel, arbitrário e caprichoso é que o pecado de Israel foi punido com igual severidade (Js 7), de modo que a santidade de Deus ficasse evidente a todos, israelitas e cananeus. Outra prova é que a misericórdia divina podia se estender a não-israelitas, desde que, pela fé, se colocassem sob a mão de Yahweh (diretamente no caso de Raabe e indiretamente no caso dos gibeonitas).
Josué percebeu claramente que a absoluta santidade de Yahweh tornava impossível a Israel adorá-lo sem incorrer em falhas, que haveriam de suscitar a ira disciplinadora do Deus da aliança (24.19, 20). Em certo sentido, Josué profetizava os acontecimentos trágicos do livro de Juízes e apontava para a necessidade de uma provisão ainda maior que a oferecida pela lei mosaica.