Alegria na Teologia de Paulo
(Teologia do Novo Testamento)
Para Paulo, o cristianismo era a religião da alegria e também a religião da graça. Como tudo era graça no que dizia respeito a sua justificação, uma das principais consequências de sua reconciliação com Deus era a capacidade de alegrar-se “em Deus por nosso Senhor Jesus Cristo” (Rm 5,11 [BMD]), apesar das angústias, tribulações e provações que sentia.
1. O vocabulário da alegria
2. Estar em Cristo
3. O fruto do Espírito
4. Alegria no sofrimento
5. A escatologia da alegria
1. O vocabulário da alegria
Das 326 ocorrências das palavras que indicam alegria no NT, 131 encontram-se nas 10 cartas que costumam ser atribuídas a Paulo, isto é, 40 por cento. Mesmo que Efésios e Colossenses não sejam levadas em conta, ainda resta uma alta porcentagem do vocabulário de alegria no NT atribuível a Paulo. Assim, é bem possível considerar Paulo o teólogo da alegria, da mesma forma que, sem dúvida, ele era o teólogo da graça (88 das 153 ocorrências neotestamentárias de charis, “graça”, ou 58 por cento, encontram-se em Paulo). E significativo que os cognatos mais comuns de alegria (chara, “alegria interior”, e chairein, “alegrar-se”) derivem da mesma raiz char- que a palavra grega para “graça”, charis. Há uma ligação muito estreita entre os dois conceitos. Os que, como Paulo, experimentam a graça de Deus sabem que, estando firmes na fé (2Cor 1,24), continuam a celebrar a vida cristã como festa de alegria (ICor 5,8), em perfeita liberdade de todas as ansiedades, preocupações e medos.2. Estar em Cristo
Para Paulo, o cristão é alguém que está “em Cristo” ou, como disse J. Stewart: “O centro da religião paulina é a união com Cristo” (Stewart, 147). O cristianismo é um relacionamento pessoal com o Senhor ressuscitado. A ideia básica da carta aos Filipenses é: “alegrai-vos no Senhor” (F1 3,1; 4,4.10). O que J. Moffatt chamou de “história da alegria” está descrito em Filipenses 4,4-7, em que sua fonte subentendida é o Senhor Jesus Cristo ressuscitado e soberano. É possível suportar a luta da vida com circunstâncias externas e com a ansiedade interior, pois “o Senhor está próximo!”. Nossa segurança está no fato de sermos guardados pela paz de Deus, que mantém nossos corações e nossos pensamentos “em Jesus Cristo”. Como a primeira, a última palavra é um relacionamento pessoal, pois a história da alegria é “simplesmente a história da experiência sincera de um homem com seu Deus em Jesus” (Moffatt).
3. O fruto do Espírito
A vida cristã é uma vida de alegre liberdade, pois, com a vinda de Cristo, a lei foi suplantada pela graça. Em contraste com seus adversários da Galácia, Paulo declarou corajosamente sua confiança na cruz e em tudo que ela representava (G1 6,14). Os fiéis deviam ser capazes de se orgulhar não só da morte de Cristo vista como extensão do amor de Deus a todos os seres humanos, mas também da obra realizada por eles em cumprimento da lei de Cristo (G1 6,2; ver Lei de Cristo), mostrando aos outros o amor divino. Entre os mais de nove frutos do Espírito em Gálatas 5,22-23, a alegria está em segundo lugar na lista, como uma das três virtudes da vida interior. Está bem próxima da maior delas todas, o amor, e é seguida pela paz (ver Fruto do Espírito).
4. Alegria no sofrimento
Circunstâncias exteriores são alegremente aceitas como fatores do progresso moral e espiritual do cristão (Rm 5,3-4). Contudo, é em uma carta escrita na prisão que a ênfase paulina no dever da celebração em meio ao sofrimento chega ao auge. Apesar de tudo que lhe aconteceu e apesar de suas circunstâncias atuais, o apóstolo ainda assim alegra-se “no Senhor” e se gloria no trabalho realizado por seu Senhor. Quando a carta aos Filipenses chega ao fim, Paulo resume: “No mais, meus irmãos, alegrai-vos no Senhor” (F1 3,1), e passa, depois de um parêntese ou interpolação, a dar a razão de sua “alegria no Senhor” — “pois a nossa pátria está nos céus” (F1 3,20). A expectativa da vinda do Senhor Jesus Cristo e da mudança de “nosso corpo humilhado, para torná-lo semelhante ao seu corpo glorioso” (F1 3,21), basta para manter os cristãos cheios de esperança e alegria. Bengel expressou habilmente a mensagem de Filipenses: “eis o resumo da carta toda: eu me alegro, eu me alegro!” (Bengel, 766). 5. A escatologia da alegria Paulo liga a alegria à esperança cristã inúmeras vezes. Embora nenhuma criatura possa orgulhar-se diante de Deus (ICor 1,29), os cristãos alimentam a esperança de partilhar a glória de Deus na vida futura (Rm 5,2, BMD). Essa esperança mantém o fiel alegre (Rm 12,12), pois inclui não só a expectativa da vinda do libertador, o Senhor Jesus Cristo, para transfigurar nossos corpos físicos (F1 3,20-21), mas também nos assegura a alegria no mundo que há de vir. Desde que soframos com Cristo aqui e agora, podemos esperar participar de seu triunfo no futuro. Essa união com Cristo é o centro da religião paulina.
Bibliografia
D. J. A. Bengel. Gnomon Novi Testamenti. 3. ed. London, Macmillan, 1855; E. Beyreuther & G. Finkenrath. “Joy, Rejoice”, NIDNTT 2, 352-361; H. Conzelmann. “ X a íp c o k t A “ . TDNTIX, 359-372; J. Moffatt. “The History of Joy”. ExpT 9, 1897-1898, 334-336; W. G. Morrice. Joy in the New Testament. Grand Rapids, Eerdmans, 1985; J. S. Stewart. A Man in Christ. London, Hodder & Stoughton, 1935.