Estudo sobre Sofonias 1
I. INTRODUÇÃO (1.1)
v. 1. Acerca de Sofonias, sua genealogia e data,
v.
Introdução.
II. A DESTRUIÇÃO DO MUNDO: FOCO EM JUDÁ E
JERUSALÉM (1.2-6)
Um cataclismo cósmico, mais
destrutivo do que o Dilúvio nos tempos de Noé, de tanto os homens
quanto os animais [...] as aves do céu e os peixes do mar, é
esperado. Na teologia bíblica, o pecado do homem é sempre visto como tendo
consequências cósmicas. terra: heb. ,adãmãh aqui
e em 1.3. Cf. ’ene$, 1.18 (duas vezes); 3.8. Ambos os termos
podem significar simplesmente “terra”. Mas se Sofonias quer dizer que
Israel é o alvo principal da ira que inclui apenas alguns dos seus
vizinhos imediatos, ele está virando a escatologia de Amós (1.3—2.8;
5.18ss) de ponta-cabeça, pois Amós, em contraste com a crença popular,
inclui Israel com as nações que estão sob a ira universal, e não as nações
com Israel. A interpretação universal torna difícil a reconciliação de
1.2-18; 3.8 com 2.1ss,6,7,9,14, 15; 3.9-20. Mas para Sofonias, o homem
da cidade, a referência a rebanhos e manadas pastando onde antes
havia uma cidade é um retrato de abandono, assim como é 1.2ss.
(3.11-20)
V. tb. o comentário de 1.18;
2.13b,14a. Em 1.4-13, temos o retrato geral dos males em Judá. Entre
eles, estão o sincretismo religioso (v. 4ss), a deslealdade nacional (v. 8),
a pilhagem social (v. 9) e a indiferença a Javé (v. 12). Por outro
lado, esses versículos podem descrever vários desvios religiosos
(cf. Watts): adoração a Baal (v. 4) e a deidades assírias (v. 5), o
sincretismo entre javismo e a religião amonita (v. 5), a apatia em relação
ao javismo (v. 6), a adoração a Moloque (v. 8), a adoção de roupas de
cultos pagãos (v. 8), o sacrilégio do Lugar Santíssimo ou a participação
na adoração a ídolos (v. 9a), a introdução da adoração pagã no templo de
Jerusalém (v. 9b), e o consequente ceticismo materialista entre o povo
comum (v. 10-13). v. 4. o remanescente de Baal implica que as
reformas tinham sido iniciadas; v. Introdução: Data da composição.
Outros traduzem da seguinte forma: “(a adoração) a Baal até os últimos
vestígios (remanescente)”, mas a NVI é mais natural. Uma reavaliação
positiva da historicidade de 2Cr 34.3-7, geralmente questionada, ajudaria aqui.
Cf. J. Bright, p. 317; F. F. Bruce, Israel and the Nations (1969),
p. 71. A expressão “com os sacerdotes”, na VA, é omitida nos melhores
textos da LXX e é metrica-mente supérflua no TM. O heb. kõhanim
tem um conjunto amplo de significados incluindo sacerdotes javistas
ortodoxos e sacerdotes de outras religiões (BDB), mas o significado
de Pmãrim é incerto; cf. F. F. Bruce, Israel and the
Nations, p. 80; cf. Chemarim, NBD. O heb. ‘im hakõhamm,
“com os sacerdotes”, talvez seja uma forma corrompida de sêrn hakõhanim, uma
nota marginal mais antiga para explicar a forma rara sêm hatmãrím, os
nomes dos ministros idólatras e dos sacerdotes no texto original principal,
v. 5. o exército de estrelas: a adoração de deidades astrais era
uma característica da religião assíria adotada por Manassés (2Rs 21.3ss;
cf. ICC, p. 188ss). O trecho retrata o caos religioso em Judá: a
adoração pagã (v. 5a), o javismo sincretista, ou, talvez, o
politeísmo (v. 5b), a apatia (v. 6), a desilusão e o ceticismo (v. 12). Moloque:
malkam no TM significa “o rei deles”, i.e., o seu deus; ou Milcom,
o nome próprio da deidade amonita; cf. o verbete Malcã no NBD. O v.
6 talvez seja uma referência à rejeição do javismo em troca
dos cultos pagãos, ou pelo javismo sincretista, que distorcia de tal
forma a percepção do caráter de Javé que os profetas negavam completamente
que fosse javismo, ou ainda uma referência à apatia em relação a Javé.
III. ANÚNCIO E DESCRIÇÃO DO
DIA DO SENHOR (1.7-18)
v. 7. Calem-se: uma
expressão em harmonia com o temor e a reverência da ocasião. o dia do
Senhor: v. o artigo geral acerca da Teologia do Antigo Testamento
neste comentário. um sacrifício: consagrou seus convidados: Geralmente
Judá é identificado como a vítima, e os povos invasores, como os
visitantes consagrados, i.e., considerados cerimonialmente adequados (cf. 1Sm
9.22ss; 16.2-5). J. H. Gailey sugere que numa festa dessas
o convidado consagrado poderia ser honrado, ao passo que aqui os
convidados, que ele considera o povo de Judá, devem ser mortos. A
terminologia lembra de forma marcante a purificação sob o rei Jeú em 2Rs
10.18-28; cf. Sf 1.4. v. 8. líderes: i.e., os príncipes,
ou oficiantes do culto a Moloque. os filhos dos reis: Os
Filhos de Josias eram jovens demais (2Rs 23.26; 22.1; cf. ICC)-,
NEB: “casa real”. Watts traz “Filhos de Melek”, referência à deidade
amonita, ao transliterar o heb. melek, em vez de traduzir o termo
por rei. Cf. Moleque, Moloque no NDB. roupas estrangeiras: Evidência
de falta de respeito próprio nacional (IB: cf. 12b; Mt 11.8), ou, no
contexto, referência a roupas cultuais pagãs. v. 9. os que evitam
pisar a soleira (“aqueles que saltam sobre o umbral”, ARC): Essa
expressão obscura pode ser uma referência a (a) injustiça social; a
privação forçada pelos ricos sobre os pobres (Pusey); (b) roubo;
referência a evitar o contato com as deidades protetoras da casa que,
assim se cria, residiam na soleira (WG); (c) adoção de um costume
filisteu, cf, 1Sm 5.5, com a presença dos
“queretitas” (v. 2.5 adiante) ou “cários” no templo em 2Rs 11.4, 19;
(d) “os que saltam no terraço do templo” (NEB), subindo no Lugar
Santíssimo, ou na plataforma do altar (cf. Ex 20.24ss), “provavelmente uma
prática comum na adoração às estrelas” (Watts); (e) “que sobe no pedestal
[de um ídolo]” (Gerleman), i.e., “que adora um ídolo” (Hyatt). V. mais
sugestões no ICC. o templo de seus deuses: heb. “a casa
dos seus senhores” ou (a) o templo; LXX: “que enchem a casa do
Senhor, seu Deus, com falsidade e fraudulência”, ou, segundo Watts, “que
enchem [...] com seus senhores (ídolos), falsos e fraudulentos” (cf. 2Rs 21.3-8;
Jr 7.30; Ez 8.5ss); ou (b) o palácio real; bajuladores traiçoeiros e
infames na casa real (ICC); ou (c) casas da nobreza: prática
fraudulenta realizada por bajuladores da nobreza (WC). Entre
os distritos da cidade (v. 10,11), somente a localização da porta dos Peixes
é certa. A linguagem é vívida e coloca Sofonias entre os comerciantes
da cidade baixa (nr. da NVI: “lugar onde se faz argamassa”); Iit.
“pedreira”, i.e., “mina a céu aberto”, enquanto os sons horrendos da
derrota avançam progressivamente para perto da porta dos Peixes,
passando pelo novo distrito para as colinas em volta deles.
No TM, a mudança para o vocativo no v. 11 indica que esse é o ponto
de vista visionário do profeta, comerciantes, heb. lit.,
“cananeus”. Aqui, por insinuação, refere-se a judeus que negociavam em
desacordo com a religião, v. 12. vasculharei [...] com lamparinas-,
Javé, por meio do invasor, propositada e metodicamente vai conduzir cada
homem ao juízo, como vinho envelhecido-. A NEB parafraseia: “vão
sentar com letargia sobre os resíduos do seu vinho”. G. A. Smith, p.
54, deve ser consultado. O vinho que não é separado dos resíduos estraga;
da mesma forma o povo de Deus, cujas vidas ficaram imperturbadas por
muito tempo, perderam a vitalidade e sentido de destino. “O Senhor nada fará, nem bem nem mal”-, i.e., ele é irrelevante para
a vida porque não tem significado nem faz diferença; ou seja, esta é
a negação máxima da revelação veterotestamentária do caráter de Javé como
“aquele que age”; cf. J. N. Schofield, Introducing OT Theology
(Londres, 1964), cap. 2. A teologia é um elemento fundamental na formação
do caráter, das atitudes e do comportamento; cf. 2Co 3.18. “Ser
transformado na mesma imagem” aplica-se tanto aos adoradores que têm
uma concepção equivocada da divindade quanto aos adoradores do próprio
Javé; Jr 2.5,8,11. Ao negar a intervenção divina na história, o
próprio povo de Deus tornou-se indiferente e inativo, v. 13,14. A suposta
incoerência entre os v. 13 e 14 (IB) se deve a um literalismo
exagerado na interpretação da apresentação vívida dos diferentes aspectos
da verdade. A frustração da ambição materialista (v. 13) e a proximidade do
juízo (v. 14) não são incompatíveis particularmente se está em vista o
cronograma da vida das nações, os guerreiros gritarão-, NEB: “O dia
do Senhor será mais rápido que um corredor, e mais veloz que um
guerreiro”. G. A. Smith: “Um homem forte vai chorar amargamente”. O melhor
estilo hebraico da emenda textual da NEB é compensação insuficiente para a
falta de mordacidade, v. 15. Aquele dia será um dia de ira\ Ira,
como uma iniciativa vigorosa contra o pecado, é um antropopatismo.
Expurgado das noções de
perda de controle associadas com as paixões humanas, é uma imagem legítima
e necessária. Os efeitos da ira divina são crise emocional profunda, perda
de posses materiais, transtornos cósmicos e o terror da invasão (v.
15,16). Cf. 1.18. v. 17. aflição [...] como se fossem cegos:
Descreve o estado de choque sem propósito e direção e as condições cambaleantes
dos homens diante da magnitude da calamidade, sangue [...]
como poeira: Os sinais da morte violenta tornam-se uma banalidade
como a poeira, entranhas: O hebraico é incerto. O único outro uso
está em Jó 20.23, e possivelmente é um eufemismo para “intestinos” (NEB). lixo:
Paralelo a poeira-, comum demais para evocar um comentário numa
sociedade que usava animais para o transporte e que não possuía um
sistema moderno de esgoto subterrâneo, v. 18.prata [...] ouro
[...] salvá-los: “Comprar” um invasor era prática comum, de modo
que não há ligação certa com Psamético do Egito e os citas invasores
(Heródoto, História, I. 104, 5). zelo [...] será
consumido: Apesar de ter um problema métrico, da sua relação com 3.8, da
sua tautologia com a linha seguinte e da destruição universal predita, não
há evidências concretas nos manuscritos para interpolações (cf. IB:
Hyatt). O zelo divino (cf. 1.15) é uma paixão que gera confiança e um
relacionamento de lealdade entre Deus e o seu povo pelo qual ele vai
erradicar a incursão que seja prejudicial ao relacionamento.
ele dará fim
repentino a todos os que vivem na terra: O fato de essa
destruição total impedir qualquer possibilidade do tipo de relacionamento que
deveria gerar não incomoda Sofonias, a não ser a preocupação em
2.1ss! Só isso já seria suficiente para advertir contra a aplicação
de uma hermenêutica literal. Sofonias ainda não enxergava a revelação
neo-testamentária de um novo relacionamento purificado de toda mancha e
que culminasse numa vida após a morte (Cf. Cl 1.21, 22; Jd 24; Rm 8.28ss;
ICo 15.42ss; Fp 1.23; lTs 4.13ss etc.).