Lucas 5 — Estudo Devocional

Lucas 5 

Lucas 5 apresenta uma narrativa poderosa de transformação, obediência e da graça ilimitada de Jesus. Neste capítulo, testemunhamos o chamado dos primeiros discípulos de Jesus, a cura de um leproso e a celebração da comunhão com os pecadores. Estas histórias servem como um lembrete do impacto transformador do encontro com Cristo e da natureza radical do Seu amor.

O capítulo começa com Jesus chamando Simão Pedro, Tiago e João para serem Seus discípulos. A resposta deles ao chamado de Jesus é imediata e sincera. Apesar da exaustão após uma noite de pesca sem sucesso, eles obedecem à ordem de Jesus de lançar novamente as redes. A pesca milagrosa revela a autoridade de Jesus sobre a natureza e prenuncia os seus novos papéis como “pescadores de homens”. Este relato fala do poder transformador do encontro com Jesus – muda as nossas prioridades, redirecionando-nos para um propósito maior do que nós mesmos.

A cura do leproso ilustra ainda mais a compaixão e a disposição de Jesus em ajudar aqueles considerados impuros e excluídos. O apelo do leproso por cura e a resposta de Jesus destacam a autoridade do Senhor sobre o quebrantamento físico e espiritual. A cura do leproso sublinha a capacidade de Cristo de restaurar e curar aqueles que se aproximam dele com humildade e fé.

Um dos momentos mais comoventes deste capítulo é a interação de Jesus com Levi (também chamado de Mateus), um cobrador de impostos. Jesus convida Levi a segui-lo, e Levi responde deixando tudo para trás para se tornar um discípulo. A resposta de Levi é um testemunho poderoso do fascínio da presença de Jesus – uma presença que nos obriga a abandonar os nossos velhos hábitos e a segui-Lo com completa devoção.

As críticas dos fariseus à escolha de Jesus de se associar com os pecadores preparam o terreno para a resposta de Jesus, destacando a Sua missão de chamar os doentes espirituais ao arrependimento. A sua declaração: “Não são os sãos que precisam de médico, mas sim os doentes”, enfatiza a inclusão do Seu convite à salvação.

Lucas 5 nos convida a refletir sobre nossos próprios encontros com Jesus e nossa resposta ao Seu chamado. Tal como os discípulos abandonaram os seus meios de subsistência para seguirem a Cristo, somos desafiados a renunciar às nossas zonas de conforto e noções preconcebidas por causa do Seu reino. Também nos lembramos do coração de Jesus pelos marginalizados e marginalizados. Sua disposição de cear com os pecadores ilustra a profundidade de Sua graça e Seu desejo de estender o perdão e a transformação a todos os que vêm a Ele em arrependimento.

Ao contemplarmos Lucas 5, abramo-nos ao poder transformador de Cristo. Tal como os discípulos, possamos atender ao Seu chamado com corações dispostos, abraçando uma vida de obediência e propósito. E nunca esqueçamos a profundidade da Sua graça – uma graça que vai além das nossas deficiências e nos convida a uma comunhão de cura e restauração.

Devocional

5.1-11 De agora em diante você vai pescar gente. Este texto conta o chamado de Simão Pedro e mais outros companheiros para serem discípulos de Jesus, o que provocou uma grande transformação na vida deles (veja as notas seguintes).

5.2 estavam lavando as redes. O começo da transformação inicia com um chamado, uma visita de Jesus, que pode ser acolhida ou não. Este chamado de Deus acontece no meio do nosso cotidiano — não é preciso fazer algo especial para receber o chamado. É hora de reconhecer a visita de Jesus no cotidiano, no processo de "lavar as redes" — rituais de purificação do nosso fazer diário. Parece que o lidar com purificação, quer material, quer espiritual, nos aproxima da dinâmica do limpar o velho para abrir-se ao novo.

5.3 entrou num dos barcos, o de Simão. Aqui Jesus inicia o relacionamento com aquele que será a pedra sobre a qual a igreja será construída. Como inicia? Com Pedro deixando que Jesus entre no seu barco. Deixar que Jesus entre — para muitos não é fácil, pode soar como invasão de privacidade, pediu que ele o afastasse um pouco da praia. Então sentou-se e começou a ensinar. O chamado de Deus muda o ângulo do cotidiano. O que significa este afastamento do chão firme da praia? Talvez um afastamento dos chãos construídos por nós, da nossa rotina de sempre; afastamento dos ângulos com que observamos as coisas e nos quais nos sentimos seguros. A devoção serve para mudar o ponto de vista; a quietude muda o olhar (4.42). Isto também significa ousar ser diferente: afastamento dos padrões de todos — ser diferente, para ser usado. Que o meu barco — meu ofício, habilidade, dom, trabalho — o que quer que seja meu habitat cotidiano, possa ser um assento usado por Jesus para ensinar. Que seja um lugar por onde a graça possa aparecer e escoar.

5.4 Leve para um lugar onde o lago é bem fundo. Vemos aqui um sentido duplo: "Águas profundas" pode ser uma indicação para o cotidiano do pescar. Jesus favorecería os negócios humanos de Pedro, usando seu poder, que exerce sobre a natureza, sobre todos os seres. A criatividade de Deus continua — ele pode continuar criando peixes e mais peixes. Pedro verá isso acontecer um pouco mais tarde, na multiplicação dos pães. Podemos também utilizar o sentido metafórico: deixar-se ir para as "águas profundas" da espiritualidade — lá onde não consigo mais ter chão e domínio, onde tenho de me deixar levar. Pode ser lugar de turbulências, de correntes submersas, de embates que envolvam dinâmicas inconscientes, onde minha profundidade é revolvida pela profundidade de Deus. Na vida de Pedro, é isto o que acontecerá. Aos outros, foi dada uma ordem diferente — apenas pescar. São as singularidades do ministério, que nem sempre são entendidas num Corpo de Cristo que teima em querer se uniformizar (veja jo 21.21-22).

5.5 já que o senhor está mandando jogar. Pedro começa a mudar o eixo do seu trabalho: já não é a lógica e seu próprio conhecimento que dominam, mas a obediência a partir do reconhecimento de quem é Jesus. O arriscar-se ao ridículo, o sentir-se exposto, tudo isso faz parte. Agora, o "Eu Sou" determina as ações — aquele que foi antes de tudo, no qual todas as coisas foram criadas, as visíveis e as invisíveis. Assim começa a carreira de um pescador de homens.

5.8 afaste-se... pois eu sou um pecador. O milagre da pesca abundante deixou claro para Simão que ele estava lidando pessoalmente com Deus; e isso imediatamente traz à tona a dura realidade dos nossos erros e do castigo que eles merecem.

5.10-11 Não tenha medo! De agora em diante você vai pescar gente. O amor e a graça de Jesus são maiores do que nossos pecados. Ele nos chama sabendo exatamente quem somos, e é para segui-lo, não para castigar nossas maldades. Como Jesus havia deixado claro na sinagoga de Nazaré, agora é tempo de salvação, e não de condenação (4.19, nota).

5.12-16 tinha o corpo todo coberto de lepra. Nos tempos de Jesus a lepra não tinha cura; era extremamente contagiosa e uma das enfermidades mais repugnantes. O leproso era condenado ao total confinamento, longe dos familiares e da sociedade; ninguém ousava tocar em um leproso, por medo de ser contagiado. A fé em Jesus Cristo fez com que aquele homem leproso se ajoelhasse diante de Jesus (gesto de adoração), encostasse o rosto no chão (gesto de humildade) e pedisse a cura (gesto de fé). Jesus sempre compadecia-se dos que sofriam e, diante de tamanha fé, estendeu o seu gesto de Pai amoroso, atendendo ao pedido do enfermo. Jesus está atento às súplicas dos que com singeleza de alma e humildade, a exemplo do leproso, buscam a cura dos seus males.

5.14 Não conte isso para ninguém. Como sempre, Jesus procurava discrição diante dos sinais e prodígios que espontaneamente realizava. Evitava os estardalhaços e propaganda, tão comuns nesses acontecimentos, vá pedir ao sacerdote que examine você. Quando Deus cura alguma doença, o resultado vai aparecer claramente nos exames; não evite o necessário exame médico ou de laboratório: ninguém jamais perdeu uma cura por não querer ser examinado. vá oferecer o sacrifício que Moisés ordenou. Este sacrifício, ordenado em Lv 14, era realizado com oferendas de animais, cereais ou vinho; tratava-se de uma cerimônia simples, sem pompa e sem alarido: a pessoa a oferecer o sacrifício comprava o animal ou objeto e, para se purificar, entregava-o ao sacerdote. Cumprido o exame e ato de purificação, voltava ao convívio familiar e à sociedade.

5.15 muita gente vinha para ouvi-lo e ser curada. Apesar do cuidado que Jesus tinha para evitar a divulgação, as notícias sobre as suas mensagens e os milagres se espalhavam por todas as localidades.

5.16 Porém Jesus ia para lugares desertos e orava. Jesus, evitando divulgações e espetáculos, afastava-se cada vez mais para lugares distantes das multidões, e buscava ficar a sós com o Pai.

5.17-26 os seus pecados estão perdoados. O paralítico foi trazido por amigos que criam em Jesus. Mas o povo judeu daquela época cria que doenças assim eram castigo de Deus pelos pecados cometidos (veja, por exemplo, Jo 9.2, nota). Jesus mostra que tem autoridade sobre ambos os problemas: os pecados e a doença, e faz o que só mesmo Deus poderia fazer.

5.27-32 viu um cobrador de impostos. Na época de Jesus, o Império Romano exercia a dominação política e econômica sobre o povo judeu, e para cobrança dos tributos, nomeava homens de confiança do Império entre os próprios judeus. Esses indivíduos gozavam de regalias, eram conhecidos como publicanos, mas os judeus alimentavam ódio contra eles, a ponto de considerá-los como traidores, ladrões, opressores e até gentios. Levi (outro nome para Mateus) era um desses publicanos, e Jesus o escolheu para ser seu discípulo, dizendo "venha comigo". A escolha de um publicano para compor o discipulado de Jesus mostra critérios muito diferentes dos que nós usaríamos. Os líderes judeus ficaram enfurecidos e censuraram os discípulos de Jesus por compartilharem a mesa de pessoas de má fama. O critério apontado por Jesus fundamenta-se não no mérito individual, mas no princípio da graça redentora: os que têm saúde não precisam de médico... Eu não vim para chamar os bons, mas para chamar os pecadores. Isso serve de orientação para nossas igrejas, para abrir as portas aos oprimidos e necessitados, os que se encontram mergulhados no lamaçal do pecado — drogados, viciados, corruptos, homicidas, adúlteros e outros que estão à margem da sociedade — oferecendo-lhes o caminho do arrependimento e salvação. A igreja precisa se distanciar do preconceito e ir em busca das ovelhas perdidas que se encontram à beira dos abismos deste mundo.

5.33-39 os discípulos do senhor não jejuam. O jejum sempre fez parte da cultura religiosa de muitos povos, entre os quais o judeu. No Antigo Testamento, o jejum era uma prática espiritual do povo de Deus. No Novo Testamento também está registrada a prática do jejum pelo povo de Deus. O traço marcante do jejum é a abstinência de comida ou bebida por determinado tempo, em busca de concentração espiritual, e em alguns casos de mais quebrantamento e consagração na expectativa de alcançar determinada graça diante de Deus. Em todas as circunstâncias, o jejum está relacionado à comunicação com Deus. No referido texto, Jesus se utilizou da figura do noivo para esclarecer que ao ser ele tirado do convívio dos seus (com a sua morte), seus discípulos iriam jejuar. 

5.36-37 vinho novo em odres novos. Jesus aproveita a reclamação dos fariseus e passa o ensinamento fundamental, utilizando uma figura feminina (costura) e outra masculina (odres e vinho): a nova aliança que ele inaugura não é um reforço ou remendo da velha. E uma aliança realmente nova, diferente da antiga. Ao enviar Jesus Cristo, Deus não quis apenas que continuássemos seguindo os Dez Mandamentos. Ele fez uma aliança absolutamente nova com a morte de Cristo na cruz e sua ressurreição. As atitudes e ensinos de Jesus ilustram isso, especialmente os acontecimentos relatados próximos deste trecho. Veja o quadro "Velha aliança e nova aliança" (Jo 1).

5.39 depois de beber vinho velho. Jesus denuncia a dificuldade que o povo de Deus tinha em abandonar a aliança da obediência à Lei para adotar a "obediência da fé" nele (Rm 1.5, nota). Veja o testemunho de Paulo a esse respeito em Fp 3.5-11 e o quadro "O lugar da lei" (Cl 3).