Evangelho de João — Método Literário

Método Literário do Evangelho de João


O reconhecimento das fontes como uma unidade literária foi obscurecido pela atenção dada aos “deslocamentos”. Uma vez dada atenção à formação literária do quarto Evangelho, a habilidade do autor em utilizar suas fontes é notória e o propósito de “relocalização” é visto como sendo desnecessário. Nota-se mui rapidamente que a faixa de vocabulário deste Evangelho é severamente limitada e, contudo, esta limitação acentua a força dramática de sua apresentação. Devido à faixa limitada de vocabulário, há uma repetição de palavras e locuções; contudo, estas nunca se tornam monótonas. Não há nenhuma tentativa de elegância de expressão; mas, por toda a simplicidade de apresentação, seu grego jamais é impreciso. Esta simplicidade conjugada, entretanto, à precisão, levou à conclusão de que o grego não era a língua nativa do autor.

O que causa uma surpreendente impressão, ao se ler o quarto Evangelho e compará-lo com os Sinópticos, é a ausência de palavras e expressões, usadas pelos outros evangelistas, que se esperaria encontrar em João também. Os seguintes termos são usados muito pouco ou nenhuma vez por João: reino, demônios, povo, homens justos, chamada, poder (Gr.: dunamis), compaixão, evangelho, orar, oração, pregar, arrepender-se, parábola, publicano e saduceu. Patente em sua ausência é o substantivo “fé” (Gr.: pistis),e,contudo, o verbo “crer” (Gr.: pisteuein) ocorre 99 vezes. A frequência do uso, pelos Sinópticos, destes outros termos pareceria torná-los palavras cardinais na proclamação do evangelho, e seria de se esperar encontrá-los no quarto Evangelho. Mas tal não é o caso.

Por outro lado, João tem várias palavras importantes que ou estão faltando ou são usadas escassamente pelos outros evangelistas: amor (Gr.: ágape), usada 44 vezes), saber (Gr.: ginosko), 57 vezes), verdade (aletheia, 46 vezes), mundo (Gr.: kosmos, 78 vezes), vida (55 vezes), luz (23 vezes) e seu oposto, trevas (8 vezes), e Consolador (Gr.: parakletos, 4 vezes e somente em João). A estas palavras podem ser acrescentadas idéias tais como, testemunho, permanecer, e a ênfase especial sobre o termo “logos” no prólogo. “Logos” aparece 40 vezes em João e 36 das ocorrências não tem nenhuma implicação teológica; somente os quatro usos no prólogo (1:1,14).

Outras características do quarto Evangelho são vistas no duplo sentido, dentro do mesmo contexto, que João dá a algumas palavras: outra vez, de cima; Espírito, vento; levantar na cruz, levantar em exaltação. Foi estimado que existem cerca de 50 características distintas encontradas em João. O uso de meta\tauta (“depois destas coisas”), para a transição de um incidente para outro, é um exemplo. Outro é o uso de kai/para ligar orações (chamado parataxe), ao invés de usar orações coordenadas. Isto tende a dar a impressão de simplicidade de estilo. Expressões como “o último dia”, “dar alguém a sua vida”, “respondendo, disse”, e o uso do pronome pessoal genitivo com um substantivo levando o artigo definido, são todos exemplos do estilo literário do autor. Estes estão de tal maneira espalhados pelo Evangelho, que dão a impressão de uma única mão. João também dá discursos extensos, que apresentam primeiramente um aspecto de um tema e depois outro. Estes discursos estão de tal modo entrelaçados, que apresentam profundas verdades teológicas, apoiadas por repetição e afirmações metafóricas, que se aproximam do uso das parábolas pelos Sinópticos. Uma característica ausente surpreendente é o do idioma semítico. Se João é o autor, é de se esperar que, sendo judeu, alguma influência semítica fosse encontrada no texto. Contudo, não entram no texto grego semitismos patentes. Estes foram traduzidos no próprio idioma do meio em que o Evangelho foi escrito. Isto indicaria que o Evangelho, conforme o temos, não é uma tradução de um original aramaico.