Interpretação de Marcos 16

Marcos 16

A Ressurreição do Senhor. 16:1-20.

O último capítulo do Evangelho encaixa em duas seções inteiramente distintas. A visita das três mulheres à sepultura ocupa 16:1-8. O restante do capítulo, 16:9-20, forma um sumário dos aparecimentos de Cristo depois da ressurreição, concluindo com a sua ascensão.

16:1. Considerando que o sábado terminava ao pôr-do-sol, parece que as três mulheres mencionadas em 15:40 foram a uma das vendas que se abriram novamente à tarde e compraram o material necessário. Os aromas (arômata) eram líquidos, tais como o azeite perfumado, pois as mulheres planejavam ungir o corpo de Jesus.

16:2. E muito cedo. João diz que ainda estava escuro (20:1), quando Marcos afirma que foi ao despontar do sol. O conflito aparente resolve-se facilmente se supormos que as mulheres começaram a sua caminhada enquanto ainda estava escuro e chegaram à sepultura exatamente quando o sol nascia.

16:4. E, olhando. A palavra é anablepô, significando “levantaram os olhos”. Talvez elas se aproximaram andando de cabeças abaixadas.

16:5. Marcos conta que viram um jovem. Mateus descreve a pessoa como sendo um anjo que removera a pedra (28:24). E Lucas diz que havia dois homens com vestidos resplandecentes (24:4). A variedade é uma evidência de que estas são as narrativas de diversas testemunhas oculares, cada uma descrevendo o que mais a impressionou. A história completa incluiria o aparecimento de dois anjos, um dos quais rolou a pedra e falou às mulheres. Surpreendidos. A palavra seria melhor traduzida para completamente atônitas. Lenski usa a palavra “mudas de surpresa” (Interpretation of Mark, pág. 742).

16:6. Não vos atemorizeis. Poderia ser traduzido para Deixem de ficar completamente atônitas. O anjo assegurou-lhes que Jesus ressuscitou e que não estava mais ali, em prova do que chamou a atenção delas para o lugar onde o puseram. João 20:6, 7 informa-nos que os panos que o envolviam ainda estavam lá.

16:7. Observe como Pedro foi destacado nos preparativos para uma reunião na Galileia. Através disso o discípulo caído recebeu a certeza de que Cristo não o rejeitara como resultado de suas negativas (14:66-72). Uma comparação feita com os outros Evangelhos mostra que os discípulos não partiram imediatamente para a Galileia e que Cristo apareceu primeiro a Pedro (Lc. 24:34) e depois aos discípulos naquela tarde (Lc. 24:36). A reunião na Galileia foi registrada em Mt. 28:16-20.

16:8. Estavam possuídas de temor e de assombro. O original de Marcos é mais vigoroso. Ele diz: “...foram tomadas de tremor e espanto”. Não foi sem razão que fugiram do sepulcro. A declaração de que nada disseram a ninguém deve ser entendida à luz dos outros Evangelhos. Nada disseram ao longo do caminho, pois estavam com medo e com pressa de levar a notícia aos discípulos (cons. Mt. 28:8; Lc. 24:9, 10).

Nota textual. 16:9-20. Nos dois manuscritos do N. T. grego mais dignos de crédito (do Vaticano e o Sinaítico) o Evangelho termina com 16:8, como acontece também com diversas versões mais antigas. Tanto Eusébio como Jerônimo declaram que o final estava ausente na maior parte dos manuscritos do seu tempo. Além disso, diversos textos e versões oferecem um substituto mais resumido de 16:9-20. Maior número de manuscritos têm a conclusão mais longa, mas grande parte deles são de data recente e de qualidade inferior. Pelos padrões reconhecidos da avaliação textual, tanto as conclusões mais longas como as mais curtas devem ser rejeitadas, e esse é o julgamento de quase todos os mestres do texto. Lenski é um dos poucos comentaristas que argumenta em favor da conclusão mais longa (Interpretation of Mark, pág. 750-755). Além disso, um exame dos versículos 9-20 não deixa de impressionar o estudante atento com o fato de que esses versículos diferem acentuadamente no estilo do restante do Evangelho. Talvez a explicação mais aceitável seja que o final do evangelho original tenha sido rasgado e perdido antes que cópias adicionais fossem tiradas. Talvez outros tenham tentado acrescentar um final substitutivo, sendo o mais bem sucedido aquele que agora aparece em 16:9-20.

16:9-11. A narrativa original, que aqui foi resumida, encontra-se em Jo. 20:11-18. Observe que a ênfase do autor foi colocada sobre a incredulidade dos discípulos (Mc. 16:11, 13, 14).

16:12, 13. Para uma narrativa mais completa deste acontecimento, veja Lc. 24:13-35. Em outra forma. Lc. 24:16 diz que seus olhos estavam de algum modo afetados de modo que não reconheceram Cristo. Se Cristo realmente mudou a sua aparência não o sabemos. Os outros eram os onze discípulos em Jerusalém (Lc. 24: 33).

16:14-18. Este aparecimento aos onze seguiu-se imediatamente depois do aparecimento aos viajantes de Emaús (Lc. 24:36-49; Jo. 20:19-25). Lucas e João não dão a impressão de que Jesus os tenha repreendido por causa da incredulidade e dureza de coração, mas que ele reconheceu como era difícil para eles crer, e procurou remover essa dificuldade oferecendo provas da sua ressurreição. Quem crer e for batizado. Este versículo tem sido usado por alguns para tentar provar que o batismo é necessário à salvação. Em primeiro lagar, o fato de que a declaração só aparece nesta conclusão controvertida do livro de Marcos deveria indicar a necessidade de cautela no uso do versículo como prova. E então, deve-se notar que na segunda metade do versículo a única base para a condenação é a recusa em crer. Pode-se, portanto, concluir que a única base para a salvação é a fé. Tal interpretação está em completa harmonia com o todo dos ensinamentos do N. T. em relação ao assunto (cons. Rm. 3:28; Ef. 2:8, 9). A declaração relativa à expulsão de demônios e falar em novas línguas (v. 17) pode muito bem ser uma referência aos acontecimentos na igreja primitiva conforme narrados em Atos. Até mesmo as palavras sobre o pegar em serpentes podem ser alusivas à experiência de Paulo em Atos 28:1-6. O N. T. não contém nenhuma outra passagem que fale de beber veneno (alguma coisa mortífera). Mesmo se esta passagem fosse indiscutivelmente genuína, não poderia ser racionalmente usada como base para deliberado e presunçoso manejo de cobras e para se beber veneno conforme praticado por algumas seitas religiosas extremistas.

16:19, 20. Este resumo final refere-se à ascensão de Cristo e o ministério sucessivo dos seus seguidores. A frase, depois de lhes ter falado, parece implicar que a ascensão de Cristo aconteceu imediatamente após seu aparecimento aos onze à tarde do dia da sua ressurreição (vs. 14-18). Entretanto, uma comparação com Lucas 24:50-53 e Atos 1:1-11 mostra que se passaram quarenta dias depois da sua morte. O versículo final pode muito bem servir como um pequeno resumo do livro de Atos. O Senhor e confirmando a palavra. Observe a extraordinária semelhança com Hb. 2:4.