Ódio — Estudos Bíblicos
ÓDIO
Esboço:
I.
Palavras Empregadas: Significação
II.
Coisas Odiadas com Razão
III. O
Caráter e as Obras do Ódio
IV. O
Ódio em I João 4:20
V. O
Ódio Exemplificado em Personagens da Bíblia
VI. O
Ódio Divino
VII. O
Ódio e a Possessão Demoníaca
I. Palavras Empregadas: Significação
A palavra hebraica mais
comum para indicar o ódio é sane, que ocorre no Antigo Testamento por cerca de
cento e quarenta vezes, desde Gên. 24:60 até Mal. 2:16. E o termo grego é miseo,
“odiar”, que aparece por trinta e nove vezes no Novo Testamento: Mat 5:43; 6:24;
10:22; 24:9,10; Mar. 13:13; Luc. 1:71; 6:22,27; 14:26; 16:13; 19:14; 21:17;
João 3:20; 7:7; 12:25; 15:18,19,23,24; 15:25 (citando Sal. 69:5), 17:14; Rom.
7:15; 9:13 (citando Mal. 1:2,3); Efé. 5:29; Tito 3:3; Heb. 1:9 (citando Sal.
45:8); I João 2:9,11; 3:13,15; 4:20; Jud. 23; Apo. 2:6; 17:16; 18:2.
Essas palavras projetam
ideias como aversão, hostilidade, desdém, malignidade, malquerença, etc. O ódio
é uma das emoções básicas, sendo verdadeiramente universal. Para o crente,
especialmente, há alguns objetos que podem ser legitimamente odiados, como a
idolatria, o pecado, em todas as suas manifestações, a adoração
insincera e distorcida, etc. Usualmente, porém, o ódio faz parte da
natureza carnal e corrupta do homem, embora, por muitas vezes, seja
apresentado como se fosse um nobre sentimento. O ódio, normalmente, é
uma forma maligna de má vontade, algumas vezes vinculado ao temor
de que o objeto odiado seja capaz de prejudicar a quem o odeia. A
ira quase sempre é um elemento que faz parte do ódio.
II. Coisas Odiadas com Razão
Lemos que Deus odeia o
mal (Pro. 6:6); e os justos fazem bem em fazer a mesma coisa (Sal. 97:10). Davi
declarou que obtinha entendimento por meio dos preceitos divinos, e assim
ele odiava todo caminho falso (Sal. 119:104). Quase todos nós somos muito
seletivos sobre as formas de mal que abominamos. Amamos certos males; e outros,
odiamos, dependendo do estágio de desenvolvimento espiritual a que já tenhamos
chegado. Devemos odiar a idolatria (Deu. 12:31), como também a adoração
sem sinceridade (Amós 5:21-23). Devemos odiar aquelas coisas que ameaçam a
integridade espiritual da comunidade espiritual (Mal. 2:16), como a
mentira (Sal. 119:163) e o desvio (Sal. 101:3). Os malfeitores são odiados
(Sal. 5:5). Tudo isso reflete a atitude do Antigo Testamento. As
próprias pessoas não devem ser odiadas, mas as coisas que elas
fazem, quando são más, devem sê-lo (Judas 3; Apo. 2:6).
III. O Caráter e as Obras do Ódio
O ódio
já é homicídio, e leva à prática do mesmo (Mat. 5:21,22; I João 3:15). O
ódio é uma das obras da carne, pelo que é contrário às virtudes cultivadas
pelo Espírito, principalmente ao amor, que é o seu oposto (Gál. 5:20). Com
frequência, o ódio oculta-se por detrás de uma capa de engano (Pro. 10:18;
26:26). O ódio provoca a contenda (Pro. 10:12); amargura a vida do
indivíduo (Pro. 10:12); não é coerente com o conhecimento de Deus (Rom. 1:30);
é contrário ao amor divino (I João 4:20), e, assim sendo, caracteriza os
incrédulos, da mesma forma que o amor é o principal sinal dos remidos (I
João 4:7ss.). O ódio milita contra Deus (Rom. 1:20), contra Cristo (João 15:26),
contra o Pai e contra o Filho (João 15:23,24). O povo de Deus é odiado
pelos que não são de Cristo (João 15:18). Aqueles que perseverarem no
ódio, serão fatalmente castigados (I Cor. 15:25, Heb. 10:28-31).
IV. O Ódio em I João 4:20
1 João 4:20: Se
alguém diz: Eu amo Deus, e odeia seu irmão, é mentiroso. Pois quem não ama
seu irmão, ao qual viu, não pode amar Deus, a quem não viu.
(Ver o artigo sobre Mandamento,
o Novo). O amor fraternal nos é aqui recomendado, aquele que odeia seu
irmão acha-se em “trevas”, isto é, pertence à “maldade cósmica”, sendo
participante da rebelião geral ou universal. Encontra-se espiritualmente “cego”
(ver I João 2:11). Caim odiou seu irmão Abel, e terminou por matá-lo (ver I João
3:12 e ss). Ele nos mostrou o que é o ódio, e para onde o ódio nos
conduz. Por outro lado, o indivíduo que “passou da morte pare a vida” ama
seus irmãos, não o fazendo, contudo, os que permanecem na “morte espiritual”,
porquanto ainda não nasceram de Deus em qualquer sentido. (Ver I João 3:14).
Sabemos quando temos começado a participar do amor divino, quando
começamos a amar os irmãos, porquanto o Espírito se movimenta em nós a fim
de nos inspirar nesse caminho (ver I João 3:14). O ódio é assassino,
do ponto de vista espiritual (ver I João 3:15 e Mat. 5:21,22). O amor,
por outro lado, está associado à outorga de uma vida superior e
desde agora nos podemos ocupar do mesmo.
E odiar seu irmão, é
mentiroso. Tal indivíduo não pode amar Deus, que está distante, se odeia o
homem, criatura de Deus, criada segundo a sua imagem, sobretudo se
tratar-se de um crente, que já começou a participar da própria vida de
Deus, trazendo a imagem do Filho, que nos está bem próxima. Tal indivíduo
não pode amar o Criador, se odeia sua criatura. Aquele que odeia,
portanto, é um ”mentiroso”, se disser que ama Deus. Amamos Deus amando
o próximo (ver Mat. 25:35 e ss). Somente através da ascensão
mística exaltada da alma (que ultrapassa a capacidade da maioria dos
homens) é que alguém pode amar diretamente Deus. Normalmente, Deus é amado
por ser amado através de suas criaturas, porque são amados aqueles que estão
sendo transformados segundo sua imagem. Esse tipo de amor é possível a todos os
homens. Se alguém compartilha da natureza moral de Deus, mediante o novo
nascimento, não pode odiar a criação de Deus.
Aquele que odeia
tem as seguintes características:
1. Está
envolvido pelas “trevas” e cativado pela malignidade cósmica (ver I João
2:11).
2. Está
cercado de armadilhas e tropeços, por ter uma personalidade corrompida (ver I
João 2:11), que é prejudicial a outros, e não benéfica.
3. Está
cego (ver I João 2:11).
4. Seus
pecados não estão perdoados; não é pessoa convertida (ver I João 2:12).
5. Não
tem comunhão com a luz de Deus (ver I João 2:10).
6. A
obra de transformação segundo a imagem de C sto ainda não obteve nele
qualquer fruto, o amor não está nele aperfeiçoado (ver I João 4:12).
7. Por
conseguinte, tal indivíduo não desfruta da presença habitadora do Espírito
Santo (ver I João 4:13).
8. Não
desfruta de comunhão mística com Deus, não permanece nele (ver I João 4:16).
9. Vive
assaitado de temores, e com toda a razão, porquanto anseia devido ao juízo
vindouro (ver I João 4:17,18).
10. Finaimente, conforme nos diz o apóstolo, esse indivíduo é
um ”mentiroso”. Por conseguinte, pertence a Satanás, que lhe é
pai, pois Satanás foi mentiroso desde o princípio (ver João 8:44
que afirma: “porque é mentiroso e pai da mentira”),
A polêmica. Tal como antes, esta passagem ataca os falsos
mestres gnósticos, os cismáticos que não sabem o que é amar, que prejudicavam
ao cristianismo com suas doutrinas e práticas imorais. Odiavam os irmãos e
provocavam sessões, divisões e ódio no seio da igreja. Punham
violentamente de lado o “novo mandamento” do amor fraternal.
Não ama... a
quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê... É fato bem conhecido e universalmente demonstrado
todos os dias que amamos aqueles que nos são mais íntimos, que fazem parte
de nossa vida.
“Senhor, disse eu,
Eu nunca poderia matar outro homem;
Crime tão grande que é
próprio das feras, é uma excrescência repelente de uma mente maldita, um ato
ultrajante do tipo mais vil.
Senhor, disse
eu,
Eu nunca poderia matar outro homem;
Um ato desprezível de ira
sem misericórdia, um golpe irreversível de inclinação perversa, um ato
inconcebível de ímpio desígnio.
Diz-me o
Senhor:
Uma palavra
ferina, lançada contra a vítima que desdenhas,
É um dardo que inflige
uma dor sem misericórdia.
A maledicência
ataca um homem pelas costas, um ato covarde do qual não te poderás retratar.
O ódio em teu coração, ou a inveja a levantar a feia cabeça.
É o desejo secreto de ver
alguém morto” (Russell Champlin).
Católicos mataram
protestantes e protestantes tiraram a vida de católicos, e ambos se têm voltado
contra os judeus e os têm assassinado, todo o tempo atribuindo ao Deus dos
cristãos a inspiração de tão grande malícia. Tão profunda é a cegueira e a
perversidade do homem!
Quiçá o pior de tudo
quanto sucede na questão que ora debatemos é que as diversas culturas, ao
imaginarem seus deuses de conformidade com a sua impiedade, registram
tais conceitos permanentemente em seus livros sagrados, fixando-os nessas
culturas. O resultado é que as gerações sucessivas, lendo e estudando
esses registros, e considerando-os livros inspirados e sem erro, atribuem
o caráter mais horrendo e bestial aos seus “deuses”. Tudo isso
tem servido de grave injúria contra a busca espiritual autêntica.
V. O Ódio Exemplificado em Personagens da Bíblia
Caim tinha ódio no
coração (Gên. 4:5); também Esaú (Gên. 27:41) e os irmãos de José (Gên. 37:4);
os habitantes de Gileade (Juí. 11:7); Saul (I Sam. 18:8,9); Acabe (I Reis
22:8); Hamã (Est. 3:5,6); os inimigos dos judeus (Est. 9:1,5; Eze. 35:5);
os adversários de Daniel (Dan. 6:4-15); Herodias (Mat. 14:3,8); os judeus
(Atos 23:12,14); o mundo inteiro (João 7:7).
VI. O Ódio Divino
Como é óbvio, Deus odeia
o mal (Pro. 6:6). Porém quando lemos na Bíblia que ele aborreceu Esaú e que
amou seu irmão, Jacó (Mal. 1:3, Rom. 8:12,13), então já entramos naquele
problema que circunda a questão do determinismo versus livre-arbítrio. Os
intérpretes muito se têm esforçado para fazer esses trechos
bíblicos amoldarem-se àquilo que eles já compreendem sobre a natureza e
o amor de Deus. Daí surgem ideias como aquelas que enumeramos abaixo:
1. O
termo “ódio” é antropomórfico, ao qual devemos entender metaforicamente,
e não em termos reais do ódio humano. Penso que essa é a resposta certa.
Os homens aplicam às palavras de Deus sentidos que lhes são
significativos, por causa de suas próprias naturezas emocionais; porque é
difícil imaginarmos Deus sujeito ao mesmo tipo de natureza emocional que os
homens têm. Porém, penso que os autores que aplicaram o termo ódio
a Deus, no tocante, por exemplo, a Esaú, estavam pensando em termos de
simples ódio, sem qualquer alusão a ideias antropomórficas. Visto que os
intérpretes insistem em aplicar emoções humanas a Deus, em sua
forma humanizada de teologia, ainda outras interpretações têm
aparecido, segundo se vê nos dois outros pontos, abaixo:
2. Esse
“ódio” seria simples rejeição, ou não-eleição.
3. Esse
“ódio” deveria ser entendido comparativamente, como um amor inferior,
ou como menor interesse, ou mesmo como total ausência de interesse pelos
odiados.
Minha opinião pessoal é
que esses versículos têm uma visão míope do amor de Deus, deixando de perceber
que esse amor tem uma aplicação universal, de tal modo que haverá uma restauração geral
(vide). Meu artigo sobre esse assunto mostra que o amor de Deus,
finalmente, haverá de prevalecer, ainda que comparativamente poucos
terminem remidos. Estou convencido de que a antiga ideia do ódio
a Esaú foi ultrapassada, na própria revelação bíblica, por um novo e
mais amplo evangelho, uma mensagem que não foi antecipada no Antigo Testamento,
e nem mesmo nos primeiros livros do Novo Testamento. Na verdade, o ódio
divino, visto ser ativo e visto que impõe juízo, exprime o seu
amor, já que o próprio julgamento tenciona trazer uma grande bênção aos
perdidos (ver I Ped. 4:6). Sem dúvida os atos de Deus em todas as
suas formas, incluindo o seu ódio no julgamento contra o mal, fazem parte
do mistério de sua vontade (Efé. 1:9,10), o que criará uma unidade
universal, em torno da pessoa do Logos (Cristo), em última análise. Ver o
artigo separado sobre os Vícios. Ver também sobre o Amor.
VII. O Ódio e a Possessão Demoníaca
O amor é a prova
da verdadeira espiritualidade. Contrariamente, o ódio facilita a
possessão demoníaca. Sem o ódio, ela praticamente não pode existir.