Origem do Mal — Estudos Bíblicos

Origem do Mal — Estudos Bíblicos

Origem do Mal — Estudos Bíblicos


ORIGEM DO MAL

Neste artigo está incluído o meu comentário sobre a Queda do Homem. O artigo separado sobre o Problema do Mal oferece detalhes adicionais acerca do assunto deste artigo.
Esboço:
I. Tipos de Mal
II. Teorias sobre a Origem do Mal
III. A Queda do Homem
IV. Quando o Homem Caiu?
V. Restauração e Redenção
I. Tipos de Mal
A tentativa para explicar a origem do mal obriga-nos a levar em conta o fato de que existem dois tipos de mal. Em primeiro lugar, há o mal moral. Em outras palavras, há coisas que existem e são praticadas por causa da vontade pervertida do homem, ou por causa da malignidade de outros seres inteligentes, maiores ou menores que o espírito humano. Em segundo lugar, há o mal natural, ou seja, o descontrole da natureza, que provoca catástrofes as mais diversas, como inundações, incêndios, terremotos, tempestades, enfermidades e, finalmente, a morte física. Para muitos pensadores, a morte é o pior de todos os males terrenos.
Então indagamos: “Por que essas coisas têm de acontecer? Como foi que elas começaram?”. Nosso artigo sobre o Problema do Mal fornece várias respostas, que não são desenvolvidas neste artigo.
II. Teorias sobre a Origem do Mal
Neste ponto, envolvemo-nos nos estudos da teodiceia (vide), que consiste na tentativa para justificar a conduta, o planejamento e o raciocínio de Deus, à luz do fato de que sua criação, realmente apresenta defeitos e está prenhe de sofrimentos e males. Se Deus é bom, se ele é todo poderoso, e se ele sabe de todas as coisas, antes mesmo de acontecerem, por qual razão Deus não impediu que o mal tivesse inicio? E, uma vez que o mal teve início, por que não providenciou para eliminá-lo? Quanto às origens do mal, oferecemos as seguintes sugestões:
1. Dualismo Absoluto. Essa ideia se vê no zoroastrismo. Essa é a ideia que diz que o mal não teve princípio, mas sempre existiu, juntamente com o bem. Além disso, o mal pertenceria a um reino distinto do reino do bem. Algo não teria ocorrido de errado com o bem, para que o mal viesse à existência. Pelo contrário, o mal sempre teria existido, lado a lado com o bem. Haveria um reino maligno, com seres espirituais, que sempre existiu e sempre existirá. O problema teria aparecido somente quando os reinos do bem e do mal começaram a misturar-se. A solução é vê-los separarem-se novamente, e não pôr fim ao reino do mal, o que seria uma façanha impossível. O zoroastrismo promete o triunfo do bem, no sentido de que o princípio do mal será derrotado e separado do principio do bem; mas o mal continuará existindo em sua própria esfera. E também pensa que em algum futuro distante, após essa separação, o reino do mal tornará a atacar e as atuais agonias terão repetição em um processo que pode reiterar-se por muitas e muitas vezes.
2. O Maniqueísmo (vide) também adotava uma posição dualista. Este sistema era uma variedade de gnosticismo (vide). O judaísmo e o cristianismo ensinam o que poderíamos chamar de uma forma suavizada de dualismo, porquanto supõem que o mal não somente será separado do bem, mas também será completamente eliminado.
3. Monismo Absoluto. O bramanismo (vide) pensa que o mundo é a emanação de Brâmane. O mundo dos fenômenos, onde o mal existe, seria, realmente, uma ilusão. Portanto, o próprio mal seria ilusório. É como se fosse um pesadelo, do qual, algum dia, o espirito verdadeiro se acordará. Só haveria uma verdadeira vida, a vida de Deus, não havendo nela mal ou defeito. Platão, no contraste que estabelecia entre os universais (vide) e os particulares (vide), aproximava-se da posição monista, ao supor que este mundo físico é apenas uma realidade secundária, imitativa, que terminará por deixar de existir. Leibniz (vide) pensava que o nosso mundo é o melhor mundo possível, e que o mal é apenas uma interpretação equivocada, por parte de mentes finitas, que não podem perceber que o mal é necessário, como parte integrante do bem.
4. Monismo Cristão. Filósofos teólogos como Agostinho e Tomás de Aquino, em sua teodiceia (vide), explicavam que o mal não é, realmente, uma entidade. Seria apenas a ausência do bem, da mesma maneira que as trevas são a ausência da luz.
5. Naturalismo. Não haveria nenhum Deus criador. O que existe, somente, é a matéria e o movimento. A matéria em movimento entrava em dificuldades e começava a operar erroneamente. O mal seria uma parte natural das vicissitudes da matéria em movimento, e não teve começo. A teologia não tem como manifestar-se a esse respeito. Tudo não passaria de um mero caos mecânico. O tiquismo (vide), nome derivado do grego tuche, “chance”, “acaso”, seria c verdadeiro deus da criação. Naturalmente, as coisas correm erradas, mas isso faria parte da própria natureza da existência (pessimismo; vide). Mas haveria um tiquismo vencido, quando usamos a nossa vontade para estabelecer um sentido em meio ac caos, injetando no mesmo algum valer ou utilidade, posto que, em si mesmo, não haja utilidade alguma no mal.
6. O Deísmo (vide). Essa posição filosófica cética diz que talvez um Deus ou força cósmica criou ou organizou a criação, mas, tendo feito isso, abandonou seu universo, deixando-o para ser governado pelas leis naturais. Essas leis seriam deveras impressionantes, a julgar por todas as muitas formas de vida que foram trazidas à existência. No entanto, também seriam defeituosas, o que explicaria o mal que vemos ao nosso redor. Nesse caso precisamos imaginar que Deus, ou alguma força cósmica, ou era finito em si mesmo—de tal maneira que vieram a surgir problemas que ele não conseguia controlar — ou então, que ele nem estava muito interessado em sua criação pelo que não tomou qualquer medida que garantisse a sua integridade.
7. O Pessimismo (vide). Deus ou alguma força cósmica seria um poder maligno (de acordo com as definições humanas normais). Logo, este mundo seria o pior de todos os mundos possíveis. O mal seria a essência mesma da existência e somente o aniquilamento total da existência poderia ser classificado como algo bom.
8. O Cristianismo com Algumas Leves Distorções. Alguns teólogos cristãos têm postulado algumas respostas duvidosas acerca da origem do mal:
a. O próprio Deus seria finito, pelo que tem os seus próprios problemas, não tendo sido capaz de impedir a entrada do mal em seu sistema.
b. Deus seria limitado em sua presciência, pelo que a penetração do mal no mundo o teria tomado inteiramente de surpresa. Mas, uma vez que o mal se manifestou, Deus teria começado a tomar medidas para corrigir o curso da malignidade e curar os seus maus efeitos.
c. O monismo cristão (ver o terceiro ponto) é a posição daqueles que dizem que o mal é apenas a ausência do bem, e não alguma entidade que exista por seus próprios direitos. Em nossa opinião, essa é uma daquelas leves distorções teológicas da cristandade.
d. O determinismo violento, conforme é visto no calvinismo radical (vide), promovido por Paulo, no nono capitulo da Epistola aos Romanos, faz Deus ser a causa até mesmo do mal, por ser ele a única causa de tudo. Essa teologia deixa de lado a possibilidade da existência de causas secundárias, que explicariam a presença do mal. Essa posição era comum no judaísmo e foi transferida para o cristianismo. Ver o artigo separado sobre o Determinismo. De acordo com o determinismo absoluto (predestinação; vide), Deus é a grande causa do mal, porquanto ele é a única causa que existe. Assim pensando, estamos olvidando o amor de Deus. Deus amaria somente os seus eleitos e odiaria ou desprezaria os demais, com toda a indiferença. Isso é o que nos ensina o nono capítulo da Epístola aos Romanos, queiramos ou não queiramos. Isso é má teologia, admitamos ou não. Felizmente, há outras porções que apresentam o outro lado da questão. Não podemos limitar Paulo ao nono capítulo de Romanos. Há trechos bíblicos que equilibram outros.
9. O Cristianismo Racional. Deus seria a causa do mal, mas apenas em um sentido secundário e não maligno. Em primeiro lugar, ele poderia ter evitado a entrada do mal no mundo, mas não o fez porque há coisas mais importantes a serem promovidas do que resguardar a criação de todo o mal. Portanto, ele permitiu a entrada do caos natural, e resultados perversos do livre-arbítrio de seres inteligentes (como os anjos e os homens). Ele sabia que se essas criaturas inteligentes pudessem ter livre escolha, em algum ponto, em algum tempo, haveriam de preferir o mal. Porém, se ele não tivesse conferido genuíno livre-arbítrio a elas, então esses seres nem seriam verdadeiramente inteligentes (pois desconheceriam a diferença entre o bem e o mal), e nem seriam seres autênticos. Tais criaturas seriam meros autómatos, com reações apenas mecânicas.
O Grande Propósito. O propósito da criacão era levar seres inteligentes a participarem da natureza divina. Essa participação só é Dossível a seres que sejam genuinamente inteligentes e autênticos. A missão do Filho teve a finalidade de fazer tais seres tornarem-se filhos de Deus Deus não deixou de impedir o mal, porque este é um subproduto necessário, embora não permanente, dentro do Seu processo remidor.
III. A Queda do Homem
1. Contexto Literário. Em primeiro lugar, deveríamos compreender que o relato bíblico sobre a queda do homem (Génesis 3) é uma versão da atividade literária da Mesopotâmia. Ver os artigos sobre Jardim do Éden, Eva e Criação, quantc a uma demonstração desse fato. Se não levarmos em conta esse fato, estaremos limitando nosso entendimento, só para obter conforto mental. Não deveríamos tomar a narrativa bíblica como uma declaração absoluta sobre a questão, mas interpretá-la com o intuito de obter o maior discernimento possível, sem fechar as portas da investigação e do raciocínio, que nos podem dar outras informações, melhorando aquilo que oferecemos aqui. Outrossim, seria um equívoco supor que já solucionamos o problema. Muitos mistérios circundam o mesmo, há muitas opções, que deveriam ser consideradas, sem importar o seu grau de valor. Ver a segunda seção deste artigo, quanto a cerfa variedade de ideias a respeito.
2. Elementos da Narrativa Bíblica. O terceiro capítulo de Génesis busca explicar três aspectos principais da condição humana: a morte universal por qual motivo o homem tem que trabalhar arduamente, e por que a mulher deve estar sujeita ao homem, tendo uma gravidez difícil e um parto doloroso. Apesar da narrativa não ensinar diretamente a doutrina do pecado original (quanto a isso ver IV Esdras 3:7,8 e Rom. 5:12), deixa implícito que os seres humanos, por ocasião da queda, adquiriram a faculdade da prática do mal, como um subproduto do discernimento entre o bem e o mal.
Elementos do Relato de Génesis:
a. Houve tempo em que o homem era inocente e presumivelmente, imortal, embora dotado de um corpo físico. Muitos intérpretes pensam que esse tipo de imortalidade contradiz o próprio princípio da matéria, e, por causa disso, acham nisso um elemento parcial ou defeituoso no relato. Lembremos, porém, que ninguém sabe como eram as coisas, antes da queda. Os pais alexandrinos supunham que a queda original envolveu os anjos, e que o homem participou da mesma, visto que, segundo a doutrina deles, o homem seria uma forma espiritual preexistente e caiu quando ainda era um ser apenas espiritual. Assim, quando o homem entrou em contato com a matéria, já era um espírito caído e, nesse próprio ato, tomou sobre si a mortalidade física. Assim, o relato de Génesis nos diria como a maldade foi transferida para o estado incorporado do homem, e não como o pecado começou, no tocante ao homem. A encarnação teria sido um meio para o homem aprender como tratar com o mal e eliminá-lo, embora não tivesse sido o seu início absoluto, no que concerne ao espírito humano.
b. Houve um tentador não humano (um poder satânico), que provocou a queda; e isso contra as expressas ordens de Deus, que havia feito certas proibições. Esse elemento do relato introduz (parabo-licamente, segundo penso, através da figura da serpente) o princípio do mal, em contraste com o princípio do bem. Há escolhas genuínas que precisam ser feitas.
c. O livre-arbítrio é um fato. O homem era genuinamente livre para optar e ele foi reprovado no teste. Apresentamos razões na segunda seção, oitavo ponto, sobre por que o homem tinha de ser livre. Os teólogos discutem sobre quanta liberdade o homem teria retido, desde a queda. E, quanto a isso, entramos na disputa entre o calvinismo e o arminianismo, sobre os quais há artigos separados.
d. O pecado alia-se ao reino do mal. Paulo deixou isso claro, em seus ensinamentos sobre a queda, no quinto capítulo de Romanos. Isso já fica claro desde a narrativa de Génesis. O homem não pecou isolado. O homem aliou-se ao poder de Satanás. E a redenção não consiste meramente na transformação do espírito humano, revertendo-o à sua anterior situação. Também envolve o livramento do poder escravizador do reino do mal. O trecho de Colossenses 1:13 diz como segue: “...ele nos libertou do império das trevas e nos transportou para o reino do Filho do seu amor”.
e. O pecado original. Ver o artigo separado sobre esse assunto. A narrativa do livro de Génesis não ensina essa doutrina, embora a deixe entendida, como o fazem muitos relatos que se seguem, porquanto os filhos de Adão são vistos envolvidos em muitos tipos de males, presumivelmente por serem herdeiros da maldade de seus progenitores. Os trechos de Salmos 51:5 e Romanos 5:12 ss são textos comuns de provas usados para defender essa doutrina. É quase certo que Paulo advogava essa posição. Os homens já nascem pecadores e isso começou por ocasião da queda de Adão e Eva no pecado, cujos efeitos foram transferidos para todos os seres humanos, como uma espécie de herança genética. Muitos teólogos modernos, porém, sentem-se insatisfeitos diante dessa explicação, por uma razão ou outra. Os estudiosos liberais supõem que isso em nada contribui para explicar as verdadeiras razões da maldade humana, pensando que seria apenas uma explicação conveniente e popular. Porém, nesse relato bíblico há uma grande realidade, por mais difícil que seja explicar como e por que as coisas sucederam assim. Mui definidamente, o homem já nasce com um defeito moral. Ele, meramente, não vem a tornar-se defeituoso. Toda a experiência humana serve para demonstrar o fato. E, se apelarmos para a reencarnação (vide), como tentativa de explicar o pecado, a única coisa que estaremos fazendo é transferir a maldade de volta a uma interminável sucessão de vidas. Eu seria pecador agora porque fui pecador em alguma outra vida anterior; e, na vida anterior, fui pecador por causa de alguma vida ainda anterior. Porém, isso só adia indefinidamente o ponto em que me tornei pecador. Pessoalmente, penso que a teologia dos pais alexandrinos da Igreja nos põe de novo na trilha certa, embora a explanação deles também deixe sem explicação muitos mistérios.
f. A morte e a alienação. O homem tornou-se um ser mortal, e então foi expulso do jardim do Éden. A Bíblia, como um livro, refere-se à profunda alienação do homem. De fato, a maioria das religiões defende a tese de que o homem é um ser alienado. Mas, a missão de Cristo pode reverter essa alienação, conforme se aprende em Colossonses 1:20 ss. O homem encontra-se, atualmente, em uma peregrinação; e a maioria dos seres humanos continua sujeita ao alienado reino das trevas. Mas, quando o homem é espiritualizado mediante a missão de Cristo, então também é reconciliado com Deus; e assim termina a sua alienação de Deus.
g. A doutrina dos dois homens. Ver o artigo separado sobre Dois Homens, Metáfora dos. Ver também Rom. 5:12 ss. Adão foi o cabeça federal do homem caído; e Cristo é o cabeça federal do homem redimido. Dois reinos, portanto, são assim formados. Há duas condições humanas gerais. O estado da perdição envolve toda uma coletividade. O estado da salvação também é condição de uma raça nova, e não apenas de indivíduos isolados.
IV. Quando o Homem Caiu?
Damos indicações a esse respeito, na segunda seção deste artigo. Alguns estudiosos supõem que o mal é eterno, e que não teve começo. Os trechos de Isaías 14:12 ss. e Apo. 12:4 dão a entender que houve uma rebelião e então a queda no pecado, em algum passado remoto, na eternidade, por parte de seres angelicais, inteligentes. Os pais alexandrinos da Igreja pensavam que ali é que teria tido lugar a queda do homem, pois supunham que o homem é um espírito preexistente, não muito diferente dos anjos, excetuando a extensão da degradação por causa da queda no pecado.
Porém, não há razão em supormos que houve apenas uma queda, mesmo que limitemos isso ao nosso presente ciclo. Pode ter havido muitos ciclos da existência, com suas respectivas quedas e redenções. Se falarmos em termos de apenas um ciclo da existência, pode ter havido muitas quedas, em várias ocasiões, envolvendo diferentes tipos de seres, ou então, várias quedas, no que concerne a uma única espécie de ser. Tudo quanto estamos afirmando aqui, porém, não passa de especulação; mas parece improvável que uma única queda, envolvendo os anjos e os homens, possa explicar a complexidade da operação do mal, na criação. Também tomo a posição que todas as nossas informações, bíblicas e extrabíblicas, são parciais no que concerne a esse problema. Assim, postular apenas uma queda, em uma única dada ocasião, é precário; mas, seja como for, as lições que nos são ministradas, mediante as condições criadas pela queda no pecado, são perfeitamente claras.
V. Restauração e Redenção
Também nada existe de mais claro, em todo este vasto mundo, do que a necessidade da redenção humana (vide). Ver o artigo geral sobre a Restauração, que é o remédio divino para a queda em escala universal. O mistério da vontade de Deus consiste em restaurar todas as coisas, unificando-as em redor do Logos (Efé. 1:9,10), o qual se chamou Jesus Cristo em sua encarnação. Fazemos a diferença entre a restauração de todos e a redenção somente de alguns. A redenção leva o homem a participar na natureza divina (II Ped. 1:4, Col. 2:10). A redenção outorga aos remidos a plena imagem de Deus, a real participação na natureza divina e a crescente participação (como um processo eterno) em seus atributos.
A restauração, por sua vez, é uma questão de importância secundária, em que a imagem de Deus é imitada em um nível (ou níveis) inferior de existência, sem dar aos restaurados a natureza e os atributos divinos essenciais. O homem foi criado segundo a imagem de Deus. Não era um ser divino, embora fosse um ser muito elevado. Porém, a queda fê-lo decair dessa posição. Na redenção, todavia, a verdadeira imagem de Deus é outorgada aos homens. Portanto, a redenção não é a mera restauração do que se perdeu. Antes, é um grande avanço, na direção de uma forma de vida metafísica. (B C E H NTI)