Vaidade — Estudos Bíblicos
VAIDADE
I. No Antigo Testamento
A ideia de “vaidade”, nas páginas da Bíblia, passou por um complexo
processo de desenvolvimento, incluindo as fases de algo vazio, daí para as
porções de inutilidade, de ludibrio e de iniquidade. E, de acordo com o
seu propósito de revelar a verdade, que é final e duradoura, as Escrituras
advertem-nos contra aquilo que tem apenas aparência de realidade, que tem
mera aparência de valor. Posto que as pessoas estão sendo desviadas do
reto caminho mediante essas coisas ilusórias, a Bíblia, pois, as revela e
as denuncia. Acompanhemos esse desenvolvimento, através dos vocábulos
hebraicos correspondentes:
A. Ideia de coisa vazia. Estão envolvidas palavras como nabab (Jó
11:12), “oco”; ruach (Jó 15:2; 16:3), “vento”; riq ou
req (Lev. 26:16,20; Jó 39:16; Sal. 2:1; 73:13; Isa. 49:4; 65:23;
Jer. 51:58; Deu. 32:47; Juí. 9:4; 11:3; II Sam. 6:20; II Crô. 13:7; Pro.
12:11; 28:19), ”vazio”; tohu (I Sam. 12:21; Isa. 45:18,19), “ruína”,
“coisa vazia”.
B. A ideia de inutilidade. Está envolvida aí a palavra
hebraica mais comumente traduzida, nas traduções e versões, por “vaidade”, ou
seja, hebel, que figura por nada menos de sessenta e cinco
vezes no Antigo Testamento, conforme se vê, por exemplo, em Jó 9:29; 21:34;
35:16; Sal. 39:6; Pro. 31:30; Ecl. 6:12; Isa. 30 7; 49:4; Jer. 10:3; Lam.
4:17; Zac. 10:2; Ecl. 1:2; 12:8. Essa palavra tem o sentido de “inutilidade”,
“futilidade”.
C. A ideia de ludibrio ou falsidade transparece,
principalmente, em uma palavra hebraica como shaw, utilizada
por cerca de vinte e uma vezes, conforme se vê, por exemplo, em Jó 7:3; 15:31;
31:5; 35:13; Sal. 12:2; 24:4; 41:6; 119:37; Pro. 30:8; Isa. 5:18; Jer.
18:15; Eze. 13:6,8,9,23; 21:29; 22:28 e Osé. 12:11. Essa palavra
hebraica significa “ludibrio”.
D. A ideia de iniqüidade, que é o último estágio no
desenvolvimento da noção de “vaidade”, entre os hebreus, envolve
palavras como: aven (Jó 11:11) “iniqüidade”; havvah
(Sal. 5:9; 52:7; 55:11), ”calamidade”, zimmah (Lev.
18:17; 19:29; 20:14), “artifício”, “mau
pensamento”, avlah (II Sam 7:10; I Crô. 17:9; Jó 11:14; 24:20;
27:4; Sal. 89:22), “perversidade”; olah (Sal. 58:2), “perversão”;
ra (Gên. 6:5; 39:9; Deu. 13:11; Juí. 9:56; 20:3,12; I Sam.
12:17,20; II Sam. 3:39; I Reis 1:52; II Reis 21:6; Jó 20:12; Sal. 7:9; 107:34;
Ecl. 7:15, Isa. 47:10; Jer. 1:16; 2:19; 22:22; 23:11,14; Eze. 16:23; Osé.
7:1-3; 9:15; 10:15; Joel 3:13; Jon. 1:2; Naum 3:19), “maldade”, “ruindade”; roa
(Deu. 28:20; Sal. 28:4; Osé. 9:15) “ruindade”, “tristeza”; resha ou
rishah (Deu. 9:27; I Sam. 24:13; Jó 34:10; 35:8; Sal. 5:4; 84:10; Pro.
4:17; 16:12; Ecl. 3:16; 8:8; Isa. 58:4,6; Jer. 14:20; Eze. 3:19; 31:11; 32:12;
Osé. 10:13; Miq. 6:10; Deu. 9:4,5; Pro. 11:5; 13:6; Isa. 9:18; Eze. 5:6; 18:20,27;
33:12,19; Zac. 5:8; Mal. 1:4, “erro”.
II. No Novo Testamento
1. Kenós, “vazio”, “vão”. Essa palavra aparece por
dezoito vezes: Mar. 12:3; Luc. 1:53; 20:10,11; Atos 4:25 (citando Sal. 2:1); I Cor.
15:10,14,58; II Cor. 6:1; Gál. 2:2; Efé. 5:6; Fil. 2:16; Col. 2:8; I Tes.
2:1; 3:5 e Tia. 2:20. A forma adverbial dessa palavra, kenõs, figura
por apenas uma vez, em Tia. 4:5.
2. Kenophonía, “som inútil”, é termo grego que aparece
por duas vezes no Novo Testamento: J Tim. 6:20 e II Tim. 2:16. Kenóo,
o verbo, em II Cor. 9:3.
3. Mátaios, “vão”, “inútil”, “sem proveito”. Palavra
grega que foi usada por seis vezes: Atos 14:15; I Cor. 3:20 (citando Sal.
94:11); I Cor. 15:17; Tito 3.9; Tia. 1:26; I Ped. 1:18.
4. Mataiótes, “vaidade”, “inutilidade”. Palavra grega
usada por apenas três vezes: Rom. 8:20; Efé. 4:17; II Ped. 2:18. O
verbo, mataióomai, “tornar vão” ou “tornar inútil”, ocorre
apenas por uma vez, em Rom. 1:21.
5. Máten, “em vão”. Palavra que ocorre por duas vezes: Mat. 15:9
e Mar. 7:7.
6. Eikê, “em vão”, “à toa”. Esse advérbio figura por
cinco vezes no Novo Testamento: Rom. 13:4, I Cor. 15:2; Gál. 3:4; 4:11 e Col. 2:18.
7. Doreán, “livremente”, “em vão”, “sem preço”. Outro
advérbio grego, que só aparece por uma vez com o sentido de “em vão”,
isto é, em Gal. 2:21.
No Antigo Testamento, a palavra hebraica hebel é usada
por trinta e cinco vezes, somente no livro de Eclesiastes, o que é
típico da mensagem desse livro. O ponto de vista do mesmo pode
parecer um tanto negativo e pessimista, mas isso somente do ângulo
desta vida, cuja grande característica é a futilidade. Poderiamos
mesmo dizer que a mensagem central desse livro é que a única coisa
que vale a pena, nesta vida terrena, é: “Teme a Deus, e guarda os
seus mandamentos; porque isto é o dever de todo homem. Porque Deus há
de trazer a juízo todas as obras, até as que estão escondidas, quer sejam
boas, quer sejam más” (Ecl. 12:13,14).
Nesta vida terrena há muita coisa que, à primeira vista, parece ter
sentido, valor e substância; mas que, após análise mais detida, mostra ser
falso e ilusório. Uma dessas ilusões é a adoração idólatra. De fato, por
várias vezes os ídolos são chamados “vaidades” (por exemplo, Deu. 32:21; I
Reis 16:13,26; Jer. 18:15). Há estudiosos que afirmam que as artes mágicas
e as bruxarias também cabem dentro da categoria dessas coisas falsas, que
só parecem ter valor enquanto não são mais profundamente examinadas. Para
exemplificar, ver Jó 7:13; Isa. 5:18; 30:28; Jer. 18:15. O mesmo se dá no
caso do perjúrio (ver Sal. 114;8).
III. Ideias Paralelas
Ideias paralelas, que não podem ser esquecidas em um estudo completo,
são as de calamidade (Pro. 22:8), falta de bom senso (Zac. 10:2 e Ecl.
8:14), precipitação (Pro. 13:11), destruição (Isa. 30:28) e acontecimentos
lamentáveis, entristecedores (Ecl. 6:4).
IV. As Vaidades Denunciadas
Também poderiamos preparar uma lista de coisas que, nas Escrituras, são
designadas como vaidades, a saber:
1. Os pensamentos e as palavras dos ímpios (Jó 15:35; Sal. 10:7 e
144:8).
2. Deixar os resultados do trabalho de uma vida inteira a
outras pessoas, que, por muitas vezes, nem conhecemos (Ecl. 2:19,21).
3. O fato de que tanto os sábios quanto os insensatos acabam tendo
a mesma sorte, neste mundo (Ecl. 2:15).
4. O fato de que os homens, apesar de tudo, não têm
qualquer vantagem acima dos animais irracionais, se considerarmos que uns
e outros terminam morrendo (Ecl. 3:19).
5. A própria vida neste mundo é uma grande futilidade (Ecl. 9:9
e 11:10).
6. Os profetas falsos (Eze. 13:6,8,9,23; 21:29 e 22:28).
7. As nações, juntamente com seus príncipes e governantes (Isa. 40:17,23).
8. Os prazeres deste mundo (Ecl. 2:1).
9. As riquezas materiais (Ecl. 5:10; cf. 4:7,8; 6:2; Pro. 13:11 ; 21:6).
10. Cada indivíduo que vem a este mundo (Sal. 39:5,11; 62:9; 144:4).
11. Todas as coisas que há nesta vida terrena (Ecl. 1:1; 12:8).
V. Ideia Moderna de Vaidade
Em português e outros idiomas modernos, a ideia de “vaidade” é bastante
diferente daquilo que encontramos nas páginas da Bíblia. Há elementos da
moderna “vaidade” que não figuram nos vocábulos biblicos, a saber: 1. a
noção de orgulho pessoal, que faz a pessoa sentir-se importante; 2. a
noção de riquezas materiais, de ostentação, de poder pessoal ou de excesso nos
adornos pessoais. No entanto, conforme certos estudiosos, há três casos,
nas páginas do Novo Testamento, que poderíam ser citados como cognatos, a
saber: em Pilipenses 2:3, encontramos o termo grego kenodoksía, ”vangloria”.
Essa mesma palavra aparece como outra categoria gramatical, em Gál. 5:26, onde
nossa versão portuguesa diz: “...Não nos deixemos possuir de vangloria,
provocando uns aos outros, tendo inveja uns dos outros”. E, finalmente, em I
João 2:16, aparece o vocábulo grego alazorteía, “orgulho”, “arrogância”.
Lemos ali: “...por-aue tudo que há no mundo, a concupiscência da carne, a
concupis-cência dos olhos e a soberba da vida, não procede do Pai,
mas procede do mundo”. E é precisamente devido à sua origem,
que todas as coisas que há neste mundo são “vaidades”, pelo
menos comparativamente falando, quando postas em confronto com as
realidades espirituais e eternas.