Uso do Antigo Testamento pelos Cristãos

Uso do Antigo Testamento pelos Cristãos

Uso do Antigo Testamento pelos Cristãos



USO DO ANTIGO TESTAMENTO PELOS CRISTÃOS PRIMITIVOS
Esboço:
1. Ilustrações Desse Uso
2. A Autoridade do Antigo Testamento
3. Variações e Adaptações
4. Rejeição de Posições Antigas
5. A Autoridade Primária do Novo Testamento

1. Ilustrações Desse Uso
Ver o artigo sobre Antigo Testamento, em seu quinto ponto, que alude a citações diretas do Antigo Testamento, no Novo Testamento. Isso ilustra até que ponto a Igreja cristã primitiva lançava mão do Antigo Testamento. Ver o artigo intitulado Profecias Messiânicas Cumpridas em Jesus. Ver também o artigo sobre a fórmula: Está Escrito. Essa fórmula foi muito usada para introduzir citações extraídas do Antigo Testamento no texto do Novo Testamento.

2. A Autoridade do Antigo Testamento
Os autores do Novo Testamento eram judeus piedosos (com a única exceçã'' de Lucas, autor do evangelho de seu nome e do livro de Atos), quase todos de persuasão farisaica. Isso significa que eles aceitavam (sem dúvida, incondicionalmente) o cânon palestino dos trinta e nove livros do Antigo Testamento. E talvez também aceitassem alguns livros apócrifos e pseudepígrafes, honrados pelos judeus dos tempos helenistas. Seja como for, é claro, no Novo Testamento, com suas muitas citações do Antigo Testamento, que os autores neotestamentários anelavam por fazer a fé cristã alicerçar-se sobre os fundamentos do Antigo Testamento. Autores do Novo Testamento, como Paulo, sempre quiseram apoiar as suas doutrinas com citações tiradas do Antigo Testamento. Isso não significa, porém, que a autoridade das revelações que produziram novas idéias fosse secundária, e que o Antigo Testamento fosse primário, mas significa que os autores do Novo Testamento estavam firmemente convictos na continuação da porção essencial do judaísmo revelado na fé cristã. Esses autores consideravam-se judeus piedosos da primeira linha, ao passo que a corrente principal do judaísmo havia apostatado, por ter rejeitado ao seu próprio Messias. A declaração que se acha em II Tim. 3:16: “Toda Escritura é inspirada por Deus...” reflete a atitude padrão dos autores sagrados do Novo Testamento, no tocante ao Antigo Testamento. Os artigos referidos no primeiro ponto, acima, demonstram a extensão em que os autores do Novo Testamento usaram o Antigo Testamento como um documento autoritário. Mas, se ansiavam por ter o Antigo Testamento como autoridade basilar, não temiam ultrapassá-lo quanto a várias categorias importantes, especialmente no que diz respeito à cristologia (vide). Seus escritos tornaram-se uma segunda grande autoridade, de onde surgiu a nossa Bíblia, composta por Antigo e Novo Testamentos. É muito difícil acreditar que isso sucedeu por mero acaso. Ver o artigo geral intitulado Autoridade.

3. Variações e Adaptações
Qualquer leitor sem preconceitos do Antigo e do Novo Testamentos descobre que o Novo Testamento ultrapassa o Antigo Testamento e chega a contradizê-lo quanto a alguns pontos fundamentais. Assim, no Antigo Testamento, a justificação é pela fé e pelas obras. Mas Paulo alterou esse conceito para o sistema da graça-fé. Apesar de o trecho de Isa. 9:6 dar-nos uma previsão da cristologia, é impossível dizermos que o Antigo Testamento antecipava o amplo desenvolvimento do conceito do Cristo divino do Novo Testamento. O desenvolvimento das doutrinas do céu e do inferno não eram conceitos bem formados no Antigo Testamento, mas estão mais alicerçados sobre desenvolvimentos que aparecem nos livros apócrifos e pseudepígrafes do Antigo Testamento. O Novo Testamento tirou proveito de alguns conceitos desses livros no tocante a essas questões e no tocante ao Messias de origem celeste, com algumas adições; isso produziu algumas doutrinas distintivamente cristãs. Ver o artigo sobre / Enoque quanto a uma demonstração sobre essas declarações.
Quando buscamos apoio no Antigo Testamento, no tocante à autoridade, ou à continuação do judaísmo sob formas novas e mais elevadas, então verificamos que, algumas vezes, os autores do Novo Testamento tiveram de fazer adaptações, produzindo variações que, sem dúvida, não concordavam com a exegese dos rabinos quanto às suas próprias Escrituras. Modernamente, chamaríamos essa atividade de ”citação fora do conceito”, pois foram feitas aplicações dos textos sagrados, e não tanto uma exposição exegética dos mesmos, em um bom número de casos. Ou, poderiamos dizer, algumas vezes os autores do Novo Testamento fizeram eisegese, em vez de exegese. Ver os artigos sobre ambos esses termos. Paulo, para exemplificar, em Gál. 4:22 ss, produziu uma alegoria na qual Hagar e o monte Sinai são vinculados entre si, para então as duas coisas representarem Jerusalém em sua apostasia. Então, contrastada a essa cidade, temos a Jerusalém celestial, a verdadeira mãe dos espirituais. Sem ouvida, os rabinos chegaram a reclamar ao lerem essas manipulações de suas Escrituras Sagradas.
Quatro tipos de atividades participaram dessa questão do uso de textos de prova do Antigo Testamento, a saber:
a.  Um uso perfeitamente legítimo, incluindo muitas profecias messiânicas.
b.  Eisegese, que empresta aos textos sagrados novos significados que nenhum rabino teria antecipado.
c.  Alegorização, ou seja, conferir aos textos sagrados sentidos simbólicos.
d. Seleção de textos de prova, com exclusão de outros. Em outras palavras, partes do Antigo Testamento foram levadas avante, mas outras partes foram deixadas para trás. A Epístola aos Hebreus fornece-nos um exemplo clássico quanto a isso. O sistema sacrifical inteiro do Antigo Testamento foi descontinuado, sendo substituído por Cristo e seu sacrifício expiatório. Apesar de que isso representa um ABC para a doutrina cristã, podemos imaginar a consternação que isso deve ter causado aos judeus ortodoxos nos dias de Paulo.
Isso posto, apesar de que todos os livros do Antigo Testamento foram reconhecidos no Novo Testamento como autoritários, como na clássica declaração de II Tim. 3:16, contudo, na realidade, uma boa porção do Antigo Testamento foi deixada de lado, deixando de ter qualquer autoridade sobre os cristãos. A questão da lei mosaica, em contraste com o sistema da graça-fé é um sistema que fere a vista. O sacerdócio levítico foi rejeitado, e um novo sacerdócio foi criado. Na verdade, o Novo e o Antigo Testamentos são radicalmente diferentes quanto a muitos pontos, apesar de que a autoridade do Antigo Testamento continua a ser reconhecida. Sem essa atividade, o Novo Testamento não teria podido sobreviver. De fato, o Novo Testamento é muito mais do que mera modificação do Antigo Testamento. Antes, trata-se de algo radicalmente novo.

4. Rejeição de Posições Antigas
A transição do Antigo para o Novo Testamento ilustra um importante fato acerca da idéia inteira da inspiração das Escrituras. Apesar de a inspiração do Antigo Testamento ser defendida pelos escritores do Novo Testamento, contudo, na realidade, eles tiveram de crer que novas revelações fazem com que certas antigas revelações se tornem obsoletas, podendo até mesmo contradizê-las em termos nada indefinidos. Portanto, não é um princípio verídico aquele que diz que uma nova revelação precisa concordar com uma antiga revelação, a fim de ser válida. Uma nova revelação pode fazer mais do que suplementar. Pode até contradizer e tornar o antigo obsoleto. A medida que for crescendo o conhecimento espiritual, teremos aí um processo natural. E chego a afirmar que isso sucede até mesmo no corpo do Novo Testamento, não meramente no Novo Testamento em relação ao Antigo Testamento. Assim, parece que Paulo tinha uma visão mais clara e completa sobre a justificação do que Tiago. E certamente o ponto de vista do julgamento que emerge do relato sobre a descida de Cristo ao hades é mais lógico, esperançoso e abrangente do que a doutrina que fala em condenados a queimar para sempre, segundo se vê em alguns versículos do Novo Testamento, um conceito tomado por empréstimo dos livros pseudepígrafes. Assim também, quando Paulo escreveu sobre os seus mistérios, ele foi além de outros escritores do Novo Testamento quanto à questão. Não-havia necessidade de Paulo concordar com o que fora dito antes dele, visto que a revelação anterior nem ao menos abordava a essência de seus mistérios. Por isso mesmo, os mistérios paulinos não precisavam concordar com idéias preliminares sobre o mesmo assunto. O mistério da vontade de Deus, de que Paulo fala em Efé. 1:9,10, certamente, ultrapassa todos os demais pontos de vista no tocante ao que Deus, finalmente, fará na redenção e na restauração da humanidade. Quanto a ilustrações sobre essas questões, ver os artigos Descida de Cristo ao Hades; Restauração; e Mistério da Vontade de Deus.
Portanto, faremos bem em ter uma visão dinâmica da revelação, e não uma visão estagnada. Há muitas coisas por serem reveladas ainda; algum dia (embora não saibamos dizer quando), uma terceira revelação pode ultrapassar o nosso Novo Testamento, da mesma maneira que este ultrapassou o Antigo Testamento.
5. A Autoridade Primária do Novo Testamento
Jesus Cristo e Paulo são ali as autoridades primárias. De fato, deles é que emergiu o cristianismo bíblico. O Antigo Testamento serviu de pedra fundamental para o Novo Templo, embora não fosse o seu verdadeiro alicerce. Quando o Novo Testamento veio à existência, houve a tendência de rejeitar o Antigo Testamento, o que se vê no caso dos mestres gnósticos, que abandonaram totalmente a autoridade do Antigo Testamento. Isso foi um exagero que os escritores do Novo Testamento e que os primeiros pais da Igreja (vide) rejeitaram, com toda a razão. Porém não há que duvidar que o Novo Pacto foi realmente novo, e não mera graduação sobre o Antigo Pacto.