Estudo sobre Rute 1
Rute 1
I. RUTE VEM PARA BELÉM
(1.1-22)
Uma época de fome na terra
de Judá faz Elimeleque (“Deus é rei”), sua esposa Noemi (“minha
agradável”) e os seus filhos Malom (“doente”) e Quiliom (“debilitado”)
deixarem a sua casa em Belém (“casa de pão”) para se estabelecer em
Moabe, um planalto a leste do mar Morto. É irônico que tivessem
de deixar a “casa de pão” na terra prometida para ir a Moabe, mas na época
dos juízes houve apostasia religiosa e o Senhor veio com julgamento
contra o seu povo. Que o propósito deles era retomar fica claro no uso da
palavra gur, que expressa residência temporária. Efrata tinha sido
o nome antigo de Belém (Gn 35.19; 48.7; Mq 5.2 e v. o paralelismo em
4.11); por isso eram chamados efrateus. Depois da morte de
Elimeleque, Malom se casou com Rute, e Quiliom, com Orfa; as
duas noivas eram moabitas. A lei não proibia o casamento com
moabitas, mas havia algumas restrições para a aceitação dos moabitas
na congregação (Dt 23.3; cf. Ne 13.23-30). Rute e Orfa não são nomes
hebreus, e o significado é incerto, v. 4. por quase dez anos: isso
provavelmente cobre todo o tempo em Moabe, e o casamento dos dois irmãos
pode ter ocorrido mais próximo do final desse período. Malom e Quiliom
morreram. O narrador aqui concentra a atenção em Noemi,
enviuvada, sofrendo com a perda dos filhos e numa terra estranha,
todas essas circunstâncias com significado religioso.
2) A determinação de Rute
em ir com Noemi (1.6-18)
Noemi decidiu voltar
para Belém depois que chegaram notícias a Moabe de que o Senhor viera
em auxílio do seu povo, dando-lhe alimento (lit. “pão”). O verbo usado
no original para traduzir “vir em auxílio” é o equivalente a “visitar”,
paqad, que pode significar “vir com bênção”, com frequência para
encerrar um período de provações, e.g., Gn 21.1; 50.24,25; Êx 13.19; Jr
15.15; 27.22; 29.10; especialmente SL 65.9. Mas o verbo pode
significar também “castigar”, como em Am 3.2,14 et al.
Noemi, não querendo
conduzir as suas noras à vida numa terra estranha, diz a elas que voltem às
suas famílias, v. 8. Ela reconhece a bondade delas com os seus maridos
e com ela e ora para que o Senhor seja leal com elas (mostrar hesed
“amor leal”; “amor constante”) e lhes conceda segurança (m‘nuhãh, v.
3.1) no casamento. (Observe que Itesedí uma característica do próprio
Deus, expressa principalmente na sua lealdade à aliança. E muito mais
forte do que bondade.) Ela deu-lhes beijos de despedida, mas elas
insistiram em ir com Noemi. Ela então, chamando-as carinhosamente de minhas
filhas, mais uma vez as aconselha a voltar. Numa série de perguntas
retóricas, Noemi — com a idéia do levira-to em mente (Dt 25.5ss) — argumenta
que ela já não pode ter esperança de ter filhos para oferecê-los como
maridos e, de qualquer maneira, não se poderia exigir delas que esperassem
tanto tempo. v. 13. A formulação desse versículo na NTLH transmite a idéia de
que Noemi expressa remorso porque as suas noras foram envolvidas na sua
aflição, mas a formulação Para mim é mais amargo do que para vocês,
pois a mão do Senhor voltou-se contra mim se harmoniza melhor com o
hebraico. Parece que o sentido que ela quer transmitir é: “Perdi marido e
filhos e sou velha demais para casar de novo e ter filhos. Vocês perderam
os maridos, mas ainda são jovens para casar de novo e ter filhos.
Por que compartilhar da minha aflição?”. E significativo que Noemi não
atribui a sua aflição ao acaso ou ao azar, mas à mão do Senhor,
um antropomorfismo comum da atividade soberana de Deus, reconhecida em
toda a história. v. 14. Orfa, evidentemente convencida pelo
argumento, despediu-se e partiu. E injusto culpar Orfa por sua decisão. Não
conhecemos todas as circunstâncias; por exemplo, talvez ela soubesse da
determinação de Rute e que Noemi não ficaria sozinha. Mas Rute, com
lealdade mais forte e laços afetivos mais próximos, //!'.»« com ela
[Noemi], (dãbaq, “apegar-se”; v. ARA e ARC; Gn 2.24; Rt 2.8, 21).
v. 15. Novamente Noemi encoraja Rute a voltar e seguir a sua cunhada que estava voltando
para o seu povo e para o seu deus, ”Camos”, cf. Nm 21.29 (ou “deuses”),
mas Rute, totalmente decidida, expressa a sua determinação em expressões
de beleza indescritível. Ela declara a sua lealdade a Noemi, sua disposição em
se identificar com o povo de Israel e a sua devoção ao Deus de Noemi.
A sua promessa é selada com um juramento que invoca o juízo de Deus se
ela não o cumprir. Essa fórmula de juramento, possivelmente
acompanhada de um gesto, é encontrada de forma completa em Samuel
e Reis, mas em forma abreviada em outros textos. v. 18. Vendo a força e a
natureza da decisão de Rute, Noemi não insistiu mais.
3) Rute e Noemi chegam a
Belém (1.19-22)
v. 19. A chegada de Noemi e
Rute a Belém causou comoção considerável. A pergunta das mulheres: Será que é
Noemi? sugere que os anos que se haviam passado e o luto pelas perdas
tinham alterado a sua aparência, v. 20. Noemi retoma o significado do seu
nome e responde: Não me chamem Noemi (“agradável”), melhor que
me chamem de Mara (“amarga”), pois o Todo-poderoso tornou a minha
vida muito amarga. Esse nome divino ’El shaddai é quase
sempre usado com referência à ação de Deus com pessoas em aflição. (V.
comentário adicional acerca de sadday de L. Morris em Judges-Ruth,
TOTC, 1968, p. 264). v. 21. A formulação da RSV, como também da
NTLH (“o Deus todo-poderoso me fez sofrer e me deu tanta aflição”), é
baseada na emenda textual do hebraico que fazem o grego, o siríaco e o
latim, que é: “o Senhor testificou contra mim”, i.e., o Senhor demonstrou
o seu desgosto por mim, por isso não me chamem de ”agradável”. A frase O Todo-poderoso trouxe desgraça sobre mim completa o
paralelismo. Noemi exagera a mudança desfavorável nas suas circunstâncias.
Ela saiu com uma família completa numa época de fome e, embora o Senhor a
trouxesse de volta privada de seu marido e de seus filhos, voltou com uma
nora dedicada, a vizinhos compassivos, e isso na época da colheita,
v. 22. Parece que é esse o ponto que o autor quer ressaltar de
forma branda e amável.