Evangelho de Marcião

Evangelho de Marcião
Fragmento do Evangelho de Marcião

EVANGELHO DE MARCIÃO. Nativo de Sinope, no Ponto, Marcião chegou a Roma por volta de 140 d.C. e se uniu à igreja ali; entretanto, foi excomungado em 144, por causa de suas opiniões heréticas. A seita que ele fundou se espalhou e durante um tempo foi uma séria ameaça à Igreja. Fortemente contrário ao Judaísmo, Marcião fazia uma distinção entre o Deus meramente justo do AT e o Deus amoroso e Pai de Jesus revelado no NT e por isso rejeitava totalmente o Antigo Testamento. Somente Paulo tinha compreendido realmente o contraste da lei e do Evangelho, de modo que as cartas paulinas (expurgadas as conotações judaicas) formavam a base do seu cânon. O Evangelho de Marcião não era uma obra independente, mas uma versão expurgada de Lucas, adaptada às teorias doutrinárias do seu autor. Não parece que Marcião tenha acrescentado muitas coisas de sua própria autoria. De acordo com Irineu (I. 25.1 Harvey), ele cortou “tudo o que estava escrito sobre o nascimento do Senhor e muitos ensinos em seus discursos, nos quais claramente confessava o Criador desse universo como seu Pai”. Foram excluídas também as narrativas do Batismo e da Tentação, que não se harmonizavam com a cristologia docética de Marcião. Ele omitiu totalmente cerca de um quarto ou um terço do Evangelho. Uma segunda visão, que tomaria Lucas dependente do Evangelho de Marcião e não o contrário, parece, nas palavras de Puech, “paradoxal e impossível de ser mantida” (NT Ap. I, 348), mas uma terceira teoria foi apresentada por J. Knox: o que Marcião usou foi um Urlukas, uma versão anterior e mais curta, que mais tarde foi expandida pela Igreja “no interesse da polêmica anti-marcionista”. A dificuldade é que não há evidência para tal Urlukas (a conjectura de Streeter do proto-Lucas é outra questão) e Irineu é bem claro, cerca de meio século depois de Marcião. As razões para Marcião ter escolhido Lucas são debatidas. Será que era o único Evangelho que ele conhecia, ou era o Evangelho do Ponto, sua terra natal? Ou será que ele fez uma escolha deliberada? Mateus, é claro, estaria fora de questão, mas, e quanto a Marcos e João? Provavelmente João seria difícil de reconciliar com a visão de Marcião, sobre as relações de Paulo e dos Doze, e este Evangelho tem um contexto místico que não combinaria com a espiritualidade de Marcião (Tumer, 172). Marcos nunca foi muito difundido na Igreja primitiva e era mais incorporado a Lucas. O fato de que o Evangelho de Marcião era uma adaptação de um dos evangelhos da Igreja mostra o prestígio que eles já estavam começando a gozar, mesmo nesse período.

BIBLIOGRAFIA. NT Ap. 1.348 s.; J. Knox, Marcion and the New Testament (1942): Tumer, The Pattern of Christian Truth (1954), 168 s.