Mateus 5:3-12 — Comentário Católico

As bem-aventuranças (5,3-12. cf. Lc 6,20b-23)

Uma comparação das duas versões mostra que Lucas tem quatro (3+1) bem-aventuranças, e Mateus, oito (7+1). Provavelmente somente as três primeiras de Lucas são autênticas; a quarta vem da protoigreja; as bem-aventuranças adicionais de Mateus são resultado de sua própria expansão a partir dos Salmos. A fonte comum é Q, e, além de Q, o uso de Is 61,1-4 por parte de Jesus. Na forma, uma bem-aventurança é uma exclamação de congratulações que reconhece um estado existente de felicidade, começando com o substantivo hebraico ’asrê ou o adjetivo grego makarios. Aqui o evangelho começa com um grito de alegria, baseado na proximidade do reino de Deus. As bem-aventuranças originais sobre os “pobres”, os “mansos” e “os que têm fome” expressam a missão de Jesus para os necessitados em Israel e o alvorecer de uma nova era da história da salvação. Os três termos se referem às mesmas pessoas. Os pobres, etc. são felizes não porque sejam moralmente melhores do que os outros, mas por causa do cuidado especial de Deus para com eles. Deus era concebido como um rei oriental e o dever do rei era proteger o fraco. A última e longa bem-aventurança sobre os perseguidos reflete a experiência do martírio na protoigreja e é explicitamente cristológica (w . 11-12). Os acréscimos redatoriais de Mateus podem ser vistos em diversos lugares. Primeiramente ele acrescenta a “justiça” nos vv. 6 e 10, como um divisor formal e como um dos grandes temas de seu evangelho. A “felizes os pobres” acrescenta “no espírito”.

Os pobres são os necessitados de Israel, os ‘ãnãwim ou ‘am hã-’ãres, que preferem o serviço divino à vantagem financeira. Sua pobreza é real e econômica, mas com uma dimensão espiritual. Em Mateus, o acréscimo de “no espírito” muda a ênfase, que passa do âmbito socioeconômico para o da moral pessoal: humildade, afastamento da riqueza, pobreza voluntária. Na Bíblia, a destituição econômica é um mal a ser corrigido (Dt 15,11), e a riqueza não é um mal em si; de fato, é uma necessidade para o bem-estar do reino, mas corre o risco de negligenciar Deus e os pobres. A prioridade de Deus é o cuidado dos pobres, os mansos: este termo, derivado do SI 37,11, significa “tardio em irar-se”, “gentil com os outros”, e conota uma forma de caridade, aflitos: aflitos por verem o mal reinar na terra (originalmente, sobre Israel), misericordiosos: isto se refere ao perdão ao próximo (Mt 6,12.14-15; 18,35), ao amor (9,13; 12,7; 23,23): especialmente dos necessitados (Mt 25,31-46) e até mesmo dos inimigos (5,44-47). Toda a vingança é excluída, puros no coração: no AT, isto se refere à purificação da impureza ritual e moral (SI 24,4; 51; Is 1,10-20). Em Mateus a “pureza no coração” está próxima à justiça e inclui a fidelidade à aliança, a lealdade aos mandamentos de Deus, a adoração sincera. os que promovem a paz: este termo é baseado na ideia de sãlôm que encontramos no AT, um conceito multifacético que implica o bem-estar total. Os rabinos democratizaram a ideologia monárquica do rei como pacificador e a prescreveram a todos. Em Mateus, promover a paz está relacionado de forma muito estreita ao amor ao próximo e, assim, à bem-aventurança dos misericordiosos. Mateus transforma, assim, um breve manifesto messiânico num programa de vida, numa lista de qualidades ou virtudes desejáveis. Cada bem-aventurança é composta mediante paralelismo sintético. Todas as recompensas encontrarão seu cumprimento no reino de Deus. A voz passiva do verbo em muitas frases que falam de recompensa é uma passiva teológica: Deus confortará, saciará, terá misericórdia, chamará (ZBG § 236). Todos os verbos que falam de recompensa estão no futuro, exceto o primeiro e o último; a escatologia futura predomina do início ao fim.