“Santificado seja teu Nome” (Mateus 6:9)


Um dos ensinos mais marcantes de Jesus está na forma em que devemos orar. Em Mateus 6:5, Jesus passa a mostrar como devemos nos dirigir a Deus em oração e quais assuntos podemos tratar. Para acentuar seu ensino, Jesus parte da forma como se orava em seus dias, quando ele exorta a não orar assim “como os hipócritas”. Tendo isso em mente, podemos pensar sobre a primeira petição feita na oração do Pai Nosso (ou Oração Dominical).

Depois de dirigir-se a Deus com as palavras “Pai nosso, que estás no céus”, Jesus disse:

“Santificado seja teu nome”

Ao se falar no “nome” de Deus, naturalmente pensamos nas ocorrências do Antigo Testamento onde Deus manifesta seu nome (Êxodo 6:3). Ainda que o AT tenha muitos títulos para se referir ao Criador, um nome próprio é usado de maneira distinta. Em português, as formas Jeová, Javé ou Yahweh, são bastante conhecidas e ainda que Yahweh (ou Javé) seja o preferido em obras acadêmicas, e aceita como a forma mais correta, há pesquisas recentes que demonstram que Yehowá (Jeová, de maneira aportuguesada) eram pronunciado entre os antigos judeus (Vídeo: Texto Judaicos Mostram a Pronúncia “Jeová”)

No entanto, muito mais que o nome, ou seja, os caracteres da língua que constituem a palavra que os judeus usavam para designar o Criador, estava em questão aqui. Freedman, D. N. (1996, c1992) em The Anchor Bible Dictionary (vol. 4, p. 1002), comenta sobre o verbete “nome” no contexto bíblico:
Deve-se ter cuidado para não interpretar os dados do AT relacionados ao tema do “nome de Deus” simplesmente à luz de nossas concepções modernas de pessoa, personalidade, existência ou identidade. Ao fazê-lo, correria o risco de perder a abordagem apropriada às dimensões essenciais da fé bíblica do antigo Israel. Além disso, o discurso do AT sobre os “nomes de Deus” deve ser sempre percebido em seu duplo contexto: a respeito do nome de Deus, Israel não pensava de maneira fundamentalmente diferente do que em relação aos nomes pessoais humanos; O pensamento de Israel sobre o “nome de Deus” foi realizado no contexto mais amplo do antigo mundo do Oriente Próximo e suas divindades.
Nos tempos antigos, o nome não era geralmente considerado como uma mera denominação para distinguir uma pessoa da outra, mas frequentemente como uma expressão da própria natureza da pessoa assim indicada, ou da sua posição, etc. Isto era verdade até certo ponto que frequentemente, quando algum aspecto importante aos fatos concernentes a um homem sofriam uma mudança, ela recebia um novo nome. Talvez você se lembre de “Abrão” que, depois da promessa de Deus, teve o nome alterado para “Abraão” (Gênesis 17). O nome era em certa medida identificado com a pessoa, mas acima de tudo, estava relacionado a tudo que representava o indivíduo. Isto é especialmente verdadeiro com relação aos nomes de Deus. O nome de Deus é o próprio Deus revelado em todas as suas obras. Assim, não podemos desvincular o nome de Deus da Sua própria pessoa.

Agora, desde que os nomes de Deus revelam quem ele é, é necessário que os conheçamos. No Antigo Testamento, o Ser Supremo é chamado de ‘El, isto é, Deus, visto como o Poderoso. Este nome ocorre em várias combinações. ‘El-Shaddai é o Deus Todo-Poderoso, a fonte de salvação para o seu povo (Gn 17:1; Êx 6:3). ‘Elohim (Gênesis 1:1) é um plural e refere-se a Deus na plenitude de seu poder. Elyon indica o Altíssimo (Números 24:16). Adonai aponta para Deus como Mestre (apropriadamente “meu Mestre”) ou Senhor; cf. “Senhor, não sou homem eloquente” (Êxodo 4:10). O significado do nome Jeová é até certo ponto explicado em Êx. 3:13, 14; cf. 6:2, 3. É uma forma do verbo ser, e foi interpretada como significando “Eu sou o que sou”, ou “Eu serei o que eu serei”. No hebraico original, este nome consiste no quatro letras YHWH, e é, portanto, chamado de tetragrama(maton). Chegou uma hora, talvez por volta de 300 a.C., quando os judeus, devido a sua reverência por Deus, ou sua interpretação de Lev. 24:16 e, também seu medo resultante de se tornar culpado do pecado da profanação, deixaram de pronunciar esse nome. Ao ler as Escrituras, eles substituíram por Adonai ou, menos frequentemente, por Elohim. Os massoretas, aqueles peritos textuais judaicos que floresceram entre a destruição de Jerusalém (70 dC) e o décimo século, mas cuja atividade num sentido mais geral antecedeu o período dos Macabeus e se estendeu até o ano de 1425 dC, anexaram às quatro consoantes (YHWH) as vogais de Adonai (ou de ‘Elohim). Está suficientemente claro em passagens como Êx. 6:2–4; 15:1–3; Sal. 83:18; Is. 42:8; Os 12:5; e Mal. 3:6 que o nome Jeová, seja ele vocalizado ou transliterado, enfatiza a fidelidade imutável da aliança de Deus com seu povo.

Várias combinações ocorrem em conexão com este nome. Provavelmente mais familiares são as designações “Jeová dos exércitos” (Sl. 46:7, 11) e “Jeová nossa justiça” (Jr. 23:6). Outras combinações são “Jeová proverá” (Gênesis 22:14), “Jeová (é) minha bandeira” (Êxodo 17:15), “Jeová te cura” (Êxodo 15:26), “Jeová (é) paz ”(Jz 6:24) e“ Jeová (é) meu pastor ”(Sl. 23:1).


A essa altura, já é bem conhecido o nome próprio de Deus (diferente de título) e já podemos encontrar em muitas traduções em português. A questão aqui é em que sentido Jesus disse para ‘santificarmos o nome do Pai’.

A obra Lange’s Commentary on the Holy Scriptures (edição eletrônica e-sword) diz:
“A expressão não se refere nem ao seu ser divino, nem às suas perfeições; como nesse caso, a petição “santificado seja o teu nome” seria ininteligível. O que é santo não pode ser santificado. O “nome de Deus” é a marca do seu ser sobre a mente humana, a manifestação de seu ser no mundo; daí quase equivalente a religião como baseada na revelação Divina. Comp. 1Ped 3:15: “Santifica o Senhor Deus em vossos corações”.
Em português, quando falamos que alguém tem o “nome sujo”, nos referimos a uma pessoa que não cumpriu com suas obrigações financeiras, ou uma pessoa que tem uma reputação imoral. Sendo Deus cumpridor de suas promessas e o exemplo perfeito de santidade, seu nome é santo no mais alto grau, o padrão perfeito de pureza e santidade. Nada nem ninguém pode manchar o nome de Deus, porque um nome só é maculado pelo próprio portador e, como vimos, Deus se destaca no mais perfeito patamar de santidade e perfeição. Como Lange comentou, algo que já é santo não precisa ser santificado.

Dessa forma, é preciso encontrar uma outra maneira de santificação. Uma vez que sujar o nome, ou ter o nome sujo, é o resultado da própria ação do indivíduo, o mesmo não acontece com o “vitupério”. Alguém pode difamar uma pessoa imaculada. Pode-se criar uma atmosfera de profanação em torno de alguém que é inocente e puro. Foi isso que aconteceu quando Adão e Eva pecaram. Ao invés de honrarem o nome de Deus, eles o blasfemaram por meio da desobediência.

Assim, santificar o nome de Deus significa retê-lo em reverência, mantê-lo em reverência, honrá-lo, glorificá-lo e exaltá-lo. Não santificar da boca para fora, como as pessoas faziam de maneira hipócrita nos dias de Jesus. Mas santificar primeiro na conduta, e só depois nas palavras. Santificar o nome de Deus envolve muito mais do que um conhecimento meramente intelectual do significado dos nomes divinos. Uma humildade de espírito, gratidão de coração, sincero estudo das obras de Deus até que a observação se transforme em arrebatador assombro e adoração.

Os compositores dos Salmos sabiam o que isso significava. Por toda parte - no trabalho da criação e nos eventos da história - eles observaram e levaram tempo para meditar sobre a majestade de Deus. Eles viam o seu Deus como Aquele que os libertou de seus inimigos e os protegia constantemente.

“Santificado seja o teu nome” significa que aquele que foi trazido para a comunhão com este ternamente e amoroso Pai agora chama a todos para compartilhar esta experiência com ele, e para exaltar este Deus glorioso. O suplicante chama toda a criação e, especialmente, o mundo dos homens para louvar o seu Deus. Ele exclama, por assim dizer, “engrandece a Jeová comigo e exaltemos juntos o seu nome” (Sl. 34:3). Ele traça os passos de Deus na história.

Em plena harmonia com estas palavras, Newman, B. M., & Stine, P. C. (1992). Em uma obra destinada para tradutores da Bíblia, intitulada A Handbook on the Gospel of Matthew, p. 168, nos diz:
O arcaico Santificado seja o teu nome é traduzido “possa o teu nome ser honrado” por Phps e “Que o teu nome seja respeitado” por Brc. NJB traduz “seu nome pode ser considerado sagrado”. Juntamente com a RSV, várias traduções modernas do inglês perpetuam o arcaico consagrado (NIV, NEB, NAB), que traduz um verbo grego que significa “tornar santo”. O TEV incorpora o nome ideia de santo, mas a reestruturação é bem diferente: “Que seu santo nome seja honrado”. (grifo meu)
Uma vida santa, correta, honrosa, limpa honra Àquele que nos deu a vida. Este tipo de conduta santifica o nome de Deus. Vale lembramos mais uma vez as palavras do apóstolo Pedro: “Antes, santificai ao Senhor Deus em vossos corações”. (1 Pedro 3:15)



Bibliografia
Newman, B. M., & Stine, P. C. (1992). A handbook on the Gospel of Matthew. New York: United Bible Societies.
Hendriksen, W., & Kistemaker, S. J. (1953-2001). Vol. 9: New Testament commentary : Exposition of the Gospel According to Matthew. Grand Rapids: Baker Book House.
Chouinard, L. (1997). Matthew. The College Press NIV commentary (Mt 6:9). Joplin, Mo.: College Press.
Davies, W. D., & Allison, D. C. (2004). A Critical and Exegetical Commentary on the Gospel according to Saint Matthew. London; New York: T&T Clark International.
Ryle, J. C. (1993). Matthew. Wheaton, Ill.: Crossway Books.
Filson F. V. Filson, A Commentary on the Gospel according to St. Matthew (London, 1960)
Morris, L. (1992). The Gospel according to Matthew. Grand Rapids, Mich.; Leicester, England: W.B. Eerdmans; Inter-Varsity Press.
Hagner, D. A. (2002). Vol. 33A: Word Biblical Commentary: Matthew 1-13. Dallas: Word, Incorporated.