Salmo 91 — Comentário Teológico

Salmo 91

Quanto a informações gerais que se aplicam a todos os salmos, ver a introdução ao Salmo 4, onde apresento sete comentários que elucidam a natureza do livro. Quanto às classes dos salmos, ver o gráfico no início do comentário, que atua como uma espécie de frontispício. Dou ali dezessete classes e listo os salmos pertencentes a cada uma delas.

Este é um salmo de sabedoria, sendo uma meditação sobre Deus como o protetor dos fiéis. Há cerca de uma dúzia desses salmos, além de partes de outros salmos. Eles participam da literatura de sabedoria dos antigos hebreus. Ver no Dicionário o artigo chamado Sabedoria, seção intitulada Sabedoria, Literatura de, para uma caracterização geral dessa literatura. Este salmo tem afinidades com o Salmo 46 e é um salmo de confiança, segundo a classificação de alguns eruditos. Ele também se reveste de qualidades didáticas, que formam ainda outro grupo. Seu tema central pode ser sumariado nas palavras de Paulo: “Se Deus é por nós, quem será contra nós?” (Rom. 8.31). Se este salmo pode ser usado como um comentário sobre o Problema do Mal (ver a respeito no Dicionário) de maneira muito positiva e otimista, não pode ser usado como um tratado teológico sobre o tema. Este hino ao Deus da proteção lista os tipos comuns de dificuldades que os homens mortais enfrentam, e vê a vitória por todos os lados para aqueles que confiam. Não entra, entretanto, no problema das exceções — aqueles tempos de agonia em que o Protetor Celestial parece ignorar-nos. Alguns estudiosos supõem que este poema fosse uma peça de literatura contra ataques demoníacos. O Talmude Babilônico refere-se a ele como uma “canção contra ocorrências más” ou como um cântico contra as “pragas” (Shebuoth 15b). Mas o hino à nossa frente por certo é muito mais do que essas estreitas classificações tolerariam.

A composição poderia provir de qualquer época, dentro da história de Israel, mas sua conexão com a literatura de sabedoria sugere uma data pós-exilica, quando esse tipo de literatura começou a florescer. Subtítulo. Este salmo é um daqueles aos quais editores posteriores não adicionaram nenhum subtítulo. São os chamados “salmos órfãos”, por carecerem de notas introdutórias. Na verdade, entretanto, todos os salmos originalmente não tinham subtítulos, os quais foram acrescentados por editores muito posteriores. Os subtítulos não se revestem de autoridade canônica e usualmente são apenas conjecturas quanto a questões com o autoria e acontecimentos históricos que podem ter inspirado as composições. Existem trinta e quatro salmos “órfãos”, a saber: Salmos 1 e 2; 10; 33; 43; 71; 91; 93 a 97; 104 a 107; 111 a 119; 135 a 137; 146 a 150.

Uso Pessoal. Pessoalmente tenho usado três salmos em minhas orações diárias: Salmo 23 (o salmo do suprimento abundante); Salmo 91 (o salmo de proteção); e Salmo 103 (o salmo da saúde física).

Deus, Meu Refúgio e Fortaleza (91.1-16)
Nenhum Mal Te Sobrevirá (91.1-13)

91.1 O que habita no esconderijo do Altíssimo. Este é um salmo de proteção. Alguns estudiosos afirmam que a leitura deste salmo é eficaz nos exorcismos. Seja como for, nós, os crentes, almejam os uma proteção mais ampla do que os exorcismos, e a leitura deste salmo só pode ser benéfica. Ela deve ser incorporada em nossas orações diárias. “Visto que o salmista estava convencido de que há segurança em confiar no Deus Altíssimo, ele se encorajava de que seria livrado de vários ataques assustadores da parte do Maligno. O poeta sabia que o Senhor tinha nomeado anjos para que o guardassem e o protegessem. Este salmo é um belo testemunho sobre a segurança na vida” (Alien P. Ross, in loc.).

Esconderijo. Literalmente, no original hebraico, temos a palavra “abrigo”. Esta palavra algumas vezes se refere ao templo de Jerusalém (como em Sal. 27.5; 31.20; 61.4). A referência aqui poderia ser aos adoradores no santuário, que encontravam ali a presença divina, bem como paz e também proteção. O termo, entretanto, pode ser metafórico, como em Sal. 32.7 e 119.114. O que se abriga no lugar onde o Altíssimo (ver a respeito no Dicionário) provê proteção está a salvo de todos os alarmas. Está inteiramente seguro o homem que vive à sombra do Todo-poderoso (ver a respeito no Dicionário). Este título de Deus só é encontrado no saltério aqui e em Sal. 68.14, Ver sobre a sombra das asas do Senhor em Sal. 17.8; 36.7; 57.1 e 63.7; e cf. Sal. 121.5. Ver as notas expositivas sobre o Altíssimo, em Sal. 7.1. Ver sobre as asas de proteção no vs. 4 deste salmo.
Que comunhão, que alegria divina,
Repousando nos braços eternos,
Que bênção, que paz é a minha,
Repousando nos braços eternos.
Repousando em Jesus, repousando em Jesus,
Em segurança e fora do alcance
de todos os alarmas.
As imagens de abrigo e sombra retratam vividamente a segurança, a paz e a confiança. O abrigo torna-se um esconderijo, um local seguro de todo temor e de todo o perigo. Assim sendo, mediante o acúmulo de termos, o poeta sacro exibe a paz que ele tinha alcançado. Os nomes de Deus aqui usados expressam Seus atributos de poder infinito e majestade, e isso só servia para aumentar mais ainda o senso de confiança do salmista. O lugar onde estava o esconderijo de Deus pode aludir ao Santo dos Santos. Nesse caso, foi-nos assegurado o acesso final a Deus, em quem se encontram a segurança e a paz.

91.2 Diz ao Senhor: Meu refúgio e meu baluarte. Yahweh é o refúgio do ser humano (ver as notas expositivas a respeito em Sal. 46.1, onde são dadas outras referências). O poeta sacro havia fugido para um lugar onde tribulações e calamidades não podiam atingi-lo, e resolveu ficar ali de maneira permanente. Seu refúgio também se tornou um baluarte (ver a respeito em Sal. 18.2; 31.3; 71,3 e 144.2). Algumas vezes a rocha é incluída nessa expressão, o que é anotado em Sal. 42.9. Além disso, ver Torre Forte, em Sal. 61.3. Esses termos militares mostram que Yahweh age com o o Senhor dos Exércitos (ver as notas a respeito em I Reis 18.15) e provê ampla proteção para os ataques de todo e qualquer inimigo. Além disso, finalmente, Yahweh é também Elohim (o Poder), contra quem nenhuma força pode mostrar-se eficaz. Ver no Dicionário sobre Deus, Nomes Bíblicos de. Com seu belo acúmulo de imagens, os vss. 1 e 2 expressam, de forma admirável, o fato de que há segurança para o homem que confia em Yahweh. A segurança é algo que cabe à intervenção divina, segundo a qual as vicissitudes da vida, com seu caos, não têm permissão de atingir o homem bom.

Devemos orar todos os dias contra o caos, pois o caos é um fator dentro do Problema do Mal (ver a respeito no Dicionário): por que os homens sofrem, e por que sofrem conforme sofrem? Até um homem inocente pode sair ferido, conforme demonstra o livro de Jó.

“Ele os circunda como as montanhas de Jerusalém; Sua salvação são muralhas e baluartes para o Seu povo; sim, Ele os cerca com uma parede de fogo (ver Sal. 125.2; Isa. 26.1; Zac. 2.5). Ele põe uma guarnição militar inteira em redor deles (ver I Ped. 1.5)... portanto, é Nele que devemos confiar, pois Ele é o Deus da graça quanto a coisas temporais e espirituais”
(John Gill, in loc.).

91.3 Pois ele te livrará do laço do passarinheiro. O Deus da proteção é agora visto a livrar de perigos específicos, poeticamente referidos, em primeiro lugar, como o laço do passarinheiro. Ver Sal. 66.11, quanto à mesma metáfora. Provavelmente estão em foco os perigos criados pelo homem. Há terríveis ultrajes que os homens perpetram uns contra os outros. Mas Deus intervém e detém os ímpios irracionais, destruindo seus maus desígnios e suas obras. Ver também Sal. 10.15; 124.7 e Eclesiastes 9.12. A figura de linguagem fala de desastres inesperados, que são muitos neste mundo e contra os quais carecemos de proteção divina especial. O problema do mal opera através das más obras, mediante as perversões morais, coisas que os homens perpetram uns contra os outros; e também opera através das calamidades naturais, abusos da natureza como incêndios, dilúvios, terremotos, enfermidades e a morte. O mal natural é referido aqui pelas palavras “peste perniciosa”. Diz o hebraico original, literalmente, “pestilência das calamidades”, isto é, acontecimentos prejudiciais e até mesmo fatais, provavelmente aqueles acidentes tolos, as enfermidades e outras coisas ruins que acontecem à parte da vontade do homem. Mas os vss. 6 e 7 talvez elaborem a questão; e, nesse caso, a vontade pervertida do homem, e não somente a natureza, imiscui-se em tais calamidades. Este salmo, bastante realista, fala das muitas perturbações e perigos que os homens enfrentam, pelo que precisamos de uma proteção muito poderosa. Encontramos tal proteção no Ser divino. Sim, as dificuldades do homem são muitíssimas e extremamente variadas. Portanto, um homem deve ter alguma maneira incomum de proteger-se. Ver também o vs. 10, que expande o tema.

Pragas. Perdas do controle próprio que atuam como uma praga; a pestilência do pecado, que destrói; enfermidades que fulminam inesperadamente e sem dar descanso; a praga do coração, que destrói um homem começando pelo lado de dentro; ruína espiritual; perigos físicos; acidentes; maquinações malignas de homens, promovidas pela vontade pervertida dos indivíduos.

91.4 Cobrir-te-á com as suas penas. Retornamos aqui à figura das asas de proteção, sugeridas no vs. 1. Ver Sal. 17.8; 36.7; 57.1; 63.7 e cf. 121.5. Está em pauta a figura de uma ave-mãe que reúne os filhotes sob as suas asas, quando aparece algum perigo. E m bora uma raposa possa facilmente rom per a barreira protetora das asas de uma ave-mãe, o homem bom pode confiar seguram ente nas asas divinas. A ave pode oferecer uma proteção apenas parcialmente eficaz, mas, quando Yahweh abre as asas por sobre Seus “filhos”, a defesa é segura e nos resguarda de todos os perigos. Diz aqui a Septuaginta; “Ele te cobrirá com a sombra de Seus ombros”. Isso provê uma excelente figura de proteção, em bora não seja a que aparece no versículo presente. Os pais carregam os filhos fracos ou doentes nas costas ou nos ombros. O Senhor carregou Israel no deserto. Ver Deu. 32.11,12, quanto à figura das asas, onde a águia está envolvida.

É pavês e escudo. Quanto à metáfora de Deus como o nosso escudo, ver notas expositivas completas em Sal. 3.3; 7.9,10; 84.8; 89.18. O poeta volta a uma metáfora militar. Ver o vs. 2, quanto a outras metáforas. “Pavês” era um escudo pequeno e redondo, ao passo que o escudo cobria o corpo inteiro e tinha um formato comprido. Deus serve de qualquer tipo de escudo, com qualquer finalidade, e a Sua verdade atua como essa proteção. A verdade é a Lei de Deus (ver o sumário a respeito em Sal. 1.3), bem como as promessas que Ele confere nos Seus pactos. Ver no Dicionário o verbete chamado Pactos. O homem bom conhece a verdade, obedece a ela e é protegido por ela.

“Essa verdade contém promessas para todos os tempos e circunstâncias, as quais serão invariavelmente cumpridas no caso daqueles que confiam no Senhor. O cumprimento de uma promessa relativa à defesa e apoio é, para a alma do crente, aquilo que os melhores escudos são para o corpo”
(Adam Clarke, in ioc.).

Cf. Efé. 6.16, onde o escudo aparece com o a fé. Trata-se de uma fé que detém os dardos inflamados do maligno.

91.5 Não te assustarás do terror noturno. À noite acontecem coisas assustadoras, mas que não nos deveriam espantar. Furtos, assassinatos, violências sexuais. Todos os tipos de homens violentos operam sob a escuridão. Além disso, enfermidades inesperadas atacam durante a noite, quando o corpo físico se m ostra mais vulnerável. Um exército invasor pode tirar vantagem de um inimigo despreparado que esteja dormindo.
“A noite é o tempo dos terrores; é um tempo de traições, saques, furtos e assassinatos. O homem piedoso deita-se e dorme tranquilamente, pois deixa seu corpo, alma e espírito, e sua substância material, nas mãos de Deus. Ele sabe que Aquele que guarda Israel não dormitará nem dormirá, pelo que Deus está estacionado à sua porta como um Guarda”
(Adam Clarke, in ioc., com uma referência a Sal. 121.4).
Uma Oração Noturna. “Bendito Senhor, toma-nos sob a Tua proteção esta noite; e preserva-nos das enfermidades, da morte repentina, da violência do fogo, do fio da espada, do desígnio de homens ímpios e da influência de espíritos maliciosos!” (Essa era a oração em família, usada pelo dr. Clarke).

Nem da seta que voa de dia. O tempo em que o salmista viveu era brutal e violento. A guerra era uma constante. Quantos jovens eram mortos pela seta que voava durante o dia! A seta era uma arma temível, com frequência usada como símbolo da violência da guerra. O poeta sacro usou-a como símbolo de qualquer perigo que pudesse ferir a um homem de súbito, durante o dia. Spurgeon errou muito quando fez esta seta representar a punição de Deus que derruba a um homem. Pelo contrário, Deus é o protetor de Seu povo, das setas que cruzam o ar durante o dia. Diferentemente dos deuses pagãos, que nem entidades eram, Yahweh é um protetor eficaz para o Seu povo, durante o dia e durante a noite. Em Sal. 11.2 as flechas representam os planos dos homens malignos, e em Sal. 64.3 representam as palavras dos malfeitores. Alguns estudiosos vêem aqui os encantamentos mágicos dos ímpios, que podem prejudicar os inocentes, mas isso parece muito distante da realidade dos fatos. Ademais, não é provável que as setas representem aqui os raios do sol. Cf. Sal. 121.6. Jarchi identifica as setas como demônios.

91.6 Nem da peste que se propaga nas trevas. Este versículo parece ser um paralelismo poético do versículo anterior, reiterando os perigos noturnos e diurnos. Aqui temos a pestilência que ataca durante as trevas, buscando vítimas. Ver o vs. 3, onde comento longamente sobre a “peste perniciosa”. A destruição é a que fere ao meio-dia, e com isso som os levados de volta à referência militar e suas flechas. Isso é anotado com detalhes no vs. 5, incluindo os significados variegados sugeridos pelos intérpretes. O Targum continua com sua interpretação demoníaca: “...uma companhia de demônios que destrói ao meio-dia”. Mas alguns preferem referir-se aos ventos quentes do deserto, que destroem a vegetação e ressecam os rios, deixando os homens sedentos, famintos e desesperados.

É verdade que os antigos contavam com demônios que atacavam a qualquer período do dia ou da noite, e também tinham pragas específicas. Até os deuses e semideuses participavam do ato, causando toda espécie de dor aos homens. Assim é que, nas obras de Teócrito (ld. 1. vs. 15), encontramos o seguinte: “Não é legítimo, não é legitimo, ó pastor, tocar a flauta ao meio-dia. Temos Pã, o qual, naquela hora, vai dormir, a fim de descansar das fadigas da caça. Naquele horário ele se mostra perigoso, e sua ira facilmente se acende”.

91.7 Caiam mil ao teu lado. Havia destruição por todos os lados; o assassinato era generalizado; acidentes ocorriam por toda a parte; as enfermidades atacavam velhos e jovens; os hospitais estavam repletos; havia homicídios nas estradas e pragas nas escolas; não havia paz nem para o justo nem para o ímpio. Na guerra, milhares de homens pereciam diariamente, mas para o homem bom, que confia em Yahweh, mil podiam cair diante dele, ou mesmo dez mil à sua direita, mas nenhuma calamidade tocaria no homem oculto no santuário de Deus. Em minha própria família algo semelhante aconteceu, contra o que constantemente citei este versículo como um escudo que protege alguém do perigo. Um de meus filhos estava vendo a morte quase semanalmente e, em certas ocasiões, diariamente. Quando caminhava pela calçada, via alguém ser atropelado por um veículo. Na estrada, passava constantemente por acidentes fatais. A morte se aproximou por várias vezes. Acontecia com tanta freqüência que ele, na verdade, estava ficando calejado diante da morte. Quando ele me telefonava de Santos, eu esperava ouvi-lo descrever uma nova calamidade. Foi uma coisa terrível. Portanto, eu continuava repetindo para ele: “Mil podem cair ao teu lado, e dez mil à tua direita, mas a morte não chegará perto de ti”. Eu repreendia qualquer espirito maligno que pudesse estar causando todas aquelas coisas. Eu orava contra o caos e continuava a citar este versículo. Gradualmente, os ataques malignos tornaram-se menos freqüentes, até que cessaram por completo. Assim sendo, o agradecimento a Deus substituiu o temor, e a confiança acalmou nosso espírito. Entre os povos antigos corria a crença de que os deuses podiam ser adorados a qualquer tempo, mas os demônios só podiam ser abordados e honrados ao meio-dia. Isso supostamente acontecia porque os demônios se mostravam muito ativos durante a noite, e nenhum homem ousaria aproximar-se deles. Ao meio-dia, porém, os demônios estavam mais relaxados e portanto mais acolhedores a qualquer petição humana. Vivemos em um mundo de poderes estranhos e misteriosos, e temos de resguardar-nos no santuário, para escapar à colheita das forças malignas.

91.8 Somente com os teus olhos contemplarás. Como pode um ser humano escapar de todos esses males? Como pode sentir-se seguro em um ambiente hostil e precário? Ele precisa voltar-se para Deus. Precisa distanciar-se do ímpio, sobre quem estão caindo todos os tipos de desastres. Precisa levar a sério os senhores do bem e do mal, apegando-se ao senhor do bem. O homem bom pode ver o desastre cair sobre o homem mau, porquanto este último está sendo castigado pela retribuição divina, em consonância com a Lei M oral da Colheita segundo a Semeadura (ver a respeito no Dicionário).

Assim sendo, a palavra encorajadora é a seguinte: “Não somente estarás em segurança, mas também verás a justiça ser feita. Aqueles que te molestam e prejudicam não terão permissão de escapar com seu jogo doentio”. Israel passou pelas águas do mar Vermelho sem ser prejudicado, mas também viu a destruição dos egípcios, o que lhe provou existir tanto uma providência negativa quanto uma providência positiva. Deus criou todas as coisas, mas também intervém em Sua criação; Ele recompensa, mas também pune. Em outras palavras, Ele é um Deus teísta, e não deísta. Ver no Dicionário os verbetes intitulados Teísmo e Deísmo, quanto a explicações sobre esses conceitos.

William Dobbie, governador de Malta, era o responsável pela defesa daquela ilha-fortaleza durante a Segunda Guerra Mundial. Mas tratava-se de uma tarefa humanamente impossível. Embora Malta fosse um lugar densamente povoado, os navios enviados com alimentos eram constantemente afundados pelas forças do eixo (alemães e italianos). Perecer de fome era uma ameaça diária. Eles possuí­am apenas quatro aviões ultrapassados e dezesseis canhões antiaéreos. Mas o governador, que era homem profundamente religioso, continuava confiando em Deus. Em um momento de desespero, as forças militares britânicas enviaram ao governador um telegrama que continha apenas uma referência bíblica, Deu. 3.22.

Os defensores de Malta imediatamente leram em suas Bíblias: “Não os temais, porque o Senhor vosso Deus é o que peleja por vós”. Coisas miraculosas come­çaram a acontecer, e assim Malta foi salva. O povo da ilha viu, com os próprios olhos, a destruição das forças inimigas. Dobbie publicou sua história em um livro, anos mais tarde. No inicio do livro, citou Sal. 46: “Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente nas tribulações”. E deu ao livro o título Um Socorro Bem Presente nas Tribulações.

91.9 Pois disseste: O Senhor é o meu refúgio. Como pode um homem evitar as coisas más que têm sido mencionadas? Como pode evitar o temor? Como pode atravessar tempos difíceis sem desmaiar? Ele fez do Altíssimo (ver a respeito no Dicionário) o Capitão da sua vida. Refugiou-se Nele (ver o vs. 2). Fixou residência no santuário de Deus (vss. 1 e 9). Escondeu-se à sombra das asas do Senhor (vs. 4). Tinha Deus por seu escudo (vs. 4).
“O salmista estava valendo-se da proteção conferida àquele que confia em Deus... e disse pessoalmente: ‘Sim, isso é a verdade que me diz respeito, pois Tu, Yahweh, és realmente o meu refúgio”.
(Ellícott, in loc.).


“Todo homem piedoso pode esperar tal proteção da parte de seu Deus e Pa!”
(Adam Clarke, in loc.).

91.10 Nenhum mal te sucederá. Aquele que tornou as coisas mencionadas no vs. 9 uma realidade em sua vida pode ter confiança de estar isento de qualquer e todo mal e de que nenhuma praga se aproximará de sua residência (literalmente, de sua tenda), embora as pessoas estejam morrendo com o moscas por todos os lados. Minha mãe costumava usar este versículo como uma oração freqüente, quando eu e meu irmão estávamos crescendo, mas especialmente no verão, quando a poliomielite matava crianças aos montões. Eu, pessoalmente, tenho prosseguido nessa prática, requerendo do Senhor a segurança e a saúde de meus filhos. É conforme diz um antigo hino: “A quem posso recorrer, senão ao Senhor?”.

Este versículo provavelmente é uma alusão às muitas pragas que sobrevieram ao Egito enquanto os filhos de Israel estavam seguros em suas tendas. Ver no Dicionário o artigo chamado Pragas do Egito. O poeta sagrado, naturalmente querendo fazer uma clara representação sobre a proteção divina, não se perde em exceções, quando homens inocentes sofrem sem razão algum a, ou por razões inteiram ente triviais. O sofrimento dos inocentes faz parte do Problema do Mal em geral (ver a respeito no Dicionário).

91.11 Porque aos seus anjos dará ordens a teu respeito. Anjos Guardiães. Era não som ente natural, mas também necessário que o salmista chegasse à questão dos anjos guardiães em sua discussão sobre a proteção divina. Ver no Dicionário os verbetes intitulados Anjo e Anjo Guardião. Provavelmente nossos melhores homens são os que se mantêm mais próximos de seus respectivos anjos guardiães. Esses seres celestes são guias, e não m eram ente protetores. Eles podem inspirar-nos com discernimento e conhecimento. São m estres, e muitas das coisas que atribuímos à m ente subconsciente podem ser devidas à atividade dos anjos guardiães-guias-professores. Ver a seção XI, Tarefas dos Anjos, no artigo do Dicionário denominado Anjos. Ver também a divisão cham ada O Ministério dos Anjos. Os vss. 11 e 12 foram citados pelo diabo, diante do Senhor Jesus, em M at. 4.6 e Luc. 4.10,11. Mas ele lhes conferiu uma estranha distorção, contra a vontade de Deus. Contudo, fica evidente que é aprovado por Deus, que nos criou e nos fez com o somos, que a Sua vontade opere através do poder dos anjos, bem com o através de outros meios, como é apenas natural.

As modernas pesquisas psíquicas confirmam a existência de espíritos que agem com o nossos guardiães, guias e professores. O “eu” superior da pessoa, o seu espírito, é uma espécie de anjo guardião, que cuida do “homem mortal” que desem penha seu papel no palco deste mundo. Mas não há razão algum a para duvidar da realidade espiritual de entidades “distintas”, que estão interessadas em nosso bem -estar e que intervêm e trabalham em favor de Deus. Ver Heb. 1.14. Há um ministério angelical, e não m eram ente uma tarefa protetora dos anjos.
Perto de cada homem, quando ele nasce, posta-se um bom
espírito, um guia santo na vida.
(Menandro)
Veredas. Estamos falando das veredas do dever; veredas de serviço amoroso: veredas de aprendizado; veredas de vida geral. Além disso, há veredas de pecados a serem evitados; veredas de atos insensatos; veredas de infidelidade; veredas maldosas; veredas dos demônios. Nossos anjos ajudam-nos a seguir as veredas certas e a evitar as veredas más. Cf. Mat. 7.13,14.

91.12 Eles te sustentarão nas suas mãos. Este versículo prossegue com a ideia da proteção, que é o tema central deste salmo, mas os elementos sugeridos no versículo anterior são verídicos e ilustram a proteção divina, segundo o artigo chamado Anjo. O filho do general George Patton. que também era general do exército americano, combateu durante a guerra da Coréia. Ele estava no meio de uma batalha, e a sua morte, juntam ente com a morte daqueles que o acompanhavam, parecia certa. Ele tinha de chegar a um local seguro e não havia esperança.

Ele levantou a Deus uma rápida oração. Então saiu da trincheira e correu. Ele contou que, por incrível que possa parecer, tudo em redor silenciou. Nenhum tiro foi disparado, e nenhum adversário parecia notar o que ele estava fazendo. Era como se ele estivesse sozinho no campo de batalha. E ele correu à vontade para seu lugar de refúgio. Mais tarde declarou: “Nunca esquecerei aquele momento!”.

E assim acontece, igualmente, conosco. Há muitos momentos de intervenção divina em nossa vida, tempos de proteção especial, e muitos outros benefícios que vão além de nossa capacidade.

Podemos ter certeza de que o homem bom conta com a presença de seu anjo, o qual manipula as coisas, conforme as necessidades do homem. Nossos anjos arranjam as circunstâncias que nos cercam. Assim oramos, oramos e oramos, mas nada acontece. Não há coriscos vindos do céu, nenhuma iluminação repentina, nenhuma manifestação divina, Mas nossos anjos estão arranjando as circunstâncias, e logo fica claro o que devemos fazer, e então dizemos: “Oh, Senhor, contínua a conferir-nos tal graça!”. Ademais, há aquelas coincidências impossíveis que acontecem ao nosso redor. São pequenos relâmpagos que brilham do céu e nos dizem: “Viste isso, homem cheio de dúvidas? Vês como faço coisas que são totalmente inesperadas? Posso fazer qualquer coisa, portanto pede-me que te mostre alguma coisa!”. Por conseguinte, respondo: “Muito bem, Senhor, mostra-me toda espécie de coisas, e eu te louvarei para sempre”.
Andarás seguro no teu caminho, e não tropeçará o teu pé.
(Provérbios 3.23)
Pedra. Tem os aqui menção a pecado, perigo, obstáculo, demora indesejada, reversão, fracasso, equívoco, ato insensato, ataque de um inimigo, enfermidade, desastre natural, falta de dinheiro, pobreza, arrogância, erro, falta de propósito definido, tentação que não pode ser vencida, promessa de Deus tolamente aplicada, promessa divina que não está sendo aplicada de forma alguma, materialismo, calamidade, morte prematura.

91.13 Pisarás o leão e a áspide. Aqui, animais perigosos tornam-se metáforas que representam perigos, reversões e tragédias que o homem bom pode sofrer. Um leão oculto na floresta pode realmente ser pisado por um homem descuidado! Poderia um homem sobreviver diante de tal situação? Mas a metáfora envolve mais do que isso: O homem bom pode sair lá fora, escolher seu leão e pisá-lo aos pés, mais ou menos com o Sansão faria. Mas que meu leitor não conte com isso. A ideia encerrada na metáfora é que o homem protegido por Deus pode fazer coisas que são tidas como impossíveis ou extremamente improváveis.

Ou então alguma áspide venenosa por ser pisada por um homem descuidado, e isso também seria uma má situação. Mas o homem divinamente protegido pode sair lá fora, encontrar a áspide venenosa e pisar propositadamente sobre ela; e, no entanto, a boca da áspide continuaria fechada. Alguns evangélicos fanáticos tomam literalmente as palavras que se encontram no final do evangelho de Marcos, e organizam o “culto da cobra”, no qual distribuem serpentes mortais entre os membros, de pessoa para pessoa, achando que exercem grande fé com esse “rito”. Naturalmente, este versículo ficou misturado no término espúrio de Mar. 16.18, e isso tem servido somente para encorajar ainda mais o culto às serpentes. Desnecessário é dizer que muitos membros desses cultos têm morrido em tais ritos. E eles dizem que essas mortes se devem “à falta de fé”, mas quem dá ouvidos a essa falta de bom senso?

Leãozinho. Talvez um homem perturbe um leão velho, bem alimentado e em repouso, e então consiga escapar do leão idoso. Mas quem enfrentaria um leão jovem e faminto? Naturalmente, Sansão conseguiu tal feito e matou o leão (Juí. 14.5,6), mas o texto sagrado deixa claro que foi o Espírito de Deus que lhe permitiu realizar o feito. De jovens leões, os homens mantêm-se afastados, e nunca houve um “culto aos leões”, no qual as crianças da escola dominical ficas sem a montar ao redor, na igreja, Metaforicamente, porém, homens têm pisado perigos maiores ainda do que jovens leões, Certas serpentes nos metem medo e procuramos evitá-las, mantendo-nos a longa distância ou fugindo quando elas aparecem. Meu tio esteve certa ocasião nas colinas perto de Pocatello, estado de Idaho, Estados Unidos, onde havia muitas cascavéis. Então ouviu o barulho da cauda de uma delas e, embora fosse muito forte (pois finalmente se tornou um conhecido boxeador peso-pesado), ele se voltou e correu o caminho até a cidade, e nem olhou para trás!

E houve também o caso de um caçador insensato que encontrou uma bola de cascavéis que se tinham reunido para hibernar durante o inverno. Ele ficou orgulhoso pela descoberta e levou a bola para os outros caçadores que estavam reunidos em torno de uma fogueira. Ele colocou a bola perto demais do fogo, e logo as cobras, em hibernação, arrastavam-se por toda a parte, enquanto os caçadores fugiam em todas as direções. “Deus capacitou Seus servos, como Sansão, Davi e Daniel, a obter vitórias sobre leões literais (ver Juí. 14.5; I Sam. 17.34,35 e Dan. 6.23), um tipo de vitória espiritual que os santos recebem sobre demônios parecidos com leões e sobre inimigos humanos (II Tim. 2.17; Êxo. 4.3,4)” (Fausset, in loc.).

A áspide... a serpente. O primeiro destes animais era uma cobra pequena, mas extremamente mortífera, conhecida no Egito e na Arábia, mas não na Palestina. O segundo era uma cobra grande, também bastante venenosa. Não está em pauta algum monstro marinho, conforme dizem aqui certas traduções. Cf. Deu. 32.33 e Êxo. 7.10.

O Senhor consola com Suas Palavras (91.14-16)

91.14 Porque a mim se apegou com amor. O primeiro e grande mandamento é que amem os a Deus (ver Deu. 6.5), embora o decálogo original não contivesse esse mandamento. Ver Rom. 13.9,10, sobre com o o amor é o cumprimento de toda a lei. Se um homem consegue amar a Deus, é-lhe garantida a proteção prometida neste salmo. Não somente ele será livrado das tribulações, mas tam­bém será exaltado e honrado em tudo quanto fizer. Naturalmente, é preciso que o homem seja altamente espiritual para que consiga amar diretamente a Deus. É fácil amar ao Senhor Jesus Cristo, porquanto Ele se aproximou de nós. Mas também podemos amar os homens, os filhos de Deus, e assim amar a Deus indiretamente.

... se apegou com amor. Diz aqui a Revised Standard Version: “apega-se a mim em amor”; e a King James Version diz: “firmou em mim o seu amor” . Em term os práticos, ama a Deus o homem que guarda os Seus mandamentos, pois guardá-los, e isso de todo coração, é amar a Deus. Ver Deu. 6.5,6; João 14.15 e 1 João 5.2. O homem que ama a Deus, qualquer que seja o grau desse amor, contanto que genuíno, será livrado dos ataques dos inimigos e das tribulações e será exaltado nos céus, onde reside o objeto de seu amor. Os vss. 14-16 são uma comunicação divina que confirma as conclusões extraídas acima, da primeira porção do Salmo 91. O poeta declarou o que achou por bem sobre proteção e prosperidade, e Deus, o Protetor e Prosperador, confirma o que o salmista disse. Quando finalmente se empregou este salmo no ritual do templo de Jerusalém, provavelmente foi um sacerdote quem entoou essas palavras, como porta-voz de Yahweh. Aben Ezra imaginou Deus a dirigir essas palavras aos anjos, os quais garantirão que elas terão cumprimento entre os homens todos os dias, na vida prática.

Conhece o meu nome. Ver em Sal. 31.3 sobre como o termo “nome” era usado, e ver também sobre Nome Santo, em Sal. 30.4 e 33.21. Ver ainda Sal. 8.1 e 20.1.

91.15 Ele me invocará, e eu lhe responderei. O homem bom é servido pelos anjos, os quais fazem as promessas de Deus operar em sua vida. Além disso, ele recebe o instrumento adicional da oração, mediante o qual pode chegar aos céus e tocar em Deus diretamente. O homem que invocar será ouvido; o homem que for ouvido obterá respostas. Ele será liberado de todos os inimigos e perturba­ções, de todos os desastres e do caos, e também será honrado ou exaltado, conforme vimos no versículo anterior.

“O Senhor conhece o Seu povo e o visita na época da adversidade. Ele os visita em suas aflições e lhes concede Sua graciosa presença, apoiando-os e certificando-lhes que não serão avassalados pelas aflições. Ele os sustenta em todas as questões e faz todas as coisas cooperar juntam ente para o bem. Ele honra Suas promessas e Seu povo... Concede-lhes com unhão e os conduz a seu próprio reino e glória”
(John Gill, in loc.).


“Eu o glorificarei. Derramarei sobre ele toda a honra, a honra que só pode vir de Deus. E mostrarei a outros homens quanto o prezo”
(Adam Clarke, in loc.).

Ver no Dicionário o verbete denominado Oração. Além de ser nossa arma ofensiva contra o mal, a oração também é nosso instrumento positivo para obter a proteção e a bênção de Deus. E a oração é um dos meios do desenvolvimento espiritual. Ver no Dicionário o artigo chamado Desenvolvimento Espiritual, Meios do.
Doce hora da oração,
Que tuas asas alcem minha petição,
Àquele cuja verdade e fidelidade
Ocupa-se a abençoar a alma que espera.
E como Ele me ordena a buscar a Sua face,
Crendo em Sua palavra e confiando em Sua graça,
Deixarei com Ele todos os meus cuidados.
(William W. Walford)

91.16 Saciá-lo-ei com longevidade. A interpretação cristã deste versículo é que o homem bom receberá longa vida na esfera terrestre e vida eterna na outra vida. E isso é uma verdade, sem importar se a visão do poeta sagrado atingiu ou não essas alturas. Receber a vida eterna é a proteção e prosperidade máxima da alma. Os hebreus temiam a morte prematura, e as múltiplas proteções de Deus garantiriam isso, dando uma boa vida para ser vivida até o fim, sem que a enfermidade e a debilidade física atacassem o crente. Saciá-lo-ei. O indivíduo que vive por muitos anos, e bem, fica satisfeito com a vida que teve, mas terrivelmente frustrado se sua vida for cortada antes que sua missão se cumpra. Portanto, Senhor, concede-nos vida longa, concede-nos essa graça! Quanto à desejabilidade de atingir uma longa vida física, ver Gên. 5.21, onde amplio o tema.

A minha salvação. Quiçá o salmista tenha tido alguma espécie de visão sobre a existência pós-túmulo, onde ele sobreviveria e participaria de alguma esfera celeste; ou talvez ele tenha usado o vocábulo “salvação” para indicar somente o livramento de todos os inimigos e provações, acompanhado das bên­çãos terrestres do povo em aliança com Deus. Ver sobre a salvação e sobre o Deus da Salvação em Sal. 62.2, onde apresento notas expositivas e referências ao tema. Ver o artigo detalhado sobre Salvação, no Dicionário. Cf. Sal. 50.23.
Tenciono chegar a Deus,
Pois é para Deus que m e dirijo tão depressa,
Pois no peito de Deus, m eu próprio lar,
Depositarei minha alma, finalmente.
(Johannes Agricola)

A promessa de uma longa vida, apesar de concordar com os sentimentos gerais do Antigo Testamento, é especialmente apropriada no fim deste salmo, o qual, desde o começo, fala sobre a proteção de perigos que ameaçavam a vida” (Ellicott, in loc.).

Esta colina, embora alta, cobiço subir por ela;
A dificuldade não me servirá de empecilho,
Pois percebo que o caminho da vida está aqui;
Vamos, encoraja-te m eu coração, não desmaies
e nem temas:
Melhor que em meio a dificuldades, subas
pelo reto caminho,
Do que com facilidade tomes o caminho errado,
cujo fim é um ai.
(John Bunyon, em O Peregrino)