Provérbios 10 — Comentário Teológico

Provérbios 10

A segunda coletânea de seus provérbios aparecem nos capítulos 25-29. Vários autores se envolveram na escrita do livro. Os capítulos 10-15 enfatizamos contraste existente entre a vida reta e a vida ímpia. Os capítulos 16-22 exaltam a vida reta. A passagem de Pro. 10.1-22.16 contém cerca de trezentos e setenta e cinco afirmações, a maioria das quais baseadas, de algum a maneira, na lei e nas declarações de sabedoria que interpretam essa lei. A maioria dessas declarações se com põe de dois versículos (linha métrica), o segundo das quais é a antítese do primeiro. Esse tipo de apresentação chama-se paralelismo antitético. Mas o trecho de Pro. 16.1-22.16 tem apenas alguns poucos desses tipos de versículos, e tem ou comparações (paralelismos sinônimos) ou segundas frases que completam a primeira ideia apresentada, o que é chamado de paralelismo sintético.

Os versículos são dispostos de forma bastante heterogênea, pelo que é impossível apontar divisões, exceto por capítulos e versículos. O que temos, pois, é uma longa compilação de declarações sábias, com uma mistura de alguns poucos versículos atados aqui e ali. Muitos assuntos são assim mencionados, junto com, ocasionalmente, dois ou m ais versículos consecutivos que tratam de um único assunto.

10.1 Provérbios de Salomão. Ver a introdução acima e a seção III, Autoria, na Introdução. Quanto a notas sobre os provérbios, ver Pro. 1.1. Essa palavra pode significar declarações ou discursos sábios e incisivos, entre outras coisas. O filho sábio alegra a seu pai. A seção começa no lar, onde a sabedoria é pela primeira vez insuflada no coração da criança. Presume-se que pai e filho, neste passo bíblico, apontam para relações físicas, ao passo que, na maior parte do primeiro livro (1.8-9.18), temos o pai espiritual (o mestre), que se dirige a seus filhos espirituais (alunos). O filho de um homem sábio também é sábio. Ele segue a lei de Moisés e põe em prática aquilo que tem aprendido. O hebraico original diz hakkam, que implica “possuir um conhecimento prático”. A lei é o manual de instruções, mas é ajudado pela adição e interpretação das declarações de sabedoria.

Ensina a criança no caminho em que deve andar, e ainda quando for velho não se desviará dele.
(Provérbios 22.6)

Antítese. Contrastando com o que acontece no caso do pai sábio, que instrui seu filho, o qual, em seguida, também torna-se sábio, temos o caso do filho insensato, que desaponta o seu pai. A experiência demonstra que há muitos filhos insensatos, os quais se envolvem em toda espécie de encrenca, pois, mesmo depois de terem recebido um bom treinamento, o rejeitam. Mas este versículo parece significar que o pai, apesar de ser um homem bom, falhou em sua obrigação de criar o filho do modo correto. Ele se mostrou lasso em seu ensino. Baha Ullah dizia que a pior coisa que um pai pode fazer é conhecer os ensinos mas não transmiti-los a seu filho.

O filho in sensato é a tristeza de sua mãe. “Tristeza”, aqui, literalmente, é peso. O coração da mãe de um filho insensato se entristece ou fica pesado. Não é fácil ver um filho fracassar espiritualmente, sem importar o que mais ele possa realizar em sua vida. A tristeza aqui é atribuída à mãe, porque a ela cabia a principal responsabilidade de treinar os filhos. Ela, porém, fracassou; ou o filho fracassou; e o resultado foi a tristeza. O autor sagrado não pretendeu excluir o pai. Ver Pro. 17.21,25; 19.13, onde encontramos o pai entristecido por causa do filho. A variação entre o pai e a mãe é um artifício literário. Sempre que um deles é mencionado, devem os entender ambos.

10.2 Este versículo apresenta o modo antitético de exposição, pois o vs. 2 (linha métrica) provê um contraste com o primeiro, e é esse método de apresentação que domina os capítulos 10-15. Ver a introdução à seção sobre os modos de expressão da seção de Pro. 10.1-22.16 (os Provérbios de Salomão, primeira coletânea).

Tesouros da impiedade. Devemos entender aqui os tesouros m ate riais, obtidos mediante práticas pecaminosas, desonestidade, furto e outros métodos ilegais. Contrastar o homem bom, que vive em consonância com a lei, e sobre quem se espera ser materialmente próspero. Sobre a lei como guia da vida, ver Deu. 6.4 ss. O homem que negligencia a lei, a ponto de ir contra ela para enriquecer, descobrirá no fim que não obteve disso nenhum proveito. Ele perderá todo proveito, ou a sua vida, ou ambas as coisas. Seja com o for, ele morrerá, talvez rico. M as de que adianta isso se perder a própria alma?

Que aproveita ao homem, ganhar o mundo inteiro e perder a
sua alma? Que daria um homem em troca de sua alma?
(Marcos 8.35,37)

Provavelmente, o autor não olhava aqui para além do sepulcro, mas sabia que a vantagem mal ganha nada aproveita, eventualmente, nem mesmo nesta vida terrena.

Antítese. O homem bom que segue a lei não sofrerá morte prematura, antes obterá vida abundante. Ver as notas expositivas em Pro. 4.13; 9.6,11, que abordam esse tema muito repetido. Mas a justiça livra da morte. No que consiste essa “justiça”? No bem que é encorajado pela lei, e em evitar o mal. O vocábulo hebraico çedhaqah tem um sentido primário de esmola, embora a referência provavelmente seja geral: ser bom e fazer o bem. Dar esmolas era uma expressão dessa justiça e um ato muito enfatizado pelo judaísmo “Esses tesouros acabam definhando (ver Pro. 13.11; 21.6) e não impedem a morte (Pro. 11.4)” (Sid S. Buzzell, in loc.). Cf. este versículo com Sal. 49.6; Luc. 12.19,20 e Pro. 11.4. Esta última passagem é quase idêntica ao presente versículo.

10.3 O Senhor não deixa ter fome o justo. Prosseguindo com o assunto da bondade, da maldade e do dinheiro, o autor assegura-nos que o Senhor (Yahweh) é Quem controla essas questões. Ele não permitirá que passe fome o homem que segue a lei.

Fui moço, e já, agora, sou velho, porém jamais vi o justo
desamparado, nem a sua descendência mendigar o pão.
(Salmo 37.25)

É o Senhor quem supre aos justos as suas necessidades temporais. Ver Mat. 6.33. Os vss. 3-5 discutem sobre a diligência e a preguiça. Espera-se do homem bom que ele trabalhe, e então Deus o fará prosperar em sua obra, para que goze sempre de um suprimento alimentar e outro suficiente. Seja como for, o autor sagrado não chamaria de bom um homem preguiçoso, sem importar quão bem ele conhecesse a lei e evitasse pecar. A preguiça é, por si mesma, um pecado sério e um defeito morai.

Antítese. O homem ímpio que ganha a vida ideal e imoralmente (vs. 2) eventualmente sofrerá revezes e perderá o seu dinheiro e, quando se aproximar da sepultura, verá a vida inútil que tem levado, fazendo do dinheiro o seu deus.

Ver II Reis 4.27 como ilustração. Ver também Tia. 4.3 e Jó 20.15.

10.4 O que trabalha com mão remissa empobrece. O preguiçoso é retratado como alguém dotado de mão remissa. Sua mão é fraca. Ele trabalha pouco e por curto tempo e, no entanto, espera que o dinheiro chova do céu. Ele ficará desapontado. Ver no Dicionário os verbetes chamados Preguiça e Preguiçoso. Ver Pro. 6.6-11, onde há uma passagem contra esse tipo de pecado e citações ilustrativas que embelezam o texto. O homem que se recusa a trabalhar fica pobre. Essa é uma das máximas do livro de Provérbios.

Quando ainda convosco, vos ordenam os isto: se alguém não
quer trabalhar, também não coma.
(II Tessalonicenses 3.10)

Antítese. O homem bom terá mão forte para trabalhar e assim contará também com o suprimento de cada uma de suas necessidades. A mão dos diligentes. “Diligente”, no original hebraico, é haruç, “cortar”. Talvez a alusão seja a alguém que corta madeira ou pedra, trabalhos pesados. O homem bom será um “pedreiro” moral e espiritual. Ele não procurará fugir de suas responsabilidades. Mas a alusão também poderia ser a “cortar o solo”, ou seja, ocupar-se na agricultura. Ou então pode estar em foco uma qualidade moral, homens que diligente e entusiasmadamente fazem o que devem fazer.

10.5 O que ajunta no verão é filho entendido. O filho sábio, que alegra a seu pai e a sua mãe (vs. 1), terá, entre as suas boas características, a diligência no trabalho, de modo que possa sustentar a si mesmo, e não precise depender de seus pais. Ele terá seu próprio lar; sua própria família; seu próprio trabalho; seu próprio salário. Metafórica ou literalmente, ele colherá a sua própria colheita, tendo trabalhado arduamente durante a primavera e o verão em sua plantação.

Ou talvez ele não seja um agricultor, mas aja como fazendeiro diligente. Ele possuirá suas próprias “terras” e nelas trabalhará. Cf. Pro. 6.8. O inseto é um ser minúsculo e verdadeiramente humilde, mas tem bom senso suficiente para trabalhar durante o verão, para ter bastante que comer nos meses frios de inverno, que se seguirão inevitavelmente.

Antítese. O filho desapontador de seus pais, entretanto, divertir-se-á durante o verão e dormirá durante o tempo da colheita, quando homens mais ativos estão trabalhando. Seu pai terá de dar-lhe o sustento, mas logo chegarão dias quando o “velho papai” não estará mais presente para efetivar esse programa. Então o filho sofrerá da pobreza e até padecerá fome. Ele faz seu pai envergonhar-se. Ver Pro. 12.24; 17.2 e 19.15.

Tempos Bons e Tempos Maus. Quando um homem é jovem e forte, deve preparar diligentemente o seu caminho. Quando ele se tornar idoso e adoentado, então será muito tarde. A súmula do provérbio diz que, no tempo da saúde e da juventude, as pessoas devem ser ativas e industriosas, em suas várias profissões e posições sociais, providenciando o necessário contra a idade avançada e as enfermidades. Elas não devem perder as oportunidades que se apresentarem, sejam de natureza natural sejam de natureza espiritual.

10.6 Sobre a cabeça do justo há bênçãos. O homem bom e industrioso tem “bênçãos sobre a cabeça”, tanto de fontes divinas quanto de fontes humanas, ou seja, tem abundância de coisas materiais, porquanto ele trabalhou para que fosse assim. Esse homem reto obedece à lei e às declarações de sabedoria, incluindo as injunções concernentes à diligência e à produção. Ele permite que a lei seja seu guia e atende às palavras de seu pai literal e de seus pais espirituais (seus mestres).

Sobre a cabeça. Isso se refere às bênçãos do pai, que impõe as mãos sobre a cabeça do filho a quem abençoa, dando a entender que o Pai celestial também impõe Suas mãos sobre a cabeça do homem bom e trabalhador. Esse homem conta com as bênçãos paternas e com a Bênção Paterna. Suas bênçãos tornam-se a coroa de aprovação.

Antítese. O preguiçoso torna-se um homem mau, pelo que a sua boca é retratada como cheia de maldições. Um pecado conduz a outro, e assim um homem termina sendo um pecador confirmado. O hebraico original, aqui, pode ser entendido como um homem sujeito às maldições e declarações duras de outros. Ele é espancado na boca com palavras violentas e aviltantes de outras pessoas, bem como com as maldições de Deus. Ele acaba por amaldiçoar os pais com a sua vida e assim torna-se um homem amaldiçoado entre os homens. Deus abençoa o homem bom, mas amaldiçoa o preguiçoso e mau .”... seus tratos violentos são francos e manifestos e são um escândalo para ele, envolvendo maldições proferidas contra ele” (John Gill, in loc.).

10.7 A memória do justo é abençoada. Uma vez que a morte tenha vindo e arrebatado o homem bom, sua memória permanecerá entre os homens como uma bênção. Isso é algo desejável para a maioria dos homens, embora, se for tudo quanto restar dele, então por quanto tempo essa memória continuará, e que bem final procederá daí? A esperança cristã da imortalidade, naturalmente, põe em eclipse quaisquer considerações como essa, mas tal esperança ainda não havia raiado na teologia hebraica. O homem cuja memória ainda abençoa os homens continua vivo nos céus, em um estado melhor.

Não será jamais abalado; será tido em memória eterna.
(Salmo 112.6)

Alguns intérpretes tomam este versículo como um mandamento: “Lembrai-vos do homem bom e segui o seu exemplo”.

Antítese. Em contraste, a memória do homem mau será sempre uma abominação e, finalmente, acabará reduzida a pó. O hebraico original é ainda mais forte: a sua memória apodrecerá juntam ente com a putrefação de seu corpo. “A memória do ímpio será tratada como algo putrefato e nojento (Sal. 9.5,6; Eclesiastes 8.10” (Fausset, in loc.).

Disse Cícero: “A vida dos mortos jaz na memória dos vivos” (Orat. 51. Philip. 9.). Naturalmente, como um estoico romano, ele acreditava na imortalidade da alma, mas apontava para a ideia que os mortos ainda vivem entre os homens.

Um mestre afeta a eternidade. Ele jamais poderá dizer onde cessa a sua influência.
(Henry Adams)

Algo dotado de beleza é uma joia para sempre; Aumenta a sua capacidade de ser amado;
Nunca passará para o nada.
(John Keats)

10.8 O sábio de coração aceita os mandamentos. É típico do segundo livro dos Provérbios, a primeira coletânea dos provérbios de Salomão (ver a introdução ao capítulo 10), a saber, o trecho de Pro. 10.1-12.16, ter breves provérbios densos, com frequência sem nenhuma conexão com os outros. Algumas raras vezes, alguns versículos permanecem com o mesmo tema e lhe dão um tratamento mais longo. Mas muitos versículos são declarações isoladas. Não há como esboçar esse material. Simplesmente passam os de versículo para versículo, observando capítulos e versículos, sem seções especiais. Assim, por exemplo, este vs. 8 nada tem que ver com os vss. 7 e 9. Esta coletânea consiste em cerca de trezentos e setenta e cinco declarações.

O nosso homem, tendo obtido alguma sabedoria por conhecer e obedecer à lei mosaica como guia, continuará recebendo mandamentos em seu coração (ver Pro. 4.23). Tal homem tem uma fé sentida no próprio coração. As declarações de sabedoria definem e reforçam a lei de Moisés. Existem cerca de oitenta declara­ções que incluem referências ao coração, no livro de Provérbios, pelo que está em pauta mais do que mera obediência mecânica a um código moral. Os m andamentos são fomentados e interpretados pelas declarações de sabedoria. “Uma pessoa sábia aprende com facilidade e se dispõe a tornar-se mais sábia (Cf. Pro. 1.5 e 9.9)” (Sid S. Buzzell, in toc.).

Antítese. O homem de “lábios tolos”, que abusa da faculdade da fala e transgride a lei de muitas maneiras, é um contraste com o homem bom, que continua aprendendo. Ele chegará à ruína. Quanto ao uso perverso da língua, ver Pro. 4.24; 6.12; 8.13 e Sal. 5.9; 12.2; 15.3; 17.3; 34.12 etc. Há cerca de cem versículos, no livro de Provérbios, que abordam a questão da linguagem.

O estado de ruína do texto pode significar muitas dificuldades, e então, finalmente, uma morte prematura e desgraçada. Mas é um anacronismo fazer disso uma referência a um julgamento para além-túmulo. Contrastar com Dan. 12.2. A ruína aparece por cinco vezes neste capítulo: vss. 8 ,1 0 ,1 4 ,1 5 e 29.

10.9 Quem anda em integridade anda seguro. “A jornada da vida, para o homem reto, é segura: íntegro, no hebraico tom, significa completo, são” (Charles Fritsch, in loc.). Esse homem será resguardado de perturbações como acidentes, enfermidades e ataques da parte dos ímpios. O resultado é que ele terá uma vida longa e feliz. Ademais, não será lançado no descrédito por parte de palradores insensatos; pelo contrário, estará a salvo de suas críticas, de suas palavras cortantes e requeimantes. “Ele poderá confiar quietamente no Senhor (Sal. 112.8)” (Ellicott, in loc.). Cf. Pro. 18.21.

Antítese. O homem que perverte o seu caminho não andará seguro, conforme acontece ao homem bom. Antes, passará por muitas perturbações, caindo em abismos e armadilhas ao longo do caminho. Ele será desmascarado quanto às coisas desonestas que fizer. Sua reputação sofrerá, e ele mesmo sofrerá. Será punido pelo infortúnio (ver Jer. 31.10). Ver Pro. 2.15 quanto aos pervertidos, onde é usada a mesma palavra empregada aqui. Ver o vs. 8, acima. A figura simbólica tencionada pode ser a de um animal que está sendo caçado e inicia um caminho extremamente tortuoso, na esperança de não ser descoberto. No fim, porém, o animal caçado é apanhado e sofre da ira do caçador. Cf. Pro. 14.23 e Eze. 19.7.

10.10 O que acena com os olhos traz desgosto. Ver Pro. 6.13, que apresenta a mesma expressão. Um engano malicioso é o que, essencialmente, significa essa frase, e a pessoa que se ocupa dessa atividade acabará prejudicando alguém. “A pessoa que é o alvo de seu ridículo, ou contra quem sua malícia é dirigida, sofrerá tristeza” (Ellicott, in loc). “Fazer gestos faciais para os companheiros sugere inten­ções pecaminosas. Cf. Pro. 6.13; 16.30; Sal. 35.19). Não admira, pois, que isso conduza à tristeza as vítimas de seus planos malignos” (Sid S. Buzzell, in loc.).

O insensato de lábios vem a arruinar-se. Se esse é o texto correto (segue o original hebraico), então ambas as sentenças do versículo são negativas e paralelas, ou são sinônimas. Trata-se da mesma frase que se acha no vs. 8 deste capítulo, onde há notas expositivas. Todavia, a versão da Septuaginta diz aqui: “Mas aquele que reprova corporalmente estabelece a paz”. Essa, pois, é a antítese da primeira parte do versículo, que é o padrão dos versículos do início do capítulo, bem com o a característica da primeira coletânea dos provérbios de Salomão (Pro. 10-15; ver também Pro. 10.1). Usualmente, o texto mais difícil é o correto, e isso significaria que o original foi uma súbita mudança da antítese da segunda cláusula para um a cláusula sinônima. Ademais, a Septuaginta, para fazer este versículo com partilhar o mesmo padrão que a maior parte da seção, mudou o original para uma antítese. Algum as vezes as versões, sobretudo a Septuaginta, mostram-se corretas, em contraste com o texto hebraico padronizado, o chamado texto massorético. Ver no Dicionário o verbete intitulado Massora (Massorah); Texto Massorético. Ver também o artigo denominado Manuscritos Antigos do Antigo Testamento quanto a informações gerais e específicas sobre como os textos corretos são selecionados quando aparecem variantes.

Se a versão da Septuaginta está correta, então temos aqui um bom emprego da faculdade da linguagem, a saber, a reprimenda contra aquilo que está errado, com o intuito de curar e trazer paz, e não tristeza. O homem bom mostrar-se-á ousado o suficiente para corrigir as injustiças, sempre que puder, mas fará isso para ajudar, e não para prejudicar.

...corrige, repreende, exorta com toda a longanimidade e
doutrina.
(II Timóteo 4.2)

10.11 A boca do justo é manancial de vida. Quando o homem bom fala, ele abençoa, e a sua fala é uma fonte. Ele ensina a lei, interpretada pelas declara­ções da sabedoria, ou seja, a fonte da vida, da material e espiritual. Ver Pro. 4.13; 9.6-11. Ver também Deu. 4.1; 5.33; 6.2 e Eze. 20.1. O homem bom fornece água para o sedento, na jornada da vida. É um lugar onde almas sedentas param para beber das águas da vida, a fonte no meio do deserto. O que ele diz fortalece e refrigera outras pessoas. Quanto ao “manancial de vida”, cf. Pro. 13.14 (a lei seguida pelo homem sábio é a fonte); 14.27 (o temor do Senhor é essa fonte); 16.22 (a sabedoria é a fonte da vida). Neste caso, a fonte da sabedoria é um riacho de águas vivas; e a com preensão é uma fonte de vida (ver Pro. 16.22).

Antítese. O contraste com a boca do homem reto é a boca do ímpio, que amaldiçoa e é amaldiçoado. Essa segunda parte do versículo é a mesma que a antítese do vs. 6. Ver as notas expositivas ali existentes.

10.12 O ódio excita contendas. O ódio é o substituto do diabo para o amor de Deus. Dizer que o ódio desperta contendas é um truísmo, mas também é um favor tão comum na vida, dentro e fora da igreja, que essa verdade se repita continuamente. Ver no Dicionário o artigo chamado Ódio, quanto a detalhes e a ilustrações sobre o assunto. O ódio se expressa “... mediante tagarelice, murmurações, más conclusões, mentiras inventadas, propagação de relatos falsos e calúnias, repreensões virulentas e calúnias” (John Gill, in loc.).

O amor cobre todas as transgressões. Antítese. Amor significa tolerância, devolução, perdão, simpatia, afetos fortes, desejo de fazer o bem a outrem. O artigo no Dicionário, chamado Amor, fornece detalhes e citações ilustrativas e poesia.

Cobre. No hebraico original, esse verbo é kasah, “avassalar”, a ponto de apagar completamente as transgressões. “O amor concilia e remove os agravos; dá a melhor interpretação a todas as coisas; sobre as chamas derrama água, e não azeite” (Adam Clarke, in loc.).

Citações da segunda parte deste versículo no Novo Testamento:

Aquele que converte o pecador do seu caminho errado,
salvará da morte a alma dele, e cobrirá multidão de pecados.
(Tiago 5.20)

E esta é uma bela maneira de terminar um livro:

Acima de tudo, porém, tende amor intenso uns para com os
outros, porque o amor cobre multidão de pecados.
(I Pedro 4.8)

Ver esses versículos em O Novo Testamento Interpretado.

10.13 Nos lábios do entendido se acha a sabedoria. A sabedoria e a compreensão são companheiras constantes no livro de Provérbios. Ver Pro. 1.2 quanto às notas expositivas. A sabedoria se encontra na lei e nas declarações de sabedoria que fomentam e interpretam essa lei; e o homem que conhece e põe em prática a lei é aquele que exerce entendimento. O sábio aplica discernimento à sua vida.

Sua compreensão é do coração (ver as notas expositivas sobre Pro. 4.23). O sábio tem entendimento, tem a mensagem em seus lábios. Ele se torna um comunicador da lei. “As palavras do sábio confirmam a sua sabedoria” (Fausset, in loc).

Antítese. Como contraste, a vara divina está sendo aplicada ao insensato, que corrompeu o seu caminho. A aplicação da vara, a surra divina, serve para conquistar a atenção do pecador, levando-o a arrepender-se e a buscar a sabedoria.

A vara é para as costas do falto de senso. Cf. Pro. 6,32; 7.7: 9.4,16; 11.12; 15.2; 17.18; 24.30; 28.16 e o vs. 21 deste mesmo capítulo. Se o insensato sabe alguma coisa sobre a lei, ele não a está pondo em prática. A vara divina, pois, haverá de tentar corrigi-lo (ver Pro. 14.3; 26.3).

Está na boca do insensato a vara para a sua própria soberba.
(Provérbios 14.3)

“O insensato deve ser impelido como um animal, ao passo que o sábio é dirigido pela sabedoria” (Charles Fritsch, in loc.).

10.14 Os sábios entesouram o conhecimento. O sábio conserva um conhecimento acumulado da lei e de suas declarações de sabedoria. De fato, é para isso que ele vive, embora obtenha seu dinheiro da parte de algum emprego secular. O nosso homem é um sábio, mas continua sendo um aprendiz diligente. Entesouram. A sabedoria é o tesouro do homem bom, e ele vive adicionando riquezas a esse tesouro.

O homem bom tira do tesouro bom coisas boas; mas o
homem mau do mau tesouro tira coisas más.
(Mateus 12.35)

Todo escriba versado no reino dos céus é semelhante a um
pai de família que tira do seu depósito coisas novas e coisas
velhas.
(Mateus 13.52)

Antítese. O Indivíduo insensato diz coisas tolas que perpetuam a destruição de qualquer que lhe der ouvidos, ao mesmo tempo que o próprio insensato também perece. Isso seria uma antítese mais apropriada para o versículo anterior, que tem a boa mensagem do sábio em operação, na primeira metade. Mas o tolo diz coisas capengas e perigosas, que são surpresas desagradáveis. Cf. o vs. 19, a seguir. Palavras insensatas que se multiplicam naturalmente estão repletas de transgressões e provocam transgressões. “O tolo palra e produz muito engano. Pensa muito e fala pouco; e sempre pensa antes de falar” (Adam Clarke, in loc.).

Havia um homem que se jactava de ter muito conhecimento, mas pouco aplicava esse conhecimento à sua vida. Tal homem só trazia vergonha e confusão sobre si mesmo e sobre aqueles que estavam com ele.

10.15 Os bens do rico são a sua cidade forte. Parece melhor tom ar aqui as riquezas como literais. Homens ricos podem comprar a proteção para si mesmos, e, se houver muitos homens ricos em uma cidade, eles serão capazes de promover defesa e segurança daquela cidade. As riquezas materiais, como é óbvio, têm sua vantagem, sem importar se pertencem a um homem só ou a muitos homens em uma cidade. Uma cidade rica terá maior segurança do que uma cidade pobre.

O autor sacro, entretanto, não deixou entendido que aqueles homens ricos são piedosos e bons por serem ricos, mas talvez seja isso que devamos compreender. A mente dos hebreus sempre vinculou a bondade à prosperidade. “Embora as riquezas não sejam colocadas acima da honra (ver Pro. 28.20) nem devam merecer a nossa confiança (ver Pro. 11.4 e 23.5), podem prover uma cerca que nos protege contra alguns desastres” (Sid S. Buzzell, in loc.).

A sabedoria protege como o dinheiro.
(Eclesiastes 7.12)

O festim faz-se para rir, o vinho alegra a vida, e o dinheiro
atende a tudo.
(Eclesiastes 10.19)

Antítese. Os pobres são destruídos por sua pobreza. Não é vantajoso para a maioria das pessoas não tér dinheiro suficiente. O homem pobre passa condições miseráveis na vida, e, quando uma criança adoece, nem ao menos há dinheiro bastante para comprar medicamentos. Para a mentalidade dos hebreus, a pobreza era um castigo proveniente da mão divina, embora isso não seja dito abertamente no presente versículo. A pobreza é uma opressão contínua. Cf. Pro. 14.20; 18,23; 19,7; 22,7, O Novo Testamento, pelo menos em certos trechos, acha uma virtude alguém ser pobre e também uma iniquidade virtual e necessária alguém ser rico. Ver em Luc. 6.20 os pobres, palavra essa que é modificada para pobres de espírito, em Mat. 5.3. Ver Tia. 5. “A pobreza arrasta um homem para baixo, tornando-o tímido (ou tolamente ousado) e deixando-o sem defesa alguma. Na realidade, é difícil elogiar a pobreza, como se ela pudesse produzir alguma virtude.

10.16 A obra do justo conduz à vida. Quando os sábios trabalham, obtêm a vida material e espiritual. Ver Pro. 4.13. Isso porque Deus os abençoa, devido à bondade deles. A expressão trabalho que aparece em algumas versões — como em nossa versão portuguesa — é traduzida por rendimento. O homem bom ganha um bom salário, porque Deus é quem o faz prosperar, dando-lhe um trabalho que rende bem. A palavra em foco pode significar o próprio trabalho ou a recompensa desse trabalho. O homem bom aplica seu dinheiro em coisas boas, em si mesmo, em seus familiares e no seu próximo. Então tal homem pode ter uma vida significativa, livre das opressões da pobreza. Cf. Pro. 3.18,21,22; 4.4,13 e 7.2. Ver no Dicionário o verbete denominado Riquezas.

Antítese. O pecador trabalha para comer, beber e aprimorar a sua vida pecaminosa. Quanto mais dinheiro tiver, em mais maldades ele poderá envolver-se, pois usa o seu dinheiro para uma vida pecaminosa abundante. Essa é a noção de prosperidade dos ímpios. Naturalmente, o salário final do pecador é a morte (ver Rom. 6.23), mas ele não sabe disso, nem que está no caminho certo do suicídio. Ele gasta em festins e excessos e colherá o que estiver em consonância com o que semeia: o desastre.

“...todos os seus ganhos... são usados em propósitos pecaminosos, como o orgulho, a luxúria, a devassidão, coisas que tendem para a morte, a saber, a morte eterna, o justo salário do pecado” (John Gill, in loc., o qual, de modo anacrônico, faz o julgamento figurar como depois do sepulcro).

10.17 O caminho para a vida é de quem guarda o ensino. A instrução aparece aqui como a fonte da vida, e essa instrução se processa na lei de Moisés, fomentada e interpretada pelas declarações da sabedoria. Verifique o leitor como a sabedoria transmite a vida, em Pro. 4.13; 9.6,11 e 10.11. Esse é um tema comum do livro de Provérbios, o qual se fundamenta, afinal de contas, sobre o ensino da lei como transmissora de vida (ver Deu. 4.1; 5.33; 6.2; Eze. 20.11). Quanto às próprias instruções, ver Pro. 1.2. O homem bom embarcou na vereda que conduz à vida. Quanto à metáfora da vereda, ver Pro. 4.11. Ver também, no Dicionário, o verbete denominado Caminho, quanto a detalhes. Quanto ao caminho do homem bom e ao caminho do homem mau, ver a nota de sumário em Pro. 4.27.

Antítese. O homem que repele a instrução se desvia e começa a vagabundear na vereda do pecado, a qual leva à morte. Um homem sábio, pois, aproveita-se da instrução que recebe, mas o homem mau torna-se infenso ao ensino e terá de sofrer as consequências de seu próprio estilo de vida. Ver no Dicionário o artigo chamado Lei Moral da Colheita segundo a Semeadura. Cf. Jer. 42.20. O que abandona a repreensão anda errado. Ver Pro. 1.23. O pecador empedernido não ouve as instruções da lei nem as declarações da sabedoria. Por isso mesmo, haverá de sofrer no fim de sua vida. Conforme comentou Jarchi, in loc., ele erra e leva outros a errar. Ele se torna, assim, fonte de desastres. Pode ser exortado, sendo-lhe mostrado quão culpado é seu andar errante, e, dessa maneira, ele tem a oportunidade de olhar para o caminho pelo qual está seguindo, em contraste com o caminho dos retos; mas, na verdade, ele já se tornou infenso ao ensino.

10.18 O que retém o ódio é de lábios falsos. Encontramos aqui duplo sinônimo, em contraste com as linhas métricas antitéticas dos capítulos 10-15 deste livro. Certos homens ímpios ocultam o ódio em lábios mentirosos. Mas esse ódio pode ferir como uma serpente os inocentes, a qualquer momento, para fazer-lhes o mal. O ódio é aquele monstro que pode matar. Os vss. 18-21 falam sobre alguns aspectos do uso da língua, um tema comum dos livros de Salmos e Provérbios. Quanto a instruções contra o uso perverso da linguagem, ver Pro. 4.24; 6.12; 8.13 e 10.8. No Dicionário ver o artigo chamado Linguagem, Uso Apropriado da.

Sinônimo. Outro tipo de pessoa que abusa da linguagem é o insensato que sai a caluniar as pessoas. Esse sai a semear a dissensão e a tribulação, e algumas vezes até pretende estar servindo a uma boa causa. Seja como for, tal homem fala abertamente, em contraste com o homem que oculta seu ódio por trás de lábios mentirosos. Embora ele seja um “tolo honesto”, nem por isso deixa de ser um elemento destruidor. “Ele espalha o mal entre as pessoas e apenas obtém má vontade para si mesmo” (Ellicott, in loc.). O ódio e a calúnia são companheiros, pelo que o versículo apresenta idéias paralelas, e não idéias contrastantes.

Gersom (in loc.) faz daquele que odeia secretamente um elemento mais pernicioso que o segundo tipo de caluniador. É difícil dar notas a tais questões. Ambos estão promovendo o m esmo tipo de jogo de ferimentos.

10.19 No muito falar não falta transgressão. O autor volta aqui às suas declara­ções antitéticas. É melhor falar pouco e pensar bem antes de dizer algo. Isso se dá porquanto as pessoas falam muito, surgem transgressões nesse falar, tanto no que é dito como também no resultado desse muito falar. Falar demais não é virtude. Há muito poder nas palavras, e elas devem ser usadas parcimoniosamente. Costumamos dizer: “Falar é barato”. E, de fato, assim é, quando as palavras não têm alvo, mas essa afirmação pode ocultar uma grande verdade. Todos os tipos de causas são promovidas por palavras que tocam no coração, quer para bem, quer para mal.

Digo-vos que de toda palavra frívola que proferirem os
homens, dela darão conta no dia de juízo.
(Mateus 12.36)

É impossível falar muito e dizer somente a verdade. Além disso, as pessoas que falam em demasia caem na bisbilhotice e na calúnia, e também na conversa corrupta, que refletem um coração pecaminoso. Outrossim, poucas pessoas estão acima desse defeito.

Antítese. Um homem sábio e bom não vive falando incessantemente, pois no muito falar há excessos. Pelo contrário, ele restringirá os seus lábios quando se sentir tentado a falar demais. O homem que é sábio aprende a controlar a língua. Ver Tia. 3.2-8, que é um extenso comentário sobre o uso correto da linguagem e o controle do mecanismo da fala.”... ele não permitirá que os seus lábios profiram coisa alguma precipitada e sem consideração; mostra-se um utilizador moderado das palavras e cuida daquilo que diz; pesa as suas palavras. Tal homem é sábio, prudente e cheio de compreensão. Ver Pro. 17.27,28” (John Gill, in loc.).

10.20 Prata escolhida é a língua do justo. Uma língua que sempre diz o que é bom é como prata altamente refinada. A escória foi removida pelos testes da vida. A sabedoria é comparada à prata, ao ouro e às jóias (ver Pro. 2.4; 3.14; 8.10,19 e 16.16), mas acaba demonstrando que tem mais valor que essas coisas preciosas. Portanto, as palavras boas são como metais e pedras preciosas. A língua do homem justo é preciosa por causa da escolha e da natureza valiosa das palavras que ele profere, fazendo bem ao próximo e repreendendo o mal, tendentes à vida e afastando da morte. A boca fala da fonte do coração (ver Mat. 12.34). É melhor dizer pouco demais do que dizer demais; e, quando dizemos algo, precisamos ministrar graça aos que ouvem.

Não saia da vossa boca nenhum a palavra torpe, e, sim,
unicamente a que for boa para edificação, conforme a
necessidade, e assim transmita graça aos que ouvem.
(Efésios 4.29)

Antítese. Em contraste, o coração, do qual o homem ímpio fala, está cheio de escória e é indigno, pelo que também suas palavras são inúteis e/ou prejudiciais. Os homens aprendem a desprezar as palavras dos pecadores. Não pode haver o bem nelas. Ver Pro. 2.2 quanto ao coração (mente). Há mais de oitenta referências ao coração, no livro de Provérbios, incluindo aspectos positivos e negativos. Ver as notas expositivas em Pro. 4.23.

10.21-22 Os lábios do justo apascentam a muitos. Os lábios de prata do homem reto (vs. 20) são úteis para alimentar muitos, dando-lhes valiosas instruções para a aplicação na vida boa. O homem bom é uma fonte constante de bênçãos para outros. Ele lidera os homens no caminho da sabedoria, ou seja, para a vida (ver Pro. 4.13; 9.6,11; 10.11,17).

Antítese. Os insensatos, longe de serem capazes de dar vida a outros, nem ao menos podem cuidar de si mesmos, e, por falta de sabedoria, morrem. Ademais, a bondade sempre esteve associada à prosperidade material na mente dos hebreus, ao passo que a pobreza esteve vinculada ao julgamento divino. Porém, é difícil acreditar que o autor falaria sobre isso e esqueceria as riquezas da alma, conhecendo a lei e pondo-a em prática, o sinal de um povo ímpar, pertencente ao pacto abraâmico (ver Gên. 15.18). “Salomão recebeu suas riquezas pelas bên­çãos especiais do Senhor, sem ao menos perguntar por elas (I Reis 3.13); e outro tanto aconteceu com Isaque (ver Gên. 26.12)” (Fausset, in loc.).

Sinônimo. Usualmente as riquezas terrenas têm essa mistura de tristeza, mas as riquezas materiais ideais, dadas por Deus, não têm essa adição perniciosa. Ou então a ideia pode ser que as riquezas de Deus, sendo do tipo espiritual, naturalmente não têm nenhuma mistura com as tristezas, conforme as riquezas terrenas inevitavelmente têm. Nenhum acúmulo de trabalho humano pode produzir o tipo de riquezas que Deus concede. Se essa é a ideia desta declaração, então um trecho paralelo é o de Mat. 6.33, que diz:

Buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas. “As bênçãos de Deus dão um aprazimento simplesmente, e Ele não impõe nenhum imposto sobre esse conforto” (Adam Clarke, in loc.). Existem tragédias associadas ao lucro ganho de modo ilegítimo (ver Pro. 10.2), e o versículo pode significar apenas que o sábio, trabalhando arduamente, adquire riquezas sem que tenha de sofrer qualquer calamidade juntamente com elas, pois obteve seu ganho honestamente.

10.23 Para o insensato praticar a maldade é divertimento. Os insensatos divertem-se com a vida caótica e prejudicial. Para eles, é tudo uma grande comédia. Eles gostam de pecar e de conduzir outras pessoas ao pecado. E também se divertem com os prejuízos causados e com a matança. Vemos essa atitude em Pro. 1.11,12. O ímpio não precisa de motivos para fazer o mal. Ele é maligno e por isso pratica o mal. Outrossim, desfruta da destruição de seus semelhantes. Este versículo, pois, dá-nos certo discernimento quanto à mente criminosa. Estudos modernos confirmam isso. Em alguns casos, sem dúvida, estão envolvidas patologias cerebrais. Em outros, a possessão ou influência demoníaca está por trás de crimes hediondos. Os animais fazem coisas animalescas, e há pouca ou nenhuma consciência sobre a questão. Os esportes foram criados para aprazimento e alívio das pressões mentais, O homem mau não dorme enquanto não tiver tido chance de fazer algo de maligno (ver Pro. 4.16). Portanto, antes de conseguir dormir, praticará seu esporte preferido, seus atos ilegais e destruidores.

Antítese. Em contraste, o homem bom continua praticando a sua profissão de obtenção de sabedoria e entendimento, para que possa fazer o bem por si mesmo e em favor de seus semelhantes. Esse é o esporte do homem bom, o que ele faz para divertir-se. Ele alcança isso tomando-se especialista no conhecimento da lei e em viver em consonância com ela, evitando o mal e fazendo o bem. “Da mesma maneira que um insensato desfruta a prática do mal, assim também um homem sábio desfruta sua conduta reta” (Charles Fritsch, in loc.). Ver Pro. 8.30 quanto ao aprazimento do homem bom dotado de sabedoria e o que ele faz na vida. “O homem justo percorre o caminho dos mandamentos de Deus com grande alacridade e bom ânimo” (John Gill, in loc.), como um atleta que se regozija por estar participando de uma corrida (ver Sal. 19.5).

10.24 Aquilo que tem e o perverso isso lhe sobrevêm. O temor de súbito sobrevêm ao homem ímpio, pois essa é a sua recompensa por estar praticando o seu esporte (vs. 23). Ele sofrerá calamidade e então morte prematura. “O ímpio e o justo receberão suas recompensas, respectivamente, bem como um galardão por causa do curso que estão seguindo na vida” (Fausset, in loc.). Cf. Isa. 66.4 e Heb. 10.27. A ideia dessa linha métrica é que o ímpio teme certos resultados dos males por ele praticados, e seus temores lhe sobrevêm de súbito, na realidade. “O que ele teme em sua mente tornar-se-á seu caso infeliz, mais cedo ou mais tarde, seu temor de aflições, calamidades, julgamentos divinos, nesta vida e na outra” (John Gill, in loc.).

Antítese. Em contraste, o homem bom obterá todas as coisas boas que deseja, materiais e espirituais, pois essa é a sua recompensa por seguir os ditames da lei. “A oração do crente assegura o cumprimento de seus desejos (ver Sal. 140.19; I João 5.14,15; 3.22,23)” (Fausset, in loc.). Deus é o doador, e assim o que for dado deve ser bom e abundante. O Espírito intercede pelo homem bom, para garantir o seu benefício.

Aquele que sonda os corações sabe qual é a m ente do
Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele
intercede pelos santos.
(Romanos 8.27)

10.25 Com o passa a tempestade, assim desaparece o perverso. Os ímpios por certo enfrentarão uma tempestade, por causa daquilo que têm feito. Essa tempestade assemelha-se a um tornado, que os levará ao esquecimento da morte. A figura simbólica pode ser a da edificação ou cabana na qual vive o homem mau. A tempestade, pois, não poupará essa edificação. A tempestade derruba essa construção e, juntamente com isso, o homem mau será destruído. Cf. esta parte do versículo a Sabedoria de Salomão 5.14,15; Jó 21.18; Mat. 7.24 ss. “A morte é a ruína do pecador, mas o ganho do homem reto (ver II Tim. 1.12)” (Ellicott, in loc.). Cf. Pro. 1.27; 6.15; 29.10.

Antítese. Em contraste, o homem bom tem um alicerce firme e pode resistir a qualquer tempestade. A tempestade pode ameaçar e mesmo vir, mas o homem bom escapará de todo dano causado pelo temporal. Ele está sobre um alicerce firme, e sua vida é preciosa aos olhos do Senhor. Em contraste com o homem ímpio, que sofre de morte prematura, o homem bom terá uma vida longa, próspera e plena. Ele cumprirá todos os desejos, tanto os seus como os de outros, na realidade. Oh, Senhor, concede-nos tal graça! Deus não se apressará em arrebatar a sua vida. Ver Mat. 7.24-27. O homem justo vive seguro, salvo nos braços de Jesus. Cf. Pro. 10.9,30; 12.3. Ele conta com um alicerce eterno e está estabelecido para sempre.

10.26 Como vinagre para os dentes e fumo para os olhos. As declarações dos sábios saltam de um assunto para outro, sem nenhuma ordem aparente. Algumas vezes dois versículos, ou alguns poucos deles, permanecem com o mesmo assunto. Um provérbio pode ser uma declaração simples e significativa, ou um discurso; e a seção dos capítulos 10-22 de Provérbios é, na maior parte, composta de declarações simples ou agrupadas de duas em duas. O vs. 26 é um provérbio isolado, sem conexão com os vss. 25 ou 27. Trata-se de um sinônimo (duas linhas métricas que falam sobre a mesma coisa).

Um mensageiro preciso é o assunto deste versículo. Tal mensageiro é uma pessoa deveras irritante, que está sujeita a duas figuras simbólicas para ser descrito: 1. Ele irrita quem quer que o queira utilizar, tal como o vinagre irrita os dentes. Alguns vinagres, feitos de vinho, eram extremamente azedos, e essa é a ideia por trás da metáfora. Um mensageiro preguiçoso, pois, azeda uma situação inteira. Naqueles dias em que não havia ainda os correios, a profissão dos mensageiros era muito importante, tanto nos negócios particulares como nos negócios comunais, tanto na paz quanto na guerra:

O mau mensageiro se precipita no mal, mas o em baixador fiel é medicina.
(Provérbios 13.17)

A frase sinônima apresenta outra metáfora, que nos é familiar em nossos próprios dias. O mensageiro preguiçoso, que não desem penha seu papel rapidamente e bem, é como a fumaça que nos irrita os olhos. Esse é um dos piores irritantes que existem, só com parável ao caso do homem preguiçoso. Assim é o preguiçoso . Ver Pro. 19.24. Ver no Dicionário os artigos chamados Preguiça e Preguiçoso, quanto a detalhes completos. “O preguiçoso, como mensageiro, causa detrimentos a seu empregador, ou por não fazer o que é de seu dever, ou por fazê-lo mal feito” (Fausset, in ioc.).

10.27 O temor do Senhor prolonga os dias da vida. Esta declaração, uma linha métrica com afirmação positiva, e então um a antítese, leva-nos de volta a um tem a muito repetido em Salmos e Provérbios — seguir a lei e sua sabedoria dá a um homem uma vida longa e próspera. M as o homem mau sofrerá morte prematura. Quanto às qualidades transmissoras de vida da lei (fomentada e ilustrada pelas declarações de sabedoria), ver Pro. 4.13 (uma nota de sumário); 9.6-11; 10.11,17. Ver também Deu. 4.1; 5.33; 6.2; Eze. 20.1. Está em foco a vida física, com vantagens físicas e espirituais em abundância, e não a vida eterna, que este versículo, um a vez cristianizado, é forçado a dar a entender.

O temor do Senhor. Quanto a esse tema comum, ver Pro. 1.7; Sal. 119.38, e o artigo do Dicionário chamado Temor.

Antítese. Em contraste, o homem iníquo pode esperar carradas de tribula­ções e então morte prematura. Talvez ele espere viver por longos anos, mas sua expectação não se cumprirá. Ver Jó 25.32,33; 22.16; Sal. 55.23. A morte prematura era um terror para os hebreus.

Não sejas demasiadamente perverso nem sejas louco; por que morrerias fora do teu tempo?
(Eclesiastes 7.17)

10.28 A esperança dos justos é alegria. Homens bons têm direito a cultivar altas esperanças. Elas terão cumprimento e, uma vez cumpridas, trarão alegria aos homens bons. Provavelmente entre essas esperanças está uma vida longa, cheia de prosperidade e boa saúde. Mas a referência aqui parece ser gerai.

A esperança surge eterna no peito humano.
(Alexander Pope)

Nosso Deus, nossa ajuda nas eras passadas,
Nossa esperança por anos vindouros,
Nosso abrigo dos empuxes da tempestade,
E nosso abrigo eterno.
(Isaac Watts)

Ver sobre Esperança no Dicionário. Ver Rom. 8.24.

Antítese. Em contraste, o pecador ímpio não precisa esperar por longo tempo. Suas expectações não serão cumpridas, e ele mesmo provavelmente terá morte prematura, depois que suas esperanças fracassarem. Cf. esta parte do versículo com Pro. 11.7 — as esperanças do homem iníquo morrem por ocasião de sua morte física. Ver também Jó 8.13; 11.30 e Sal. 112.10.

10.29 O caminho do Senhor é fortaleza para os íntegros. Yahweh (o Senhor; ver sobre Deus, Nomes Bíblicos de, no Dicionário), o Deus eterno, é a fortaleza de todos os homens sábios que seguem o bom caminho. Ver sobre a metáfora do “caminho” em Pro. 4.16, e ver também o contraste entre o caminho bom e o caminho mau, em Pro. 4.27. O homem bom é fortalecido por sua sabedoria, pois é favorecido por Deus. Ele conta com esse alicerce eterno (ver Pro. 10.2), e nenhum temporal poderá prejudicá-lo. “Quanto mais ele trabalha, tanto mais forte fica “(Adam Clarke, in loc.). Oh, Senhor, concede-nos tal graça! O homem bom é fortalecido a ponto de seguir até a perfeição (assim, pelo menos, diz o hebraico, literalmente: “uma fortaleza para a perfeição é o caminho do Senhor”). “O caminho do Senhor é uma forte proteção para o homem bom, pois nenhum dano lhe poderá sobrevir enquanto ele segue por esse caminho (ver I Ped. 3.13)” (Ellicott, in loc.).

Antítese. O ímpio, seguindo caminho contrário, cai aos pedaços, em lugar de ser fortalecido. E assim, se arruína; ele é destruído pelos próprios pecados. Cf. Sal. 1.6 e 37.20. Cf. em um contexto neotestamentário, uma declaração similar, em II Cor. 2.15,16. Existe uma providência negativa e uma providência positiva, e os homens determinam o que receberão nos caminhos pelos quais enveredam na vida. Ver no Dicionário o artigo chamado Providência de Deus. Este provérbio, juntam ente com muitos outros, enfatiza a importância de tom ar e então cumprir escolhas apropriadas, pois nelas estão as fontes da vida.

10.30 O justo jamais será abalado. A ideia, aqui, é a mesma do vs. 25, embora as metáforas tenham sido levemente modificadas. O homem bom conta com um alicerce firme, pelo que não poderá ser abalado. Quanto ao justo não poder ser abalado, ver Sal. 55.22 e 66.9. Ver também Sal. 37.22,29 e 125.1. “Eles se encontram no inabalável pacto da graça; eles se encontram na Rocha dos Séculos, Cristo Jesus; todas as Pessoas Divinas e Suas perfeições estão ao lado deles. Eles são resguardados pelo poder de Deus, mediante a fé, para a salvação” (John Gill, in loc.).

Antítese. Em contraste, os ímpios não encontrarão alicerce algum em todo este largo mundo. Eles não continuarão a habitar na Terra Prometida; antes, serão removidos dali. No vs. 25 (que é um paralelo próximo deste versículo), o pecador é visto arrebatado por uma tempestade. Aqui fica entendido que a metáfora é o alicerce, ou uma casa sobre um firme alicerce. Os mansos retos herdarão a terra (ver Mat. 5.5), mas, quando a herdarem, os pecadores já não serão encontrados.

Os retos habitarão a terra, e os íntegros permanecerão nela.
Mas os perversos serão eliminados da terra, e os aleivosos
serão dela desarraigados.
(Provérbios 2.21,22)

Conforme se pode ver facilmente, quando esta passagem de Provérbios foi escrita, não havia nenhum ensino de recompensa e punição na vida do pós-túmulo. Apesar disso, o versículo é forçado a dizer tal coisa; mas para isso os que assim dizem criam um anacronismo. O ensino sobre a imortalidade começou a ser referido nos Salmos e nos Profetas. A doutrina das recompensas e punições futuras logo se seguiu. Contrastar este provérbio com Dan. 12.2. Ver também Sal. 37.9,11,22,29 e II Ped. 3.13.

10.31 A boca do justo produz sabedoria. O autor sacro de súbito muda sua atenção para o tema do uso apropriado da linguagem. Ver Pro. 4.24; 6.12; 8.13; 10.8,18,19; Sal. 5.9; 12.2; 15.3; 17.3; 34.12’35.28; 36.3; 39,1,9; 55.21; 66.17; 73.9; 94.4; 101.5. Ver no Dicionário o verbete intitulado Linguagem, Uso Apropriado da. A boca do homem bom produz sabedoria, e a sabedoria é transmissora de vida (ver Pro. 4.13; 9.6,11; 10.11,17). A metáfora aqui aludida é à árvore da vida.

A boca do homem bom produz todas as espécies de benefícios deleitosos para os que enveredam pelo caminho da vida. Cf. Sal. 92.14 e Mat. 7.17.

A boca do justo profere a sabedoria, e a sua língua faia o que
é justo.
(Salmo 37.30)

Antítese. A boca do pecador, em contraste com a boca do homem bom, é uma questão de morte. A língua dele, cortada de dentro de sua boca, conforme ditava um antigo castigo, algumas vezes era perdida devido a coisas prejudiciais que eram ditas, e, de outras vezes, por pura crueldade. “Se a língua de todo especialista e repreendedor fosse extraída, não teríamos tanto barulho neste mundo!” (Adam Clarke, in loc., que disse a verdade em meio a um comentário muito ácido).

A língua da perversidade. Ver Tia, 3.2 ss. quanto a uma passagem bíblica que versa sobre os abusos da língua. Apenas o homem verdadeiramente perfeito não injuria com a língua, pelo que temos aqui um pecado universal. Mas algumas pessoas, especialmente as mulheres, se especializam nesse pecado. Cf. Pro. 2.12.

10.32 Os lábios do justo sabem o que agrada. O autor sacro continua aqui a abordar o tema do uso correto da língua. O homem sábio usa sua faculdade da fala de maneira correta, pelo que emprega os lábios para dizer o que é aceitável. Sua fala beneficia a outros, sendo instruções na lei, conforme ela é fomentada e interpretada pelas declarações de sabedoria. Esse tipo de linguagem traz todos os benefícios que a lei promete, incluindo vida longa, próspera e feliz (ver Pro. 4.13; 9.6,11; 10.11,17). O homem que escuta a lei e a obedece vive melhor e por mais tempo. Os lábios do homem justo são como árvores frutíferas saudáveis (vs. 31).

O que agrada. Agrada a quem? A Deus e aos homens, pois se trata de uma linguagem graciosa e benéfica, Cf. Luc. 4 .2 2 .”... agradável e proveitosa” (Adam Clarke, in loc.).

Antítese. Esta linha métrica repete a segunda linha métrica do vs. 31, pois ambos os trechos usam a palavra “perversidade”, que no hebraico significa algo que “sai do caminho”. Ver Pro. 2.12.