Estudo sobre Colossenses 3:16

Colossenses 3:16


Paulo descreveu a verdadeira santificação evangélica. Ela é dada com a própria fé autêntica. Apesar disso permanece relevante a pergunta de como ela, afinal, adquire força de maneira prática em nossa vida. Paulo passa a falar um pouco mais a esse respeito. É significativo que a presente passagem constitua o paralelo da resposta à pergunta “como ficamos cheios do Espírito?” da carta aos Efésios (Ef 5.18-21). Na verdade ambas as coisas estão interligadas. Somos “santos” porque o Espírito Santo habita em nós. A “santificação” acontece pela ação do Espírito Santo em toda a nossa vida. Nossa santificação se torna vigorosa quando nos enchemos do Espírito. Como isso acontece?

“A palavra do Cristo seja abundante em vossa casa.” Para muitos a palavra é uma visitante dominical bem-vinda. Isso não basta. Outros ainda acolhem a palavra em outras oportunidades: no estudo bíblico, no grupo de homens, na ordem de senhoras, na reunião de jovens. Isso não basta! Outros a deixam entrar em seu lar até mesmo diariamente para uma breve visita por ocasião da devocional em casa. Isso não basta! Ela precisa “estar em casa” entre nós, de modo que nós “estejamos em casa” nela. Afinal, a igreja de Jesus não pode ficar devendo à congregação da velha aliança, à qual fora dito: “Estas palavras que hoje te ordeno estarão no teu coração; tu as inculcarás a teus filhos, e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te” (Dt 6.6s). Porque na “palavra do Cristo” está o Espírito e está a vida (Jo 6.63). Lutero empregou a ilustração do fogo, no qual o ferro frio e cinzento passa a arder como brasa viva. Como se formará uma vida santificada se a palavra viva e plena do Espírito não perpassar e iluminar tudo de forma “abundante”? Por que nós, que de resto gostamos de ter tudo “abundantemente”, somos tão parcimoniosos nesse ponto?

Em geral dizemos “a palavra de Deus”. Paulo escreve aqui “a palavra do Cristo”. Obviamente isso não significa que o AT esteja sendo colocado de lado. Para a igreja daquela época “a Escritura” na verdade era somente o AT. “É ela que dá testemunho de mim”, afirma Jesus (Jo 5.39). Justamente por isso o AT se tornou tão familiar e próximo da igreja apostólica, porque ela o lia como a “palavra do Cristo”. Contudo às “Escrituras” e à palavra que Cristo (por meio de quem e em direção do qual tudo foi criado) fala através delas acrescentava-se agora sua nova palavra. Ela ainda não estava fixada como “livro”. Ainda era palavra vivamente narrada, proclamada, ouvida, guardada. Temos hoje a felicidade de comprar essa “palavra do Cristo”, bela e nitidamente impressa, por pouco dinheiro. Mas talvez, justamente por ser palavra muito pouco narrada, ouvida, guardada e refletida em nosso meio é que ela esteja tão pouco “em casa” entre nós.

Mais uma vez Paulo não pensa em cristãos solitários que apenas meditam sobre a palavra silenciosamente, para si mesmos. Novamente ele vê a irmandade em vivas trocas de ideias ao redor da palavra. Por isso ele acrescenta imediatamente o segundo aspecto: “Com toda a sabedoria instruí e aconselhai-vos uns aos outros.” A irmandade não tem “pastor”, ao qual se delega o “instruir e aconselhar” e que por fim reivindica isso como seu “direito” exclusivo. Igreja é “corpo”, no qual os membros dão uns aos outros aquilo de que carecem, para que o corpo todo “cresça seu crescimento divino”. São capazes de dar uns aos outros porque eles mesmos recebem, porque eles mesmos vivem na palavra do Cristo e se abastecem dela. Como deixariam de ter algo para passar adiante em abundância! Toda irmandade que de fato permite que a palavra esteja abundantemente em casa em seu meio experimenta isso continuamente com alegria e como fato real.

Nestas exposições Paulo distingue entre “instruir” e “aconselhar”. Afinal, ele levava muito a sério o crescimento do entendimento: Cl 1.9; 2.2s. Por isso é preciso “instruir” sem cessar. Contudo, levava igualmente a sério a santificação real, e precisamente a santificação concreta de cada trajetória de vida individual. Nessa situação é preciso “aconselhar”. O termo grego na realidade diz: “corrigir o sentido”, ou seja, algo como “pôr a cabeça no lugar”. Como é fácil que o indivíduo veja as coisas de forma distorcida, porque a influência oculta do eu turba sua visão. Então cada um precisa do irmão, que o ajuda a ter uma visão clara e uma vontade firme. Obviamente esse “ensinar e aconselhar” precisa acontecer “com toda a sabedoria”. Argumentar insensatamente com o outro traz mais dano que ajuda, mesmo quando seu conteúdo é muito “correto”. Mas essa sabedoria também é gerada, como também em Cl 1.9, pelo Espírito de Deus e brota tanto do amor que mantém tudo unido quanto do convívio abundante com a palavra do Cristo.

Pode chamar nossa atenção que Paulo utilize as mesmas expressões para a atividade da igreja que ele usa em Cl 1.28 para seu próprio trabalho. Não há diferença fundamental entre o “grande apóstolo” e os “simples membros da igreja” em Colossos. Não é verdade que o apóstolo exista para ensinar e exortar, e o membro da igreja em Colossos apenas para contar o dinheiro das coletas e distribuir folhetos. A diferença está somente na amplitude da tarefa. Paulo tem consciência de ser devedor de “todo ser humano”, os colossenses têm uma tarefa “uns para com os outros”. Contudo Paulo não conhece aqui um “cargo” que monopoliza o ensino e a exortação.


O modelo que Paulo desejava não era uma igreja calada e “sóbria”. Vislumbra corações tão viva e profundamente movidos que deles emana o cântico a Deus. Ele imagina esse louvor de múltiplas formas. “Em salmos, hinos e canções conforme os concede o Espírito, pela graça cantai em vosso coração a Deus.” Não somente os salmos da Bíblia, não apenas os hinos solenes (“louvores”) têm origem divina e são dignos de ser entoados na igreja. Também “canções” foram concedidas por Deus. Paulo não fala do valor literário ou musical das canções. Afinal, está ciente de que Deus frequentemente escolhe justamente “as coisas comuns e desprezadas diante do mundo” para envergonhar aquelas que “são algo” (1Co 1.28). Seu empenho é unicamente que uma canção se origine do Espírito de Deus e seja portadora desse Espírito. Ao falar de um cantar “em vossos corações”, Paulo dificilmente tem em mente apenas um louvor interior que nem mesmo chega aos lábios. Por um lado, numa época de moradias superlotadas, em que cristãos viviam em ambientes hostis, é um consolo saber que podem cantar “em seus corações” e que Deus ouve também a canção dos corações. Mas o próprio Paulo cantou tão alto na prisão de Filipos que sua canção repercutiu por todo o prédio. Por isso também aqui a preposição grega en deve ter novamente o significado muito mais amplo que nosso “em”, visando expressar que o coração é o lugar em que surge o cantar autêntico. Corresponde ao nosso cantar “de” coração. Sem envolvimento dos corações todo o louvor perde o valor perante Deus, ainda que cantores e coros de alto nível apresentem a mais nobre música sacra.

“Pela graça”, acrescentou Paulo, posicionando essa palavra entre “conforme os concede o Espírito” e “cantai”. Com que parte a relacionaremos? Em termos de conteúdo a diferença não será grande. A igreja pode cantar porque experimentou a graça e se encontra na graça. Pessoas agraciadas sentem-se impelidas a jubilar, louvar e agradecer. Isso se torna automaticamente uma canção. Sentem-se incentivadas a levar a mensagem da graça adiante por meio do canto. Assim o Espírito Santo gera as canções pela graça, assim a igreja as entoa pela graça. Esse cantar não é um belo “número extra” acrescentado à vida da igreja, mas faz parte da própria vida eclesial, uma parte da santificação verdadeira, porque faz com que as pessoas se encham do Espírito.