Comentário a Carta de Tiago 4:2

comentario da carta de tiago 4.2 Desejais, e ainda assim não tendes...

Visto que nos manuscritos originais não havia nenhuma pontuação, este versículo (2) tem sido vertido de maneiras diferentes por diversos tradutores.[1] (A nossa tradução, porém, tem o apoio de muitas traduções em linguagem moderna.) Tiago não especifica o que é que a pessoa estava desejando. Sem dúvida, referia-se às coisas desejadas para satisfazer a ânsia de prazeres, ou coisas de natureza imoral ou materialista, bem como, possivelmente, poder, destaque, o reconhecimento dos outros, e assim por diante. Esta foi a opinião de F. J. A. Hort, co-produtor do texto grego pontuado das Escrituras Gregas Cristãs, que disse que, neste contexto, a palavra traduzida aqui por “desejais” expressa inveja de destaque, categoria ou fama, ambição pessoal sórdida e amarga.[2]

O desejado bem poderia ser algo a que a pessoa não tem direito ou que simplesmente não está ao seu alcance. Embora não pudesse alcançar o objetivo de seu desejo ardente por meios honestos, não o tiraria da mente. Continuaria a desejar o que não possuía.

Prosseguis assassinando e cobiçando...

Permitia-se o desenvolvimento do desejo de algo que não se podia obter honradamente — por exemplo, por trabalho ou esforço honesto, bem motivado. Podemos notar que o apóstata “homem que é contra a lei” é revelado por Paulo como sendo motivado pelo forte desejo de obter adulação e poder. (2 Tes. 2:3, 4) A cobiça dos cristãos aos quais Tiago escreveu desenvolvera-se ao ponto de dar margem a um espírito de ódio assassino.

Certos cristãos demonstravam ter falta de amor aos seus irmãos na família da fé, pois, ao verem seus concristãos em necessidade, negavam-se a ajudá-los. Apegavam-se gananciosamente ao que possuíam, ao mesmo tempo procurando obter aquilo a que não tinham direito ou que estava além de seu alcance de obter por meios honestos. (Veja Tiago 2:14-16; 1 João 2:15-17; 3:15, 17.)

A história do mundo, e até mesmo a história da antiga nação de Israel, mostra como o desejo errado pode resultar em assassinato. Veja com quanta rapidez penetrou na raça humana e levou ao assassinato de Abel por seu irmão Caim, primogênito de Adão e Eva. Considere também como a cobiça do Rei Acabe, de Israel, o fez permitir o assassinato de Nabote, às instâncias de sua esposa Jezabel. (Gên. 4:8; 1 Reis 21:2-16)

Contudo, sois incapazes de obter...

Não podiam obter as coisas desejadas porque os desejos eram errados, e essas coisas não tinham a bênção de Deus. Não podiam ser obtidas por meios justos e honestos, especialmente não na congregação de Deus.

Prosseguis lutando e guerreando...

Visto que sua cobiça e sua maneira corruta e odiosa de proceder não satisfaziam os seus desejos, persistiam em lutar e em guerrear, no empenho de alcançar seus objetivos. Tais coisas são muito evidentes no mundo. Mas, até certo ponto limitado, o mesmo espírito e as mesmas ações se haviam desenvolvido até mesmo nas congregações, e isto se pode dar também hoje, se os membros da congregação, inclusive os na dianteira, não procurarem a sabedoria celestial, a união e a paz.

Não tendes porque não pedis...

Alguns daqueles a quem Tiago se dirigiu, por causa de sua conduta odiosa, simplesmente não se podiam chegar a Deus de modo puro. (Veja Lamentações 3:44.) Sabiam que Deus não ia conceder esses desejos, mas não queriam mudar e orar pelas coisas corretas, segundo a vontade Dele. (1 João 5:14) Se tivessem pedido o que realmente era necessário e o que podia ajudar espiritualmente a eles, bem como a outros, Deus o teria concedido. E, quer recebessem as coisas pedidas, quer não, podiam ter a certeza de que Deus só negaria algo porque era melhor que não o tivessem. Supriria outras coisas que seriam muito melhores para o bem-estar deles.


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Notas
[1] A Versão Normal Revisada (em inglês) verte o versículo 2 como descrevendo causa e efeito nas primeiras três frases. Reza como paralelismo: “Desejais e não tendes; por isso matais. E cobiçais e não podeis obter; por isso lutais e guerreais. Não tendes porque não pedis.” (Veja Pontifício Instituto Bíblico.) Mas, a nota ao pé da página, sobre este versículo, concorda na pontuação com a nossa tradução. Veja também o comentário sobre Tiago 4:2 no Comentário Crítico Internacional (em inglês), de Driver, Plummer e Briggs.
[2] A Epístola de São Tiago, texto grego com comentário em inglês.