Comentário de João Calvino: João 2:19

Destrui este templo. Este é um modo alegórico de expressão, e Cristo intencionalmente falou com esse grau de obscuridade, porque os considerava indignos de uma resposta direta, como Ele declara em outro lugar que Ele lhes fala em parábolas, porque eles são incapazes de compreender os mistérios do Reino Celestial, (Mat 13:13.) Mas primeiro, Ele se recusa a conceder-lhes o que eles pediram, ou porque isso não teria sido de qualquer vantagem, ou porque Ele sabia que não era o momento apropriado. Ele ocasionalmente fez algumas concessões, mesmo com os seus pedidos irrazoáveis, e, portanto, deve ter havido uma razão forte do porque agora Ele se recusou. Ainda que não possam recorrer a isso como um pretexto para se justifucarem, Ele declara que o Seu poder será provado e confirmado por um sinal de valor incomum, pois não poderia haver maior aprovação do poder divino de Cristo do que a Sua ressurreição dos mortos. Mas Ele transmite esta informação figurativamente, porque Ele não considera-os dignos de uma promessa explícita. Em suma, Ele trata os incrédulos como eles merecem, e, ao mesmo tempo, se protege contra toda a provação. Ainda não era evidenciado, de fato, que eles eram obstinados, mas Cristo sabia bem qual era o estado de seus sentimentos.

Mas pode-se perguntar: uma vez que ele realizou muitos milagres, e de vários tipos, por que Ele agora mencionar apenas um? Eu respondo, ele não disse nada sobre todos os outros milagres, primeiro, porque a sua ressurreição apenas era o suficiente para fechar a boca deles: Em segundo lugar, ele não estava disposto a expor o poder de Deus à ridicularizarão, pois mesmo com respeito à glória de Sua ressurreição, Ele falou alegoricamente: Em terceiro lugar, eu digo que Ele produziu o que era adequado para o caso em questão, pois, por estas palavras, Ele mostra que toda a autoridade sobre o Templo pertencia a Ele, pois Seu poder é assim grande na construção do verdadeiro Templo de Deus.

Este templo. Embora ele use a palavra templo, por acomodação a ocorrência presente, ainda assim o corpo de Cristo é justa e apropriadamente chamado de um templo. O corpo de cada um de nós é chamado de tabernáculo, (2Cor 5:4; 2Ped 1:13), porque a alma habita nela, mas o corpo de Cristo era a morada da sua divindade. Porque sabemos que o Filho de Deus se vestiu com a nossa natureza de tal forma que a majestade eterna de Deus habitava na carne que Ele assumiu, como no seu santuário.

O argumento de Nestório, que abusou dessa passagem para provar que não é um e o mesmo Cristo que é Deus e homem, pode ser facilmente refutado. Ele raciocinou assim: o Filho de Deus habitava na carne, como em um templo, por conseguinte, as naturezas são distintas, de modo que a mesma pessoa não era Deus e homem. Mas este argumento pode ser aplicado para os homens, pois irá seguir que não é um homem cuja alma habita no corpo como em um tabernáculo, e, portanto, é tolice torcer esta forma de expressão com o propósito de tirar a unidade da pessoa de Cristo. Deve ser observado que os nossos corpos também são chamados de templos de Deus, (1Cor 3:16, e 1Cor 6:19; 2Cor 6:16), mas é em um sentido diferente, ou seja, porque Deus habita em nós pelo poder e graça do seu Espírito, mas em Cristo a plenitude da Divindade habita corporalmente, de forma que Ele é verdadeiramente Deus manifestado em carne, (1Tim 3:16.)

Vou levantá-lo novamente. Aqui Cristo reivindica para si mesmo a glória de sua ressurreição, embora, em muitas passagens da Escritura, se é declarado como sendo a obra de Deus Pai. Mas essas duas afirmações estão perfeitamente de acordo umas com os outras, pois, a fim de dar-nos exaltada concepção do poder de Deus, a Escritura atribui expressamente ao Pai que ressuscitou seu Filho dentre os mortos; mas aqui, o Cristo de uma maneira especial, afirma sua própria Divindade. E Paulo concilia ambas as ideias.


“Se o Espírito Daquele que ressuscitou Jesus dos mortos habita em vós, Aquele que ressuscitou Cristo dentre os mortos deve também levantar os vossos corpos mortais, pelo Seu Espírito que habita em vós,” (Rom 8:11.)


Enquanto ele faz do Espírito o autor da ressurreição, e chama-o de forma indiscriminada, por vezes, o Espírito de Cristo, e, por vezes, o Espírito do Pai.

Fonte: John Calvin's Bible Commentary, da The Calvin Translation Society (1509-1564)