Nomes Bíblicos no Contexto Cultural

(Esse é um estudo bíblico extenso composto de várias partes complementares. Se você chegou até nosso blog por essa página, sugerimos analisar esse assunto dentro do seu contexto: O Nome Divino - YHWH)

NOMES BÍBLICOS, JEOVÁ, JAVÉ, NOME DE DEUS, TETRAGRAMA, ESTUDO BIBLICOS, TEOLOGICOS
§ 1. Os Nomes Bíblicos no Contexto Sócio-cultural.


“Um “nome” é aquilo pelo qual uma pessoa, lugar, ou coisa é marcada e conhecida.” – International Standard Bible Encyclopedia.

A palavra para “nome” no Antigo Testamento é shem (que é também o nome de um dos filhos de Noé). A etimologia da palavra é incerta, embora possa vir de shama, “colocar uma marca”; shum é a forma Aramaica. Além de designar pessoas, os nomes também eram equivalentes a fama, reconhecimento, reputação, caráter conquistado ou expresso, etc. (Gen 6:4; 2Sa 7:9, 2Sa 7:23, etc.); podia existe um “mal nome” Deu 22:14, 19; o “nome” é também equivalente a “pessoas” ou “nação” (que pode ser “apagado,” i.e. destruído (Deu 7:24, etc.)); falar ou escrever “no nome de alguém” significava autoridade (Exo 5:23; 1Rs 21:8, etc.); “invocar o nome de alguém” sobre um lugar ou povo indicava possessão (2Sa 12:28; Amo 9:12, etc.); agir “no nome” era o mesmo que representar tal pessoa diante de outros Deu 25:6; ser chamado ou conhecido “por nome” indicava conhecimento individual e especial do mesmo Exo 31:2; Isa 43:1; 45:3-4. Gen 2:19-20 .

Enquanto os nossos nomes são praticamente decididos apenas baseados no gosto e destinados apenas a identificação de cada pessoa, os nomes bíblicos eram frequentemente descritivos da pessoa, de sua personalidade ou mesmo com um significado profético. Na maioria das vezes, como a religiosidade era muito forte entre os povos primitivos bíblicos, os nomes sempre estavam ligados a alguma divindade tribal e local, ou então fazia referência a alguma graça alcançada. No caso dos judeus, vemos isso em quase todos os nomes bíblicos, e.g. Nathaniel (“dádiva de Deus”); Samuel (“ouvido por Deus”); Adonijah (“Iavé é meu Senhor”), etc.

Outras vezes o nome descrevia algo em particular. Por exemplo, o nome de Isaque, “Riso”, lembrava o riso de seus pais idosos ao ouvirem que teriam um filho. (Gênesis 17:17, 19; 18:12) O nome de Esaú significava “Peludo”, descrevendo uma característica física. Seu outro nome, Edom, “Vermelho”, ou “Corado”, era um lembrete de que ele vendera seu direito de primogenitura por um prato de cozido vermelho. (Gênesis 25:25, 30-34; 27:11; 36:1) Jacó, embora fosse apenas um pouquinho mais jovem que seu irmão gêmeo, Esaú, comprou o direito de primogênito de Esaú e recebeu de seu pai as bênçãos de primogênito. De nascimento, o significado do nome de Jacó era “Agarrar o Calcanhar” ou “Suplantador”. (Gênesis 27:36) Similarmente, o nome de Salomão, durante o reinado de quem Israel usufruiu paz e prosperidade, significa “Pacífico”. — 1 Crônicas 22:9.

Interessante que o mesmo hábito de colocar nome por razões religiosas não era um assunto apenas de Israel. O mesmo se deu quando os jovens hebreus chegam a Babilônia para o exílio. O relato nos diz que os seus nomes foram mudados para corresponder algum sentido religioso das deidades babilônicas. No caso de Daniel e de seus três amigos hebreus, a mudança de nomes foi significativa. Os nomes que receberam dos pais estavam em harmonia com a adoração de Yahweh. “Daniel” significa “Meu Juiz É Deus”. O significado de “Hananias” é “Yahweh Mostrou Favor”. “Misael” possivelmente significa “Quem É Semelhante a Deus?”. “Azarias” significa “Yahweh Ajudou”. No entanto, os novos nomes dados aos quatro hebreus estavam todos intimamente associados com os de deuses falsos, sugerindo que o verdadeiro Deus fora subjugado por tais divindades. O nome de Daniel foi mudado para Beltessazar, que significa “Protege a Vida do Rei”. Pelo visto, esta era uma forma abreviada duma invocação a Bel, ou Marduque, o deus principal de Babilônia. Quer Nabucodonosor tenha tido parte na escolha do nome de Daniel, quer não, orgulhava-se de que era “segundo o nome de [seu] deus”. (Daniel 4:8) Hananias recebeu o nome de Sadraque, que algumas autoridades acham ser um nome composto que significa “Ordem de Aku”. O interessante é que Aku era o nome dum deus sumeriano. A mudança do nome de Misael para Mesaque (possivelmente Mishaaku) era aparentemente uma variante engenhosa de “Quem É Semelhante a Deus?” para “Quem É o que Aku É?”. O nome babilônico de Azarias era Abednego, provavelmente significando “Servo de Nego”. E “Nego” é uma variante de “Nebo”, nome duma divindade que vários governantes babilônicos também levavam. – Cf. Daniel 1:7.

Um outro exemplo de culturas extra-judaicas que usavam os nomes dentro desse contexto sócio-religioso é o de Moisés. Depois que a filha do Faraó tomou Moisés ainda criança, o relato inspirado nos diz: “Trouxe-o então à filha de Faraó, de modo que se tornou filho para ela; e ela passou a chamá-lo pelo nome de Moisés e a dizer: “É porque o tirei da água.”” (Êxodo 2:10) Percebe-se assim que, depois de lhe dar o nome, ela explicou, de acordo com o costume cultural dos egípcios, que seu nome seria esse como referência do que lhe acontecera, quando ela disse: “É porque o tirei da água.”

Uma outra particularidade com respeito aos nomes bíblicos era a mudança de nome. Comentando sobre esse costume, o Dr. Willian Smith, diz o seguinte:

“Era de costume marcar a entrada de alguém em uma nova relação com um novo nome, em cujo caso, a aceitação do novo nome envolve o reconhecimento soberano Daquele que deu o nome, de forma que a importância e a nova esfera dada aos órgãos de Revelação no reino de Deus são frequentemente indicados pela mudança de nome. Os exemplos são Abraão, Gen 17:5; Sara, Gen 17:15; Israel, como a designação do caráter espiritual no lugar de Jacó, que designou o caráter natural. Gen 32:28.”

O Dicionário Bíblico Ilustrado (Volume 1, página 572, em inglês), diz:

“Um estudo da palavra ‘nome’ no A.T revela o quanto ela significa em hebraico. O nome não é simples rótulo, mas é significativo da personalidade real daquele a quem pertence.”

O fato de que o nome é considerado algo importante por Deus deduz-se de que, por meio de um anjo, Ele instruiu as futuras mães de João Batista e de Jesus quanto a qual devia ser o nome dos filhos delas. (Lucas 1:13, 31) E às vezes Ele mudou os nomes, ou deu nomes adicionais às pessoas, para indicar o lugar que teriam em seu propósito, como foi comentado pelo Dr. Willian Smith acima. Por exemplo, quando Deus predisse que Seu servo Abrão (“Pai da Exaltação”) se tornaria pai de muitas nações, Ele mudou seu nome para Abraão (“Pai Duma Multidão”). E Ele mudou o nome da esposa de Abraão, Sarai (“Contenciosa”), para Sara (“Princesa”), visto que ela seria a mãe do descendente de Abraão. — Gênesis 17:5, 15, 16; veja Gênesis 32:28; 2 Samuel 12:24, 25.

Jesus, também, reconheceu a importância dos nomes e referiu-se ao nome de Pedro ao dar-lhe um privilégio de ministério. (Mateus 16:16-19) Até mesmo criaturas espirituais têm nome. Dois mencionados na Bíblia são Gabriel e Miguel. (Lucas 1:26; Judas 9) E quando o homem dá nome a coisas inanimadas, como estrelas, planetas, cidades, montanhas e rios, ele meramente imita seu Criador. Por exemplo, a Bíblia nos diz que Deus chama a todas as estrelas por nome. (Isaías 40:26), a uma das primeiras atividades que o Criador deu ao recém formado homem foi a que está registrado em Gênesis cap. 2, que diz: “Ora, Yahweh Deus estava formando do solo todo animal selvático do campo e toda criatura voadora dos céus, e ele começou a trazê-los ao homem para ver como chamaria a cada um deles; e o que o homem chamava a cada alma vivente, este era seu nome.” (Gênesis 2:19) Isso, por si só, nos mostra que o próprio Criador dá importância a essa questão.

Sim, o nome é importante aos olhos de Deus, e Ele pôs no homem o desejo de identificar pessoas e coisas por meio de nomes. Assim, anjos, pessoas, animais, bem como estrelas e outras coisas inanimadas, têm nome. Seria coerente da parte do Criador de todas essas coisas manter-se anônimo? Claro que não, especialmente em vista das palavras do salmista: “Bendiga toda a carne Seu Santo Nome por tempo indefinido, para todo o sempre.” — Salmo 145:21.

O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento (Volume 2, página 649, em inglês), diz:

“Um dos aspectos mais fundamentais e essenciais da revelação bíblica é o fato de que Deus não fica sem nome: ele tem um nome pessoal, por meio do qual pode e deve ser invocado.”

Jesus certamente tinha esse nome em mente quando ensinou seus seguidores a orar:

“Nosso Pai nos céus, santificado seja o teu nome.” — Mateus 6:9.

Embora tenhamos mencionado fatos das Escrituras Hebraicas (A.T) para constituir nossa concepção e entendimento do significa sócio-cultural da palavra “nome”, o mesmo se aplica as Escrituras Cristãs (N.T), uma vez que elas nos contam o relato e vida de pessoas que eram judeus, e mantinham seus costumes sociais e religiosos do A.T.

Vemos o caso de Saulo de Tarso, depois de sua experiência espiritual com o Senhor Jesus Cristo, passou a ser mais conhecido como o apóstolo Paulo.[1] (Atos cap. 9) Para caracterizar seu serviço entre os gentios, serviço esse recebido durante esse evento que mudou sua vida, Saulo passa a ser conhecido mais pelo nome grego do que seu nome judaico.

Portanto, em termos bíblicos, o nome de alguém, no geral, era muito importante. Esse não era apenas um rótulo, nem mesmo feito por mero gosto linguístico. Os nomes bíblicos desempenhavam um papel significativo na vida do povo de Deus no passado, dando-Lhe honra, reconhecimento, respeito como Deus único e verdadeiro. Os nomes próprios dos indivíduos judeus falam a respeito de si mesmos, e da relação e comunhão que tinham com Yahweh. É dentro desse contexto linguístico de suma importância que nós passaremos a observar mais aspectos que envolvem o Nome dos nomes.

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Notas
[1] Devemos ter em mente que era comum entre os judeus do séc. I terem dois nomes, um judaico e um gentílico, que era principalmente usado quando os mesmos se encontravam fora dos limites de Israel. No caso do apóstolo Paulo, ele não teve uma mudança de nome, como nos casos considerados do A.T., contrário ao que muitos acreditam hoje. Paulo continuou a ter seu nome judaico. A primeira ocorrência do nome Παυλος é em Atos 13:9, que de certa forma explica o uso dos dois nomes respectivamente. O texto diz: “Saulo, que é também Paulo,...” O “também” indica que ele ainda sustentava os dois nomes. No entanto, é possível que este apóstolo tenha escolhido ser conhecido por seu nome romano (i.e Paulo) em vista de sua comissão de declarar as boas novas aos não-judeus. — At 9:15; Gál 2:7, 8.