Encarnação e Nascimento de Cristo
1. A ENCARNAÇÃO E O NASCIMENTO DE CRISTO. Sob este título geral, vários pontos merecem atenção.
a. O sujeito da encarnação. Não foi o trino Deus, mas a segunda pessoa da Trindade que assumiu a natureza humana. Por essa razão, é melhor dizer que o Verbo se fez carne, do que dizer que Deus se fez homem. Ao mesmo tempo, devemos lembrar que cada uma das pessoas divinas agiu na encarnação, Mt 1.20; Lc 1.35; Jo 1.14; At 2.30; Rm 8.3; Gl 4.4; Fp 2.7. Quer dizer também que a encarnação não foi uma coisa que simplesmente aconteceu com o Logos, mas foi uma ativa realização da parte dele. Ao se falar de encarnação em distinção do nascimento do Logos, dá-se ênfase à Sua participação ativa neste fato histórico, e se pressupõe a Sua preexistência. Não é possível falar da encarnação de alguém que não teve existência prévia. Esta preexistência é claramente ensinada na Escritura: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”, Jo 1.1. “eu desci do céu”, Jo 6.38. “Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que pela sua pobreza vos tornásseis ricos”, 2 Co 8.9. “pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens”, Fp 2.6, 7. “Vindo, pois, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho”, Gl 4.4. O preexistente Filho de Deus assume a natureza humana e se reveste de carne e sangue humanos, um milagre que ultrapassa o nosso limitado entendimento. Isto mostra claramente que o infinito pode entrar em relações finitas, e de fato entra, e que, de algum modo, o sobrenatural pode entrar na vida histórica do mundo.
b. A necessidade da encarnação. Desde os dias do escolasticismo, tem-se debatido a questão sobre se a encarnação deve ser considerada como envolvida na idéia da redenção, ou como já envolvida na idéia da criação. Popularmente exposta, a questão era se o Filho de Deus poderia ter vindo em carne mesmo que o homem não tivesse caído em pecado. Rupert de Deutz foi o primeiro a afirmar clara e positivamente que Ele se encarnaria independentemente do pecado. Seu conceito foi compartilhado por Alexandre de hales e Duns Scotus, mas Tomaz de Aquino tomou a posição de que a razão da encarnação está na entrada do pecado no mundo. Os reformadores partilham este conceito, e as igrejas da Reforma ensinam que a encarnação foi tornada necessária pela queda do homem. Contudo, alguns especialistas luteranos e reformados (calvinistas), como Osiander, Rothe, Dorner, Lange, Van Oosterzee, Martensen, Ebrad e Westcott, tinham a opinião contrária. Os argumentos aduzidos por eles eram como se segue: Um fato estupendo como a encarnação não pode ser contingente, e não pode ter a sua causa no pecado como um ato acidental e arbitrário do homem. Deve ter sido incluído no plano original de Deus. A religião anterior e posterior à Queda não pode ser essencialmente diferente. Se é necessário um Mediador agora, deve ter sido necessário também antes da Queda. Além disso, a obra realizada por Cristo não se limita à expiação e às suas operações salvíficas. Ele é o mediador, mas também o Chefe, a Cabeça; é n!ao somente o arché (princípio), mas também o telos (fim) da criação, 1 Co 15.45-47; Ef 1.10, 21-23; 5.31, 32; Cl 1.15-17.
Todavia, deve-se notar que a escritura invariavelmente representa a encarnação como condicionada pelo pecado humano. Não se pode eliminar facilmente a força de passagens como Lc 19.10; Jo 3.16; Gl 4.4; 1 Jo 3.8; Fp 2.5-11. A idéia às vezes expressa de que a encarnação era em si mesma conveniente e necessária para Deus, pode levar à noção panteísta de uma auto-revelação eterna de Deus no mundo. A dificuldade ligada ao plano de Deus, dificuldade que se supõe pesar sobre este conceito, não existirá se considerarmos o assunto sub specie aeternitatis (na perspectiva da eternidade). Não há senão um só plano de Deus, e este plano inclui, desde o início último, o pecado do homem e a encarnação do Verbo. Em última análise, como é natural, a encarnação, como também toda a obra de redenção, dependia, não do pecado, mas do beneplácito de Deus. Não é preciso negar que Cristo tem também significação cósmica, mas esta não se acha ligada à Sua significação redentora, em Ef 1.10, 20-23; Cl 1.14-20.
c. A mudança efetuada na encarnação. Quando se nos diz que o Verbo se fez carne, não significa que o Verbo deixou de ser o que era antes. Quanto ao Seu Ser essencial, o Logos era exatamente o mesmo, antes e depois da encarnação. O verbo egeneto, em Jo 1.14 (o Verbo se fez carne), certamente não significa que o Logos se transformou em carne, alterando assim a Sua natureza essencial, mas simplesmente que Ele contraiu aquele caráter particular, que Ele adquiriu uma forma adicional, sem de modo algum mudar a Sua natureza original. Ele continuou sendo o infinito e imutável Filo de Deus. Ademais, a afirmação de que o Verbo se fez carne não significa que Ele se revestiu de uma pessoa humana, nem, por outro lado, que Ele apenas se revestiu de uma pessoa humana, nem, por outro lado, que Ele apenas se revestiu de um corpo humano. A palavra sarx (carne) aqui denota a natureza humana, que consiste de corpo e alma. A palavra é empregada num sentido um tanto similar em Rm 8.3; 1 Tm 3.16; 1 Jo 4.2; 2 Jo 7 (comp. Fp 2.7).
d. A encarnação fez de Cristo um membro da raça humana. Em oposição aos ensinos dos anabatistas, a nossa Confissão afirma que Cristo assumiu a Sua natureza humana da substancia da Sua mãe. A opinião predominante entre os anabatistas era que o Senhor trouxe do céu a Sua natureza humana, e que Maria foi apenas o conduto ou canal pelo qual a natureza humana passou. Segundo este conceito, a Sua natureza humana foi realmente uma nova criação, semelhante à nossa, mas não organicamente ligada à nossa. Logo se verá a importância de opor-nos a esse conceito. Se a natureza humana de Cristo não derivou do mesmo tronco que a nossa, mas apenas se assemelhou a ela, não existe aquela relação entre nós e Ele que é necessária para tornar a Sua mediação eficaz para o nosso bem.
e. A encarnação efetuada por uma concepção sobrenatural e um nascimento virginal. A nossa Confissão afirma que a natureza de Cristo foi “concebida no ventre da bendita virgem Maria pelo poder do Espírito Santo, sem o concurso do homem”. Isto salienta o fato de que o nascimento de Cristo absolutamente não foi um nascimento comum, mas, sim, um nascimento sobrenatural, em virtude do qual Ele foi chamado “Filho de Deus”. O elemento mais importante, com relação ao nascimento de Jesus, foi a operação sobrenatural do Espírito Santo, pois só por este meio foi possível o nascimento virginal. A Bíblia se refere a esta característica em Mt 1.18-20; Lc 1.34, 35; Hb 10.5. A obra do Espírito Santo concernente à concepção de Jesus foi dupla: (1) Ele foi a causa eficiente do que foi concebido no ventre de Maria, e assim excluiu a atividade do homem como fator eficiente. Isso está em completa harmonia com o fato de que a pessoa que nasceu não era uma pessoa humana, mas a pessoa do Filho de Deus que, como tal, não estava incluída na aliança das obras e estava livre da culpa do pecado. (2) Ele santificou a natureza humana de Cristo logo no início, e assim a manteve livre da corrupção do pecado. Não podemos dizer exatamente como pó Espírito realizou esta obra santificadora, porque até hoje não se sabe bem como a corrupção do pecado passa ordinariamente de pai para filho. Deve-se notar, porém, que a influencia santificante do Espírito Santo não se limitou à concepção de Jesus, mas teve continuidade por toda a Sua vida, Jo 3.34; Hb 9.14.
Foi somente pela sobrenatural concepção de Cristo que Ele pôde nascer de uma virgem. A doutrina do nascimento virginal baseia-se nas seguintes passagens da Escritura: Is 7.14; Mt 1.18, 20; Lc 1.34, 35, e também é favorecida por Gl 4.4. Esta doutrina foi confessada na igreja desde os primeiros tempos. Já a encontramos mas formas originais da confissão apostólica e, posteriormente, em todas as grandes confissões das igrejas protestantes e do catolicismo romano. Sua rejeição atual não se deve à falta de provas bíblicas, nem à falta de sanção eclesiástica, mas à corrente aversão geral pelo sobrenatural. As passagens da Escritura em que se baseia a doutrina são simplesmente repudiadas com bases críticas que estão longe de convincentes; e isso a despeito do fato de que a integridade das narrativas está comprovadamente fora e além de contestação; e se admite gratuitamente que o silêncio dos outros escritores do Novo testamento com relação ao nascimento virginal prova que eles nada saibam do suposto fato do nascimento virginal prova que eles nada sabiam do suposto fato do nascimento miraculoso. Todas as espécies de tentativas engenhosas são feitas para explicar como o conto do nascimento virginal surgiu e conquistou aceitação geral. Alguns buscam a explicação nas tradições dos hebreus, outros, nas dos gentios. Não podemos entrar numa discussão deste problema aqui, e, portanto, meramente nos reportamos a obras como as seguintes: Marchen, The Virgin Birth of Christ (O nascimento Virginal de Cristo); Orr, The Virgin Birth of Christ; Sweet, The Birth and Infancy of Jesus Christ (O Nascimento e a Infância de Jesus Cristo); Cooke, Did Paul Know the Virgin Birth? Será que Pulo Sabia do nascimento Virginal?), Knowling, The Virgin Birth.
Às vezes perguntam se o nascimento virginal é matéria de importância doutrinária. Brunner declara que não tem o mínimo interesse pelo assunto. Ele rejeita a doutrina do nascimento milagroso de Cristo e sustenta que foi puramente natural, mas não está suficientemente interessado em defender extensamente a sua opinião. Além disso, ele diz: “A doutrina do nascimento virginal teria sido abandonada há muito tempo, não fosse o fato de, ao que parece, haver interesses dogmáticos preocupados com a sua manutenção”. Barth reconhece o milagre do nascimento virginal, e vê nele um sinal do fato de que Deus estabeleceu criadoramente um novo princípio condescendendo em fazer-se homem. Ele vê também no nascimento virginal importância doutrinária. Segundo ele, a “herança do pecado”é transmitida pelo pai, de modo que Cristo pode assumir a “criaturidade” nascendo de Maria e, ao mesmo tempo, escapar da “herança do pecado”pela eliminação do pai humano. Em resposta à indagação se o nascimento virginal tem importância doutrinária, pode-se dizer que é inconcebível que Deus fizesse Cristo nascer desse modo tão extraordinário, se isto não atendesse a algum propósito. Pode-se expor o seu propósito doutrinário como se segue: (1) Era mister que Cristo se constituísse o Messias e o messiânico Filho de Deus. Conseqüentemente, era necessário que Ele nascesse de mulher, mas também que não fosse fruto da vontade do homem, mas nascesse de Deus. O que é nascido da carne é carne. Com toda a probabilidade, este maravilhoso nascimento de Jesus estava na mente de João quando ele escreveu o que está em Jo 1.13. (2) Se Cristo fosse gerado por um homem, seria uma pessoa humana, incluída na aliança das obras, e, como tal, partilharia da culpa comum da humanidade. Mas, visto que o Seu sujeito, o Seu ego, a Sua pessoa, não provém de Adão, Ele não está na aliança das obras e está livre da culpa do pecado. E estando livre da culpa do pecado, a Sua natureza também pôde ser mantida livre da corrupção do pecado, antes e depois do Seu nascimento.
f. A encarnação propriamente dita, uma parte da humilhação de Cristo. Será a encarnação uma parte da humilhação de Cristo, ou não? Os luteranos, com a sua distinção entre a incarnatio e a exinanitio, negam que o seja, e baseiam a sua negação no fato de que a humilhação de Cristo limitou-se à Sua existência terrena, ao passo que a Sua humanidade continua no céu. Ele tem ainda a sua natureza humana e todavia, não se acha mais num estado de humilhação. Havia alguma diferença de opinião sobre este ponto mesmo entre os teólogos reformados (calvinistas). Ao que parece, esta questão deve ser resolvida com discriminação. Pode-se dizer que a encarnação, totalmente no abstrato, o mero fato de que Deus em Cristo assumiu a natureza humana, apesar de ser um ato de condescendência, não foi em si mesma uma humilhação, embora Kuyper ache que foi. Mas certamente constitui humilhação o fato de o Logos assumir a “carne”, isto é, a natureza humana como esta é desde a Queda, enfraquecida e sujeita ao sofrimento e à morte, embora isenta da mancha do pecado. Isto parece estar implícito em passagens como Rm 8.3; 2 Co 8.9; Fp 2.6, 7.
a. O sujeito da encarnação. Não foi o trino Deus, mas a segunda pessoa da Trindade que assumiu a natureza humana. Por essa razão, é melhor dizer que o Verbo se fez carne, do que dizer que Deus se fez homem. Ao mesmo tempo, devemos lembrar que cada uma das pessoas divinas agiu na encarnação, Mt 1.20; Lc 1.35; Jo 1.14; At 2.30; Rm 8.3; Gl 4.4; Fp 2.7. Quer dizer também que a encarnação não foi uma coisa que simplesmente aconteceu com o Logos, mas foi uma ativa realização da parte dele. Ao se falar de encarnação em distinção do nascimento do Logos, dá-se ênfase à Sua participação ativa neste fato histórico, e se pressupõe a Sua preexistência. Não é possível falar da encarnação de alguém que não teve existência prévia. Esta preexistência é claramente ensinada na Escritura: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”, Jo 1.1. “eu desci do céu”, Jo 6.38. “Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que pela sua pobreza vos tornásseis ricos”, 2 Co 8.9. “pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens”, Fp 2.6, 7. “Vindo, pois, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho”, Gl 4.4. O preexistente Filho de Deus assume a natureza humana e se reveste de carne e sangue humanos, um milagre que ultrapassa o nosso limitado entendimento. Isto mostra claramente que o infinito pode entrar em relações finitas, e de fato entra, e que, de algum modo, o sobrenatural pode entrar na vida histórica do mundo.
b. A necessidade da encarnação. Desde os dias do escolasticismo, tem-se debatido a questão sobre se a encarnação deve ser considerada como envolvida na idéia da redenção, ou como já envolvida na idéia da criação. Popularmente exposta, a questão era se o Filho de Deus poderia ter vindo em carne mesmo que o homem não tivesse caído em pecado. Rupert de Deutz foi o primeiro a afirmar clara e positivamente que Ele se encarnaria independentemente do pecado. Seu conceito foi compartilhado por Alexandre de hales e Duns Scotus, mas Tomaz de Aquino tomou a posição de que a razão da encarnação está na entrada do pecado no mundo. Os reformadores partilham este conceito, e as igrejas da Reforma ensinam que a encarnação foi tornada necessária pela queda do homem. Contudo, alguns especialistas luteranos e reformados (calvinistas), como Osiander, Rothe, Dorner, Lange, Van Oosterzee, Martensen, Ebrad e Westcott, tinham a opinião contrária. Os argumentos aduzidos por eles eram como se segue: Um fato estupendo como a encarnação não pode ser contingente, e não pode ter a sua causa no pecado como um ato acidental e arbitrário do homem. Deve ter sido incluído no plano original de Deus. A religião anterior e posterior à Queda não pode ser essencialmente diferente. Se é necessário um Mediador agora, deve ter sido necessário também antes da Queda. Além disso, a obra realizada por Cristo não se limita à expiação e às suas operações salvíficas. Ele é o mediador, mas também o Chefe, a Cabeça; é n!ao somente o arché (princípio), mas também o telos (fim) da criação, 1 Co 15.45-47; Ef 1.10, 21-23; 5.31, 32; Cl 1.15-17.
Todavia, deve-se notar que a escritura invariavelmente representa a encarnação como condicionada pelo pecado humano. Não se pode eliminar facilmente a força de passagens como Lc 19.10; Jo 3.16; Gl 4.4; 1 Jo 3.8; Fp 2.5-11. A idéia às vezes expressa de que a encarnação era em si mesma conveniente e necessária para Deus, pode levar à noção panteísta de uma auto-revelação eterna de Deus no mundo. A dificuldade ligada ao plano de Deus, dificuldade que se supõe pesar sobre este conceito, não existirá se considerarmos o assunto sub specie aeternitatis (na perspectiva da eternidade). Não há senão um só plano de Deus, e este plano inclui, desde o início último, o pecado do homem e a encarnação do Verbo. Em última análise, como é natural, a encarnação, como também toda a obra de redenção, dependia, não do pecado, mas do beneplácito de Deus. Não é preciso negar que Cristo tem também significação cósmica, mas esta não se acha ligada à Sua significação redentora, em Ef 1.10, 20-23; Cl 1.14-20.
c. A mudança efetuada na encarnação. Quando se nos diz que o Verbo se fez carne, não significa que o Verbo deixou de ser o que era antes. Quanto ao Seu Ser essencial, o Logos era exatamente o mesmo, antes e depois da encarnação. O verbo egeneto, em Jo 1.14 (o Verbo se fez carne), certamente não significa que o Logos se transformou em carne, alterando assim a Sua natureza essencial, mas simplesmente que Ele contraiu aquele caráter particular, que Ele adquiriu uma forma adicional, sem de modo algum mudar a Sua natureza original. Ele continuou sendo o infinito e imutável Filo de Deus. Ademais, a afirmação de que o Verbo se fez carne não significa que Ele se revestiu de uma pessoa humana, nem, por outro lado, que Ele apenas se revestiu de uma pessoa humana, nem, por outro lado, que Ele apenas se revestiu de um corpo humano. A palavra sarx (carne) aqui denota a natureza humana, que consiste de corpo e alma. A palavra é empregada num sentido um tanto similar em Rm 8.3; 1 Tm 3.16; 1 Jo 4.2; 2 Jo 7 (comp. Fp 2.7).
d. A encarnação fez de Cristo um membro da raça humana. Em oposição aos ensinos dos anabatistas, a nossa Confissão afirma que Cristo assumiu a Sua natureza humana da substancia da Sua mãe. A opinião predominante entre os anabatistas era que o Senhor trouxe do céu a Sua natureza humana, e que Maria foi apenas o conduto ou canal pelo qual a natureza humana passou. Segundo este conceito, a Sua natureza humana foi realmente uma nova criação, semelhante à nossa, mas não organicamente ligada à nossa. Logo se verá a importância de opor-nos a esse conceito. Se a natureza humana de Cristo não derivou do mesmo tronco que a nossa, mas apenas se assemelhou a ela, não existe aquela relação entre nós e Ele que é necessária para tornar a Sua mediação eficaz para o nosso bem.
e. A encarnação efetuada por uma concepção sobrenatural e um nascimento virginal. A nossa Confissão afirma que a natureza de Cristo foi “concebida no ventre da bendita virgem Maria pelo poder do Espírito Santo, sem o concurso do homem”. Isto salienta o fato de que o nascimento de Cristo absolutamente não foi um nascimento comum, mas, sim, um nascimento sobrenatural, em virtude do qual Ele foi chamado “Filho de Deus”. O elemento mais importante, com relação ao nascimento de Jesus, foi a operação sobrenatural do Espírito Santo, pois só por este meio foi possível o nascimento virginal. A Bíblia se refere a esta característica em Mt 1.18-20; Lc 1.34, 35; Hb 10.5. A obra do Espírito Santo concernente à concepção de Jesus foi dupla: (1) Ele foi a causa eficiente do que foi concebido no ventre de Maria, e assim excluiu a atividade do homem como fator eficiente. Isso está em completa harmonia com o fato de que a pessoa que nasceu não era uma pessoa humana, mas a pessoa do Filho de Deus que, como tal, não estava incluída na aliança das obras e estava livre da culpa do pecado. (2) Ele santificou a natureza humana de Cristo logo no início, e assim a manteve livre da corrupção do pecado. Não podemos dizer exatamente como pó Espírito realizou esta obra santificadora, porque até hoje não se sabe bem como a corrupção do pecado passa ordinariamente de pai para filho. Deve-se notar, porém, que a influencia santificante do Espírito Santo não se limitou à concepção de Jesus, mas teve continuidade por toda a Sua vida, Jo 3.34; Hb 9.14.
Foi somente pela sobrenatural concepção de Cristo que Ele pôde nascer de uma virgem. A doutrina do nascimento virginal baseia-se nas seguintes passagens da Escritura: Is 7.14; Mt 1.18, 20; Lc 1.34, 35, e também é favorecida por Gl 4.4. Esta doutrina foi confessada na igreja desde os primeiros tempos. Já a encontramos mas formas originais da confissão apostólica e, posteriormente, em todas as grandes confissões das igrejas protestantes e do catolicismo romano. Sua rejeição atual não se deve à falta de provas bíblicas, nem à falta de sanção eclesiástica, mas à corrente aversão geral pelo sobrenatural. As passagens da Escritura em que se baseia a doutrina são simplesmente repudiadas com bases críticas que estão longe de convincentes; e isso a despeito do fato de que a integridade das narrativas está comprovadamente fora e além de contestação; e se admite gratuitamente que o silêncio dos outros escritores do Novo testamento com relação ao nascimento virginal prova que eles nada saibam do suposto fato do nascimento virginal prova que eles nada sabiam do suposto fato do nascimento miraculoso. Todas as espécies de tentativas engenhosas são feitas para explicar como o conto do nascimento virginal surgiu e conquistou aceitação geral. Alguns buscam a explicação nas tradições dos hebreus, outros, nas dos gentios. Não podemos entrar numa discussão deste problema aqui, e, portanto, meramente nos reportamos a obras como as seguintes: Marchen, The Virgin Birth of Christ (O nascimento Virginal de Cristo); Orr, The Virgin Birth of Christ; Sweet, The Birth and Infancy of Jesus Christ (O Nascimento e a Infância de Jesus Cristo); Cooke, Did Paul Know the Virgin Birth? Será que Pulo Sabia do nascimento Virginal?), Knowling, The Virgin Birth.
Às vezes perguntam se o nascimento virginal é matéria de importância doutrinária. Brunner declara que não tem o mínimo interesse pelo assunto. Ele rejeita a doutrina do nascimento milagroso de Cristo e sustenta que foi puramente natural, mas não está suficientemente interessado em defender extensamente a sua opinião. Além disso, ele diz: “A doutrina do nascimento virginal teria sido abandonada há muito tempo, não fosse o fato de, ao que parece, haver interesses dogmáticos preocupados com a sua manutenção”. Barth reconhece o milagre do nascimento virginal, e vê nele um sinal do fato de que Deus estabeleceu criadoramente um novo princípio condescendendo em fazer-se homem. Ele vê também no nascimento virginal importância doutrinária. Segundo ele, a “herança do pecado”é transmitida pelo pai, de modo que Cristo pode assumir a “criaturidade” nascendo de Maria e, ao mesmo tempo, escapar da “herança do pecado”pela eliminação do pai humano. Em resposta à indagação se o nascimento virginal tem importância doutrinária, pode-se dizer que é inconcebível que Deus fizesse Cristo nascer desse modo tão extraordinário, se isto não atendesse a algum propósito. Pode-se expor o seu propósito doutrinário como se segue: (1) Era mister que Cristo se constituísse o Messias e o messiânico Filho de Deus. Conseqüentemente, era necessário que Ele nascesse de mulher, mas também que não fosse fruto da vontade do homem, mas nascesse de Deus. O que é nascido da carne é carne. Com toda a probabilidade, este maravilhoso nascimento de Jesus estava na mente de João quando ele escreveu o que está em Jo 1.13. (2) Se Cristo fosse gerado por um homem, seria uma pessoa humana, incluída na aliança das obras, e, como tal, partilharia da culpa comum da humanidade. Mas, visto que o Seu sujeito, o Seu ego, a Sua pessoa, não provém de Adão, Ele não está na aliança das obras e está livre da culpa do pecado. E estando livre da culpa do pecado, a Sua natureza também pôde ser mantida livre da corrupção do pecado, antes e depois do Seu nascimento.
f. A encarnação propriamente dita, uma parte da humilhação de Cristo. Será a encarnação uma parte da humilhação de Cristo, ou não? Os luteranos, com a sua distinção entre a incarnatio e a exinanitio, negam que o seja, e baseiam a sua negação no fato de que a humilhação de Cristo limitou-se à Sua existência terrena, ao passo que a Sua humanidade continua no céu. Ele tem ainda a sua natureza humana e todavia, não se acha mais num estado de humilhação. Havia alguma diferença de opinião sobre este ponto mesmo entre os teólogos reformados (calvinistas). Ao que parece, esta questão deve ser resolvida com discriminação. Pode-se dizer que a encarnação, totalmente no abstrato, o mero fato de que Deus em Cristo assumiu a natureza humana, apesar de ser um ato de condescendência, não foi em si mesma uma humilhação, embora Kuyper ache que foi. Mas certamente constitui humilhação o fato de o Logos assumir a “carne”, isto é, a natureza humana como esta é desde a Queda, enfraquecida e sujeita ao sofrimento e à morte, embora isenta da mancha do pecado. Isto parece estar implícito em passagens como Rm 8.3; 2 Co 8.9; Fp 2.6, 7.