Apelo de Paulo a César
APELO DE PAULO A CÉSAR
Temos em Atos 25:11 um exemplo do
provocatio, isto é, um direito legal,
de todos os cidadãos romanos, de apelarem contra o veredicto de qualquer magistrado
ou governante de província. Ante tal apelo, qualquer caso era transferido para
o tribunal de César, que então constituía o que hoje chamaríamos de tribunal
supremo. Essa forma de apelo existia, ainda que sob variegadas formas, desde os
tempos m ais remotos do império rom ano. Como exemplo disso, pode-se examinar o
caso de Horácio, segundo o registro de Lívio 1.26. O direito do provocatio foi garantido pela Lex
Valeria, em 509 A.C. (Ver Lívio ii.8,
U.C. 245). Esse direito foi suspenso por algum tempo, entretanto, durante o
período dos “Decenviros”, um conselho de dez magistrados da antiga Roma, que,
em 450 A.C., preparou o primeiro código das leis romanas. Todavia, tal direito
foi reestabelecido após a deposição dos Decenviros, conforme Lívio também nos
diz (iii.55, U.C. 305). Nos primeiros tempos da república romana, o apelo ou provocatio era dirigido ad populum, isto é, ao povo. Posteriormente, porém,
passou a ser feito aos tribunos, que
eram os principais líderes do povo. Finalmente, entretanto, veio a ser feito ao
“princeps”, o mais elevado poder, isto é, ao imperador. Quando um apelo assim
era feito ao imperador, isso eliminava todas as decisões legais e os processos
porventura feitos até então. Foi mediante o apelo que fez a César, pois, que o
apóstolo Paulo conseguiu livrar-se da vacilação incompreensível de governantes
secundários, como Félix e Festo. Nos primeiros tempos, só se podia fazer tal
apelo dentro da própria capital do império, Roma; e até uma distância de uma
milha romana para além de suas muralhas. Entretanto, nos tempos de Paulo, esse
direito se estendera a todos os cidadãos do império, em qualquer lugar onde se encontrassem.
Quanta coisa estava envolvida
nessa decisão de Paulo, de apelar para César? Isso é o que procuramos mostrar
nos cinco pontos abaixo:
1. De modo geral, precisam os admitir
que o apóstolo já entendera que a maré se voltara contra ele nesse caso, e que
Festo talvez estivesse começando a acreditar em algumas das acusações dos
judeus, ou pelo menos, que não se dispunha a entrar em choque com eles, por
causa de um mero prisioneiro.
2. Assim sendo, é perfeitamente
possível que Festo, a fim de desembaraçar-se de tão complicado caso, quisesse
entregar Paulo à discrição do sinédrio, o que teria sido fatal para o apóstolo.
3. Depois de ter passado por m
ais de dois anos aprisionado em Cesareia, o apóstolo já perdera toda a esperança
de encontrar justiça ali. Só lhe restava o recurso de esperar que um julgamento
mais imparcial lhe fosse proporcionado em Roma, perante o tribunal supremo de
César.
4. Após tão longo período de
aprisionamento, o apóstolo já havia perdido a paciência. Aqueles que têm
sofrido prolongados períodos de encarceramento, geralmente expressam o
desespero que acompanha esses julgamentos sempre adiados. Paulo não tolerava mais
adiamentos, e assim resolveu provocar alguma forma de mudança nessa situação.
5. Desde há muito o apóstolo dos
gentios desejava conhecer Roma, tendo recebido a promessa, da parte do próprio
Senhor Jesus, que isso sucederia finalmente. (Ver Atos 23:11). E possível que
agora Paulo encarasse esse apelo como um a maneira providencial de garantir
essa viagem, embora sem dúvida preferisse muito mais poder chegar na capital do
império romano na qualidade de homem livre, e não como prisioneiro. No trecho
de Atos 28:19, Paulo se refere à atitude que tomou nesta ocasião como algo a
que fora constrangido, e não voluntariam
ente.
Viajar a Roma, para ali ser julgado pelo tribunal de César, era
financeiramente pesado, enfadonho e uma perda de tempo. Todavia, aparentemente
não havia outra maneira de sair Paulo do dilema em que se encontrava. “Essa lei
(do apelo a César) era tão sagrada e imperativa que, nas perseguições contra o
cristianismo que houve durante o reinado de Trajano, Plínio não se atrevia a
executar os cidadãos romanos que porventura se tivessem tornado cristãos.
Assim, em sua carta Trajano (Lib. x. Ep.
97), diz ele: ‘Fuerunt alli
similis amentiae, quos, quia civis Romani erant, annotavi in urbem remittendos’,
cujo sentido é: ‘Houve outros culpados de loucura semelhante, aos quais,
descobrindo eu serem cidadãos rom anos, determinei enviá-los à cidade (Roma).’
Mui provavelmente esses são os que haviam feito apelo a César”. (Adam Clarke,
em Atos 25:11).
O imperador Nero, “...para César...” O César do tempo do
aprisionamento do apóstolo Paulo era Nero, o qual foi imperador de 54 a 68 D.C.
Nero era o trineto de Augusto, por meio de sua mãe. F ora adotado por Cláudio,
o imperador anterior,' como seu herdeiro. Nero era filho de uma distinta
família da antiga aristocracia romana, os Domitti, Foi o último César por hereditariedade, porquanto
os imperadores que houve depois de Nero não eram membros dessa família. “Cesar”
era o sobrenome de Júlio César. E mais tarde esse nome foi aplicado como título
aos outros membros dessa família que governou o gigantesco império romano, título
esse que também foi adotado pelos subsequentes imperadores romanos, ainda que
não pertencessem a essa dinastia.
Nero fez chegar ao ponto final a hegemonia de
sua família devido às suas inúmeras atrocidades, que destruíram o prestígio da
família. Ele mesmo terminou por suicidar-se, em 68 D.C., por causa das revoltas
que estouraram em Roma, por sua causa. Após a sua morte prematura, surgiram
lendas em várias localidades a seu respeito, incluindo a ideia de diversas
reencarnações. Alguns cristãos primitivos emitiram a opinião de que o futuro
anticristo seria um a reencarnação de Nero, ideia essa que tem reaparecido nos
tempos m ais recentes, como nos escritos de um escritor como William R. Newell,
autor de vários comentários sobre livros canônicos do Antigo e do Novo
Testamentos. (Outros, porém, têm pensado que o anticristo será uma reencarnação
de Judas Iscariotes, suposição essa que
tem sido apoiada por uma autoridade não menor que a do dr. M.R.