“A luz resplandece nas trevas...” — João 1:5

ESTUDOS BIBLICOS, TEOLOGIA, EVANGELHO
João 1:5 Aqui encontramos outra das palavras chaves de João: a palavra trevas (skotos, skotia). Esta palavra trevas aparece sete vezes no Evangelho. Para João, no mundo havia trevas que eram tão reais como a luz.

(1) As trevas são hostis à luz. A luz resplandece nas trevas, mas, por mais que se esforcem, as trevas não podem extingui-la. O homem pecador ama as trevas e odeia a luz, porque esta mostra muitas coisas. Pode acontecer que aqui houvesse um pensamento que João tomou emprestado. Sabemos que João estava disposto a sair e adotar idéias novas, se com isso podia apresentar e recomendar a mensagem cristã aos homens.

Nesta época a grande religião oriental, o zoroastrismo, a religião persa, exercia uma forte influência sobre o pensamento dos homens. Este sustentava que no universo havia dois grandes poderes antagônicos, o deus da luz e o deus das trevas, Aúra-Masda e Arimã. Todo o universo era um campo de batalha neste conflito eterno, cósmico, entre a luz e as trevas. E a única coisa que importava na vida era o lado que o homem escolhia.

De maneira que João está dizendo: “A este mundo vem Jesus, a luz do mundo; há algumas trevas que queriam eliminá-lo, desterrá-lo da vida, extingui-lo. Mas em Jesus há um poder invencível. As trevas podem odiá-lo, mas jamais podem livrar-se dele”. Como se disse com o maior acerto: “Todas as trevas do mundo não podem extinguir a chama mais ínfima”.

No final, a luz inconquistável derrotará as trevas hostis. João está dizendo: “Escolha o seu lado no conflito eterno e escolha bem”.

(2) As trevas representam a esfera natural de todos aqueles que odeiam o bem. Quem teme a luz são os homens cujas obras são más (3:19-20). O homem que tem algo a esconder, odeia a luz e ama a escuridão; mas é impossível esconder algo de Deus. A tocha de Deus varre com as sombras e ilumina os males do mundo. (3) Em algumas passagens as trevas parecem representar à ignorância, em particular aquela ignorância que rechaça a luz do Jesus Cristo. Jesus disse: “Eu sou a luz do mundo; quem me segue, não andará em trevas” (8:12). Diz a seus discípulos que a luz só estará com eles por pouco tempo: devem andar nela; se não o fizerem, vêm as trevas e quem anda em trevas não sabe para onde vai (12:35). Diz que veio com sua luz para que os homens não permaneçam em trevas (12:46). Sem Jesus Cristo nenhum homem pode encontrar ou ver o caminho. É como um homem que tem os olhos vendados ou até como um cego. Sem Jesus Cristo a vida se perde. Foi Goethe quem clamou: “Luz, mais luz!”

Um dos velhos líderes escoceses disse a seus amigos ao chegar ao fim: “Acendam a vela, para que possa ver para morrer”. Jesus é a luz que mostra o caminho ao homem e que ilumina o caminho a cada passo.

Em algumas ocasiões João emprega esta palavra trevas de maneira simbólica. Está acostumado a usá-la para significar algo mais que a mera escuridão de uma noite terrena. Relata o milagre de Jesus quando caminhou sobre as águas. Diz como os discípulos embarcaram no bote e cruzavam o lago sem Jesus; e logo diz: “Já se fazia escuro, e Jesus ainda não viera ter com eles” (6:17). Sem a presença de Jesus a única coisa que havia era a escuridão ameaçadora. Fala da manhã da ressurreição e das horas que passaram antes de que aqueles que o tinham amado percebessem que tinha ressuscitado dentre os mortos.

Começa o relato assim: “No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao sepulcro de madrugada, sendo ainda escuro” (20:1). Nesse momento estava vivendo em um mundo do qual acreditava que Jesus tinha sido banido, e um mundo desse tipo era escuro. João relata a história do Última Ceia. Conta como Judas recebeu o suborno e depois saiu a fazer sua obra terrível e a fazer os acertos para trair a Jesus; e ao contar a história, diz João com um simbolismo imponente: “Ele, tendo recebido o bocado, saiu logo. E era noite” (13:30). Judas saía de noite de uma vida que tinha traído a Cristo. Para João, uma vida sem Cristo era uma vida em trevas.

As trevas representam a vida sem Cristo, e em particular a vida que deu as costas a Cristo. Antes de abandonar esta passagem devemos notar outra coisa mais. Em grego, a palavra que nós traduzimos por extinguir é katalambanein. Esta palavra pode ter três significados:

(a) Pode querer dizer que as trevas nunca compreenderam a luz. Há um sentido em que o homem do mundo não pode compreender as exigências de Cristo e o caminho que lhe oferece. Parece-lhe uma insensatez total.

O homem não pode compreender a Cristo até que não se submete a Ele.

(b) Pode significar que as trevas nunca venceram a luz. Katalambanein pode significar perseguir até que alguém vença e assim domine e supere. Isto poderia significar que as trevas do mundo tinham feito todo o possível para eliminar a Jesus Cristo, inclusive o tinham crucificado, mas jamais puderam destruí-lo. Esta poderia ser uma referência ao Cristo crucificado e conquistador.

(c) Pode empregar-se no sentido de apagar uma chama ou fogo. Neste sentido a tomamos nesta passagem. Embora os homens fizeram todo o possível para obscurecer e extinguir a luz de Deus em Cristo, não puderam apagá-la. A luz de Cristo continua resplandecendo em todas as gerações apesar dos esforços dos homens por extinguir a chama.

Fonte: O NOVO TESTAMENTO Comentado por William Barclay