Efésios 5: Significado, Devocional e Exegese

Efésios 5

Efésios 5 concentra e desdobra a parênese iniciada no capítulo anterior, traduzindo a alta cristologia de Ef 1–3 em um caminho de vida marcado por três “caminhadas”: “andar em amor” (5:2), “andar como filhos da luz” (5:8) e “andar com sabedoria” (5:15). O ponto de partida é o imperativo identitário “sede imitadores de Deus” (5:1), imediatamente ancorado no sacrifício de Cristo — “amou-nos e a si mesmo se entregou por nós como oferta e sacrifício a Deus, em aroma suave” — de modo que a ética não nasce de um moralismo abstrato, mas da participação na oferta do Filho. Assim, pureza no corpo e nas posses, verdade na fala e discernimento na convivência (5:3–7) são a forma coerente de uma vida que recebeu a graça: a velha lógica de trevas cede lugar ao “fruto da luz” — bondade, justiça e verdade — e ao despertar batismal que reorienta toda a existência à presença de Cristo (5:8–14).

O centro do capítulo articula sabedoria e espiritualidade: “vede cuidadosamente como andais” (5:15) convoca a remir o tempo e a conhecer a vontade do Senhor, enquanto o contraste “não vos embriagueis com vinho, mas sede cheios do Espírito” (5:18) funciona como dobradiça sintática e teológica. A vida cheia do Espírito ganha forma em quatro gestos contínuos — falar entre si com salmos, hinos e cânticos espirituais; cantar e salmodiar ao Senhor; dar graças sempre e por tudo; submeter-se mutuamente no temor de Cristo (5:19–21) —, mostrando que a plenitude do Espírito tem som de louvor, afeto de gratidão e forma social de deferência. A partir daí, a ética alcança a casa e inaugura o Haustafel: o matrimônio é lido à luz do mistério Cristo–Igreja (5:22–33), com a esposa ordenando-se “como ao Senhor” e o marido amando “como Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela”, a fim de santificá-la e apresentá-la gloriosa. Em síntese, Efésios 5 condensa a vida cristã em amor que se oferece, luz que discerne e sabedoria cheia do Espírito que canta, agradece e se submete — da assembleia ao lar — como expressão concreta do evangelho.

I. Estrutura e Estilo Literário

Efésios 5 organiza-se como uma parênese em três “caminhadas” que funcionam como colunas do capítulo — “andai em amor” (5:2), “andai como filhos da luz” (5:8) e “vede cuidadosamente como andais” (5:15) — culminando numa exortação-chave que comanda a sintaxe do trecho central: “sede cheios do Espírito” (plērousthe en pneumati, 5:18). A macroestrutura, portanto, progride do imperativo identitário (imitar a Deus e andar em amor, 5:1–7), à antítese luz/trevas (5:8–14), à sabedoria que discerne e ordena o tempo (5:15–21), e desemboca no início do Haustafel (código doméstico) com o par esposas/maridos (5:22–33; prepara 6:1–9). Em cada bloco, Paulo concatena mandatos e motivações com partículas inferenciais (oun, gar) e com inclusões lexicais que costuram as seções: o triplo peripateite (“caminhai”) marca as dobras do argumento e transforma a cristologia dos caps. 1–3 em ethos comunitário.

O estilo de 5:1–7 combina doxologia e léxico cultual com listas vício/virtude típicas da retórica helenístico-judaica. A abertura “sede imitadores de Deus” (mimētai tou theou) é imediatamente ancorada na oferta de Cristo: “amou e entregou-se… como oferta e sacrifício, aroma suave” (prosphoran kai thysian… eis osmēn euōdias), de modo que a tríade negativa “porneía, impureza, avareza” é rechaçada não por moralismo, mas por incongruência cultual: “como convém a santos”. A peça trabalha antíteses nítidas (ação de graças vs. “palavra torpe”) e repete sons e campos semânticos (a série porneía/akatharsía/pleonexía) para fixar na memória um mapa de fala, desejos e posses coerente com a oferta de Cristo.

A seção luz/trevas (5:8–14) emprega metáforas identitárias e uma pequena peça poético-litúrgica. O imperativo “andai como filhos da luz” é seguido por um predicativo ético em paralelismo ternário — “o fruto da luz consiste em bondade, justiça e verdade” — e por verbos de prova e desmascaramento (“provando o que é agradável ao Senhor”, “expondo as obras infrutuosas das trevas”). O clímax vem com um provável fragmento hínico/batismal (“Desperta, tu que dormes… e Cristo te iluminará”, 5:14), cuja cadência imperativa e binária (dormir/erguer, morte/iluminação) funciona como transição para a perícope sapiencial seguinte: a luz não é apenas identidade; é critério que desperta e reorienta.

Em 5:15–21, o estilo muda para a precisão da sabedoria: advérbios e contrastes (“cuidadosamente”, “não como néscios, mas como sábios”; “não vos embriagueis… mas sede cheios do Espírito”) ordenam o tempo e a vontade de Deus. Aqui, a sintaxe grega é determinante: o imperativo presente passivo plērousthe (“sede cheios”) governa quatro particípios que descrevem a vida cheia do Espírito como prática coral e cotidiana — falando (lalountes) entre vós com salmos, hinos e cânticos espirituais; cantando (adontes) e salmodiando (psallontes) ao Senhor no coração; dando graças (eucharistountes) sempre; submetendo-vos (hypotassomenoi) uns aos outros no temor de Cristo. Estes particípios criam uma cascata sonora (léxico musical), afetiva (gratidão) e social (submissão mútua) que, literariamente, faz ponte para o código doméstico subsequente: a última ação (“submetendo-vos”) funciona como dobradiça retórica para 5:22–6:9.

O par conjugal (5:22–33) mistura parênese doméstica greco-romana com alta retórica cristológica. Há paralelismo assimétrico e expansivo: a frase às esposas é breve e relacional (“submete-te… como ao Senhor”), enquanto a aos maridos se alonga em cristologia exemplificativa (“amai… como Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela”), com uma cadeia de infinitivos finalísticos que dão ritmo e finalidade: “para santificá-la… purificando… para apresentar a si mesmo Igreja gloriosa”. A metáfora Cabeça–Corpo funciona como matriz imagética, e o argumento culmina em citação tipológica de Gênesis 2:24 e na declaração “mistério grande” (mystērion mega): estilo que funde exegese de Escritura, teologia nupcial e ética doméstica. O fecho alterna pronome distributivo (“cada um de vós…”) e imperativo (“ame… respeite”), produzindo cadência memorável que sela a unidade entre forma e conteúdo: amor sacrificial e respeito ordenado como ícone do amor de Cristo.

Assim, em termos de estrutura e estilo, Efésios 5 é uma peça parenética de períodos bem articulados, anáforas estratégicas (“caminhai”), antíteses pedagógicas (amor/impureza; luz/trevas; vinho/Espírito) e transições sintáticas precisas (o imperativo “sede cheios” regendo os particípios). O capítulo canta enquanto exorta, e exorta enquanto canta: do altar (5:2) à assembleia (5:19–20) e da assembleia ao lar (5:22–33), a linguagem cultual, sapiencial e nupcial se entrelaçam para fazer da doutrina um caminho — amor que se entrega, luz que discerne, sabedoria que ordena, tudo sob a regência do Espírito e à imagem de Cristo.

II. Hebraísmos e o Texto Grego

Efésios 5 escreve grego com respiração hebraica. O imperativo-programa “sede imitadores de Deus” (mimētai tou theou, 5:1) verte para o koiné a velha imitatio Dei da Torá (“sede santos, porque eu sou santo”, Lv 19:2), e os três convites de caminhada — “andai em amor” (5:2), “andai como filhos da luz” (5:8) e “vede cuidadosamente como andais” (5:15) — traduzem em peripatein o verbo sapiente hebraico halak (“andar”, isto é, conduzir a vida diante de Deus). O resultado é uma ética de aliança, dita em grego elegante, mas com cadência de sabedoria bíblica: a doutrina se torna caminho.

A abertura cultual condensa hebraísmos léxicos clássicos. Cristo “amou e se entregou por nós como oferta e sacrifício a Deus, em aroma suave” (prosphora kai thysia… eis osmēn euōdias, 5:2), fórmula que ecoa a LXX para o hebraico רֵיחַ נִיחוֹחַ (rēaḥ nīḥōaḥ, “aroma aprazível”) de Levítico. O par prosphora/thysia e o sintagma osmē euōdias transportam, em chave cristológica, o culto do Antigo Testamento para o ato único do Filho. Em contraste, a tríade “porneia, impureza (akatharsia), avareza (pleonexia)” fala com vocabulário da pureza/impureza (טָמֵא/ṭāmēʾ) e com a crítica profética à cobiça — que Paulo identifica como idolatria (5:5), um semitismo conceitual: desejar como absoluto é adorar outro deus. Do mesmo campo brotam “herança” (klēronomia) e “reino”, categorias veterotestamentárias (נַחֲלָה/naḥălāh; מַלְכוּת/malkût) que Paulo reemprega para situar a pertença e o destino do povo sob “o reino de Cristo e de Deus”.

A antítese luz/trevas retoma uma imagética veterotestamentária e qumrânica (“filhos da luz”), agora expressa como identidade realizada “no Senhor”: “o fruto da luz é bondade, justiça e verdade” (5:9) junta ḥéṣed/ṣĕdāqāh/ʾĕmet (misericórdia/justiça/verdade) sob a metáfora agrícola cara aos profetas. A perícope culmina num provável fragmento hínico de tonalidade batismal — “Desperta, tu que dormes… e Cristo te iluminará” (5:14) — que costura ecos de Isaías (60:1; 26:19; 9:2) num verso grego lapidar. Aqui, o hebraísmo é de imagem e de ritmo: despertar/erguer/iluminar são verbos da nova criação, agora postos na boca de um cântico da Igreja.

A seção sapiencial (5:15–21) reescreve Provérbios em koiné, com contrastes binários (“não como néscios, mas como sábios”) e o hebraísta “remir o tempo” (exagorazomenoi ton kairon) que trata o dia como bem a ser resgatado para Deus. O clímax “sede cheios do Espírito” (plērousthe en pneumati, 5:18) convoca a tradição bíblica do “encher-se” do Espírito (Êxodo 31:3; Miqueias 3:8) e, sintaticamente, governa quatro particípios que descrevem a vida cheia do Espírito: falando com salmos, hinos e cânticos espirituais; cantando/salmodiando ao Senhor; dando graças (eucharistountes) “sempre e por tudo”; submetendo-vos uns aos outros “no temor de Cristo”. O léxico musical e cultual puxa o Saltério para dentro da assembleia cristã, enquanto o “temor” (phobos) mantém acesa a sabedoria de yirʾat YHWH (“temor do Senhor”) em chave cristológica.

No Haustafel (5:22–33), o hebraísta Paulo alia parênese doméstica greco-romana a tipologia de aliança. O amor do marido “como Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela” (5:25) reapresenta o Servo sofredor (Is 53) em prosa apostólica. A santificação da esposa-Igreja “pela lavagem de água com a palavra” (tō loutrō tou hydatos en rhēmati, 5:26) combina o banho nupcial com as promessas de purificação de Ezequiel 36:25 e o poder vivificador da Palavra (cf. João 15:3; Tt 3:5). A citação de Gênesis 2:24 culmina na confissão “mistério grande” (mystērion mega, 5:32): o matrimônio, instituído na criação, é lido como sinal sacramental do amor nupcial Cristo–Igreja. Em grego, a metáfora Cabeça–Corpo (kephalē–sōma) dá forma à eclesiologia dos caps. 1–4; em hebraico, ela preserva a lógica da aliança: cabeça que serve, corpo que se ordena, ambos destinados à comunhão.

Mesmo nos detalhes, o texto grego guarda colorido semítico: “filhos da desobediência” (5:6) e “filhos da luz” (5:8) são hebraísmos de filiação ética; “não entristeçais o Espírito” (4:30 em continuidade temática) dialoga com Isaías 63:10; o agradecimento constante é a contraface da “palavra torpe”, conforme Provérbios, e a exortação sobre vinho vs. Espírito ecoa a contraposição profética entre entorpecimento e lucidez dada por Deus. Assim, Efésios 5 conjuga categorias do culto (oferta, aroma, lavagem), imagens proféticas (luz, despertar, purificação), sabedoria prática (andar, remir o tempo, temor) e tipologia nupcial (Gênesis 2) numa dicção grega precisa e musical. O hebraísta escreve como helenista maduro: a alma da Escritura dá o tom; o koiné fornece a afinação — e a Igreja aprende a andar em amor, como filhos da luz, cheios do Espírito.

III. Esboço de Efésios 5

A. Imitação de Deus e “caminhar em amor” (5:1–7)
a. “Sede imitadores de Deus” e “andai em amor” à semelhança de Cristo que se entregou em oferta e sacrifício (5:1–2)
b. Exclusão de imoralidade sexual, impureza, cobiça e linguagem indecorosa; em seu lugar, ação de graças (5:3–4)
c. Razões teológicas: herança e reino excluem o idólatra/cobiçoso; não ser enganado — a ira vem sobre os “filhos da desobediência” (5:5–7)

B. “Caminhar como filhos da luz” (5:8–14)
a. Identidade transformada: outrora trevas, agora luz no Senhor (5:8a)
b. Fruto da luz: bondade, justiça e verdade; discernir o que agrada ao Senhor (5:8b–10)
c. Não participar das obras infrutuosas das trevas, mas expô-las (5:11–13)
d. Chamado hínico ao despertar: “Desperta… e Cristo te iluminará” (5:14)

C. Sabedoria prática e plenitude do Espírito (5:15–21)
a. Andar cuidadosamente: remir o tempo; compreender a vontade do Senhor (5:15–17)
b. Contraste: não embriaguez com vinho, mas ser cheio do Espírito (5:18)
c. Quatro marcas da vida cheia do Espírito:
d. falando entre vós com salmos, hinos e cânticos espirituais;
e. cantando e salmodiando ao Senhor no coração;
f. dando graças sempre e por tudo;
g. submetendo-vos uns aos outros no temor de Cristo (5:19–21)

D. O matrimônio à luz do mistério Cristo–Igreja (5:22–33)
a. Esposas: ordenar-se aos maridos “como ao Senhor”, à imagem da relação Igreja–Cristo, Cabeça (5:22–24)
b. Maridos: amar a esposa “como Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou”, visando sua santificação e beleza (5:25–27)
c. Amar “como ao próprio corpo”; ninguém odeia a própria carne — Cristo nutre e cuida do seu corpo (5:28–30)
d. Fundamento criacional e sentido tipológico: Gn 2:24 e o “mistério grande” aplicado a Cristo e à Igreja; síntese ética: amor do marido e respeito da esposa (5:31–33)

IV. Versículo-Chave

Efésios 5:2

Andai em amor, como também Cristo vos amou e a si mesmo se entregou por nós, como oferta e sacrifício a Deus, em aroma suave.

Este versículo concentra o coração de Efésios 5: a ética cristã nasce do amor autodoado de Cristo e toma a forma de caminhada. “Andai” (peripateite) traduz a vida inteira como percurso; “em amor” define a atmosfera; e o padrão é objetivo: “como Cristo… se entregou”. O léxico cultual — prosphora/thysia… osmē euōdias (“oferta/sacrifício… aroma suave”) — ancora toda a parênese na cruz como culto perfeito, de onde decorre a coerência com a santidade (5:3–7), a passagem de trevas para luz (5:8–14), a sabedoria que remi o tempo (5:15–17) e a vida cheia do Espírito que canta, agradece e se submete mutuamente (5:18–21).

Assim, 5:2 é o eixo afetivo-teológico do capítulo: dá o modelo (o amor sacrifical de Cristo), o motivo (adoração a Deus) e o modo (caminhar). Até o código doméstico (5:22–33) se curva a ele: o marido é chamado a amar “como Cristo amou a Igreja” (5:25), desdobramento direto de 5:2. Se 5:18 (“sede cheios do Espírito”) descreve a energia que sustenta a vida cristã, 5:2 fornece o desenho que toda a vida deve copiar — imitar a Deus (5:1) andando no amor com o cheiro da oferta de Cristo.

V. Intertextualidade com o Antigo e o Novo Testamento

Efésios 5 tece sua exortação com fios longos da Torá, dos Profetas, dos Escritos e do próprio Novo Testamento, convertendo a alta cristologia da carta em caminho de santidade. O chamado inicial — “sede imitadores de Deus” (mimētai tou theou, 5:1) — verte para o koiné a antiga imitatio Dei da Lei: “sede santos, porque eu, o SENHOR, sou santo” (Levítico 19:2), reouvida no NT em “sede perfeitos” (Mateus 5:48) e “santos em todo procedimento” (1 Pedro 1:15–16). Quando Paulo manda “andar em amor” (peripateite en agapē, 5:2), ele amarra o mandamento novo de Jesus (João 13:34–35) à forma do amor em 1 João 3:16 (“conhecemos o amor nisto: que ele deu a sua vida por nós”). A expressão cultual “oferta e sacrifício a Deus, em aroma suave” (prosphora kai thysia… eis osmēn euōdias, 5:2) recolhe a fórmula levítica do rēaḥ nīḥōaḥ (“aroma aprazível”, Lv 1–3) e a relê cristologicamente (Hebreus 10:5–10), como também dialoga com 2 Coríntios 2:15, onde a Igreja participa do “bom cheiro de Cristo”.

Na sequência, a lista vício/virtude (5:3–7) é uma reescritura ética da aliança. A tríade “porneiaakatharsiapleonexia” (imoralidade sexual, impureza, cobiça) ecoa a gramática de pureza/impureza do Pentateuco e a denúncia profética da avareza; quando Paulo declara que a cobiça é “idolatria” (5:5), ele sintetiza o décimo mandamento (Êxodo 20:17) e o primeiro, apontando com Col 3:5 que desejar como absoluto é adorar outro deus. A advertência sobre “herança” (klēronomia) e “reino de Cristo e de Deus” transcodifica a herança da terra (Josué 13-21; naḥălāh) em destino escatológico, em harmonia com 1 Coríntios 6:9-10 e Gálatas 5:19-21, e sob o pano de fundo régio de Daniel 7 (domínio entregue ao Filho do Homem).

A grande antítese luz/trevas (5:8–14) vive de Isaías e da tradição judaica dos “filhos da luz”. “O povo que andava em trevas viu grande luz” (Isaías 9:2) e “levanta-te, resplandece” (Isaías 60:1) estão por trás do “andai como filhos da luz” e do chamado a “provar o que é agradável ao Senhor”. O tripé “bondade, justiça e verdade” (5:9) alinha-se à tríade sapiencial-profética de ḥéṣed/ṣĕdāqāh/ʾĕmet (misericórdia, justiça, verdade; cf. Miqueias 6:8; Salmos 85:10–11). Expor “as obras infrutuosas das trevas” dialoga diretamente com João 3:20–21, onde a luz faz sair à tona as obras feitas em Deus. O provável fragmento hínico de 5:14 — “Desperta, tu que dormes… e Cristo te iluminará” — funde ecos de Isaías 26:19; 60:1 (despertar/erguer/iluminar) e conversa com a exortação de Romanos 13:11–14 a “despertar do sono” e “revestir-se do Senhor Jesus Cristo”, sinal de que o texto já circulava em contexto batismal.

O bloco sapiencial (5:15–21) encena Provérbios em koiné: “vede cuidadosamente… remindo o tempo” (exagorazomenoi ton kairon) lembra Salmos 90:12 (“ensina-nos a contar os nossos dias”) e a diligência de Pv 4, enquanto “não vos conformeis, mas discerni a vontade do Senhor” (cf. Romanos 12:2) dá o eixo do juízo cristão. O contraste “não vos embriagueis com vinho… mas sede cheios do Espírito” (5:18) se apoia na crítica à embriaguez (Provérbios 20:1; 23:29–35) e mira a novidade pentecostal (Atos 2:13–18): não torpor, mas plenitude do Espírito. Sintaticamente, o imperativo plērousthe rege quatro particípios que descrevem a vida cheia do Espírito: falar entre si “salmos, hinos e cânticos espirituais”, cantar e salmodiar “ao Senhor”, dar graças “sempre e por tudo” (eco forte de 1 Tessalonisses 5:18), e submeter-se “uns aos outros no temor de Cristo” — este último participa da ética do serviço do próprio Cristo (Marcos 10:42–45; Filipenses 2:3–5) e prepara a transição para o código doméstico.

No Haustafel (5:22–33), Paulo costura Gênesis, Profetas e evangelho numa tipologia nupcial. A citação de Gn 2:24 fundamenta o vínculo conjugal, que Jesus já havia reafirmado (Mateus 19:5–6), e a chama “mistério grande” (mystērion mega, 5:32): o matrimônio criado é sinal do amor Cristo–Igreja. O amor do marido “como Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela” traduz Isaías 53 (o Servo que se entrega) em chave pastoral, enquanto a santificação “pela lavagem de água com a palavra” (tō loutrō tou hydatos en rhēmati, 5:26) junta Ezequiel 36:25-27 (purificação e Espírito), Jo 15:3 (“estais limpos pela palavra”) e Tito 3:5 (o “lavacro da regeneração”). A metáfora Cabeça–Corpo, já estrutural em Efésios 1-4 e paralela a Colossenses 1:18; 2:19, define papéis sem dissolver a assimetria: a cabeça que ama até se entregar, o corpo que se ordena ao amado; e o fecho “cada um ame… e a mulher reverencie” ecoa a sintaxe sapiencial do “temor do SENHOR”, agora cristologizada.

No conjunto, Efésios 5 orquestra Torá (santidade, aroma, herança), Profetas (luz, despertar, purificação), Escritos (Saltério e sabedoria), evangelhos (mandamento novo, ensino sobre o matrimônio) e cartas apostólicas (Pentecostes vivido, corpo sob a Cabeça), para formar uma ética do “andar” que é culto e vida: imitar a Deus no amor entregue, sair das trevas para a luz, remir o tempo com sabedoria e viver cheios do Espírito em louvor, gratidão e mútua submissão — da assembleia ao lar.

Efésios 5 afirma que a ética cristã nasce do culto perfeito de Cristo e toma a forma de uma caminhada configurada pelo amor. O comando programático “sede imitadores de Deus” (5:1) é imediatamente concretizado em “andai em amor” (5:2): Cristo “nos amou e a si mesmo se entregou por nós como oferta e sacrifício a Deus, em aroma suave” (prosphorá / thysía… osmē euōdías). Assim, a moral não é um sistema de méritos, mas a resposta grata ao sacrifício do Filho; imitar Deus é reproduzir o padrão do amor autodoado de Cristo. Por isso, a santidade que o capítulo exige não é ascetismo árido, e sim coerência cultual: quem foi alcançado pela oferta do Messias já pertence ao Deus santo.

Nesse horizonte, Efésios 5 redefine desejo, linguagem e posse. A tríade “porneia–impureza–cobiça” é desmascarada como incompatível com “os santos”, e a cobiça é chamada pelo seu nome teológico — idolatria (5:3–5). O critério do reino e da herança estabelece a gravidade: não se trata de etiqueta, mas de acesso ao domínio de Cristo e de Deus. Em contraste com a “palavra torpe”, a ação de graças (eucharistía) torna-se a gramática do coração: o discurso reconcilia-se com o culto. No mesmo movimento, a identidade é redita em termos de luz/trevas: outrora trevas, agora “luz no Senhor”, a comunidade produz o “fruto da luz” — bondade, justiça e verdade —, discerne o que agrada a Deus e expõe as obras infrutuosas das trevas. O chamado hínico “Desperta… e Cristo te iluminará” (5:14) traduz em chave batismal a passagem do sono para a vida; a ética é fruto de uma iluminação real.

A sabedoria que sustenta essa vida é prática e urgente: “vede cuidadosamente como andais… remindo o tempo, porque os dias são maus” (5:15–16). O centro pneumatológico do capítulo contrapõe torpor e plenitude: “não vos embriagueis com vinho… mas sede cheios do Espírito” (plērōsthe en pneumati, 5:18). Essa plenitude tem forma comunitária e litúrgica — falando entre vós salmos, hinos e cânticos espirituais; cantando e salmodiando ao Senhor no coração; dando graças sempre e por tudo; submetendo-vos uns aos outros no temor de Cristo (5:19–21). A eclesiologia de Efésios 1–4 reaparece aqui como prática: a Igreja amadurece na cadência de louvor, gratidão e mútua deferência; a espiritualidade genuína é coral, agradecida e socialmente ordenadora.

Essa ordem do Espírito invade a casa. O chamado à submissão mútua (5:21) desemboca no matrimônio como ícone do mistério Cristo–Igreja (5:22–33). A esposa se orienta ao marido “como ao Senhor”, e o marido ama “como Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela”, visando sua santificação “pela lavagem da água com a palavra”. A teologia do casamento é, portanto, cristológica e sacramental: a aliança criada (Gênesis 2:24) torna-se sinal histórico do amor nupcial do Redentor — “mistério grande” (mystērion mega). Amor sacrificial e respeito reverente não são papéis sociológicos arbitrários, mas desdobramentos do evangelho encenados no cotidiano.

Em síntese, Efésios 5 condensa a vida cristã em três movimentos que se implicam: andar em amor segundo o sacrifício de Cristo, andar como filhos da luz sob discernimento santo, e ser cheio do Espírito para uma existência de louvor, gratidão e submissão servil. O telos permanece cultual: tudo retorna a Deus “em aroma suave”. A alta cristologia dos capítulos iniciais desce ao chão da fala, do corpo, do tempo e da casa, formando um povo cuja adoração se traduz em ética e cuja ética devolve glória a Deus.

VI. Comentário de Efésios 5

Meu comentário expositivo sobre Efésios 5:22–33 sustenta que o código doméstico nasce do princípio anterior de submissão mútua e é moldado pelo evangelho: a submissão da esposa é relacional, voluntária e limitada por “como ao Senhor”, jamais legitimando pecado, abuso ou idolatria — obedece-se a Deus antes dos homens [Efésios 5:21–22; Atos 5:29; 1 Pedro 3:1–2]. “Cabeça” (kephalē) descreve a liderança do marido como responsável e nutridora, espelhando Cristo que governa e dá vida ao corpo; por isso o imperativo central ao marido não é “mandar”, mas amar como Cristo amou e se entregou pela igreja — amor sacrificial que busca o florescimento da esposa [Efésios 5:23, 25; João 13:34; Marcos 10:45; Filipenses 2:5–8]. O alvo desse amor é santificação: Cristo purifica a noiva “com a lavagem de água pela Palavra” (imagética batismal), e o cuidado do marido deve favorecer a santidade dela, não dificultá-la [Efésios 5:26; João 15:3; Ezequiel 36:25–27; Tito 3:5–7]. A meta escatológica é apresentar a igreja gloriosa, santa e sem defeito; o casamento cristão participa desse projeto como sinal vivo do evangelho [Efésios 5:27; Colossenses 1:22; Apocalipse 19:7–8]. Daí a ética concreta: o marido ama a esposa “como ao próprio corpo”, nutrindo e cuidando com ternura — como Cristo faz com a igreja — porque ambos são uma só carne [Efésios 5:28–30; Salmo 23; 1 Tessalonicenses 2:7–8; Gênesis 2:24; 1 Coríntios 7:4]. O vínculo conjugal remonta à criação e é elevado a mistério: desde Gênesis, “uma só carne” apontava para a união Cristo-Igreja, arquétipo que dá forma e finalidade ao matrimônio [Gênesis 2:24; Mateus 19:4–6; Efésios 5:31–32; Oseias 2:19–20; Apocalipse 21:2, 9]. A síntese prática fecha o ciclo: cada marido ame sua esposa como a si mesmo e cada esposa respeite seu marido — um dueto de amor e honra, sustentado pela graça e regulado pela palavra apostólica [Efésios 5:33; Colossenses 3:18–19; 1 Pedro 3:7; Provérbios 31:10–12].

Efésios 5:1 Sede, pois, imitadores de Deus,... (O “pois” conecta com 4:32: porque Deus nos perdoou em Cristo, imitá-lo é resposta filial. Mimētai = “copiadores do padrão”; a ética cristã é imitação do Pai revelado no Filho, não moralismo abstrato [Levítico 19:2; Mateus 5:48; 1 Pedro 1:15-16; Efésios 4:32].) como filhos amados; (A base da imitação é a adoção: imitamos não para sermos aceitos, mas porque já fomos “amados” e adotados [Efésios 1:5-6; 1 João 3:1]. Identidade gera comportamento.)

Efésios 5:2 e andai em amor,... (Vida inteira como “caminho” de amor — decisão contínua, concreta e custosa [João 13:34-35; Romanos 13:8-10].) como também Cristo nos amou... (Cristo é o critério e a medida do amor: referência objetiva, histórica, não sentimento vago [Romanos 5:8; Gálatas 2:20].) e se entregou a si mesmo por nós,... (Autoentrega substitutiva e voluntária do Servo: Ele dá a própria vida “por nós” — linguagem vicária [Marcos 10:45; João 10:11].) como oferta e sacrifício a Deus,... (Categoria cultual: Sua cruz cumpre e supera o sistema sacrificial, oferecendo obediência perfeita ao Pai [Salmos 40:6-8; Hebreus 10:5-10].) em aroma suave. (Eco da fórmula levítica para sacrifícios aceitos; a obra do Filho é plenamente agradável a Deus e, por isso, eficaz para nós [Levítico 1:9; Efésios 1:6].)

Efésios 5:3 Mas a impudicícia... (porneía: imoralidade sexual em geral; viola a aliança do corpo com Cristo [1 Coríntios 6:13-20].) e toda sorte de impurezas... (akatharsía: impureza moral ampla, interna e externa [Marcos 7:20-23].) ou cobiça nem sequer se nomeiem entre vós,... (Barra altíssima: nem normalizar, nem tratar levianamente; a cobiça (pleonexía) é apetite sem freio, raiz de idolatria [Colossenses 3:5; 1 Tessalonicenses 4:3-7].) como convém a santos;... (Conduta compatível com a identidade separada para Deus, recebida em Cristo [1 Pedro 1:14-16].)

Efésios 5:4 nem conversação torpe,... (aischrotēs/aischrologia; cf. sapros em 4:29 = fala “podre”: indecência verbal que corrói pessoas e comunidade [Tiago 3:6-10].) nem palavras vãs... (mōrología = falatório tolo, fútil, que banaliza o santo [Provérbios 10:19].) ou chocarrices,... (eutrapelía = troça obscena; espirituosidade perversa que ridiculariza o bem [Provérbios 26:18-19].) coisas essas inconvenientes;... (Impróprias ao culto e à comunhão dos santos.) antes, pelo contrário, ações de graças. (A boca que antes degradava, agora abençoa: gratidão reencena a realidade do evangelho [Colossenses 4:6; 1 Tessalonicenses 5:18; Mateus 12:36].)

Efésios 5:5 Sabei, pois, isto: (Solenidade apostólica: certeza moral.) nenhum incontinente,... (Sexualmente devasso; cf. porneia.) ou impuro,... (Vida contaminada por práticas e desejos contrários à santidade.) ou avarento,... (Apego possessivo que escraviza o coração.) que é idólatra,... (Avariça é culto a outro “deus” — dinheiro, prazer, eu [Mateus 6:24; Colossenses 3:5].) tem herança no reino de Cristo e de Deus. (Herdeiros vivem como herdeiros; persistência obstinada nesses vícios desmente a pertença ao Reino [1 Coríntios 6:9-10; Gálatas 5:19-21; Efésios 1:14].)

Efésios 5:6 Ninguém vos engane com palavras vãs;... (Há retóricas que relativizam o pecado (“não é bem assim”). Resistir à sedução do discurso vazio é ato de fidelidade [Isaías 5:20; Gênesis 3:1-5].) porque, por essas coisas, vem a ira de Deus sobre os filhos da desobediência. (A santidade divina reage contra o mal; a ira não é explosão caprichosa, é juízo santo contra o que destrói a criação e as pessoas [Romanos 1:18; Colossenses 3:6; 1 Tessalonicenses 1:10].)

Efésios 5:7 Portanto,... (Conclusão prática.) não sejais participantes com eles. (Separação não é isolamento social, mas não-cooperar com obras e ambientes que normalizam o mal [Salmo 1:1; 2 Coríntios 6:14-18; Efésios 5:11].)

Efésios 5:8 Pois, outrora, éreis trevas,... (Não “estáveis nas trevas”: éreis trevas — condição ontológica de alienação [Efésios 2:1-3; Colossenses 1:13].) porém, agora, sois luz no Senhor;... (Mudança de ser pela união com Cristo, a Luz do mundo [João 8:12; 1 Tessalonicenses 5:5].) andai como filhos da luz... (Coerência entre identidade e vida pública: refletir o Pai de luzes [Mateus 5:14-16; Tiago 1:17].)

Efésios 5:9 porque o fruto da luz consiste em toda bondade, e justiça, e verdade,... (Triádica ética: agathōsynē = benemerência ativa; dikaiosynē = retidão relacional; alētheia = integridade. Nota textual: alguns manuscritos trazem “fruto do Espírito”; o sentido permanece — a vida iluminada frutifica [Gálatas 5:22-23; Miqueias 6:8; Efésios 4:24].)

Efésios 5:10 provando sempre o que é agradável ao Senhor. (dokimazontes = testar, discernir pela prática; sabedoria cristã é discernimento vivido diante do Senhor [Romanos 12:2; Filipenses 1:9-10].)

Efésios 5:11 E não sejais cúmplices nas obras infrutíferas das trevas;... (Trevas “produzem” esterilidade; não colaborar com elas protege a igreja e o próximo [Romanos 13:12].) antes, porém, reprovai-as. (elenchete = expor, confrontar em amor, visando arrependimento e cura [Mateus 18:15; João 3:20-21; 2 Tessalonicenses 3:14-15].)

Efésios 5:12 Porque o que eles fazem em oculto,... (Pecado busca sombra; segredo alimenta vício [Provérbios 9:17-18].) o só referir é vergonha. (Não transformar denúncia em voyeurismo moral: discrição santa ao tratar do mal, sem conivência [1 Coríntios 5:1-2].)

Efésios 5:13 Mas todas as coisas,... (Mudança de cena.) quando reprovadas pela luz,... (A presença da luz — Cristo e sua verdade — traz à tona o real [João 1:5].) se tornam manifestas;... (O que é revelado pode ser tratado; a graça trabalha com a verdade, não com a negação [Salmo 51:6].) porque tudo que se manifesta é luz. (A luz não só expõe; ela transforma: aquilo que é trazido à luz pode tornar-se veículo de luz — testemunho de restauração [2 Coríntios 4:6; 1 João 1:7].)

Efésios 5:14 Pelo que diz: (Provável hino/colagem de Isaías 26:19; 60:1; 52:1 adaptados ao querigma cristão.) Desperta, ó tu que dormes,... (Chamado à vigilância espiritual; o sono moral é perigo real [Romanos 13:11-12].) levanta-te de entre os mortos,... (Linguagem de conversão e avivamento: sair da esfera de morte [Efésios 2:1-6].) e Cristo te iluminará. (O Ressuscitado é a Luz que dá direção e vida [Isaías 60:1-3; João 8:12].)

Efésios 5:15 Portanto, vede prudentemente como andais,... (blepete akribōs = examinem com precisão; vida atenta, não automática [Salmo 90:12].) não como néscios,... (O néscio ignora Deus e o tempo [Provérbios 1:7].) e sim como sábios,... (Sabedoria bíblica é habilidade de viver diante de Deus no aqui e agora [Colossenses 4:5; Tiago 3:13-17].)

Efésios 5:16 remindo o tempo,... (exagorazomenoi ton kairon = “resgatando o momento oportuno”: aproveitar cada oportunidade para o bem e para o evangelho [Colossenses 4:5; Gálatas 6:10].) porque os dias são maus. (Ambiente hostil exige urgência e vigilância; a maldade não é desculpa para inação, mas chamado à prontidão [1 Pedro 4:7; Eclesiastes 9:10].)

Efésios 5:17 Por esta razão,... (Conclusão de sabedoria.) não vos torneis insensatos,... (asynetoi = sem entendimento espiritual.) mas procurai compreender qual a vontade do Senhor. (Discernimento teologal: conhecer e praticar o querer de Cristo revelado nas Escrituras e aplicado pelo Espírito [Efésios 1:9; Romanos 12:2; Salmo 143:10].)

Efésios 5:18 E não vos embriagueis com vinho,... (A embriaguez é “cheio de” outra coisa: descontrole e quebra da sobriedade [Provérbios 20:1; 23:29-35].) no qual há dissolução, mas enchei-vos do Espírito,... (asōtia = devassidão que desperdiça; contraste de cheios: mandamento contínuo — “sede sendo cheios” — sob o governo do Espírito, que produz autocontrole e louvor [Atos 2:13-18; Gálatas 5:18,22-23].)

Efésios 5:19 falando entre vós com salmos,... (Dimensão horizontal do culto: a Palavra cantada habita a comunidade [Colossenses 3:16; Salmos 95; 150].) entoando e louvando de coração ao Senhor... (Dimensão vertical: canto sincero, do íntimo, não mera performance [João 4:23-24].) com hinos e cânticos espirituais,... (Variedade legítima de formas sob o mesmo Espírito; o conteúdo é Cristo, o efeito é edificação [Salmos 33:3].)

Efésios 5:20 dando sempre graças... (Ritmo da vida cheia do Espírito: gratidão constante, não intermitente [1 Tessalonicenses 5:18].) por tudo a nosso Deus e Pai,... (Deus soberano conduz todas as coisas para o bem; damos graças em tudo, e por tudo que Ele usa para cumprir Seus fins [Romanos 8:28; Filipenses 1:12].) em nome de nosso Senhor Jesus Cristo,... (Mediação e autoridade de Jesus orientam nossa gratidão e a tornam culto agradável [Colossenses 3:17; Hebreus 13:15].)

Efésios 5:21 sujeitando-vos uns aos outros no temor de Cristo. (Postura mútua de serviço humilde sob a reverência de Cristo: princípio-ponte que introduz as “tábuas domésticas” seguintes. Submissão aqui não é anulação da pessoa, mas priorização do outro por amor ao Senhor [Filipenses 2:3-5; Marcos 10:42-45; Efésios 5:22-33].)

B. O Modelo de Cristo para o Casamento (Efésios 5:22-33)

Efésios 5:22 As mulheres sejam submissas ao seu próprio marido,... (O verbo “submeter-se” decorre do v.21 — “sujeitando-vos uns aos outros” — e aqui se aplica à esposa para com seu próprio marido: trata-se de uma postura relacional e voluntária de ordem, lealdade e cooperação, não de inferioridade ontológica nem de silêncio forçado; limita-se à aliança matrimonial, não a “todos os homens” [Efésios 5:21; Colossenses 3:18; 1 Pedro 3:1-6].) como ao Senhor;... (A medida e o motivo são “ao Senhor”: a esposa serve a Cristo ao servir o marido — nunca o equipara ao Senhor; por isso, a submissão não abrange ordens pecaminosas, abuso ou idolatria: “antes, importa obedecer a Deus” [Atos 5:29; Atos 4:19; Gálatas 3:28].)

Efésios 5:23 porque o marido é o cabeça da mulher,... (“Cabeça”, kephalē, em Efésios combina liderança responsável e função fonte-nutridora: não tirania, mas direção sacrificial que visa o florescimento dela [1 Coríntios 11:3; 1 Pedro 3:7].) como também Cristo é o cabeça da igreja,... (O paradigma é Cristo: Sua “cabeça” governa e dá vida ao corpo; logo, qualquer exercício de liderança conjugal deve imitar o pastoreio de Cristo, não modelos seculares de domínio [Efésios 1:22-23; Colossenses 1:18].) sendo este mesmo o salvador do corpo. (Cristo salva, protege e sustenta Sua igreja; o marido não redime a esposa, mas sua liderança existe para o bem dela — proteção, provisão, cuidado, e não controle [João 10:11; Efésios 5:29].)

Efésios 5:24 Como, porém, a igreja está sujeita a Cristo,... (A sujeição da igreja é inteligente, amorosa e confiante; nasce da bondade do Senhor. Esse é o modelo da disposição da esposa em relação ao marido dentro da aliança [João 15:9-10].) assim também as mulheres sejam em tudo submissas ao seu marido. (“Em tudo” refere-se às esferas da vida conjugal ordinária — planos, economia, missão do lar — sempre salvaguardado pelo “ao Senhor” do v.22: nada que contrarie Cristo se impõe à consciência cristã [Atos 5:29; 1 Pedro 3:1-2].)

Efésios 5:25 Maridos, amai vossa mulher,... (Imperativo presente: amar continuamente. Paulo não manda “governar”, mas amar — o centro ético do papel do marido.) como também Cristo amou a igreja... (Padrão e medida do amor conjugal: o amor de Cristo, santo, paciente, fiel, que busca o bem do outro à custa de si mesmo [João 13:34; 1 João 3:16].) e a si mesmo se entregou por ela,... (Autoentrega vicária: a cruz define o tipo de liderança — sacrificial e servidora, não autorreferente [Filipenses 2:5-8; Marcos 10:45].)

Efésios 5:26 para que a santificasse,... (Finalidade do amor de Cristo: promover santidade — o crescimento real da igreja na vida de Deus; no lar, o amor do marido deve favorecer a santificação da esposa, não estorvá-la [Colossenses 1:28; 1 Tessalonicenses 4:3].) tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra,... (Imagem batismal: “banho de água com a Palavra” — o evangelho que limpa e inaugura a vida nova; a Palavra aplica o que o rito significa [João 15:3; Tito 3:5-7; Ezequiel 36:25-27].)

Efésios 5:27 para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa,... (Meta escatológica: Cristo prepara a noiva para Ele — igreja radiante, honrada, digna.) sem mácula,... (Sem mancha moral cultual — eco do vocabulário sacrificial [Levítico 22:20; Colossenses 1:22].) nem ruga,... (Sem sinais de decadência — juventude perene da nova criação.) nem coisa semelhante,... (Qualquer defeito é excluído na obra consumada.) porém santa e sem defeito. (Linguagem de consagração e integridade — o alvo do amor de Cristo é nossa santidade; o amor do marido coopera com esse projeto, nunca o sabota [Efésios 1:4; Apocalipse 19:7-8].)

Efésios 5:28 Assim também os maridos devem amar a sua mulher... (Conclusão prática: a teologia de Cristo gera ética conjugal.) como ao próprio corpo... (Porque no matrimônio ambos formam uma unidade orgânica; amar a esposa é amar a si mesmo na unidade do casal [Gênesis 2:24; 1 Coríntios 7:4].) Quem ama a esposa a si mesmo se ama. (Não é narcisismo; é reconhecimento da “uma só carne”: o bem dela é o seu bem [Mateus 19:5-6].)

Efésios 5:29 Porque ninguém jamais odiou a própria carne;... (Regra da experiência: é natural nutrir e cuidar do próprio corpo.) antes, a alimenta e dela cuida,... (ektrephō = nutrir, criar; thalpō = aquecer, acalentar; fala de provisão, proteção e ternura cotidianas.) como também Cristo o faz com a igreja;... (Cristo nutre e aquece Seu povo com Palavra, sacramentos e providência — modelo imediato para o marido [Salmo 23; 1 Tessalonicenses 2:7-8].)

Efésios 5:30 porque somos membros do seu corpo. (Fundamento da analogia: união com Cristo — a igreja é Seu corpo; o casamento aponta para essa união mística e dela recebe padrão de amor e comunhão [1 Coríntios 12:27; Efésios 1:22-23; João 15:1-5].)

Efésios 5:31 Eis por que deixará o homem a seu pai e a sua mãe... (Citação de Gênesis 2:24: o casamento é instituído por Deus na criação; requer priorização — a nova unidade supera a família de origem [Gênesis 2:24; Mateus 19:4-6].) e se unirá à sua mulher,... (proskollēthēsetai = “apegar-se firmemente”: pacto de aliança, fidelidade e exclusividade.) e se tornarão os dois uma só carne. (Unidade integral — corpo, afeto, projeto, espiritualidade — sacralizada por Deus e protegida contra adultério e dureza de coração [Malaquias 2:14-16; 1 Coríntios 6:16-20].)

Efésios 5:32 Grande é este mistério,... (mystērion = realidade outrora velada e agora revelada: o casamento, desde Gênesis, apontava para algo maior.) mas eu me refiro a Cristo e à igreja. (O arquétipo é o evangelho: a união Cristo-igreja dá sentido ao símbolo do matrimônio; isso não relativiza a ética conjugal, antes a eleva ao nível sacramental de testemunho [Oséias 2:19-20; Apocalipse 19:7-9; 21:2,9].)

Efésios 5:33 Não obstante, vós, cada um de per si também ame a própria esposa... (Aplicação final ao marido: amor concreto, perseverante, do tipo de Cristo — iniciativa, sacrifício, cuidado diário [Colossenses 3:19; 1 Pedro 3:7].) como a si mesmo,... (Retoma a “uma só carne”: o padrão é o cuidado de si, agora voltado a ela.) e a esposa respeite ao marido. (phobetai = reverenciar, honrar: reconhecimento da responsabilidade do marido sob Cristo, expresso em apreço, lealdade e apoio; longe de medo servil, trata-se de uma resposta ao amor cristiforme que abençoa o lar [Provérbios 31:10-12; Efésios 5:21].)

VIII. Devocional de Efésios 5

Efésios 5 convoca a igreja a “andar em amor” tendo Cristo como padrão: Ele “se entregou por nós” como oferta e sacrifício “em aroma suave”, linguagem que retoma o cheiro agradável do altar e mostra que o amor cristão é sacrificial, generoso e constante (Gênesis 8:21; Levítico 1:9; Romanos 12:1; 1 João 3:16; Filipenses 2:5). Esse amor se concretiza na santidade prática: imoralidade, impureza e cobiça (idolatria) não combinam com o Reino; não nos deixemos iludir por “palavras vãs”, pois por causa dessas coisas vem a ira de Deus (1 Coríntios 6:9–11; Colossenses 3:5). A história confirma o aviso: a tragédia em Sitim e o juízo que se seguiu, bem como o caso de Acã, expõem o fim amargo do pecado; por isso, “sai dela, povo meu” (Números 25:1 com 1 Coríntios 10:8; Josué 7:10–26; Apocalipse 18:4).

Quem foi feito “luz no Senhor” deve andar como filho da luz, provando o que agrada a Deus e reprovando as obras infrutíferas das trevas. A luz de Cristo nos guia e expõe, de modo que vivamos de forma íntegra, visível e útil ao mundo (João 8:12; 1 João 1:6–7; 2 Coríntios 6:14; Filipenses 2:15–16; Provérbios 4:18). Esse caminhar aparece como “fruto do Espírito em toda bondade, justiça e verdade”: não nasce do moralismo, mas da vida de Cristo em nós, que nos faz permanecer na videira e viver no Espírito (Gálatas 5:22–23; João 15:5; Romanos 8:9). É uma verdade que veste o coração, como um cinto que sustenta toda a armadura (Efésios 6:14).

Quando a fé cochila, Deus desperta: “Desperta, tu que dormes, levanta-te dentre os mortos, e Cristo te iluminará.” Aqui há mandamento, súplica e promessa que se encaixam: Deus ordena um novo coração, nós pedimos que Ele o crie, e Ele promete dá-lo (Ezequiel 18:31; Salmo 51:10; Ezequiel 36:26). A luz de Cristo traz conhecimento do Pai e do Filho, santificação real, consolo durável e promessa de glória (Mateus 11:25, 27; 1 Coríntios 1:30; Isaías 51:11; Apocalipse 3:21).

Por isso, “vede prudentemente como andais… remindo o tempo, porque os dias são maus.” Sabedoria é pisar com precisão à luz da Palavra, discernindo e aproveitando cada oportunidade para o bem, sem se deixar arrastar por exemplos que obscurecem o coração (João 12:35; Hebreus 5:12; 2 Coríntios 6:14; Jó 28:28). Viver assim não é rigorismo, é a inteligência do temor do Senhor.

A alternativa cristã à embriaguez é ser “cheio do Espírito”: o próprio Deus habita em nós, enche entendimento, vontade e afetos, e transborda em louvor, Palavra rica no coração e gratidão constante “ao Pai, em nome do Senhor Jesus Cristo” (1 Coríntios 6:19; Efésios 2:22; João 14:16–17; Atos 2:38–39; Colossenses 3:16; Hebreus 13:15). Quanto mais do Espírito, mais sobriedade, ordem e semelhança com Cristo.

No lar, a ética do amor se traduz em submissão mútua “no temor de Cristo”. A esposa se submete “como ao Senhor”; o marido ama “como Cristo amou a igreja” e Se entregou por ela, guiando com cuidado sacrificial e objetivo espiritual. O arquétipo vem da criação e aponta além dela: “um só corpo” em aliança, no qual honra, cuidado e santidade se abraçam (Gênesis 2:23–24; 1 Coríntios 11:3; 1 Pedro 3:1–6; Salmo 45:10–11).

O alvo de Cristo para a igreja explica Seu amor: Ele “a amou e a Si mesmo Se entregou por ela” para santificá-la e purificá-la “com a lavagem de água pela Palavra”, até apresentá-la “gloriosa, sem mancha nem ruga”, plenamente santa. A água do novo coração prometido, a Palavra que consagra e o zelo do Esposo que prepara a Noiva convergem nessa esperança (Tito 3:5; Ezequiel 36:25–27; João 17:17; 2 Coríntios 11:2; Judas 24).

Daqui brota a doçura da nossa união: “somos membros do Seu corpo.” Ele participa de nossas aflições, e nós participamos de Seus benefícios—justiça imputada, graça abundante e herança real; nEle recebemos de Sua plenitude e, com Ele, reinaremos (João 15:5; 1 Coríntios 6:17; Colossenses 1:19; João 1:16; Apocalipse 3:21).

Tudo isso é “um grande mistério”: o casamento aponta para a união Cristo–igreja, concebida no conselho eterno, revelada no Evangelho e destinada às bodas do Cordeiro. O Esposo divino toma para Si um povo, desposa-o em fidelidade e misericórdia, restaura a noiva caída e a chama ao banquete final (1 Timóteo 3:16; Colossenses 2:2; Efésios 1:9–10; Gênesis 2:23–24; Isaías 54:5; João 3:29; Oséias 2:19–20; Jeremias 3:14; Ezequiel 16:6–8; Apocalipse 19:6–9). Pela fé somos “desposados” com Cristo, frutificamos para Deus e guardamos a certeza de que aquele que nos recebe jamais nos lançará fora, antes superabundará em graça até que os frutos do Espírito amadureçam para Sua glória (Romanos 7:4; João 6:37; Romanos 5:20; Gálatas 5:22–23).

A. Andar em amor: o perfume de Cristo no cotidiano

“E andai em amor, como também Cristo nos amou e se entregou por nós, como oferta e sacrifício a Deus, em aroma suave” (Efésios 5:2). A vida cristã não é um conjunto de gestos esporádicos de bondade, mas uma caminhada contínua sob a forma do amor. Paulo não manda apenas “sentir” amor, mas “andar” nele — isto é, escolher, repetidamente, o caminho da entrega, porque Cristo nos amou primeiro e se deu a si mesmo por nós (1 João 4:10–11). O padrão não é a medida do nosso coração, mas a cruz; o alvo não é agradar aos homens, mas a Deus, diante de quem a entrega de Jesus foi “aroma suave”, eco das ofertas antigas que subiam como cheiro agradável ao Senhor (Gênesis 8:21; Levítico 1:9).

Quando Paulo diz que Cristo se ofereceu “como oferta e sacrifício”, ele nos lembra que a nossa salvação não repousa em compaixão abstrata, mas em substituição real: “O Senhor fez cair sobre ele a iniquidade de nós todos” (Isaías 53:6, 10), “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (João 1:29). Ele “nos amou e a si mesmo se entregou por nós” (Gálatas 2:20), “tendo-se oferecido a si mesmo, sem mácula, a Deus” (Hebreus 9:14). Este amor não foi sentimento, foi sacrifício: “o Filho do Homem… veio para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Marcos 10:45). Andar em amor, portanto, é viver cruciformemente, com a mente de Cristo que “a si mesmo se esvaziou… e humilhou-se” (Filipenses 2:5–8).

Mas Paulo acrescenta algo decisivo: Cristo se entregou “a Deus” — o destinatário último do amor prático é o Pai. Por isso, o amor cristão tem direção e discernimento: não é condescendência com o mal, é obediência que agrada a Deus (Colossenses 3:17, 23). O mesmo capítulo que manda “andar em amor” proíbe impureza, cobiça, palavras torpes (Efésios 5:3–4); é o eco do chamado antigo: “Sede santos, porque eu, o Senhor, vosso Deus, sou santo” (Levítico 19:2), confirmado por Jesus: “Se me amais, guardareis os meus mandamentos” (João 14:15). Assim, amor sem santidade vira licença; santidade sem amor vira dureza. Em Cristo, ambos se abraçam.

Como, então, andar em amor? Primeiro, recebendo do próprio Cristo o amor que devemos viver. O amor de Deus “é derramado em nosso coração pelo Espírito Santo” (Romanos 5:5). É fruto do Espírito, não da força de vontade: “O fruto do Espírito é amor” (Gálatas 5:22). Andar em amor é, portanto, andar no Espírito (Gálatas 5:16), mantendo-se junto da fonte por meio da Palavra e da oração (Salmo 1:2–3; Lucas 11:13). Sem essa seiva, até gestos belos perdem o perfume de Cristo.

Segundo, traduzindo amor em atos concretos. Paulo havia acabado de chamar a igreja ao perdão e à bondade, “perdoando-vos uns aos outros, como também Deus, em Cristo, vos perdoou” (Efésios 4:32). Amor que anda reconcilia: escolhe perdoar como fomos perdoados (Mateus 18:21–35; Colossenses 3:12–13). Amor que anda edifica com a língua: “Nenhuma palavra torpe saia da vossa boca, mas só a que for boa para edificação” (Efésios 4:29; Provérbios 15:1). Amor que anda trabalha e reparte: “trabalhe… para que tenha o que repartir com o que tem necessidade” (Efésios 4:28; Atos 20:35). Amor que anda cura ira antes do pôr do sol (Efésios 4:26; Salmo 4:4). É simples e custoso — como a cruz.

Terceiro, oferecendo a vida toda como culto perfumado. Se o sacrifício de Cristo foi “aroma suave” para Deus, o nosso chamado é responder entregando-nos como “sacrifício vivo, santo e agradável a Deus” (Romanos 12:1). Em Cristo, nossas pequenas entregas — tempo, escuta, recursos, intercessão —, ainda que imperfeitas, tornam-se aceitáveis (Hebreus 13:15–16; 1 Pedro 2:5). E, ao espalharmos esse amor, nos tornamos “o bom perfume de Cristo” no mundo (2 Coríntios 2:14–15), sinal de uma outra realidade.

Esse caminho tem um preço. Amar pessoas reais significa tocar feridas, suportar ofensas e abrir mão de direitos. “Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a sua vida por nós, e nós devemos dar a vida pelos irmãos” (1 João 3:16–18). Às vezes, dar a vida será não revidar; outras, será persistir em falar a verdade em amor (Efésios 4:15), mesmo quando é mais fácil calar; noutras, será carregar fardos alheios (Gálatas 6:2). A medida não é o merecimento do outro, é o amor que recebemos (Lucas 6:35–36). O Pai “faz nascer o seu sol sobre maus e bons”; quem foi alcançado por esse sol aprende a aquecer até os ingratos.

Andar em amor, porém, não é andar sozinho. Cristo é a Cabeça da igreja, e cada membro recebe dele graça para suprir o outro, “fazendo o aumento do corpo para sua edificação em amor” (Efésios 4:16). Na prática, isso significa transformar lares, equipes e igrejas em ambientes de aliança, onde o perdão é mais rápido do que a ofensa, a honra mais frequente do que a crítica, a hospitalidade mais natural do que o isolamento (Romanos 12:10–13; Hebreus 13:1–2). Onde essa cultura floresce, o mundo percebe que Jesus está vivo: “Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros” (João 13:34–35).

Se hoje você se sente seco para amar, volte à fonte. Contemple o Cordeiro que se entregou por você (João 1:29), deixe que o Espírito reavive em seu coração a certeza do perdão (Efésios 1:7; Romanos 8:15–16) e peça a Deus que faça seu amor “crescer e abundar… com conhecimento e toda a percepção” (Filipenses 1:9–11). Depois, escolha um passo concreto: uma ligação, uma reconciliação, um gesto de generosidade, uma palavra que edifica. Amor não é um pico emocional; é uma peregrinação diária sob a sombra da cruz, até o dia em que veremos Aquele cujo amor nos alcançou e nos transformou (1 João 3:2–3). Que o nosso caminhar, então, exale no mundo o mesmo perfume que subiu do Calvário como “cheiro suave” a Deus (Levítico 2:2; Efésios 5:2).

B. Não se deixem enganar: santidade real em um mundo de palavras vazias

“Porque bem sabeis isto: que nenhum impuro, ou devasso, ou avarento, que é idólatra, tem herança no reino de Cristo e de Deus. Ninguém vos engane com palavras vãs; porque por estas coisas vem a ira de Deus sobre os filhos da desobediência. Portanto, não sejais participantes com eles” (Efésios 5:5–7). O Espírito Santo não fala para nos constranger com moralismo, mas para nos salvar da autoilusão. O alvo é o reino — “uma herança incorruptível” (1 Pedro 1:4) — e o risco é real: pecados acariciados no coração e praticados sem arrependimento nos excluem dessa herança (1 Coríntios 6:9–10). A graça de Deus não nos acaricia na direção do precipício; ela “se manifestou… educando-nos para que, renunciando à impiedade e às paixões mundanas, vivamos… de modo sensato, justo e piedoso” (Tito 2:11–12).

Paulo nomeia três ídolos que seduzem em qualquer cultura: imoralidade sexual, impureza e avareza. A Bíblia inteira testemunha que a sexualidade é dom santo, reservado à aliança do casamento (Gênesis 2:24; Hebreus 13:4). Fora desse pacto, ela deixa de ser entrega para virar consumo; em vez de imagens de Cristo e da igreja, viramos consumidores de corpos (Efésios 5:3–4). José nos mostra o caminho da luz ao fugir da cama de Potifar: “Como pois cometeria eu tamanha maldade e pecaria contra Deus?” (Gênesis 39:9). Jesus aprofunda o diagnóstico ao nível do coração: o olhar cobiçoso já viola (Mateus 5:27–28). A “impureza” que muitos tratam como fraqueza inocente é fermento que leveda a massa toda (Gálatas 5:9; Tiago 1:14–15). O discipulado não é flertar com limites, é crucificar a carne (Gálatas 5:24).

A avareza, por sua vez, é idolatria porque desloca a confiança e o prazer do Deus vivo para aquilo que possuímos (Colossenses 3:5). Não é privilégio dos ricos; é o impulso de dizer ao ouro: “Tu és a minha esperança” (Jó 31:24–28). Jesus advertiu: “Não podeis servir a Deus e às riquezas” (Mateus 6:24). Zaqueu é o contraexemplo da graça verdadeira: tocado por Cristo, não racionalizou sua cobiça, mas a tratou com generosidade radical (Lucas 19:8–9). Quem diz “Deus conhece o meu coração” e mantém as mãos fechadas ainda não entendeu que o Reino reeduca afetos e hábitos (Atos 20:35; 2 Coríntios 9:7–8).

Por isso Paulo ordena: “Ninguém vos engane com palavras vãs.” Palavras vãs são sedutoras: revestem o pecado com eufemismos (“é só diversão”, “é a cultura da empresa”, “todo mundo faz”), apelam para uma graça barata que perdoa sem transformar (Judas 4), confundem tolerância com aprovação (Isaías 5:20). Mas a Palavra é clara: “por estas coisas vem a ira de Deus sobre os filhos da desobediência” (Efésios 5:6; Colossenses 3:6). A ira de Deus não é explosão caprichosa; é a resposta santa de quem ama a justiça e protege suas criaturas. Israel provou isso em Baal-Peor, quando a fornicação trouxe juízo (Números 25:1–9; 1 Coríntios 10:8). Acã provou isso ao cobiçar e ocultar despojos; sua história nos lembra que aquilo que escondemos não está oculto aos olhos de Deus (Josué 7:1, 10–26; Hebreus 4:13). “De Deus não se zomba; tudo o que o homem semear, isso também ceifará” (Gálatas 6:7–8).

“Portanto, não sejais participantes com eles.” Participar não é apenas praticar; é aprovar, aplaudir, normalizar (Romanos 1:32). O chamado é romper a comunhão com as obras, não com as pessoas: “Não vos associeis às obras infrutíferas das trevas; antes, reprovai-as” (Efésios 5:11). Isso exige coragem, compaixão e sabedoria: coragem para nadar contra a corrente; compaixão para restaurar quem caiu (Gálatas 6:1); sabedoria para discernir a própria fraqueza e fugir, como José, em vez de negociar com tentações (1 Coríntios 6:18; 2 Timóteo 2:22). Não é isolamento farisaico; é peregrinação santa: “Segui a paz com todos e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hebreus 12:14).

Tal advertência não nos deixa sem esperança. A mesma carta que ameaça o pecado anuncia um Salvador que perdoa e transforma. Em Corinto havia fornicadores, idólatras e avarentos; mas Paulo pôde dizer: “Tais fostes alguns de vós; mas fostes lavados, fostes santificados, fostes justificados no nome do Senhor Jesus Cristo e no Espírito do nosso Deus” (1 Coríntios 6:11). A mulher pecadora encontrou perdão e amor (Lucas 7:36–50). O homem apanhado em adultério ouviu: “Nem eu te condeno; vai, e não peques mais” (João 8:11). Se confessarmos, Deus é fiel e justo para perdoar e purificar (1 João 1:9). A graça não nos deixa onde nos encontrou; ela nos ensina a dizer “não” e nos dá poder para obedecer (Ezequiel 36:26–27; Romanos 8:13).

Como, então, responder hoje? Primeiro, examine-se à luz da Palavra, não de comparações convenientes (Salmo 139:23–24; Tiago 1:22–25). Nomeie pecados, não os perfume. Segundo, corra para Cristo com fé humilde; Ele é “nosso advogado junto ao Pai” e “propiciação pelos nossos pecados” (1 João 2:1–2). Terceiro, entre em práticas de luz: confissão, prestação de contas, limites concretos, disciplinas de coração e corpo (Provérbios 28:13; Tiago 5:16; Mateus 5:29–30). Quarto, substitua ídolos por adoração: satisfação em Deus no lugar da cobiça (Salmo 16:2, 11), pureza movida por amor a Cristo no lugar da impureza (2 Coríntios 11:2–3). Quinto, caminhe com o Espírito, que produz fruto novo onde havia espinhos (Gálatas 5:16, 22–24).

O texto termina com herança e ira — dois destinos que hoje se decidem no terreno dos afetos e hábitos. Como filhos amados, não participemos das trevas; “andemos como filhos da luz (porque o fruto da luz consiste em toda bondade, justiça e verdade), experimentando o que é agradável ao Senhor” (Efésios 5:8–10). O Pai não nos chama a menos do que a alegria do seu Reino (Romanos 14:17). Que ninguém nos engane com palavras vazias: o caminho estreito é, na verdade, o caminho livre — e, no fim dele, está o Rei que nos amou e nos lavou em seu sangue (Apocalipse 1:5–6).

C. Filhos da luz: viva o que você já é em Cristo

“Vós éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor; andai como filhos da luz” (Efésios 5:8). O chamado apostólico não é apenas “faça diferente”, mas “seja quem você já é em Cristo”. Antes, diz a Escritura, vivíamos num eclipse de entendimento, vontade e afeto: trevas que confundem o bem com o mal, que chamam amargura de doçura e doçura de amargura (Isaías 5:20). O “homem natural” não discerne as coisas do Espírito, porque elas se discernem espiritualmente (1 Coríntios 2:14). Não é só comportamento; é condição: caminhávamos “segundo o curso deste mundo” e “sem Deus no mundo” (Efésios 2:2; Efésios 2:12). Mas a graça irrompeu como aurora: “o povo que andava em trevas viu grande luz” (Isaías 9:2); o Pai “nos libertou do império das trevas e nos transportou para o Reino do Filho do seu amor” (Colossenses 1:13). Essa luz não é uma ideia, é uma Pessoa: “Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida” (João 8:12). Por isso Paulo não diz “agora tendes luz”, mas “agora sois luz no Senhor”: unidos a Cristo, participamos da sua vida, e sua luz, refletida em nós, torna-se nosso novo DNA (1 Pedro 2:9). Se isso é verdade, “ande como filho da luz”. A Palavra vira lâmpada para os pés, luz para o caminho (Salmo 119:105), e a vida começa a brilhar como “a vereda do justo, que é como a luz da aurora, que vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito” (Provérbios 4:18). “O fruto da luz consiste em toda bondade, justiça e verdade” (Efésios 5:9): bondade que se doa como o Bom Samaritano, justiça que trata o próximo com equidade, verdade que rejeita a duplicidade e fala com graça e firmeza (Miquéias 6:8; João 1:14). Andar na luz envolve comunhão e confissão: “se andarmos na luz, como Ele está na luz, mantemos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus nos purifica de todo pecado” (1 João 1:7). Luz expõe e cura; trevas escondem e adoecem. Por isso, “rejeitemos as obras das trevas e vistamo-nos das armas da luz… revesti-vos do Senhor Jesus Cristo” (Romanos 13:12–14). Não há aliança entre luz e trevas; não é orgulho, é coerência: “que comunhão pode ter a luz com as trevas?” (2 Coríntios 6:14). Isso inclui romper com práticas, ambientes e narrativas que normalizam a impureza, a cobiça e a mentira (Efésios 5:3–7), e também denunciar tais obras “não participando delas, mas antes reprovando-as” — não com arrogância farisaica, mas com a clareza e a compaixão de quem quer ganhar o irmão (Efésios 5:11; Gálatas 6:1). Como se anda assim, no concreto da semana? Primeiro, vivendo de olhos abertos: ore como Davi, “Sonda-me, ó Deus… e guia-me pelo caminho eterno” (Salmo 139:23–24). A luz do Espírito promete guiar cegos por veredas que não conheciam, tornando “trevas em luz” (Isaías 42:16). Segundo, deixando a Palavra ditar ritmo e rota, “retendo a palavra da vida” enquanto brilhamos “como luzeiros no mundo” (Filipenses 2:15–16). Terceiro, dependendo do Espírito para dizer não e dizer sim: “andai no Espírito e jamais satisfareis os desejos da carne” (Gálatas 5:16). O mesmo Espírito que expõe, frutifica: amor, alegria, paz… contra estas coisas não há lei (Gálatas 5:22–23). Quarto, lembrando que luz é missional: Jesus chamou você de “luz do mundo” para que, ao verem suas boas obras, glorifiquem o Pai (Mateus 5:14–16). Não é autopromoção; é translucidez. Talvez você se veja ainda com “cheiro de fumaça”, como “tição tirado do fogo” (Zacarias 3:2). Não desanime: a ordem de hoje não é “fabrique luz”, é “ande na luz que já o alcançou”. Se tropeçar, não esconda: confesse e levante; “quem encobre as suas transgressões jamais prosperará; mas o que as confessa e deixa alcançará misericórdia” (Provérbios 28:13). E se tudo parecer escuro, agarre a promessa: “Dai glória ao Senhor, vosso Deus, antes que faça vir as trevas… e converta a luz em densas trevas” (Jeremias 13:16). Levante-se, resplandeça, “porque vem a tua luz, e a glória do Senhor vai nascendo sobre ti” (Isaías 60:1–3). Hoje, pela fé, decida viver como quem já saiu da noite: a luz que começou em Cristo brilhará mais e mais, até que “o Senhor será a tua luz perpétua, e os dias do teu pranto findarão” (Isaías 60:19–20).

D. Fruto do Espírito: bondade, justiça e verdade no cotidiano

“Porque o fruto do Espírito está em toda bondade, e justiça, e verdade” (Efésios 5:9). Paulo acabou de lembrar que “vós éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor” e, por isso, devem “andar como filhos da luz” (Efésios 5:8). Ele então descreve como essa luz se torna visível: não por discursos brilhantes, mas por um caráter moldado pelo Espírito Santo em três direções inseparáveis — bondade, justiça e verdade. É o retrato moral do próprio Deus, cujas obras enchem a terra de sua bondade (Salmos 33:5), cujos caminhos são justiça (Deuteronômio 32:4) e cuja palavra é verdade (João 17:17). Seguir a Cristo é ser conformado a Ele, que veio “cheio de graça e de verdade” (João 1:14), e que, ungido pelo Espírito (Lucas 4:18), caminhou fazendo o bem (Atos 10:38).

Bondade é a disposição generosa que se inclina ao bem do outro simplesmente porque Deus é bom (Salmos 119:68). É mais do que simpatia; é ação concreta. O bom samaritano cruzou a rua, reteve agenda e abriu a bolsa (Lucas 10:33–35). A fé que o Espírito produz se torna “fé que opera pelo amor” (Gálatas 5:6), visita órfãos e viúvas nas suas tribulações (Tiago 1:27), reparte pão com o faminto e acolhe o pobre desamparado (Isaías 58:7). É por isso que Jesus nos chama de “luz do mundo”, para que vejam as boas obras e glorifiquem o Pai (Mateus 5:14–16). Se a nossa bondade termina em nós, é vaidade; se aponta para Deus, é fruto do Espírito.

Justiça é o compromisso de tratar pessoas, palavras e recursos de acordo com o padrão reto de Deus. Ela começa no coração e se estende às relações, ao trabalho, às finanças e às causas públicas. Miquéias resume: “praticar a justiça, amar a misericórdia e andar humildemente com o teu Deus” (Miquéias 6:8). O Evangelho nos liberta do egoísmo que supervaloriza meus direitos e minimiza os dos outros; pelo Espírito, passamos a “render a todos o que lhes é devido” (Romanos 13:7), a preferir o outro em honra (Romanos 12:10) e, quando lesados, a preferir sofrer o dano a praticá-lo (1 Coríntios 6:7). Assim a justiça se torna visível em contratos, compromissos e decisões diárias — não por medo de punição, mas por amor ao Justo que nos justificou (Romanos 3:26).

Verdade é a simplicidade sem máscara de quem anda na luz de Deus. Onde o Espírito governa, há integridade: “eis aqui um verdadeiro israelita, em quem não há dolo” (João 1:47). A verdade não é só falar certo; é viver coerente. Rejeitamos a duplicidade e a mentira (Efésios 4:25), mantemos palavra dada (Salmos 15:4) e buscamos que o interior corresponda ao exterior (Mateus 23:26). Andar “na verdade” significa permitir que a Palavra nos meça e molde (João 17:17), confessando pecados em vez de escondê-los (1 João 1:7–9) e ajustando a vida ao que Deus diz, ainda que custe reputação, lucro ou conforto (2 Coríntios 4:2).

Note que Paulo chama isso de fruto — não de performance. Fruto nasce de união: “sem mim nada podeis fazer” (João 15:5). O Espírito é quem vivifica (Efésios 2:5), escreve a lei no coração (Jeremias 31:33), derrama o amor de Deus em nós (Romanos 5:5) e nos fortalece “no homem interior” (Efésios 3:16). Por isso, a vida cristã não é moralismo autopropulsor; é dependência diária: Palavra como lâmpada (Salmos 119:105), oração como respiração (Lucas 11:13), comunhão como estufa onde o fruto amadurece (Hebreus 10:24–25). Quando a motivação é o aplauso humano, o máximo que se colhe é reputação (Mateus 6:1–2); quando a raiz é Cristo, o fruto é para Deus (Romanos 7:4).

Esse tripé também nos protege de falsificações. Bondade sem verdade vira sentimentalismo que aprova o que Deus reprova (Romanos 1:32). Verdade sem bondade degenera em dureza farisaica (Mateus 23:23). Justiça sem bondade e verdade pode se tornar milimétrica com o outro e complacente consigo (Mateus 7:1–5). O Espírito mantém as três juntas, como luz que é pura, inocente e benéfica (Filipenses 2:15–16). E, onde a luz chega, ela expõe e cura: “não tenhais comunhão com as obras infrutíferas das trevas; antes, reprovai-as” (Efésios 5:11). Isso começa dentro: “Sonda-me, ó Deus… vê se há em mim algum caminho mau” (Salmos 139:23–24). Depois alcança fora, sempre com mansidão de quem lembra que também foi tirado das trevas (Gálatas 6:1; Efésios 2:1–5).

Talvez você diga: “Vejo pouco desse fruto em mim.” A boa notícia é que Deus mesmo promete fazer do deserto um pomar (Isaías 32:15), plantar-nos “junto às águas” para que, no calor, a folha não murche e no ano de sequidão não deixe de dar fruto (Jeremias 17:7–8; Salmos 1:3). Volte-se para Cristo, permaneça nEle, e peça: “Cria em mim um coração puro” (Salmos 51:10); Ele se alegra em dar o Espírito aos que pedem (Lucas 11:13). E caminhe: a vereda do justo é progressiva (Provérbios 4:18). Hoje, escolha a boa obra escondida, a decisão justa custosa, a palavra verdadeira difícil. É assim, passo a passo, que a luz cresce, o fruto amadurece e o Pai é glorificado (João 15:8).

E. Desperta, levanta-te… e anda na luz

“Desperta, tu que dormes, levanta-te dentre os mortos, e Cristo te iluminará” (Efésios 5:14). Essa chamada junta mandamento e promessa: Deus ordena, e o mesmo Deus promete dar tudo o que ordena. A Escritura nunca opõe essas duas coisas. Ele diz: “Lançai de vós… as vossas transgressões e criai em vós um coração novo” (Ezequiel 18:31), o salmista transforma o mandamento em oração: “Cria em mim, ó Deus, um coração puro” (Salmos 51:10), e o próprio Deus responde: “Dar-vos-ei coração novo e porei dentro de vós espírito novo” (Ezequiel 36:26). Em Efésios 5:14, Paulo pinta o pecador como alguém que dorme em falsa segurança e como morto em impotência moral (Efésios 2:1–5). É o sono de Jonas em meio à tempestade (Jonas 1:5), a paz enganosa de quem esquece que “a noite é passada, o dia é chegado” (Romanos 13:11–12). Mas o mesmo Cristo que denuncia a sonolência promete acender a luz: “Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida” (João 8:12).

Despertar significa admitir que a indiferença espiritual é culpa, não azar, e que o coração sem Deus não está neutro, mas corrompido e incapaz de agradá-lo (Romanos 7:18; 1 Coríntios 2:14). Por isso o chamado vem com urgência: “Buscai o Senhor enquanto se pode achar” (Isaías 55:6–7). Ao obedecermos, não nos apoiamos em forças próprias; corremos a Cristo, pois “sem mim nada podeis fazer” (João 15:5). É nessa dependência que se cumpre a promessa: Ele nos dá luz — conhecimento, santidade, consolo e esperança.

Ele dá conhecimento, porque as coisas do Reino não se captam por gênio, mas por revelação. O Pai “escondeu estas coisas aos sábios e entendidos e as revelou aos pequeninos” (Mateus 11:25–27), e “da sua boca” vem sabedoria para o simples que clama (Provérbios 2:3–6; Salmos 25:9). A luz de Cristo abre os olhos, expõe ídolos, mostra a feiura do pecado e a beleza do Salvador (2 Coríntios 4:6).

Ele dá santidade. O Nome dele anuncia libertação: “Ele salvará o seu povo dos seus pecados” (Mateus 1:21). O que nos chama, também nos transforma: Cristo “foi feito por Deus… santificação” para nós (1 Coríntios 1:30). O que parecia invencível Ele lança “nas profundezas do mar” (Miquéias 7:19); o metal misturado Ele purifica (Isaías 1:25). Por isso o despertar continua em passos concretos: confessar, romper com as obras infrutíferas das trevas, andar como filhos da luz (Efésios 5:8–11; 1 João 1:7–9).

Ele dá consolo. Onde havia peso de culpa, Ele veste “de louvor em vez de espírito angustiado” (Isaías 61:1–3). O coração, antes inquieto, passa a provar “a paz de Deus, que excede todo entendimento” (Filipenses 4:7). E essa alegria supera os melhores prazeres terrenos: “Mais alegria me puseste no coração do que no tempo em que se multiplicam o seu trigo e o seu vinho” (Salmos 4:6–7; Salmos 84:10).

Ele dá glória. A luz que começa como alvorada termina em dia perfeito (Provérbios 4:18). O Pai não nega bem algum aos que andam na retidão (Salmos 84:11); aos que vencem, o Filho concede assentar-se com Ele no seu trono (Apocalipse 3:21). Hoje participamos “dos sofrimentos”, mas também “seremos glorificados com ele” (Romanos 8:17). E então valerá para sempre: “O Senhor será a tua luz eterna” (Isaías 60:19–20).

Se você percebe que tem “dormido”, não adie: “Ainda por um pouco a luz está convosco; andai enquanto tendes luz… crede na luz, para que sejais filhos da luz” (João 12:35–36). Responda ao mandamento com oração humilde, e à promessa com fé obediente. Trabalhe a sua salvação com temor e tremor, certo de que “Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar” (Filipenses 2:12–13). Desperte. Levante-se. Cristo — hoje, não amanhã — lhe dará luz.

F. Remindo o tempo em dias maus

“Vede prudentemente como andais, não como néscios, mas como sábios, remindo o tempo, porque os dias são maus” (Efésios 5:15–16). Paulo une duas ideias que nunca se separam na vida cristã: caminhar com sabedoria e tratar o tempo como algo que precisa ser resgatado, comprado de volta. O sábio bíblico não é o que sabe muitos conceitos, mas o que discerne a vontade de Deus e a ela se rende no concreto do dia a dia (Efésios 5:17). Por isso a Escritura nos ensina a contar os nossos dias para alcançarmos coração sábio (Salmos 90:12), lembrando que a vida é neblina que logo se dissipa (Tiago 4:14) e que “há tempo para todo propósito debaixo do céu” (Eclesiastes 3:1), mas nenhum tempo para a negligência da alma.

“Remir” o tempo supõe que ele tem sido roubado: por pecados acariciados, por distrações legítimas que viraram ídolos, por medos que nos paralisam ou por uma pressa ansiosa que nos empurra para todo lado, menos para Deus. Jesus viveu com senso de urgência santa: “Convém que eu faça as obras daquele que me enviou enquanto é dia” (João 9:4). Ele nos chama a manter as candeias acesas, cingidos e vigilantes (Lucas 12:35–40), a não deixar que os cuidados, riquezas e deleites desta vida sufoquem a Palavra (Lucas 8:14), a preferir “a boa parte” como Maria, que se assentou para ouvir o Senhor (Lucas 10:38–42). Quando Paulo diz “os dias são maus”, ele não nos convida ao pânico, mas à sobriedade: vivemos numa “era presente perversa” (Gálatas 1:4), em que a iniquidade se multiplica (Mateus 24:12), e por isso precisamos da armadura de Deus para resistir no dia mau (Efésios 6:13). Remir o tempo, então, é escolher, muitas vezes contra a corrente, aquilo que agrada ao Senhor (Efésios 5:10), provando todas as coisas, retendo o bem e abstendo-nos de toda forma de mal (1 Tessalonicenses 5:21–22).

Essa sabedoria é prática e se aprende com o próprio Deus. “Se alguém necessita de sabedoria, peça-a a Deus” (Tiago 1:5). Ele nos treina com imagens simples: a formiga que, sem chefe, prepara o verão (Provérbios 6:6–8); o prudente que prevê o mal e se esconde (Provérbios 22:3); o justo que pesa seus passos diante do Senhor (Provérbios 14:15–16). E Ele nos move por motivações profundas: fomos comprados por preço (1 Coríntios 6:20), portanto o nosso tempo já não é nosso; pertence Àquele que nos amou e se entregou por nós (Gálatas 2:20). O Evangelho não apenas perdoa o passado; ele também redime os minutos presentes e reorienta a agenda. Deus mesmo é capaz de “restituir os anos que foram consumidos” (Joel 2:25), e essa promessa nos impede de desesperar: arrependimento hoje, obediência hoje e fé hoje podem florescer onde só havia perdas.

Como isso se encarna? Remimos o tempo quando abrimos espaço diário para a Palavra e a oração, não como dever frio, mas como respiração da alma (Atos 2:42; Salmos 119:97). Remimos o tempo quando santificamos o Dia do Senhor, não por legalismo, mas para desfrutar, com a igreja, do descanso que antecipa a eternidade (Êxodo 20:8; Hebreus 10:24–25). Remimos o tempo no trabalho, fazendo tudo “de coração, como para o Senhor e não para homens” (Colossenses 3:23), e em casa, reconhecendo que as pequenas fidelidades são boas obras que Deus preparou para andarmos nelas (Efésios 2:10). Remimos o tempo nas provações, sabendo que tribulação produz perseverança, caráter aprovado e esperança (Romanos 5:3–5; Tiago 1:2–4). Remimos o tempo no amor prático, aproveitando as oportunidades para fazer o bem a todos, “principalmente aos da família da fé” (Gálatas 6:10), e ainda que já tenhamos desperdiçado muito, não nos entregamos à culpa estéril, mas, como Paulo, esquecendo das coisas que para trás ficam, avançamos para as que estão adiante (Filipenses 3:13–14).

Andar “circunspectamente” é andar com luz e temor diante de Deus. Não seguimos a multidão no mal (Êxodo 23:2), não chamamos de prudência o que é covardia nem de liberdade o que é laço. Exemplos nos atraem e pressionam; Demas amou o presente século e abandonou o apóstolo (2 Timóteo 4:10), mas Josué e Calebe discerniram e mantiveram outro espírito (Números 14:24). O circunspecto pergunta: “Isso é sábio? Isso edifica? Isso me aproxima de Cristo e do próximo?” (1 Coríntios 10:23–24). E quando cai, levanta-se depressa, porque sabe que cada queda sem arrependimento é tempo perdido; cada confissão é tempo resgatado (1 João 1:9; Salmos 32:5).

Por fim, remimos o tempo porque “agora é o tempo favorável, agora é o dia da salvação” (2 Coríntios 6:2). O amanhã pertence a Deus, o hoje é o nosso altar. Enquanto aguardamos o Reino, vive-se com as sandálias calçadas e a lâmpada acesa (Êxodo 12:11; Mateus 25:1–13). E quando a ansiedade pela agenda apertar, lembremo-nos: o Senhor não pede de nós onipresença nem onipotência; pede fidelidade no próximo passo. “Ensina-nos a contar os nossos dias, para que alcancemos coração sábio” (Salmos 90:12). Que Ele mesmo nos faça sábios para andar, vigilantes para orar, firmes para servir e livres para amar, até que o último minuto seja engolido pela luz do Dia perfeito (Provérbios 4:18; Isaías 60:19–20).

G. Cheios do Espírito para uma vida que canta e agradece

“Não vos embriagueis com vinho, no qual há dissolução, mas enchei-vos do Espírito; falando entre vós com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando de coração ao Senhor; dando sempre graças por tudo a Deus Pai, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo” (Efésios 5:18–20). Paulo contrapõe dois enchimentos que moldam a vida: o entorpecimento que desagrega (Provérbios 23:29–35; Isaías 5:11) e a plenitude do Espírito que integra, disciplina e transborda em adoração (Gálatas 5:22–23; 2 Timóteo 1:7). O chamado “enchei-vos” é presente contínuo: não é um pico isolado, mas um estilo de vida dependente, como um ramo que vive da seiva da videira (João 15:5). Deus prometeu colocar em nós um novo coração e o seu Espírito para nos fazer andar nos seus caminhos (Ezequiel 36:26–27), promessa ampliada por Joel (“derramarei do meu Espírito sobre toda a carne”, Joel 2:28–29) e inaugurada na igreja em Atos 2. Por isso, não é presunção pedir e esperar essa plenitude; é obediência confiante ao Pai que dá o Espírito aos que pedem (Lucas 11:13), e é marca básica de quem pertence a Cristo (Romanos 8:9).

A vida cheia do Espírito reorganiza nossa conversa, nossa música e nossa gratidão. Primeiro, transforma a maneira como falamos “entre nós”: o plural importa. A plenitude do Espírito não isola; constrói comunhão. Quando a Palavra de Cristo habita ricamente, ela sai pela boca para edificar o outro em salmos, hinos e cânticos espirituais (Colossenses 3:16; Hebreus 10:24–25). Isso não se limita ao culto, mas atravessa corredores, mesas e caminhos, como o salmista que fazia dos estatutos do Senhor as canções da sua peregrinação (Salmos 119:54). O povo cheio do Espírito fala o que é bom para edificação (Efésios 4:29), consola com promessas (Isaías 41:10), corrige com mansidão (Gálatas 6:1) e testemunha com ousadia (Atos 4:31).

Segundo, essa plenitude faz a alma cantar “ao Senhor”. Não é performance, é melodia do coração: “Cantai ao Senhor um cântico novo” (Salmos 96:1; Salmos 33:1–3). O Deus que nos tira do poço põe em nós um novo cântico (Salmos 40:1–3), e a igreja responde com louvor que é “sacrifício de lábios que confessam o seu nome” (Hebreus 13:15; 1 Pedro 2:5). O contraste é nítido: o vinho desinibe e espalha, mas a presença do Espírito ordena os afetos, alinha a mente e liberta para uma alegria sóbria que lembra o céu (Romanos 14:17). Se o coração está amargo, o Espírito nos conduz ao Evangelho até a doçura voltar (Salmos 103:1–5; Filipenses 4:4–7).

Terceiro, a plenitude se mostra numa gratidão invencível: “dando sempre graças por tudo”. Não é negar a dor; é reconhecer a mão do Pai em todas as coisas (Romanos 8:28; Gênesis 50:20). Jó pôde adorar ao perder quase tudo (Jó 1:20–21), Habacuque cantou entre figueiras secas e currais vazios (Habacuque 3:17–18), Davi aprendeu a dizer “Bendize, ó minha alma, ao Senhor” quando a alma estava caída (Salmos 42:5; Salmos 103:2). O Espírito nos ensina essa gramática da gratidão: nas vitórias e nos vales, no ordinário e no extraordinário (1 Tessalonicenses 5:16–18). E não agradecemos em nosso nome, mas “em nome de nosso Senhor Jesus Cristo”, pois é por meio dele que toda bênção chega e por meio dele que toda ação de graças sobe (João 14:13–14; Efésios 1:3; Hebreus 13:15).

Ser cheio do Espírito também significa ser guiado pela Escritura e conservado na ordem de Cristo. Por isso, provamos os espíritos (1 João 4:1), lembrando que “o espírito dos profetas está sujeito aos profetas” (1 Coríntios 14:32–33). Não buscamos êxtases que nos desviem da sobriedade e do amor; buscamos a presença que nos torna mais parecidos com Jesus: mais santos na vida cotidiana (Romanos 12:1–2), mais firmes contra o pecado que embriaga (1 Pedro 4:3–4), mais generosos no serviço (Gálatas 5:13). O mesmo Espírito que enche Bezalel de sabedoria para trabalhar com excelência (Êxodo 31:3) também enche Estêvão de coragem para testemunhar (Atos 7:55) e enche a igreja de perseverança na oração e na Palavra (Atos 2:42).

Como, então, buscamos essa plenitude? Arrependendo-nos do que nos entorpece (Provérbios 20:1; Romanos 13:13), pedindo com fé (Lucas 11:13), nutrindo-nos da Palavra (Salmos 1:1–3; Colossenses 3:16), permanecendo na comunhão dos santos (Atos 2:42), e obedecendo prontamente à vontade revelada (João 14:21). Deus não nos chama a um copo de água quando há um rio: “Quem crer em mim… do seu interior fluirão rios de água viva. Isto ele disse a respeito do Espírito” (João 7:37–39). O convite é a viver cheios para falar vida, cantar graça e agradecer sempre—até o dia em que a nossa canção se juntar à do Cordeiro e a gratidão não precise mais de fé, porque veremos face a face (Apocalipse 5:9–13; 1 João 3:2).

H. Aliança que espelha o Evangelho

“Submetendo-vos uns aos outros no temor de Cristo… Maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela… e as mulheres, respeitem o marido” (Efésios 5:21–33). Paulo trata o casamento não como um contrato utilitário, mas como um sacramento vivo do Evangelho: uma aliança visível que sinaliza a Aliança invisível entre Cristo e a Igreja. Por isso, ele começa com o solo onde tudo floresce: o “temor do Senhor”, que é o princípio da sabedoria (Provérbios 9:10). A mutualidade do versículo 21 estabelece o clima do lar: uma submissão recíproca que se traduz em serviço humilde (João 13:14–15) e busca do bem do outro acima do próprio (Filipenses 2:3–5). Nesse ambiente, papéis distintos não são armas de disputa, mas caminhos de amor.

Quando Paulo chama a esposa a submeter-se ao marido “como ao Senhor” (Efésios 5:22–24), ele não legitima tirania, mas convoca a confiança que brota de uma liderança semelhante à de Cristo. O padrão é a obediência da Igreja a Jesus, que não oprime, antes conduz à vida (Mateus 11:28–30). A submissão cristã é uma resposta livre e piedosa a uma autoridade que existe para servir (Marcos 10:42–45). E tem limites santos: se a ordem humana contraria a vontade de Deus, “importa obedecer a Deus antes que aos homens” (Atos 5:29). Em outras palavras, a esposa não rende sua consciência, mas oferece seu coração ao cuidado de um marido que a ama como Cristo ama sua Igreja.

Ao marido, a ordem é tão elevada quanto clara: “amai vossas mulheres, como também Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela” (Efésios 5:25). Aqui está a régua: amor sacrificial, voluntário, constante. Cristo desceu, esvaziou-se e deu a vida para santificar e apresentar a Igreja “gloriosa, sem mácula” (Filipenses 2:6–8; João 10:11; Hebreus 12:2). O marido ama assim quando renuncia ao ego, protege e provê sem amargura (Colossenses 3:19), honra a esposa como “coerdeira da graça da vida” para que suas orações não sejam impedidas (1 Pedro 3:7) e usa a força não para dominar, mas para nutrir e aquecer, “como o Senhor à Igreja” (Efésios 5:29). A liderança cristã em casa é lava-pés, não cetro de ferro (João 13:1–5).

Paulo descreve um processo: Cristo “santifica e purifica… com a lavagem de água pela palavra” (Efésios 5:26). O lar cristão participa dessa obra quando se abre à Palavra que limpa (João 15:3), ora junto, confessa pecados e perdoa (Tiago 5:16; Mateus 6:12), e pratica a disciplina da mesa, do culto doméstico e da comunhão com a igreja (Salmos 128; Atos 2:42). Essa “lavagem” lembra as promessas de Deus de aspergir água pura e dar um novo coração (Ezequiel 36:25–27) e o lavar regenerador do Espírito (Tito 3:5). Casamentos murcham quando a Palavra some; florescem quando Cristo habita ricamente entre nós (Colossenses 3:16).

A imagem de Gênesis retorna como fundamento: “deixa o homem pai e mãe, e se une à sua mulher, e serão ambos uma só carne” (Gênesis 2:24; Efésios 5:31). Deixar, unir, tornar-se um: prioridades são realinhadas, lealdades redefinidas, intimidade construída. Essa união exige exclusividade e fidelidade, honradas pelo próprio Deus que odeia o repúdio (Malaquias 2:14–16) e considera o matrimônio digno de honra e o leito sem mácula (Hebreus 13:4). Pureza sexual não é moralismo, é adoração: “esta é a vontade de Deus: a vossa santificação; que vos abstenhais da imoralidade” (1 Tessalonicenses 4:3–7). O erotismo, no pacto, vira cântico de alegria, como no Cântico dos Cânticos; fora dele, vira fogo que queima (Provérbios 6:27–29).

“Este mistério é grande” (Efésios 5:32): o casamento aponta para algo maior do que ele mesmo — as bodas do Cordeiro (Apocalipse 19:7). Por isso, o amor do marido deve catequizar a esposa sobre Cristo; e a reverência da esposa deve catequizar o marido sobre a Igreja. Quando ele se doa e a santifica, ele prega a cruz; quando ela confia e se oferece, ela prega a fé. E ambos, pecadores remidos, aprendem a se perdoar “como Deus, em Cristo, vos perdoou” (Efésios 4:32), praticando o amor que “tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (1 Coríntios 13:4–7).

Na prática, isso se traduz em hábitos santos: falar a verdade em amor (Efésios 4:15), ser tardio para se irar e pronto a ouvir (Tiago 1:19), cultivar mansidão e humildade que são preciosas diante de Deus (1 Pedro 3:4), e buscar consolo e direção no Senhor quando surgirem conflitos (Salmos 25:4–5). Submissão e amor não anulam a individualidade; redimem-na, convertendo potenciais atritos em harmonias. Quando preferimos um ao outro em honra (Romanos 12:10), conflitos deixam de ser guerras por poder e viram oficinas de santificação.

Importa dizer com clareza: o texto não protege abusos. A autoridade do marido é funcional e servil; qualquer uso de força, manipulação ou violência trai Cristo e requer disciplina e proteção pastoral e, se necessário, civil (Salmos 11:5; Romanos 13:1–4). Do mesmo modo, a submissão não é silêncio diante do pecado, mas fidelidade a Deus que pode incluir buscar ajuda e dizer “não” ao mal (Atos 5:29; Provérbios 31:8–9). A cruz não normaliza o mal; derrota-o.

Se o ideal parece alto, é porque o casamento cristão depende de graça. Não começamos com amor perfeito; aprendemos a amar porque “Ele nos amou primeiro” (1 João 4:19). O Espírito Santo, que sela e enche o crente (Efésios 1:13; Efésios 5:18), é quem produz paciência, bondade, domínio próprio (Gálatas 5:22–23) e nos capacita a viver o “como Cristo/como a Igreja” que Paulo traça. Por isso, casais devem pedir diariamente a ajuda do alto (Salmos 127:1), lembrando que a aliança que firmaram diante de Deus é lugar de missão: santificar um ao outro até o dia em que Cristo nos apresentar “gloriosos” (Efésios 5:27).

Ao final, Paulo resume: “o marido ame… como a si mesmo; e a esposa respeite o marido” (Efésios 5:33). Amor e respeito são as duas mãos que erguem o mesmo lar. O marido que ama como cabeça cura, guia e abençoa; a esposa que respeita como corpo responde, fortalece e embeliza. Juntos, caminham sob o senhorio de Cristo, antecipando no cotidiano as bodas eternas. Que o Senhor, que uniu os primeiros dois no Éden (Gênesis 2:22–24) e nos uniu a si mesmo pela cruz (Romanos 5:8), sustente nossos votos, cure nossas feridas e faça dos nossos lares pequenas parábolas do Reino, até o dia em que a Igreja, “adornada como noiva”, ouvirá: “Vinde!” (Apocalipse 21:2; Apocalipse 22:17).

I. Amor que santifica: o fim de tudo o que Cristo fez

“Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela, para a santificar, purificando-a com a lavagem de água pela palavra; para a apresentar a si mesmo Igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e inculpável” (Efésios 5:25–27). Aqui vemos o coração do Evangelho: o amor de Cristo não é apenas afeto; é ação que resgata, lava, forma e leva à glória. Ele não amou a Igreja porque ela já era bela; amou para torná-la bela. O Cordeiro se entregou, não somente para nos livrar da pena do pecado, mas para nos libertar do poder do pecado, restaurando em nós a imagem de Deus (Gênesis 1:26–27; Romanos 8:29).

Esse amor começa na cruz e segue operando hoje. Cristo “deu a si mesmo” como nosso fiador e sacrifício (Isaías 53:5–6; João 10:11; Hebreus 9:26–28). Mas o propósito da entrega é claramente moral e espiritual: “para a santificar”. A salvação não termina no perdão; ela progride em santificação e desemboca em glorificação (Romanos 8:30). Quem reduz a obra de Cristo a um simples “livre-se do inferno” trai a intenção do Noivo: Ele não apenas tira as roupas sujas; Ele prepara a Noiva para o casamento eterno (Apocalipse 19:7–8).

Paulo fala de “lavagem de água pela palavra”. O Antigo Testamento já unia água e promessa quando Deus disse: “Aspergirei água pura sobre vós… dar-vos-ei um coração novo” (Ezequiel 36:25–27). No Novo Testamento, Jesus falou de “nascer da água e do Espírito” (João 3:5), e os apóstolos anunciaram o “lavar regenerador e renovador do Espírito Santo” (Tito 3:5). A água aponta para o batismo, sinal visível da graça; a palavra aponta para o instrumento vivo pelo qual Deus cria e sustenta essa vida nova (João 15:3; 1 Pedro 1:23; Tiago 1:18). Onde a Palavra é ouvida com fé, o Espírito aplica o sangue do Cordeiro, limpa a consciência e começa a remodelar o coração (Hebreus 9:14; Hebreus 10:22).

Perceba também o alvo final: “apresentar a si mesmo Igreja gloriosa”. Desde o Éden, quando Deus trouxe a mulher ao homem (Gênesis 2:22–24), há uma apresentação solene de noiva. Em Cristo, a cena reaparece: Ele mesmo prepara, Ele mesmo apresenta, Ele mesmo se alegra com a beleza que Ele mesmo concedeu. Naquele Dia, a Igreja estará “sem mácula, nem ruga”, linguagem que aponta para pureza total e juventude perene; uma santidade não só forense (nossa justificação em Cristo), mas plenamente experimentada (nossa glorificação em Cristo) (Judas 24; Colossenses 1:22). O que hoje é luta contra pecados persistentes e rugas teimosas se tornará louvor perfeito, porque “Aquele que começou boa obra em vós a aperfeiçoará até ao Dia de Cristo” (Filipenses 1:6).

Essa visão molda a vida devocional e pastoral agora. Primeiro, nos chama a desejar santidade com a mesma intensidade com que Cristo a deseja para nós. Ele deu o próprio sangue “para nos remir de toda iniquidade e purificar para si um povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras” (Tito 2:14). Buscar santidade não é moralismo; é corresponder ao amor do Noivo. Quando oramos “seja feita a tua vontade”, pedimos exatamente o que Cristo comprou: um coração que ama o que Deus ama (Salmos 51:10; Mateus 6:10).

Segundo, nos chama a perseverar nos meios ordinários pelos quais Ele nos lava: a Palavra, os sacramentos, a oração e a comunhão dos santos. A Palavra limpa porque revela Cristo, confronta o pecado, consola o abatido e nos treina para toda boa obra (Salmos 19:7–11; 2 Timóteo 3:16–17). O batismo nos lembra que fomos unidos a Cristo em sua morte e ressurreição, para andarmos em novidade de vida (Romanos 6:3–4). A Ceia do Senhor nos mantém junto à cruz, nutrindo fé, esperança e amor até que Ele venha (Lucas 22:19–20; 1 Coríntios 11:26). A oração abre espaço para o Espírito aplicar a Palavra e conformar nossos desejos ao coração do Pai (Lucas 11:13; Romanos 8:26–27). E a comunhão da Igreja é a oficina onde Cristo, por meio de exortação e encorajamento mútuos, alisa nossas rugas e nos amadurece (Provérbios 27:17; Hebreus 10:24–25).

Terceiro, essa passagem cura dois enganos comuns. De um lado, o engano de quem busca “salvação” sem santidade: Cristo não morreu para nos manter cômodos no pecado, mas para nos libertar dele (1 João 3:8–10). De outro lado, o engano de quem persegue santidade sem Evangelho: não nos apresentaremos gloriosos por força própria; é Cristo quem nos lava, veste e apresenta (Zacarias 3:3–5; Efésios 2:8–10). A santificação é obra de graça, e justamente por isso é também chamado irresistível a cooperarmos, “aperfeiçoando a santidade no temor de Deus” (2 Coríntios 7:1; Filipenses 2:12–13).

Quarto, o texto sustenta o ânimo de quem se sente longe desse retrato. Talvez você veja manchas e rugas demais. Lembre-se: o Noivo sabia de tudo quando decidiu amar. Ele não desiste de uma obra que lhe custou o sangue (Romanos 5:8–10). Confesse pecados sem medo, receba de novo a Palavra que lava, creia que “onde abundou o pecado, superabundou a graça” (Romanos 5:20), e levante-se para andar pela fé, aguardando o dia em que a fé dará lugar à visão (2 Coríntios 5:7; Apocalipse 21:2–4).

Por fim, Efésios 5:25–27 dá conteúdo ao nosso louvor. Quando cantamos, não celebramos apenas um perdão passado, mas uma promessa em andamento e um futuro garantido: Ele nos amou, Ele nos santifica, Ele nos apresentará. O Cordeiro que casou com a Igreja é também o Pastor que a guia até o último vale, e o Rei que a introduz na sala do banquete (Salmos 23; Cântico dos Cânticos 2:4). Portanto, ofereça-Lhe hoje o corpo e a mente como sacrifício vivo (Romanos 12:1–2), mergulhe de novo na Palavra que limpa (João 17:17), e siga em santidade com olhos nas bodas do Cordeiro (Apocalipse 19:7–9). Cristo não descansará até ver sua Noiva gloriosa; e nós não descansaremos até sermos inteiramente como Ele é (1 João 3:2–3).

J. Membros do Seu Corpo: a alegria e as obrigações da união com Cristo

“Porque somos membros do seu corpo, da sua carne e dos seus ossos” (Efésios 5:30). Nessa imagem ousada, Paulo nos convida a contemplar a realidade mais íntima do Evangelho: não apenas fomos perdoados por Cristo; fomos unidos a Cristo. Tal união não é poesia devocional, mas o centro vital da vida cristã. Como Eva foi formada e apresentada a Adão, e ele exclamou “esta é agora osso dos meus ossos e carne da minha carne” (Gênesis 2:23–24), assim a Igreja é tirada, por graça, da obra do novo Adão e apresentada a Ele como noiva e como corpo (Efésios 5:25–27; Apocalipse 19:7–8). Essa união tem dimensões complementares. Legalmente, Cristo se fez nosso Fiador: o que nos cabia pagar, Ele assumiu; o que Lhe pertence em justiça, Ele nos credita (Isaías 53:5–6; 2 Coríntios 5:21; Romanos 5:19). Espiritualmente, o Espírito Santo nos enxerta nEle, para que vivamos da Sua própria vida: “aquele que se une ao Senhor é um só espírito com Ele” (1 Coríntios 6:17); “Eu sou a videira, vós os ramos” (João 15:5); “vós estais mortos, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus” (Colossenses 3:3–4). Como Cabeça e corpo, partilhamos uma mesma vida e um mesmo destino (Efésios 1:22–23; Colossenses 1:18; Romanos 12:5). Por isso, Cristo toma para si o que toca em nós: “Saulo, Saulo, por que me persegues?” (Atos 9:4); “em toda a angústia deles, Ele foi angustiado” (Isaías 63:9); e também nos socorre como Sumo Sacerdote compassivo (Hebreus 4:15–16). E, inversamente, nós participamos do que é dEle: “do Seu fulness temos recebido, e graça sobre graça” (João 1:16); Ele é “o SENHOR, nossa Justiça” (Jeremias 23:6); nEle temos sabedoria, justiça, santificação e redenção (1 Coríntios 1:30); com Ele somos herdeiros e coerdeiros (Romanos 8:17), ressuscitados e assentados nos lugares celestiais (Efésios 2:4–7). Essa união é fruto da nova aliança prometida, na qual Deus dá coração novo e Seu Espírito para nos fazer andar nos Seus caminhos (Jeremias 31:31–34; Ezequiel 36:26–27); ela se inicia pela fé, selada no batismo que aponta para a lavagem regeneradora do Espírito (Tito 3:5), e se aprofunda pela Palavra que nos purifica e santifica (João 15:3; João 17:17). Mas essa proximidade sagrada traz consigo vocação elevada: sendo membros do corpo de Cristo, não podemos conceber uma vida apartada da cabeça; separados dEle nada podemos fazer (João 15:5). A união requer comunhão: habitar na Palavra, responder em obediência, perseverar na oração, nutrir-se na mesa do Senhor, edificar-se na comunhão dos santos (Atos 2:42; 1 Coríntios 10:16–17). Requer também pureza: quem é de Cristo crucificou a carne com as suas paixões (Gálatas 5:24); “sede santos, porque Eu sou santo” (1 Pedro 1:15–16); não entristeçais o Espírito pelo qual fostes selados (Efésios 4:30). E requer amor prático, pois não há como ser um com Cristo e não se doar como Cristo: “já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim” (Gálatas 2:20); “apresentai os vossos corpos como sacrifício vivo” (Romanos 12:1–2). Com isso, duas consolações se firmam. Primeira: nossas feridas nunca mais são apenas nossas; a Cabeça as conhece, sofre conosco e dá graça suficiente (2 Coríntios 12:9; Salmos 23). Segunda: nossas lutas pela santidade não são tentativas solitárias; a mesma vida que pulsa na Cabeça flui nos membros (Romanos 8:9–11). Se tropeçamos, voltamos à fonte que nos lava e restaura (1 João 1:7–9); se fraquejamos, pedimos o Espírito e somos fortalecidos no homem interior (Lucas 11:13; Efésios 3:16). Viver “como membros do seu corpo, da sua carne e dos seus ossos” significa, então, duas coisas ao mesmo tempo: repouso e responsabilidade. Repouso, porque nossa identidade e aceitação não oscilam com nossos humores, mas repousam no amor do Noivo que nos comprou e nos manterá até nos apresentar “sem mácula, nem ruga” (Efésios 5:27; Filipenses 1:6; Judas 24). Responsabilidade, porque nossa vida agora exibe a vida dEle: unidade que supera barreiras (Efésios 4:1–6), pureza que honra o corpo (1 Coríntios 6:15–20), serviço que edifica os outros membros (1 Coríntios 12:12–27; Gálatas 5:13). À luz disso, a aplicação é simples e profunda: permaneça nEle pela fé diariamente; alimente-se da Palavra que une e purifica; entregue ao Espírito qualquer área do coração que ainda resista; e viva com olhos nas bodas do Cordeiro, quando a união que hoje vivemos pela fé se tornará visão e festa (Apocalipse 21:2–4). Até lá, tome como oração constante: “Atrai-me; correremos após Ti” (Cântico dos Cânticos 1:4), e como esperança constante: “Eu neles, e Tu em mim… para que o mundo conheça… e para que o amor com que Me amaste esteja neles” (João 17:23–26).

L. “Um grande mistério”: a união entre Cristo e o seu povo

Quando Paulo afirma: “Este mistério é grande; eu, porém, me refiro a Cristo e à Igreja” (Efésios 5:32), ele nos convida a olhar além do casamento humano e enxergar a realidade mais profunda do Evangelho: Deus uniu o Filho ao seu povo numa aliança de amor. Toda a fé cristã é chamada de “mistério” porque nela contemplamos Deus manifestado em carne, justificado no Espírito e recebido na glória (1 Timóteo 3:16); e esse mistério se desenha desde o Éden, quando, ao ver a mulher, Adão exclamou: “osso dos meus ossos e carne da minha carne”, e a Escritura selou: “os dois serão uma só carne” (Gênesis 2:23–24). Paulo lê essa cena como figura da união de Cristo com sua Igreja: Ele, o Noivo; nós, a Noiva (João 3:29; Isaías 54:5; Isaías 62:5; Apocalipse 19:7–9).

Essa união tem duas faces. Legalmente, Cristo se fez nosso Fiador: “o que não conheceu pecado, Deus o fez pecado por nós, para que nele fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Coríntios 5:21; Romanos 5:19). Espiritualmente, o Espírito Santo nos enxerta em Cristo, de modo que recebemos sua vida: “aquele que se une ao Senhor é um só espírito com Ele” (1 Coríntios 6:17); “eu sou a videira, vós os ramos… sem mim nada podeis fazer” (João 15:5). Por isso Paulo ousa dizer: “somos membros do seu corpo” (Efésios 5:30). Como Cabeça, Cristo sente nossas dores, sustenta nossa fraqueza e defende nossa causa: “Saulo, por que me persegues?” (Atos 9:4); “em toda a angústia deles, Ele foi angustiado” (Isaías 63:9); e nos convida a achegar com ousadia ao trono da graça (Hebreus 4:15–16). E como Esposo, Ele nos ama e nos santifica, lavando-nos “com a lavagem de água pela palavra” para nos apresentar “gloriosa, sem mancha nem ruga” (Efésios 5:25–27; João 17:17).

Pastoralmente, esse mistério consola e convoca. Consola, porque nossas feridas nunca mais são só nossas: pertencem Àquele que nos amou e a si mesmo se entregou por nós; sua graça basta, seu poder se aperfeiçoa na fraqueza (2 Coríntios 12:9; Salmos 23). Convoca, porque união implica lealdade. Tal como a noiva deixa pai e mãe para se unir ao esposo (Gênesis 2:24), somos chamados a “esquecer” os velhos amores e viver somente para Cristo: “esquece o teu povo e a casa de teu pai… porque Ele é o teu Senhor; inclina-te diante dele” (Salmos 45:10–11). Paulo diz que morremos para a antiga aliança “a fim de pertencermos a outro, àquele que ressuscitou, para que frutifiquemos para Deus” (Romanos 7:4). Sem essa união, não há fruto; nela, o Espírito produz bondade, justiça e verdade (Gálatas 5:22–23; Efésios 5:9).

Como, então, viver esse mistério no cotidiano? Primeiro, pela fé que se entrega: “Desposar-vos-ei comigo para sempre… em fidelidade” (Oséias 2:19–20). Crer é dizer “sim” ao Noivo e receber sua justiça, sua vida, seu nome (Jeremias 23:6; Colossenses 3:3–4). Segundo, permanecendo na Palavra e nos meios de graça, pois é assim que o Esposo nos purifica e fortalece (João 15:3–7; Atos 2:42). Terceiro, guardando pureza e reverência: “sede santos, porque eu sou santo” (1 Pedro 1:15–16); “não entristeçais o Espírito” (Efésios 4:30). Quarto, amando o corpo que é dEle: o amor à Igreja é amor ao Esposo, porque “somos muitos, um só pão e um só corpo” (1 Coríntios 10:17; 1 Coríntios 12:12–27).

E se alguém teme ser indigno dessa aliança, ou lembra suas infidelidades, ouça a graça: o Senhor encontra a noiva “poluída em seu sangue” e diz: “vive!”; estende o manto, faz aliança e declara: “tu te tornaste minha” (Ezequiel 16:6–8). Mesmo ao infiel Ele clama: “Convertei-vos, porque eu sou casado convosco” (Jeremias 3:14). Portanto, aproxime-se com arrependimento e fé: “quem vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora” (João 6:37). Persevere com os olhos no dia das bodas do Cordeiro, quando a união hoje vivida pela fé será festa sem fim (Apocalipse 19:6–9). Até lá, repita a oração da noiva: “Atrai-me; correremos após ti” (Cântico dos Cânticos 1:4), e caminhe com a esperança do Noivo: “Eu neles e tu em mim… para que o amor com que me amaste esteja neles” (João 17:23–26). Esse é o grande mistério — e a grande alegria — de pertencer a Cristo.

IX. Concordância Bíblica Comentada

Em Efésios 5:1 Paulo dá o mandamento-raiz da ética cristã: “Sede imitadores de Deus, como filhos amados”. O “como” é decisivo: não imitamos para virar filhos; imitamos porque já somos filhos, amados por Ele. Esse pano de fundo vem do versículo imediatamente anterior (Efésios 4:32): Deus perdoou-nos em Cristo, portanto, quem O imita perdoa e se compadece — é assim que a paternidade divina se torna forma de vida. A Torá já fixara o padrão: “Sede santos, porque eu sou santo” (Levítico 11:45), que Pedro aplica diretamente aos cristãos (1 Pedro 1:15–16). Jesus explicita a mesma lógica: o Pai faz nascer o seu sol sobre bons e maus; por isso, os filhos amam inclusive inimigos (Mateus 5:45) e perseguem a perfeição do Pai (Mateus 5:48). O paralelo em Lucas é ainda mais explícito: “Sede misericordiosos, como também o vosso Pai é misericordioso” (Lucas 6:35–36). Paulo, então, chama essa imitação de “andar” (estilo de vida) próprio de filhos. E como sabemos que somos filhos? Porque Deus nos chama e trata como tal: “Efraim é para mim filho querido” (Jeremias 31:20); o povo que não era povo será chamado “filhos do Deus vivo” (Oséias 1:10); a todos quantos o receberam, o Filho deu o direito de se tornarem filhos de Deus (João 1:12). Por isso os crentes são “eleitos de Deus, santos e amados” (Colossenses 3:12), e a igreja se espanta: “Vede que grande amor o Pai nos tem concedido, a ponto de sermos chamados filhos de Deus… e de fato somos” (1 João 3:1–2). Imitação, então, é resposta filial: se Deus nos amou, devemos amar uns aos outros (1 João 4:11). Essa é também a pedagogia apostólica: “sede meus imitadores, como eu sou de Cristo” (1 Coríntios 11:1); seguir a Cristo, servi-lo e andar nele (João 12:26; Colossenses 2:6) descreve a mesma trilha, onde o fruto do Espírito começa por “amor” (Gálatas 5:22) e a identidade de “filhos” aparece como testemunho no meio de uma geração torta (Filipenses 2:15). Em síntese, Efésios 5:1 reúne essas linhas: a santidade de Levítico e de 1 Pedro, a misericórdia de Lucas, a perfeição amorosa de Mateus e a filiação proclamada por João, Jeremias e Oséias — tudo isso virando espelho: imitai o Pai porque sois filhos amados.

Em Efésios 5:2 Paulo mostra como essa imitação se encarna: “andai em amor, como também Cristo nos amou e se entregou a si mesmo por nós, em oferta e sacrifício a Deus, em cheiro suave.” O “andar” em amor já foi desenhado na carta: enraizados e fundados em amor (Efésios 3:17), praticando mansidão e longanimidade (Efésios 4:2) e “falando a verdade em amor” (Efésios 4:15). Jesus dá o mandamento novo e a medida: “Como eu vos amei, assim vos ameis uns aos outros” (João 13:34). Daí Paulo insistir: “todas as vossas coisas sejam feitas com amor” (1 Coríntios 16:14), pois o amor é o “vínculo da perfeição” que ata as demais virtudes (Colossenses 3:14); aprendemos do próprio Deus a amar (1 Tessalonicenses 4:9), de modo que o crente “serve de exemplo… no amor” (1 Timóteo 4:12) e cobre “multidão de pecados” (1 Pedro 4:8). Mas a régua de Efésios 5:2 é ainda mais alta: Cristo. Ele “nos amou” e esse amor tomou a forma de autoentrega: “o Filho do Homem veio para dar a sua vida em resgate por muitos” (Mateus 20:28); “Ninguém tem maior amor do que este: dar a vida pelos seus amigos” (João 15:12–13). Esse dom nos constrange e reorienta: “se um morreu por todos… vivam não mais para si, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou” (2 Coríntios 5:14–15). Sendo rico, ele se fez pobre por amor (2 Coríntios 8:9); “se entregou por nossos pecados” (Gálatas 1:4) e “me amou e a si mesmo se entregou por mim” (Gálatas 2:20); é o mediador que “a si mesmo se deu em resgate” (1 Timóteo 2:6) e “se deu… para nos remir e purificar” (Tito 2:14). Hebreus explica a profundidade sacerdotal dessa entrega: não como os sacerdotes que “cada dia” oferecem sacrifícios incapazes de remover pecados (Hebreus 10:11), mas o Cristo que “uma vez por todas” se ofereceu (Hebreus 10:10), “pelo Espírito eterno” (Hebreus 9:14), aparecendo “ao consumar dos séculos para anular o pecado pelo sacrifício de si mesmo” (Hebreus 9:26) e vive para interceder (Hebreus 7:25–27). Pedro junta modelo e expiação: Cristo “padeceu por vós, deixando-vos exemplo… levando ele mesmo em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro” (1 Pedro 2:21–24). João resume: “Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a sua vida por nós; e devemos dar a vida pelos irmãos” (1 João 3:16). O Apocalipse canta a mesma obra, agora como culto: Ele “nos ama… e nos lavou dos pecados… pelo seu sangue” (Apocalipse 1:5); o Cordeiro foi morto e “com o teu sangue compraste para Deus” (Apocalipse 5:9).

É nesse contexto que Paulo usa a linguagem sacerdotal: “oferta e sacrifício a Deus, em cheiro suave”. Desde Noé, quando Deus “cheirou o suave cheiro” (Gênesis 8:21), a Escritura usa essa expressão para sacrifícios aceitos (Levítico 1:9, 13, 17; 3:16). Cristo é a realidade a que tudo apontava: “Deus, enviando o seu Filho em semelhança de carne do pecado e pelo pecado” (Romanos 8:3), “nosso Cordeiro pascal” imolado (1 Coríntios 5:7), cujo sacrifício purifica e santifica de uma vez (Hebreus 9:23; 10:12). A crítica de Amós — “aborreço as vossas festas” (Amós 5:21) — mostra o contraste: rituais sem amor são fedor; o sacrifício de Cristo, amor até o fim, é perfume. E, unidos a Ele, a própria vida da igreja pode tornar-se “cheiro de Cristo” para Deus (2 Coríntios 2:15). Assim, “andar em amor” é participar desse movimento: o amor imita o Pai (Efésios 5:1), segue o Filho que se entregou (Efésios 5:2) e, como “filhos amados”, transforma cada gesto — palavra, perdão, serviço, generosidade — em oferta agradável a Deus.

Em Efésios 5:3 Paulo junta três linhas e as amarra com uma régua: “imoralidade sexual (porneía), impureza e cobiça nem sequer sejam nomeadas entre vós, como convém a santos”. A própria carta já preparou esse terreno: quando ele disse que alguns “se entregaram à dissolução para, com avidez, cometerem toda impureza” (Efésios 4:19) e que, em Cristo, “não foi assim que aprendestes” (Efésios 4:20), Paulo estava apontando para a mudança de práticas e de padrões que agora explicita em 5:3; logo adiante ele repetirá o alerta mostrando o desfecho: os praticantes impenitentes “não têm herança no Reino” (Efésios 5:5).

Primeiro, a imoralidade sexual. Paulo lê Efésios 5:3 com os óculos de toda a Escritura: Israel caiu em Sitim porque uniu-se a cultos e a prostituição idólatra (Números 25:1); a Torá, por isso, proscreve qualquer prostituição sagrada em Israel (Deuteronômio 23:17–18). Jesus confirma que as “fornicações” brotam do coração (Mateus 15:19; Marcos 7:21), de modo que a decisão do Concílio em Jerusalém manda os convertidos, desde o primeiro passo, abster-se de imoralidade (Atos dos Apóstolos 15:20). Romanos descreve a degradação humana incluindo a devassidão no catálogo da impiedade (Romanos 1:29) e chama o cristão a não oferecer os membros ao pecado (Romanos 6:13). Em Corinto, Paulo aplica Efésios 5:3 pastoralmente: não compactuar socialmente com quem se diz irmão e persiste em prática sexual imoral (1 Coríntios 5:10–11); adverte que os impuros “não herdarão o Reino” (1 Coríntios 6:9), lembra que “o corpo é para o Senhor” (1 Coríntios 6:13) e ordena: “fugi da fornicação” (1 Coríntios 6:18). Ele ancora essa urgência na história: Israel “fornicou” e caíram vinte e três mil num dia (1 Coríntios 10:8), por isso teme achar entre os coríntios “impureza, prostituição e lascívia” não arrependidas (2 Coríntios 12:21). Gálatas chama essas obras de “da carne” e, como Efésios 5:5, declara que quem as pratica não herda o Reino (Gálatas 5:19–21). Colossenses manda matar a porneía (Colossenses 3:5); 1 Tessalonicenses diz que a santificação é abster-se dela (1 Tessalonicenses 4:3) porque Deus nos chamou à santidade (1 Tessalonicenses 4:7). Hebreus previne contra a impureza profana (12:16) e honra o matrimônio como leito sem mácula (13:4). Pedro denuncia os que seguem “as concupiscências da carne” (2 Pedro 2:10). E o Apocalipse volta ao par de idolatria + imoralidade: Balaão ensinou a tropeçar nisso (Apocalipse 2:14); “Jezabel” não quis arrepender-se (Apocalipse 2:21); muitos não se arrependeram de suas “prostituições” (Apocalipse 9:21); no fim, os sexualmente imorais ficam de fora (Apocalipse 21:8; 22:15). Tudo isso explica por que, em Efésios 5:3, tais coisas nem devem “ser nomeadas” no meio dos santos: não cabem no povo que foi feito templo.

Depois, a cobiça (avareza). Efésios 5:3 liga-a à imoralidade porque ambas brotam de um coração que deseja possuir — pessoas ou coisas — como ídolos; não por acaso, Efésios 5:5 e Colossenses 3:5 chamam a cobiça de idolatria. A Lei já a coloca no décimo mandamento (Êxodo 20:17) e exige líderes que odeiem a avareza (Êxodo 18:21). A história de Acã mostra como o “vi, cobicei, tomei” destrói famílias e o povo (Josué 7:21); os filhos de Samuel perverteram o direito por amor ao suborno (1 Samuel 8:3). Os Salmos desmascaram o avarento que se gloria no seu desejo (Salmos 10:3) e oram por um coração inclinado à Palavra, “não à cobiça” (Salmos 119:36). A sabedoria chama de tolo o governante opressor e cobiçoso (Provérbios 28:16). Os profetas insistem: “todos… desde o menor até o maior, se dão à avareza” (Jeremias 6:13; 8:10); “os teus olhos e o teu coração não se ocupam senão da tua avareza” (Jeremias 22:17); “com a boca mostram muito amor, mas o seu coração segue a sua avareza” (Ezequiel 33:31); “cobiçam campos e os arrebatam” (Miquéias 2:2). Jesus lista a cobiça entre os males que procedem do coração (Marcos 7:22), adverte: “acautelai-vos de toda avareza” (Lucas 12:15) e desmascara os fariseus “avarentos” (Lucas 16:14). Paulo dá o próprio exemplo de não cobiçar prata, ouro ou vestes (Atos dos Apóstolos 20:33) e adverte que os cobiçosos não herdam o Reino (1 Coríntios 6:10). Pastoralmente, ele diz que presbíteros não podem ser “amigos do dinheiro” nem “avarentos” (1 Timóteo 3:3; Tito 1:7), denuncia falsos mestres que “por torpe ganância” transtornam casas (Tito 1:11) e que, “movidos por avareza”, mercadejam a fé (2 Pedro 2:3; cf. 2 Pedro 2:14). O remédio é contentamento: “seja a vossa vida sem avareza; contentai-vos com o que tendes” (Hebreus 13:5). Tudo isso desemboca de novo em Efésios 5:3: tal vício não combina com quem adora o Deus vivo.

Terceiro, a cláusula ético-litúrgica: “nem sequer se nomeiem entre vós, como convém a santos.” Paulo não está proibindo denunciar o pecado (ele mesmo o faz), mas definindo o clima da comunidade: essas práticas não podem ser tema, sabor, nem bandeira entre os santos. Ele já dirá no v. 12 que “as coisas que eles fazem em oculto é vergonhoso até o dizer” (Efésios 5:12). A Torá usa expressão semelhante: “do nome de outros deuses nem se ouça” (Êxodo 23:13) — isto é, não lhes dês palco. Em Corinto, o caso de incesto era “tal que nem entre os gentios se nomeia” (1 Coríntios 5:1); a igreja, portanto, precisa tratar com santidade. E “como convém” tem paralelo claro: “portai-vos dignamente do evangelho” (Filipenses 1:27); recebei a serva de Cristo “como convém a santos” (Romanos 16:2); mulheres “como convém a quem professa piedade” (1 Timóteo 2:10); idosas “como convém a santas” (Tito 2:3). Essas passagens mostram o que Efésios 5:3 exige: decoro santo no falar, no acolher, no viver.

As referências “recíprocas” ampliam e concretizam o porquê. Quando Siquém “fez loucura em Israel” violentando Diná (Gênesis 34:7), a Escritura chama o ato de “coisa nefanda”, linguagem que explica o “nem se nomeie”. José, em contraste, foge da ocasião (Gênesis 39:11), ilustrando o “fugi” de 1 Coríntios 6:18. O Decálogo protege a aliança conjugal (Êxodo 20:14), e as leis de pureza (Levítico 15:18) educam Israel para discernir o limite entre santo e profano — tema retomado por Hebreus 12:15, que adverte contra raízes que contaminam muitos. Isaías 57:17 denuncia a iniquidade da cobiça; Ezequiel 33:9 lembra a responsabilidade de avisar o ímpio, função que a igreja cumpre quando não normaliza o que Efésios 5:3 proíbe. Jesus repete: não é o que entra, mas o que sai do coração e da boca que contamina (Mateus 15:20), e a lâmpada não foi feita para ficar debaixo do alqueire (Marcos 4:21): a comunidade existe para brilhar santidade, não para ecoar as trevas. “O homem bom, do bom tesouro do coração, tira o bem” (Lucas 6:45) — por isso Efésios 5:3 regula até o vocabulário comunitário. Paulo lembra que, por natureza, ninguém é justo (Romanos 3:10); foi a Lei que lhe revelou o próprio pecado da cobiça (Romanos 7:7). Daí a urgência: “se viverdes segundo a carne, morrereis” (Romanos 8:13); “andemos decentemente, não em orgias e dissoluções” (Romanos 13:13). Até conselhos de ordem servem à mesma meta: ordenar a vida para “decoro” e “serviço sem distração” (1 Coríntios 7:35). Efésios 4:17 já havia proibido “andar como os gentios andam”, e 4:29 regulou a língua para edificar — coerência com 5:3. Mesmo exortações domésticas como “esposas, sujeitai-vos… como convém no Senhor” (Colossenses 3:18) ecoam a frase “como convém a santos”. A Lei moral segue válida “para os imorais” (1 Timóteo 1:10), e Tiago 3:6 lembra que a língua pode atear fogo e contaminar o corpo inteiro — outro motivo para que certas coisas não sejam pauta no povo de Deus.

Assim, Efésios 5:3 não é só uma lista de proibições: é um ambiente. Ele reúne o testemunho de toda a Bíblia para dizer que a igreja, como “santos” no mundo, deve viver e falar de tal modo que imoralidade e cobiça não encontrem casa, palco nem perfume entre nós. Onde outrora havia “vergonha até de dizer”, agora haja santidade que se vê, “como convém a santos”.

Em Efésios 5:4 Paulo trata do “vocabulário do povo santo”: se 5:3 já expulsou do meio da igreja a imoralidade e a cobiça, 5:4 leva isso à boca, proibindo “obscenidades, conversas tolas e gracejos grosseiros”, e trocando tudo isso por “ações de graças”. A própria carta já dera o contraste: em vez de “palavra torpe”, palavra que edifica (Efésios 4:29). A sabedoria antiga confirma: o prudente guarda o conhecimento enquanto o insensato espalha tolices (Provérbios 12:23), a língua dos sábios adentra o conhecimento enquanto a boca dos tolos jorra estultice (Provérbios 15:2), e o falatório do néscio começa em insensatez e acaba em loucura perversa (Eclesiastes 10:13). Jesus vai à raiz: “a boca fala do que está cheio o coração”, e “de toda palavra ociosa” daremos contas — por isso “justificados” ou “condenados” pelas palavras (Mateus 12:34–37); o seu catálogo do que sai do coração inclui também a “maldade” e a “loucura”, espelho das “conversas tolas” (Marcos 7:22). Por isso Paulo manda “deixar… a linguagem obscena” (Colossenses 3:8) e Tiago mostra por quê: a língua, pequena, dirige rumos como leme e, indomada, incendeia e contamina (Tiago 3:4–8). Mesmo quando não nomeia “indecência” diretamente, a Bíblia descreve o ambiente que ela cria: Ló “afligia a sua alma” pelo procedimento dissoluto que ouvia todos os dias (2 Pedro 2:7), e os falsos mestres seduzem com “palavras jactanciosas de vaidade” (2 Pedro 2:18); Judas pinta o quadro dos que “falam mal do que não entendem” e cuja fala espumeja como “ondas bravias do mar” (Judas 10; Judas 13). A frase “coisas que não convêm” é a mesma de Romanos quando Deus entrega os homens a um pensar reprovado para fazerem o que não é conveniente (Romanos 1:28); e Paulo mostra, em Filemom, que mesmo quando tem autoridade para “ordenar o que convém”, prefere apelar “pelo amor” — a régua do falar cristão (Filemom 8). O antídoto direto de 5:4 é “antes, ações de graças”: isso já marcou a carta (Efésios 1:16; 5:19–20) e ecoa a liturgia de Israel — “formoso é” aos retos louvar (Salmos 33:1); “bom é render graças” (Salmos 92:1); “louvem ao SENHOR… e ofereçam sacrifícios de ações de graças” (Salmos 107:21–22). Daniel orava e dava graças com janelas abertas, mesmo sob ameaça (Daniel 6:10); Jesus deu graças antes de repartir o pão (João 6:23); a igreja ora e Deus responde por “muitas ações de graças” (2 Coríntios 1:11) e termina exclamando: “Graças a Deus pelo seu dom inefável!” (2 Coríntios 9:15). Por isso a vida em Cristo abandona ansiedade e enche a oração de “súplicas com ações de graças” (Filipenses 4:6); a comunidade deixa a língua para a Palavra e para a gratidão (Colossenses 3:15–17); os apóstolos perguntam: “que ação de graças podemos dar a Deus por vós?” (1 Tessalonicenses 3:9) e mandam: “Em tudo dai graças” (1 Tessalonicenses 5:18); e o culto cristão oferece “sacrifício de louvor, isto é, o fruto de lábios que confessam o seu nome” (Hebreus 13:15). As referências recíprocas reforçam o mesmo traço: Aimaás correndo sem mensagem é imagem de falar que não edifica (2 Samuel 18:22); o justo se alegra quando os lábios falam reto (Provérbios 23:16) e o “era só brincadeira” desmascara a crueldade travestida de piada (Provérbios 26:19); “ai de vós os que ris agora”, quando o riso é cínico (Lucas 6:25), e de novo: “o homem bom, do bom tesouro do coração, tira o bem” (Lucas 6:45). O aviso de não herdar o Reino encosta o tema do falar no tema da vida (1 Coríntios 6:9); “despojando-vos de toda imundícia” inclui a da boca (Tiago 1:21); uma religião que não refreia a língua é vã (Tiago 1:26); e a língua, “mundo de iniquidade”, precisa ser santificada (Tiago 3:6). Assim, Efésios 5:4 não regula “educação” à moda humana; ele troca o som do povo de Deus: sai a verborragia que obscurece, entra o louvor que clareia.

Em Efésios 5:5 Paulo explica por que a igreja precisa dessa “faxina” da boca e da vida: “sabeis isto: nenhum imoral, nem impuro, nem cobiçoso (que é idólatra) tem herança no Reino.” Ele não inventa a lista; ele a alinha com todo o Novo Testamento. Corinto ouvira o mesmo: os sexualmente imorais, idólatras, adúlteros, maldizentes e avarentos “não herdarão o Reino” (1 Coríntios 6:9–10). Gálatas chamara a fornicação, a impureza e a idolatria de “obras da carne” e repetira: “os que praticam tais coisas não herdarão o Reino” (Gálatas 5:19; Gálatas 5:21). Hebreus, por sua vez, honra o matrimônio e diz que Deus julgará “fornicadores e adúlteros” (Hebreus 13:4). A frase “o cobiçoso, que é idólatra” está literalmente em Colossenses: a avareza é idolatria (Colossenses 3:5), justamente porque desloca a confiança e o prazer do Deus vivo para o ter; daí as advertências pastorais contra a raiz de todos os males, o amor ao dinheiro, e contra pôr a esperança na incerteza das riquezas (1 Timóteo 6:10; 1 Timóteo 6:17). O Apocalipse fecha a porta da Nova Jerusalém ao mesmo catálogo: “os covardes, incrédulos, abomináveis, homicidas, fornicadores, feiticeiros, idólatras e todos os mentirosos terão a sua parte no lago de fogo” (Apocalipse 21:8), e “ficarão de fora” os que persistem nessas práticas (Apocalipse 22:15). O pano de fundo “recíproco” ajuda a entender o “porquê”: o primeiro mandamento veta qualquer deus rival (Êxodo 20:3), e a história mostra como a cobiça perverte — de Raabe recebendo espiões em segredo (Josué 2:1) à compra de Sansão por dinheiro (Juízes 16:18), passando pelo ímpio que “se gloria na concupiscência da sua alma” (Salmos 10:3), pela “via que desce” da mulher estranha (Provérbios 2:18) e pelas cordas do próprio pecado que apertam o perverso (Provérbios 5:22). Jeremias lista o roubo, adultério e falso juramento (Jeremias 7:9) e, noutro lugar, mostra que a missão profética é avisar o ímpio para que não morra em seu pecado (Ezequiel 3:18; Ezequiel 3:21); mas se o coração instala ídolos (Ezequiel 14:3) e a boca lisonjeia enquanto o coração corre atrás da ganância (Ezequiel 33:31), a alma se entristece como o moço rico, incapaz de soltar o tesouro (Mateus 19:22; Marcos 10:22; Lucas 18:23). Em contraste, os benditos do Pai herdam o Reino (Mateus 25:34). Até governantes ímpios amam subornos e “esperam dinheiro”, imagem do coração que vende justiça (Atos dos Apóstolos 24:26). A exortação volta: não conviver com quem se diz irmão e é “cobiçoso” (1 Coríntios 5:11); lamentar, se for preciso, a persistência de “impureza e prostituição” (2 Coríntios 12:21); e lembrar que sem santificação ninguém verá o Senhor, nem Esaú, “profano”, que trocou o direito de primogenitura (Hebreus 12:14; Hebreus 12:16). A saída é clara: vida sem avareza, contentes em Deus (Hebreus 13:5). No final, nada contaminado entra no Reino (Apocalipse 21:27). Efésios 5:5, portanto, não é mero moralismo: é o mapa das heranças — o Reino é de quem abandonou ídolos e abraçou o Rei.

Em Efésios 5:6 Paulo corta a desculpa religiosa: “Ninguém vos engane com palavras vãs; porque por causa destas coisas vem a ira de Deus sobre os filhos da desobediência.” Os profetas já advertiam contra promessas vazias: não deis ouvidos a videntes que vos enganam (Jeremias 29:8–9; Jeremias 29:31); Ezequiel denuncia os que “rebocam com cal” e dão paz quando não há paz (Ezequiel 13:10–16); Miqueias acusa os que enganam com o que as pessoas querem ouvir (Miquéias 3:5). Jesus retoma: “Vede que ninguém vos engane” (Mateus 24:4), porque surgirão falsos cristos e falsos profetas com sinais (Mateus 24:24; Marcos 13:5; Marcos 13:22). Os apóstolos ecoam: “Deus não se deixa escarnecer; o que o homem semear, isso também ceifará” — logo, “não” à teologia que normaliza o pecado (Gálatas 6:7–8); “ninguém vos engane com raciocínios persuasivos”, nem com “filosofias e vãs sutilezas” ou “culto dos anjos” (Colossenses 2:4; Colossenses 2:8; Colossenses 2:18); “ninguém de modo algum vos engane”, porque antes do fim há a apostasia e operação de erro para que creiam na mentira (2 Tessalonicenses 2:3; 2 Tessalonicenses 2:10–12); “provai os espíritos” (1 João 4:1). Até o mote político de Senaqueribe — “palavra vã é o conselho e a força para a guerra” — ilustra como a vanglória vazia engana (2 Reis 18:20). Quanto ao juízo, Paulo lembra que a ira de Deus se revela do céu contra toda impiedade (Romanos 1:18) — exatamente o que Colossenses repete: por causa das coisas listadas (fornicação, impureza, cobiça), “vem a ira de Deus” (Colossenses 3:6). A história de Israel é prova: quarenta anos de ira por causa da rebeldia (Números 32:13–14); a praga por causa do pecado em Peor (Josué 22:17–18); a “ira do SENHOR” que “se levantou” contra os murmuradores (Salmos 78:31). E a expressão “filhos da desobediência” liga 5:6 a 2:2–3: outrora andávamos segundo o príncipe deste mundo e éramos por natureza “filhos da ira”; agora, não podemos beber a mesma fonte e esperar outro fim (Efésios 2:2–3). O termo “desobediência” ali tem o sabor de incredulidade, como em Hebreus (“não puderam entrar por causa da incredulidade”, Hebreus 3:19) e em 1 Pedro (“para isso também foram postos, para desobedecerem à Palavra”, 1 Pedro 2:8). As referências recíprocas falam com uma só voz: “Agravem-se os serviços… para que não deem ouvidos a palavras vãs” (Êxodo 5:9); “Separai-vos do meio desta congregação” que se corrompe (Números 16:21; 17:10); não digas “terei paz ainda que ande na dureza do meu coração” (Deuteronômio 29:19); Deus firma o seu povo para que os filhos não perturbem mais (1 Crônicas 17:9), mas quando Judá abandona a casa do SENHOR, a ira cai (2 Crônicas 24:18). Confiar na vaidade é enganar a si mesmo (Jó 15:31) e a soberba pode te levar ao castigo (Jó 36:18); Deus rejeita os que andam em falsidade (Salmos 119:118) e os prende nas cordas dos seus pecados (Provérbios 5:22); “há caminho que ao homem parece direito, mas o fim são caminhos de morte” (Provérbios 14:12), e a violência dos ímpios os arrebata (Provérbios 21:7). Isaías pergunta: “De quem zombais?” (Isaías 57:4) — zombaria que vira surdez ao aviso: “não vos enganeis” (Jeremias 37:9). O vigia que não avisa é culpado (Ezequiel 3:18; Ezequiel 3:21). Jesus, então, manda acautelar-se dos falsos profetas (Mateus 7:15); a paz do evangelho, quando rejeitada, não repousa (Lucas 10:6); e muitos virão dizendo “sou eu”, “o tempo está próximo” — “não vades após eles” (Lucas 21:8). Quem não crê permanece sob a ira (João 3:36). Deus manda arrepender-se (Atos dos Apóstolos 17:30), e não há “jeitinho”: “onde não há lei, também não há transgressão” — logo, o juízo é real (Romanos 4:15). “Ninguém se engane” (1 Coríntios 3:18); “as más conversações corrompem os bons costumes” (1 Coríntios 15:33); “que comunhão tem a luz com as trevas?” (2 Coríntios 6:14); e, se necessário, “chorar” pela impureza que ficou sem arrependimento (2 Coríntios 12:21). Volta o refrão: os que praticam tais coisas não herdam o Reino (Gálatas 5:21); por isso, “tomai toda a armadura” para permanecer no dia mau (Efésios 6:13); muitos andam como “inimigos da cruz” (Filipenses 3:18); o Senhor é vingador contra a fraude (1 Tessalonicenses 4:6); não vos perturbeis com boatos (2 Tessalonicenses 2:2); há quem professe conhecer Deus mas o nega por obras (Tito 1:16); esforcemo-nos para entrar no descanso, para que ninguém caia no mesmo exemplo de desobediência (Hebreus 4:11), e não sejamos “carregados por doutrinas várias e estranhas” (Hebreus 13:9); como filhos obedientes, não nos conformemos às paixões de antes (1 Pedro 1:14); “filhinhos, ninguém vos engane” — a prática revela o pertencer (1 João 3:7); e o fim dos impenitentes é o mesmo de Efésios 5:5–6: fogo (Apocalipse 21:8).

Assim, Efésios 5:4–6 forma um só raciocínio: o povo santo muda o som (sai a fala impura, entra a gratidão), muda o chão (abandona porneía e cobiça, que são idolatria) e muda a bússola (não segue palavras vazias, mas a verdade do Reino), porque sabe duas coisas: quem fala e vive como filho já participa da herança, e quem insiste na desobediência se põe debaixo da ira — não por retórica apostólica, mas por toda a Escritura.

Paulo acaba de mostrar, em 5:3–6, o perfil das obras das trevas e as palavras vãs que as justificam; o “portanto” de 5:7 manda romper comunhão com isso. A própria carta explica como: “não tomeis parte nas obras infrutuosas das trevas; antes, reprovai-as” (Efésios 5:11). O padrão não é novo. Quando Corá, Datã e Abirão arrastaram Israel à rebeldia, a voz de Deus soou: “Apartai-vos das tendas destes homens ímpios e não toqueis em coisa alguma deles” (Números 16:26; e o mesmo movimento já fora ordenado em Números 16:21). A sabedoria canta na mesma clave: se os pecadores disserem “Vem conosco”, “não consintas”, porque a sociedade do mal partilha também o juízo (Provérbios 1:10–17); “Deixai a insensatez e vivei” (Provérbios 9:6), e lembra: “Quem anda com sábios será sábio, mas o companheiro dos tolos será afligido” (Provérbios 13:20). Salmos 50:18 vai ao ponto: consentir com o ladrão e partilhar com adúlteros já é fazer-se cúmplice — a comunhão moral precede a comunhão prática. Por isso, na vida pastoral, Paulo ordena: “A ninguém imponhas precipitadamente as mãos, nem participes dos pecados alheios” (1 Timóteo 5:22). E no clímax do juízo sobre a “Babilônia” (a cultura idólatra e sedutora), o céu repete o refrão de Números 16: “Sai dela, povo meu, para que não sejas participante dos seus pecados, e para que não incorras nas suas pragas” (Apocalipse 18:4).

Até as leis de pureza ilustravam esse princípio da separação: distinguir entre o puro e o impuro (Levítico 20:25), não tocar no que contamina (Levítico 11:8) — e, sim, até listas como a das aves imundas (Levítico 11:16) ensinavam, pedagógica e cotidianamente, a fazer diferença. O mesmo espírito está em Levítico 18:3: não imitar os costumes do Egito e de Canaã. Jó 24:14 pinta o cotidiano das trevas (o assassino que se levanta de madrugada), lembrando que habitar com tais obras é alinhar-se a elas. No Novo Testamento, o chamado é para brilhar “sem culpa no meio de uma geração corrompida” (Filipenses 2:15), deixando o passado das concupiscências (1 Pedro 4:2) e caminhando na revelação que já desponta “como candeia em lugar escuro” até o pleno dia (2 Pedro 1:19). Efésios 5:7, portanto, é a aplicação do êxodo moral: sair de alianças que normalizam o pecado, para entrar na comunhão que testemunha a luz.

Efésios 5:8 — “Porque outrora éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor; andai como filhos da luz.” O versículo tem três tempos — outrora, agora e o andar — e as referências do TSK abrem cada janela. “Outrora éreis trevas”: a própria carta recorda quem éramos — estranhos às alianças e sem esperança (Efésios 2:11–12), “entenebrecidos no entendimento” (Efésios 4:18), dominados por potestades das trevas (Efésios 6:12). Isso cumpre o cenário bíblico: “os lugares tenebrosos da terra” estão cheios de moradas de violência (Salmos 74:20); “o povo que andava em trevas viu grande luz” (Isaías 9:2); Deus promete guiar cegos por caminhos que não conheciam (Isaías 42:16) e descreve uma terra coberta de escuridão (Isaías 60:2). Jeremias adverte: “Dai glória ao SENHOR… antes que tropeceis nos montes tenebrosos” (Jeremias 13:16). Mateus 4:16 aplica Isaías 9:2 à chegada do Messias; Zacarias profetiza que Deus enviaria alguém para alumiar os que jazem em trevas (Lucas 1:79). Em Atos dos Apóstolos 17:30, Paulo chama de “ignorância” esse passado e anuncia que Deus agora ordena arrependimento; e, no seu testemunho, define sua missão como “abrir olhos, converter das trevas para a luz, e do poder de Satanás para Deus” (Atos 26:18). Romanos 1:21 descreve o coração entenebrecido pela ingratidão e idolatria, e 2:19 ironiza os que se julgam “luz dos que estão em trevas” sem o serem. A passagem para Efésios 5:8 prepara-se assim: “que comunhão tem a luz com as trevas?” (2 Coríntios 6:14). O evangelho é êxodo: o Pai nos resgatou do domínio das trevas (Colossenses 1:13); “outrora também nós” vivíamos enganados e servindo às paixões (Tito 3:3); mas fomos chamados “das trevas para a sua maravilhosa luz” (1 Pedro 2:9). Por isso João pode dizer: “as trevas vão passando e a verdadeira luz já brilha” (1 João 2:8).

“Agora sois luz no Senhor”: essa identidade nasce do próprio Cristo. Ele é o Servo designado “luz para as nações”, que abre olhos e diz aos presos: “sai” (Isaías 42:6–7; 49:6; 49:9); por isso, “levanta-te, resplandece, porque vem a tua luz” (Isaías 60:1), e até as nações caminham ao teu resplendor (Isaías 60:3); no fim, o próprio SENHOR será a tua luz perpétua, sem pôr-do-sol (Isaías 60:19–20). O prólogo de João declara: “Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens… a luz resplandece nas trevas” (João 1:4–5), Ele é a “luz verdadeira que ilumina a todo homem” (João 1:9), e diz: “Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas” (João 8:12); “Eu vim como luz ao mundo, para que todo o que crê em mim não permaneça nas trevas” (João 12:46). Em Cristo nos foi dada sabedoria (1 Coríntios 1:30); contemplando a sua glória, somos transformados (2 Coríntios 3:18), porque o Deus que disse “Haja luz” (Gênesis 1:3) resplandeceu em nossos corações para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face de Cristo (2 Coríntios 4:6). Por isso, “não estais em trevas” — sois “filhos da luz e do dia” — e, como tais, sóbrios e vigilantes (1 Tessalonicenses 5:4–8). João aplica o diagnóstico: quem ama permanece na luz; quem odeia anda nas trevas e não sabe para onde vai (1 João 2:9–11).

“Andai como filhos da luz”: se agora somos, devemos andar. Efésios 5:2 já mandou “andar em amor”; Isaías 2:5 convoca: “andemos na luz do SENHOR”. Jesus apela: “Enquanto tendes a luz, crede na luz, para que vos torneis filhos da luz” (João 12:36) — e até a parábola lembra que “os filhos da luz” devem ser diligentes no uso do tempo (Lucas 16:8). Andar na luz é andar “no Espírito” (Gálatas 5:25), viver como peregrinos que proclamam as virtudes de quem os chamou (1 Pedro 2:9–11) e, na prática diária, “andar na luz” — aí há comunhão e o sangue purifica (1 João 1:7).

As referências “recíprocas” reforçam o enredo inteiro: desde o “Haja luz” inaugural (Gênesis 1:3) até a ordem de manter as lâmpadas acesas no santuário (Levítico 24:2), Deus forma um povo que “hoje” se torna Seu (Deuteronômio 27:9) e aprende a caminhar “à luz” de Deus (Jó 29:3; Salmos 56:13), liberto “das trevas e da sombra da morte” (Salmos 107:14). Porque “a luz é mais excelente do que as trevas” (Eclesiastes 2:13), a nova estação chega (Cântico dos Cânticos 2:11), o “véu” é removido (Isaías 25:7), caem as ilusões dos ídolos (Isaías 44:9), e o Dia do SENHOR traz um cosmo reordenado (Zacarias 14:6). O “Sol da justiça” desponta (Malaquias 4:2); “vós sois a luz do mundo… assim resplandeça a vossa luz” (Mateus 5:14–16); mas se o “olho” é mau, todo o corpo fica em trevas (Mateus 6:23). O Ungido veio dar vista aos cegos (Lucas 4:18) e repetir: “Andai enquanto tendes a luz” (João 12:35). Daí em diante, “andar em novidade de vida” (Romanos 6:4), “honestamente, como de dia” (Romanos 13:13), lembrando que “fostes lavados” (1 Coríntios 6:11). Em Efésios 1:18, Deus ilumina os “olhos do coração”; e então o povo brilha como luseiros (Filipenses 2:15), “anda dignamente de Deus” (1 Tessalonicenses 2:12), vive “já do dia” (1 Tessalonicenses 5:5; 5:8), deixa o passado (1 Pedro 4:2) e segura firme a “candeia que alumia em lugar escuro” até que a estrela da manhã nasça (2 Pedro 1:19), perseverando em andar na verdade (2 João 1:4).

Assim, Efésios 5:7–8 costura toda a Escritura: sai da comunhão que contamina; entra na luz que transforma; e, por isso, anda conforme aquilo que, pela graça, já és em Cristo.

Paulo diz “fruto da luz” e, com isso, aponta para a vida gerada pelo Espírito. A lista clássica de “fruto do Espírito” (Gálatas 5:22–23) mostra as mesmas cores que Efésios 5:9 realça: aquilo que a luz produz em quem foi unido a Cristo. A primeira faceta é a bondade: os Salmos confessam que bem nenhum possuímos fora de Deus e do seu povo (Salmo 16:2–3), e Paulo lembra que é a bondade de Deus que nos conduz ao arrependimento (Romanos 2:4); por isso ele pode dizer à igreja que está cheia de bondade e habilitada a aconselhar (Romanos 15:14). Essa bondade é o transbordar do Bom Pastor a quem voltamos (1 Pedro 2:25) e deve ser imitada — “não imites o mal, mas o bem” (3 João 11). A segunda faceta é a justiça: Deus ama a justiça — o cetro do Filho é “cetro de equidade” (Hebreus 1:8) — e Ele nos enche de “frutos de justiça” por meio de Jesus (Filipenses 1:11). Por isso o discípulo é chamado a seguir a justiça (1 Timóteo 6:11), a praticá-la pela fé (Hebreus 11:33) e a viver para a justiça porque Cristo levou nossos pecados no madeiro (1 Pedro 2:24). João dá o teste prático: se Ele é justo, “todo aquele que pratica a justiça é nascido d’Ele” (1 João 2:29); quem é de Deus não vive na prática do pecado, e nisso se distinguem os filhos de Deus e os filhos do diabo (1 João 3:9–10). A terceira faceta é a verdade: em Efésios a verdade é o ar que a nova criação respira — “seguindo a verdade em amor” (Efésios 4:15), “deixai a mentira; cada um fale a verdade com o seu próximo” (Efésios 4:25), e “cingi-vos com a verdade” como couraça e cinto na batalha (Efésios 6:14). O retrato de Jesus diante de Natanael sela o ponto: “eis um israelita em quem não há dolo” (João 1:47). Assim, Efésios 5:9 resume: onde a luz do Espírito reina, brota bondade (o bem ativo), justiça (o reto agir) e verdade (a integridade que rejeita o engano).

Efésios 5:10 — “Aprovando o que é agradável ao Senhor.” A luz não só produz caráter; ela também discern e prova. A palavra de Paulo ecoa a experiência de Davi que “experimentou” a armadura de Saul e a rejeitou por não lhe convir (1 Samuel 17:39): vida cristã exige provação e aprovação. Por isso, “transformai-vos… para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (Romanos 12:1–2); é o mesmo chamado de “aprovar as coisas excelentes” (Filipenses 1:10) e de “examinar tudo, retendo o bem” (1 Tessalonicenses 5:21). E o que passa no crivo? Aquilo que é agradável ao Senhor. A Escritura educa a nossa sensibilidade: “Sejam agradáveis as palavras da minha boca” (Salmo 19:14); “fazer justiça e juízo é mais agradável ao SENHOR do que sacrifício” (Provérbios 21:3); jejuns e ofertas sem coração Deus não aceita (Isaías 58:5; Jeremias 6:20). Já o serviço no reino “agrada a Deus e é aprovado pelos homens” (Romanos 14:18), e ofertas de amor são “sacrifício agradável, de cheiro suave” (Filipenses 4:18). É “bom e agradável diante de Deus” orar e viver com piedade (1 Timóteo 2:3; 1 Timóteo 5:4); recebendo um reino inabalável, sirvamos “de modo agradável, com reverência e santo temor” (Hebreus 12:28), oferecendo “sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por Jesus Cristo” (1 Pedro 2:5) — inclusive quando sofrer injustamente por fazer o bem (1 Pedro 2:20). Efésios 5:10, portanto, nos chama a uma ética criteriosa: a luz nos treina a aprovar o que Deus aprova.

Efésios 5:11 — “E não vos associeis às obras infrutuosas das trevas; antes, reprovai-as.” Depois de dizer o que a luz produz e como ela discern e aprova, Paulo ensina como a luz lida com as trevas: não com neutralidade cúmplice, mas com ruptura e reprovação. “Não sejais participantes com eles” já tinha soado no versículo 7, e o eco percorre a Bíblia. Jacó recusou “entrar no conselho” violento de Simeão e Levi (Gênesis 49:5–7); “bem-aventurado o homem que não anda no conselho dos ímpios” (Salmo 1:1–2); Davi não se assentou com homens vãos (Salmo 26:4–5) e pergunta: “acaso o trono da iniquidade se associará a Ti?” (Salmo 94:20–21). A sabedoria manda: “não entres na vereda dos ímpios… afasta-te” (Provérbios 4:14–15) e “deixai as loucuras e vivei” (Provérbios 9:6); Jeremias testemunha que não se assentou na roda dos escarnecedores (Jeremias 15:17). No Novo Testamento, Paulo ordena marcar e evitar os que causam divisões (Romanos 16:17); não se associar com quem leva o nome de irmão e vive em pecado (1 Coríntios 5:9–11); e lembra que não se pode beber “o cálice do Senhor” e “o cálice dos demônios” (1 Coríntios 10:20–21). O princípio se amplia: “não vos prendais a um jugo desigual” (2 Coríntios 6:14–18); “apartai-vos de todo irmão que vive desordenadamente” e “não vos associeis” a quem não obedece à palavra (2 Tessalonicenses 3:6; 3:14); “afasta-te dos tais” (1 Timóteo 6:5); “afasta-te” daqueles que têm forma de piedade, mas negam o poder (2 Timóteo 3:5). A mesma linha aparece na hospitalidade: não recebas nem saúdes o falso mestre (2 João 10–11). E, no grande juízo contra a Babilônia, volta o brado: “Sai dela, povo meu” (Apocalipse 18:4).

Paulo chama essas obras de “infrutuosas” porque seu fim é esterilidade e perdição: “comerão do fruto do seu caminho” (Provérbios 1:31); “ai do ímpio! mal lhe irá” (Isaías 3:10–11); “das coisas de que agora vos envergonhais… o fim delas é morte” (Romanos 6:21); “quem semeia para a carne ceifará corrupção” (Gálatas 6:8). São “obras das trevas” porque se amam e se escondem nelas (Jó 24:13–17; João 3:19–21), porque trocam a verdade pela mentira (Romanos 1:22–32) e pertencem à noite que precisamos despir (Romanos 13:12; 1 Tessalonicenses 5:7). A alternativa cristã não é silêncio conivente, mas reprovação amorosa e firme: “não odiarás teu irmão… repreenderás o teu próximo” (Levítico 19:17); “fira-me o justo, será excelente bálsamo” (Salmo 141:5); “não repreendas o escarnecedor”, mas “corrige o sábio” (Provérbios 9:7–8); quem rejeita a repreensão caminha para a quebra sem cura (Provérbios 13:18; 29:1), ao passo que a repreensão sábia é jóia (Provérbios 25:12) e instrução (Provérbios 19:25; 15:12). Os profetas denunciaram quem “faz o inocente culpado” (Isaías 29:21); Jesus estabeleceu o caminho de amor que confronta: “se teu irmão pecar, vai e repreende-o entre ti e ele” (Mateus 18:15); João Batista reprovou Herodes (Lucas 3:19); e os pastores são chamados a repreender, censurar e exortar com toda longanimidade (1 Timóteo 5:20; 2 Timóteo 4:2; Tito 2:15).

Efésios 5:9–11, portanto, costura uma lógica inseparável: a luz gera caráter (bondade, justiça, verdade), a luz discern e aprova o que agrada a Deus, e a luz rompe e reprova aquilo que, por mais sedutor, é esterilidade de trevas. Onde essa tríade floresce, a igreja deixa de ser cúmplice e se torna testemunha.

Paulo não está estimulando curiosidade doentia; ele está coibindo-a. A ética do capítulo já tinha exigido: “nem ainda se nomeie entre vós” imoralidade ou impureza (Efésios 5:3) e “conversação torpe, palavras vãs ou chocarrices” (Efésios 5:4). O versículo 12 explica o porquê: o pecado gosta do segredo, e o próprio narrar dele de modo leviano pode normalizá-lo. Isso ecoa Jesus: “os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras eram más; todo aquele que pratica o mal aborrece a luz e não vem para a luz, para que as suas obras não sejam reprovadas” (João 3:19–20). O Antigo Testamento descreve essa clandestinidade moral: “armam laços às escondidas… intentam iniquidades… e dizem: ‘Quem nos verá?’” (Salmo 64:5–6); “águas roubadas são doces” (Provérbios 9:17) — o prazer do ilícito cresce no esconderijo. Quando a vergonha morre (“não sabem envergonhar-se”, Jeremias 6:15), a sociedade já está com a consciência cauterizada. Por isso Paulo, em outra igreja, não sensacionaliza o caso “tão imoral que nem entre os gentios se nomeia” (1 Coríntios 5:1); ele chama a comunidade a disciplina santa, não a comentários picantes. Em Efésios 5:12, então, a regra é pastoral: não façam do segredo do pecado assunto de recreio; calar o sensacionalismo protege a pureza da igreja e prepara o terreno para a verdadeira reprovação que vem da luz (v. 13).

Efésios 5:13 — “Mas todas as coisas, quando reprovadas pela luz, se tornam manifestas; porque tudo que se manifesta é luz.” Aqui Paulo explica a dinâmica do verso anterior: a tarefa não é descrever trevas, mas trazer luz. “Reprovar” (v. 11) significa confrontar com a verdade, e a luz torna visível o que estava escondido. É o jeito de Deus trabalhar desde o princípio: “Haja luz” (Gênesis 1:3). Paulo aplica esse fiat criador à conversão: “Deus, que disse: Das trevas resplandecerá a luz, brilhou em nossos corações para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face de Cristo” (2 Coríntios 4:6). A **entrada da tua palavra dá luz” (Salmo 119:130); “o mandamento é lâmpada e a lei é luz” (Provérbios 6:23). É por isso que Jesus se apresenta como “a luz do mundo” (João 8:12; 9:5) e conclama: “Andai enquanto tendes a luz, para que as trevas não vos apanhem… crede na luz, para que vos torneis filhos da luz” (João 12:35–36, 46). O versículo 13 afirma algo profundo: a luz não só expõe; ela tem poder transformador — “tudo que se manifesta é luz”. Quando a verdade evangelho expõe, ela transfere pessoas “das trevas para a luz e do poder de Satanás para Deus” (Atos 26:18); quem é alcançado deixa de ser “trevas” e passa a ser “luz no Senhor” (Efésios 5:8). Por isso, quando a igreja reúne e a palavra penetra, “os segredos do coração se tornam manifestos” e o visitante “adorará a Deus” (1 Coríntios 14:24–25); a exposição não é humilhação pública — é luz salvadora. E porque “somos do dia” (1 Tessalonicenses 5:5), despimos “as obras das trevas” e nos armamos “com as armas da luz” (Romanos 13:12). Assim, Efésios 5:13 amarra a missão: a igreja não vence o oculto comentando o oculto, mas acendendo a luz da Palavra — a mesma luz que Deus acendeu na criação e reacende, agora, nos corações.

Paulo cita (ou compõe) um hino de despertamento: “Desperta, tu que dormes, levanta-te dentre os mortos, e Cristo te iluminará.” O “ele/isto” (he/it) sinaliza que é uma proclamação que chama o pecador da letargia para a luz de Cristo. Os profetas já usavam esse chamado: Isaías 51:17 e 52:1 conclamam Sião a acordar do torpor do exílio, e Isaías 60:1 manda levantar-se porque “veio a tua luz”, exatamente o movimento que Paulo aplica à conversão. No Novo Testamento, Romanos 13:11–12 traduz “despertar do sono” em urgência ética: já raiou o dia da salvação; por isso, deixem “as obras das trevas” — ideia idêntica ao contexto de Efésios 5. 1 Coríntios 15:34 ordena “despertai para a justiça e não pequeis”, conectando sobriedade doutrinária e santidade prática; 1 Tessalonicenses 5:6 manda “não durmamos… mas vigiemos e sejamos sóbrios”, contraponto direto entre sono moral e vigilância; 2 Timóteo 2:26 descreve gente “despertando” do laço do diabo — a libertação por meio do evangelho que Efésios 5 anuncia.

O segundo imperativo (“levanta-te dentre os mortos”) ecoa o milagre do novo nascimento: Efésios 2:5 já disse que Deus “nos vivificou”; Isaías 26:19 promete ressurreição (“os teus mortos viverão”), que Paulo antecipa espiritualmente na conversão; a visão dos ossos secos em Ezequiel 37:4–10 mostra o Espírito reconstituindo um povo — imagem perfeita do que a luz faz nas trevas; João 5:25–29 fala de uma “hora” em que os mortos ouvirão a voz do Filho e viverão (primeiro espiritualmente, depois fisicamente), e João 11:43–44 ilustra: Lázaro sai do túmulo ao ouvir a voz de Cristo, modelo do chamado eficaz; Romanos 6:4–5, 13 aplica isso: ressuscitados com Cristo, andem em novidade de vida, consagrando membros à justiça; Colossenses 3:1 conclui: se vocês “ressuscitaram com Cristo”, busquem as coisas do alto — exatamente “levantar-se” para viver na luz.

A cláusula final (“e Cristo te iluminará”) aponta para quem é a Luz: João 8:12 e 9:5 identificam Jesus como “a luz do mundo”; Atos 13:47 cita a vocação messiânica: luz para as nações, que chega aos gentios — tema central de Efésios; 2 Coríntios 4:6 explica o mecanismo: o mesmo Deus que disse “Haja luz” brilha no coração pelo evangelho de Cristo; 2 Timóteo 1:10 diz que Cristo “trouxe à luz a vida e a incorrupção” — a iluminação prometida no versículo. As referências “recíprocas” reforçam esse arco: do “Haja luz” de Gênesis 1:3 ao contraste morte/vida de Gênesis 2:17; os chamados a “levantar” (Juízes 5:12; 1 Crônicas 22:16; Atos 12:7), as imagens de despertar (Jó 14:12; Salmo 13:3), a entrada da luz pela Palavra (Salmo 119:130), os avisos contra o entorpecimento (Provérbios 6:9; 19:15; 20:13; 24:33), o povo que andava em trevas vendo grande luz (Isaías 9:2; 29:18; 35:5; 49:9), o clamor do capitão a Jonas (Jonas 1:6), os convites de Jesus a andar na luz (João 12:35–36, 46) e o resumo apostólico: Deus nos tira das trevas para a luz (Atos 26:18); tudo converge na mesma lógica de Efésios 5:14.

Efésios 5:15 “Vede prudentemente como andais, não como néscios, mas como sábios.” O “vede” exige atenção reverente: Mateus 8:4; 27:4, 24 mostram “ver” como ato responsável; 1 Tessalonicenses 5:15 e Hebreus 12:25 mandam vigiar para não pagar mal por mal nem recusar a voz de Deus; 1 Pedro 1:22 liga obediência à verdade e pureza fraterna; Apocalipse 19:10 lembra que o testemunho de Jesus rege nosso discernimento. “Andar” com prudência retoma o fio bíblico: Êxodo 23:13: “Guardai-vos de tudo que vos tenho dito”; Mateus 10:16: “sede prudentes como as serpentes e simples como as pombas”; 1 Coríntios 14:20: deixem a infantilidade no entendimento; Filipenses 1:27: que o vosso modo de viver seja digno do evangelho; Colossenses 1:9; 4:5: viver com sabedoria “para com os de fora”. O contraste “não como néscios” aparece quando Davi se acusa de insensatez (2 Samuel 24:10), Jó corrige uma leitura tola do sofrimento (Jó 2:10), o salmista confessa ter sido “como um animal” (Salmo 73:22), Provérbios 14:8 opõe a prudência à loucura, as virgens néscias de Mateus 25:2 falham em vigilância, Jesus chama de nécios os tardos a crer (Lucas 24:25), Gálatas 3:1, 3 denuncia começar no Espírito e tentar completar na carne, 1 Timóteo 6:9 adverte contra precipitação ruinosa, e Tiago 3:13 define a verdadeira sabedoria em boa conduta — tudo isso explica o “como sábios” de Efésios 5:15.

Efésios 5:16 “Remindo o tempo, porque os dias são maus.” “Remir” é aproveitar cada oportunidade: Eclesiastes 9:10 chama a fazer com diligência “tudo quanto te vier à mão”; Romanos 13:11 volta à urgência: já é hora de despertar; Gálatas 6:10 orienta a usar as ocasiões para o bem; Colossenses 4:5 repete literalmente “remindo o tempo” no trato com os de fora. Por que essa urgência? “Porque os dias são maus”: a armadura de Efésios 6:13 (no “dia mau”) e os pés calçados com o evangelho (Efésios 6:15) pressupõem oposição real; Salmo 37:19 promete preservação “nos dias maus”; Eclesiastes 11:2 e 12:1 advertem a prover-se e lembrar-se do Criador “antes” que cheguem os dias difíceis; Amós 5:13 diz que, em tempos maus, o prudente se cala — logo, fale e aja quando há chance; João 12:35: “Andai enquanto tendes luz”; Atos 11:28–29 mostra a igreja respondendo a uma crise com prontidão; 1 Coríntios 7:26, 29–31 aconselha decisões à luz da “presente angústia” e da brevidade do tempo. Remir o tempo, portanto, é viver missionariamente, atento ao caráter hostil da época.

Efésios 5:17 “Por isso, não sejais insensatos, mas entendei qual seja a vontade do Senhor.” A Bíblia sempre enlaça sabedoria e vontade de Deus: Deuteronômio 4:6 chama de sabedoria obedecer aos estatutos; 1 Reis 3:9–12 mostra Deus dando entendimento para “discernir entre o bem e o mal”; Jó 28:28 resume: “o temor do Senhor é sabedoria”; Salmo 111:10 e 119:27 vinculam entendimento aos mandamentos. Provérbios 2:5; 14:8; 23:23 insistem em buscar, ponderar e “comprar a verdade”. O oposto é trágico: Jeremias 4:22 acusa um povo “sábio para o mal”; João 7:17 ensina que quem quer fazer a vontade de Deus conhecerá a doutrina — entender nasce da obediência. No Novo Testamento, Romanos 12:2 manda renovar a mente para experimentar a vontade boa, perfeita e agradável; Colossenses 1:9 ora por “pleno conhecimento da Sua vontade”; 1 Tessalonicenses 4:1–3; 5:18 explicitam essa vontade (santificação, ação de graças); 1 Pedro 4:2 conclui: viver o resto do tempo não mais segundo as concupiscências dos homens, mas segundo a vontade de Deus. É isso que Efésios 5:17 exige: inteligência espiritual que traduz discernimento em prática.

Efésios 5:18 “E não vos embriagueis com vinho, no qual há devassidão, mas enchei-vos do Espírito.” A primeira metade encontra abundante testemunho bíblico: Gênesis 9:21 (Noé vulnerável pela embriaguez) e Gênesis 19:32–35 (Ló em degradação moral) exemplificam como o álcool desarma a consciência; Deuteronômio 21:20 associa “comilão e beberrão” à rebeldia; Salmo 69:12 descreve o zombar do ébrio; Provérbios 20:1 adverte que o vinho é escarnecedor e Provérbios 23:20–21, 29–35 detalham o ciclo vicioso da bebedeira; Isaías 5:11–13, 22 denuncia embriaguez que entorpece para a justiça; Mateus 24:49 e Lucas 12:45; 21:34 mostram a embriaguez como sinal de insensibilidade escatológica; Romanos 13:13 proíbe “orgias e bebedices”; 1 Coríntios 5:11; 6:10; 11:21 ligam a prática à disciplina e à exclusão do Reino; Gálatas 5:21 inclui-a nas “obras da carne”, e 1 Tessalonicenses 5:7 observa: “os que se embriagam, embriagam-se de noite.” O termo “devassidão” casa com Mateus 23:25 (excesso impuro) e 1 Pedro 4:3–4 (extravios, orgias, bebedices). A segunda metade (“enchei-vos do Espírito”) não é um vazio moral, mas um encher alternativo: Deus satisfaz a alma melhor do que o vinho (Salmo 63:3–5; Cantares 1:4; 7:9 usam a metáfora do gozo); as promessas de banquete e sede saciada (Isaías 25:6; 55:1) antecipam a abundância do Espírito; Zacarias 9:15–17; 10:7 falam de alegria divina que supera o vinho. Jesus garante o dom do Espírito ao que pede (Lucas 11:13). Em Pentecostes, alguns zombam dizendo “estão cheios de mosto” (Atos 2:13), mas Pedro corrige: é o cumprimento de Joel — “derramarei do meu Espírito” (Atos 2:14–18); Barnabé é descrito como “cheio do Espírito” (Atos 11:24). Esse enchimento produz caráter (Gálatas 5:22–25) e cântico, gratidão e submissão (os frutos que Paulo lista nos vv. 19–21). Assim, Efésios 5:18 não é mera proibição: é um convite a uma plenitude que governa a mente e o comportamento, em contraste direto com a entorpecência da carne.

Em Efésios 5:19 Paulo mostra o transbordamento prático do “enchei-vos do Espírito”: a comunidade passa a instruir-se mutuamente por meio de cânticos que carregam a Palavra. O paralelo com Colossenses 3:16 confirma isso: quando a Palavra de Cristo habita ricamente, “ensinando e admoestando-vos uns aos outros” acontece por “salmos, hinos e cânticos espirituais”. “Salmos” (cantos sagrados tradicionalmente acompanhados por cordas) remetem naturalmente ao livro de Salmos e ao uso de Davi (Salmos 95:2; 105:2; ver também 1 Crônicas 16:9); “hinos” são louvores explícitos a Deus (Mateus 26:30 mostra Jesus e os discípulos cantando após a ceia); “cânticos espirituais” são composições poéticas direcionadas a Deus e saturadas do Espírito. O “cantando e salmodiando ao Senhor no coração” preserva a sinceridade do culto: não é performance, é devoção (Salmos 47:7–8; 86:12; 147:7), em espírito e em verdade (João 4:23–24), o oposto do louvor de lábios com coração distante (Mateus 15:8). Por isso a igreja canta até nas cadeias, edificando a si mesma e testemunhando ao mundo (Atos 16:25; 1 Coríntios 14:26; Tiago 5:13); e a história bíblica inteira associa a obra de Deus a um povo que canta (Salmos 92:1; 138:1; Hebreus 13:15).

Em Efésios 5:20 o mesmo enchimento do Espírito se manifesta numa gratidão abrangente: “sempre, por tudo”, ao “Deus e Pai”, e “em nome de nosso Senhor Jesus Cristo”. Jó exclamou “o Senhor o deu, o Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor” (Jó 1:21), Davi jurou bendizer ao Senhor em todo o tempo (Salmos 34:1), e Isaías recita as misericórdias do Senhor (Isaías 63:7): essa é a tonalidade da vida cristã. No Novo Testamento, os apóstolos constantemente rendem graças por pessoas e circunstâncias (Atos 5:41; 1 Coríntios 1:4; Filipenses 1:3; Colossenses 1:11–12; 1 Tessalonicenses 3:9; 5:18; 2 Tessalonicenses 1:3; 2:13). O modo é “em nome de Jesus”, que não é fórmula vazia, mas mediação real: pedir e render graças no nome do Filho é alinhar-se à vontade do Pai e acessar sua graça (João 14:13–14; 15:16; 16:23–26; Colossenses 3:17). Assim, o “sacrifício de louvor” se torna contínuo (Hebreus 13:15; 1 Pedro 2:5; 4:11).

Em Efésios 5:21 Paulo coroa o trio com a disposição que preserva a harmonia: “sujeitando-vos uns aos outros no temor de Cristo.” Não é servilismo, é reverência prática que reconhece Cristo como Senhor e, por isso, aprende a colocar o outro em primeiro lugar (Filipenses 2:3). A Escritura inteira honra estruturas de submissão por amor a Deus: Hagar retorna e se submete (Gênesis 16:9), as lideranças legítimas são reconhecidas (1 Crônicas 29:24), a igreja se submete a servos fiéis (1 Coríntios 16:16), e os crentes se sujeitam às autoridades civis “por causa do Senhor” (Romanos 13:1–5; 1 Pedro 2:13). No âmbito eclesial, obedecer e ser persuadido por líderes que velam pelas almas evita contendas e promove paz (Hebreus 13:17). Tudo isso se faz “no temor” — a consciência viva de Deus que impede abusos e parcialidades (2 Crônicas 19:7; Neemias 5:9, 15; Provérbios 24:21; 1 Pedro 2:17). Este versículo funciona como dobradiça para as relações domésticas que virão (Efésios 5:22–6:9): a submissão mútua, orientada por Cristo, é a atmosfera onde o cântico sincero e a gratidão constante realmente florescem.

Efésios 5:22. O chamado às esposas para “submeter-se… como ao Senhor” não nasce de capricho cultural; ele se ancora no padrão da criação, no drama da queda e na ordem redentora. Depois da desordem introduzida em Gênesis 3:16, a Escritura volta a ordenar a vida do povo de Deus, pedindo que a submissão seja “no Senhor”, isto é, sob a autoridade de Cristo e com vistas à sua glória (Colossenses 3:18–25). Paulo mantém a mesma linha em 1 Coríntios 14:34 e em Tito 2:5, e Pedro mostra como esse espírito se traduz em pureza e respeito que ganham o coração do marido “sem palavra”, à semelhança de Sara (1 Pedro 3:1–6). O “como ao Senhor” também conecta com a ética do trabalho “como a Cristo”, não como a homens (Efésios 6:5; Colossenses 3:22–23): a referência final de toda obediência cristã é o próprio Cristo.

Efésios 5:23. A razão dada por Paulo é cristológica: “o marido é o cabeça da mulher, como também Cristo é o cabeça da igreja”. Essa metáfora já foi estabelecida antes na carta (Efésios 1:22–23; 4:15) e ecoa a teologia de Colossenses 1:18: Cristo, Cabeça e Fonte de vida do seu corpo. Em 1 Coríntios 11:3–10, Paulo expõe o princípio da “cabeça” como ordem de autoridade que honra a criação e a glória de Deus. Importante: o modelo de “cabeça” não é domínio frio, mas cuidado que salva e preserva; Cristo é Cabeça que resgata com o próprio sangue (Atos 20:28; Apocalipse 5:9) e livra da ira (1 Tessalonicenses 1:10). Assim, a liderança do marido deve espelhar a liderança redentora de Cristo.

Efésios 5:24. “Assim como a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo aos maridos.” O paralelo reforça que a submissão é um ato de fé e adoração, não de inferioridade ontológica. Paulo aplica o mesmo princípio às demais esferas da vida: filhos e servos obedecem “no Senhor”, reconhecendo uma ordem que visa edificação e paz (Efésios 5:33; Colossenses 3:20, 22; Tito 2:7, 9). A referência à igreja guarda a medida: a submissão é “como a igreja a Cristo”, ou seja, dentro de parâmetros santos, para o bem do lar e a glória do Senhor.

Efésios 5:25. Se o versículo 22 aponta a postura da esposa, o 25 estabelece o peso maior sobre o marido: “Maridos, amai vossas esposas, como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela.” O padrão é o amor sacrificial do Messias: Ele “se entregou” (Efésios 5:2), “veio para servir e dar a sua vida” (Mateus 20:28), partiu o pão e o cálice como sinal de entrega (Lucas 22:19–20), deu sua carne para a vida do mundo (João 6:51), comprou a igreja com seu sangue (Atos 20:28; Gálatas 1:4; 2:20; 1 Timóteo 2:6; 1 Pedro 1:18–21; Apocalipse 1:5; 5:9). Por isso, o amor conjugal não é sentimento volúvel, mas pacto que protege, nutre e se sacrifica. Ele se enraíza no desígnio original da união “uma só carne” (Gênesis 2:24), rejeita amargura (Colossenses 3:19) e honra a esposa como coerdeira da graça (1 Pedro 3:7). Assim, a “submissão” do 22 é enquadrada pela “cruciformidade” do 25: quando o marido ama como Cristo, o lar se torna um ícone vivo do evangelho.

Efésios 5:26. O amor sacrificial do Messias tem um objetivo: santificar e purificar a sua noiva “com a lavagem de água pela palavra”. Jesus já havia orado por essa santificação: “Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade” (João 17:17–19), e declarou que seus discípulos estavam “limpos pela palavra” (João 15:3; ver também João 17:7). Essa purificação une os dois grandes fios do evangelho: o sangue que limpa a consciência (Hebreus 9:14; 10:10) e o Espírito que aplica essa obra, lavando e renovando (Tito 3:5–7; 1 Coríntios 6:11; 1 Pedro 1:2). O Antigo Testamento já antecipava esse banho nupcial: o Senhor aspergiria água pura e limparia o seu povo (Ezequiel 36:25; ver Ezequiel 16:9; Zacarias 13:1). No Novo Testamento, esse “lavar” se associa ao novo nascimento “da água e do Espírito” (João 3:5), ao apelo do batismo como invocação do Nome que lava pecados (Atos 22:16) e ao acesso sincero a Deus com “o corpo lavado com água pura” (Hebreus 10:22). Em resumo, Cristo ama de modo eficaz: ele se entrega, e então, pela Palavra e pelo Espírito, realmente torna sua igreja santa.

Efésios 5:27. O propósito seguinte é nupcial: apresentar a igreja a si mesmo “gloriosa, sem mácula, nem ruga”. Paulo já falara desse “noivado” puro (2 Coríntios 11:2) e de nos apresentar santos e irrepreensíveis (Colossenses 1:22, 28; Judas 24). A linguagem ecoa o culto: Deus sempre exigiu ofertas “sem defeito” (Levítico 1:3), apontando para a noiva descrita como perfeitamente formosa (Cântico dos Cânticos 4:7). Os profetas viram Sião revestida de glória (Salmo 45:13; Isaías 60:15–20; Isaías 62:3; Jeremias 33:9), e o Apocalipse mostra essa realidade consumada: uma multidão purificada (Apocalipse 7:9–17) e a cidade-noiva resplandecente, onde “nunca jamais penetrará coisa alguma contaminada” (Apocalipse 21:10–27). O amor de Cristo, portanto, não só perdoa; ele embeleza e conforma a noiva ao padrão da santidade (Efésios 1:4; 1 Tessalonicenses 5:23).

Efésios 5:28–29. Da teologia à prática: “Assim devem os maridos amar as suas mulheres como aos seus próprios corpos.” A lógica é criacional: marido e esposa são “uma só carne” (Gênesis 2:21–24; Mateus 19:5–6). Amar a esposa é, portanto, cuidar de si mesmo; por isso “ninguém jamais odiou a sua própria carne”, antes a “nutre e dela cuida”. Esse verbo duplo espelha o próprio Cristo-Pastor, que ajunta, alimenta e conduz com ternura (Isaías 40:11; Ezequiel 34:14–15), dando-se como pão vivo que sustenta a vida do seu povo (João 6:50–58). Onde o evangelho molda o coração do marido, desaparecem dureza e negligência (Provérbios 11:17; Colossenses 3:19), e floresce cuidado paciente, protetor e providente — o mesmo cuidado com que Cristo trata sua igreja.

Efésios 5:30. A razão final fecha o círculo: “porque somos membros do seu corpo.” Essa união orgânica já percorre a carta (Efésios 1:23) e se amplia em toda a teologia paulina: muitos membros, um só corpo em Cristo (Romanos 12:5; 1 Coríntios 6:15; 12:12–27; Colossenses 2:19). Tocar na igreja é tocar em Cristo (Atos 9:4); logo, a ética do casamento não é um acessório moral, mas um sacramento vivo da união Cristo–igreja. É por isso que o amor que santifica (v. 26), a beleza que Cristo opera (v. 27) e o cuidado que nutre (vv. 28–29) desembocam nesta confissão: pertencemos a Ele — e, pertencendo a Ele, pertencemos uns aos outros.

Efésios 5:31. Paulo cita Gênesis 2:24 para ancorar o casamento no projeto criacional: deixar, unir e tornar-se “uma só carne”. O próprio Jesus aplicou esse texto para afirmar a indissolubilidade da união (Mateus 19:5; Marcos 10:7–8), e Paulo já o usara para mostrar que até a união sexual cria um vínculo real de “um só corpo” (1 Coríntios 6:16). Assim, amar a esposa “como ao próprio corpo” (contexto de Efésios 5:28–29) não é metáfora frouxa: é consequência direta da realidade criacional — dois tornam-se um. Esse fundamento corrige tanto o poliamor e a poligamia antigas (ecoadas negativamente em Juízes 8:30) quanto o utilitarismo moderno: a ética matrimonial nasce de Gênesis e é reafirmada pelo Messias.

Efésios 5:32. Aqui Paulo revela o “mistério” por trás do casamento: o casal é um sinal visível da aliança invisível entre Cristo e a igreja. O “mistério” em Efésios nunca é um enigma esotérico, mas um plano divino antes oculto e agora anunciado (ver Efésios 3:4; comparar com Colossenses 2:2 e 1 Timóteo 3:16). Por isso toda a linguagem nupcial da Bíblia converge para o Messias e seu povo: a princesa adornada do Salmo 45, a noiva do Cântico dos Cânticos, o Deus-Esposo que toma Sião por esposa (Isaías 54:5; 62:4–5), o Noivo de quem João Batista é “amigo” (João 3:29), o zelo apostólico por uma “virgem pura” para Cristo (2 Coríntios 11:2) e, por fim, as Bodas do Cordeiro (Apocalipse 19:7–8; 21:2). O casamento cristão, portanto, não é fim em si: ele aponta para a comunhão redentora Cristo–Igreja.

Efésios 5:33. A aplicação é dupla e assimétrica, porque segue a tipologia do mistério: “o marido ame… e a esposa respeite.” O padrão do marido é o amor sacrificial de Cristo (reafirmado no próprio contexto: Efésios 5:25, 28–29; paralelo em Colossenses 3:19; 1 Pedro 3:7). O chamado da esposa é a atitude de respeito que a igreja deve ao seu Senhor (conforme Efésios 5:22, 24), um “temor reverente” que a Escritura associa à honra devida às autoridades e aos pais (1 Reis 1:31; Ester 1:20; Hebreus 12:9) e que Pedro descreve como pura conduta cheia de respeito (1 Pedro 3:2–6). Quando cada parte encarna seu papel à luz do evangelho, o lar torna-se um ícone vivo do grande mistério: o amor que Cristo tem por sua igreja e a reverência confiante com que a igreja responde ao seu Noivo.

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