Interpretação de Colossenses 3

Interpretação de Colossenses 3




Colossenses 3
3:1-3. O cristão não só morreu mas também ressuscitou com Cristo. Em sua experiência real ele reside “nos lugares celestiais” (Ef. 2:6). A velha dispensação ainda se manifesta no cristão individual – ele peca, fica doente, morre; a nova dispensação permanece oculta, apenas realizada no corpo do Salvador. Não obstante, no ano 30 D.C. sua existência na velha dispensação morreu, crucificada com Cristo (cons. II Co. 5:14; Gl. 2:20). Isto exige que o cristão busque (na inclinação de sua vontade) e dirija sua afeição (froneite, na inclinação de sua mente) para a realidade da nova dispensação lá do alto (cons. Rm. 12:1,2). “Lá do alto” e “aqui” (ou da terra) nas cartas de Paulo e João nem sempre indicam contrastes espaciais, embora esse tipo de expressão naturalmente esteja envolvendo uma referência a Cristo e aos céus. Os termos expressam um contraste crucial no relacionamento temporal – a velha dispensação e a nova.
No ano 30 A.D. a nova dispensação surgiu inesperadamente na história da ressurreição de Cristo. Mas Cristo, em quem a nova dispensação atualmente inere, está em cima, enquanto o mundo continua nas profundezas da velha dispensação. Os cristãos atualmente existem “lá no alto”, isto é, na nova dispensação, apenas “em Cristo” e através da habitação do Espírito Santo neles. Mas sua existência comunitária em Cristo não é menos real que a sua existência individual. A cidadania de um cristão está na “Jerusalém que é de cima” (Gl. 4:26), e isto exige uma transformação contínua da sua mente e vontade em relação a esta realidade. Conformar-se ao ritual, ao cerimonial, aos “poderes” medianeiros da velha dispensação é negar a vida comunitária ressurreta com Cristo.
4. No sentido de que Cristo ... é a nossa vida, um cristão “percebe” mesmo agora a consumação de sua união com Cristo. Mas na parousia, isto é, quando Cristo vier novamente, o cristão estará com ele não meramente no sentido comunitário, mas cheio de glória individualmente (cons. Rm. 8:18; lI Co. 3:18). Este é o aspecto “futurista” do ensino escatológico de Paulo. Manifestar (faneroo), embora não seja tão comum quanto parousia, tem sido usado em diversas passagens para indicar o segundo advento de Cristo (II Ts. 2: 8; lI Co. 5:10; I Tm. 6:14; lI Tm. 4:1, 8; cons. I Pe. 5:4; I Jo. 2:28; 3:2).
IV. O Senhorio de Cristo na Vida do Cristão. 3:5 – 4:6.
No padrão paulino (cons. Rm. 12:1; Ef. 4:1), uma transição do modo indicativo doutrinário para o imperativo ético aparece agora. Não há, é claro, uma absoluta dicotomia na seqüência doutrina-ética. Se Paulo diz alguma coisa nesta forma literária, é por que a doutrina é a base da ética: O que um homem crê determina substancialmente como ele age.
A. O Imperativo Cristão: Pôr em Prática Individualmente a Realidade do Viver “em Cristo”. 3:5-17.
5. Membros ... sobre a terra (E.R.C.) provavelmente não se refere aos órgãos literalmente corporais usados para a imoralidade (Moule; cons. I Co. 6: 15) mas às atitudes e ações corporais que expressam “o velho homem” (Bruce; cons. Rm. 7:23; 8:13). Incluído nisto (como também na fornicação) está o pecado da avareza: desejo aquisitivo ou egoísmo. Talvez, o moderno e materialista Cristianismo, precise muito de um voto de nada possuir e de uma oração para libertação das coisas e da ambição. (O pensamento é de A. W. Tozer.) Chamar a avareza de idolatria não é forte demais se percebermos que, quando nós desejamos fortemente possuir uma coisa, ela passa na realidade a possuir parte de nós.
6. Ira. (orge; cons. TWNT, V, especialmente pág. 419-448) está freqüentemente associada com indignação (thymos), quando ocasionalmente atribuídas a Deus (Rm. 2:8; cons. Ap. 16:19; 19:15). Para o homem, a ira não está proibida de maneira absoluta, como na doutrina dos estóicos da apatheia (veja Ef. 4:26; cons. I Co. 14:20; Jo. 2:13-17; Tg. 1:19, 20). Não obstante, Paulo não a descreve como característica do “velho homem” (Ef. 4:31; Cl. 3:8; cons. Rm. 12:19).
O conceito da ira de Deus não é resquício de uma primitiva ideologia do V.T. A ira de Deus é a base para o temor de Deus (Hb. 10:31; Tg. 4:12; Mt. 10:28); e não deve ser compreendida como uma emoção momentânea mas como uma disposição assentada, um princípio de retribuição (Rm. 1:18; 3:5; 9:22; cons. Jo. 3:36; Hb. 3:11), não diferente da de um governador terreno (Rm. 13 : 4, 5 ; cons. Hb. 11:27). Costuma ser associada ao dia do juízo (Rm. 2:5; I Ts. 1:10). Longe de negar o amor de Deus, Sua ira a confirma. Pois sem justiça, a misericórdia perde seu significado. (Cons. R. V. G. Tasker, The Biblical Doctrine of The Wrath of God.)
7,8. Cons. 2:6. Do vosso falar pode se referir a todos os pecados relacionados. O pecado expresso em palavras é contagioso, e o controle da expressão do pecado é um grande passo para a libertação.
9,10. Despistes (apekdysamenoi), referindo-se ao momento da conversão, transmite a idéia de desvestir, como se fosse uma roupa, e de declarar uma sentença contra o velho homem, isto é, pela identificação com Cristo na Sua morte (veja 2:15). Neon (novo), ou, como está em outra passagem, kainos (por exemplo, Ef. 4:24) interpreta-se pelo que vem a seguir, que se refaz. Isto é, a existência comunitária “em Cristo” está se desenvolvendo no cristão individualmente (cons. II Co. 3:18; veja Introdução). Assim, a imagem de Deus, que o primeiro Adão deixou de perceber, está para se cumprir nos filhos do segundo Adão (cons. Gn. 1:26; Hb. 2:5 e segs.; Rm. 8:29; I Co. 15:45 e segs.). Isto significa que os crentes não vestem simplesmente os novos atributos, mas passam por uma transformação psicológica que, por ocasião da parousia de Cristo, isto é, Sua segunda vinda, serão vistos em seu caráter radical e compreensivo (Rm. 12:2; I Co. 15:53). Os cristãos, conforme expressa a Epístola de Diogneto escrita no segundo século, pertencem a uma “nova raça”. Conhecimento. Veja 1:9.
11. Cita. O mais baixo tipo de escravo bárbaro. Em Cristo todas as distinções são transcendentes; aos pés da cruz o chão é plano. Não é, entretanto, o nivelamento da moderna ética socialista, que apenas pode produzir a “nova classe” de Djilas. Não é uma uniformidade de status no presente mundo, mas uma mudança de atitude pela qual o estigma de ser diferente desaparece por causa do amor. É “uma unidade na diversidade, uma unidade que transcende as diferenças e as tarefas dentro delas, mas nunca uma unidade que ignora ou nega as diferenças ou que necessariamente as procure aniquilar” (E. E. Ellis, “Segregation and the Kingdom of God”, Christianity Today, I, 12. Março 18, 1957, pág. 8). Assim o apóstolo, que declarou que em Cristo “não há macho nem fêmea” e “não há judeu nem grego”, ao mesmo tempo instruiu as mulheres a ficarem em silêncio nas igrejas e observava ritos judeus que tinha proibido aos gentios (Gl. 3:28; l Co. II:3 e segs.; 14:34; Atos 16:3; 18:18; Rm. 14; Gl. 5:2,3). Veja 3:18 e segs.
12-14. À Igreja, ao verdadeiro Israel, pertencem os títulos dados ao Israel do VT: eleitos, santos, amados (cons. Rm. 2:29; 9:6; Gl. 3:29; 6:16; Fp. 3:3). As virtudes aqui relacionadas, que enfatizam o relacionamento dos cristãos numa situação cheia de desinteligência, refletem o caráter de Cristo, cujo exemplo é citado (cons. II Co. 8: 9; Mt. 6:12). A virtude que resume tudo, dá significado e cimenta o resto é o amor (Rm. 13:9,10).
15,16. A paz de Cristo. Aquela paz que Cristo concede àqueles em união com Ele (cons. Jo. 14:27; Rm. 5:1). O domine é no sentido de arbitrar diferenças que possam surgir no corpo (Bruce). Semelhantemente, a palavra de Cristo que habita no crente, isto é, seus ensinamentos, exerce uma influência transformadora na vida do crente.
Cristãos dos tempos passados têm dado o seu testemunho dizendo que “Cristo colocou uma canção em meu coração”. E não é exagero dizer que cânticos têm ensinado mais teologia aos novos convertidos do que os livros de texto. Na igreja paulina os pronunciamentos orais às vezes aconteciam na forma de um hino (I Co. 14:15), e algumas passagens do N.T. refletem que tiveram origem em um hino (cons. Fp. 2: 5-11; Ef. 5:14; E. G. Selwyn, The First Epistle of Peter, pág. 273 e segs.). Gratidão. A graça de Deus (Lightfoot) ou a atitude grata do cristão (Moule).
17. Viver em nome do Senhor Jesus exclui a necessidade de regras; motivação interior substitui normas externas. Assim o Senhorio de Cristo se expressa no todo da vida. Seu Senhorio implica não apenas em um modo de conduta mas numa atitude para com a vida: refletindo conscientemente a vontade de Cristo, as atitudes da pessoa se transformam em um ato de ação de graças a Cristo. Regras externas, mesmo quando boas, não são adequadas para todas as situações: a “regra” do Cristo que habita o crente é a única orientação suficiente (cons. I Co. 10:31; Gl. 5:18).
B. Preceitos Especiais. 3:18 — 4:6.
A presente seção ilustra como os princípios da “vida em Cristo” podem ser expressas nos negócios quotidianos. Além de ver aqui como funciona um lar cristão, há quem veja também como era a primitiva sociedade cristã. A igreja primitiva incluía pessoas ricas além do número muito maior de pobres, senhores e também escravos (3:18 — 4: 1). Além de destacar a natureza do lar cristão, Paulo dá atenção particular a importância central da oração (4: 2-4) e ao relacionamento do cristão com o não-cristão (4:4-6).
A conduta do lar era um assunto muito discutido tanto pelos escritos judeus quanto pelos pagãos (por exemplo, o Eclesiástico apócrifo, 30:1-13; 42:5 e segs.). E parece que era um item regular nos ensinamentos paulinos (cons. Ef. 5:22-33; I Tm. 6:1-8; Tt. 2:1-10). Contrastando com os ensinamentos judeus e pagãos, Paulo enfatiza a mutualidade dos direitos e responsabilidades. Uma segunda característica cristã é a motivação recomendada ao leitor. Uma vez que a unidade em Cristo não nega a diversidade de função e status no mundo (veja Cl. 3:11), o cristão, tal como o pagão, deve se preocupar com os devidos costumes e ordem sociais. O cristão, entretanto, é motivado pelo seu relacionamento com Cristo e sua responsabilidade diante de Deus (por exemplo, 3:18, 20, 22-25).
18,19. A submissão das esposas deve ser retribuída pelo amor dos maridos. Conforme Ef. 5:28 torna explícito, o amor aqui não indica mera afeição mas uma preocupação expansiva por toda a pessoa da esposa.
20,21. Em tudo. A criança fica conhecendo a vontade de Deus através do conselho de seus pais. Em uma família cristã não é próprio sugerir conflito entre o dever para com os pais e o dever para com Deus (T.K. Abbott, The Epistles to the Ephesians and to the Colossians.)
Fazê-lo é grato diante do Senhor provavelmente se infere à obediência motivada pelo amor a Cristo; ela não limita a responsabilidade da criança para com os pais cristãos. Embora, em um caso extremo, um jovem possa precisar escolher entre a vontade de Cristo em oposição à dos pais que não são cristãos (cons. Lc. 14:26), essa atitude só deveria ser tomada depois de sóbria reflexão e aconselhamento cristão. “Não corrija em excesso os seus filhos” (Phillips). O propósito da disciplina é desenvolver o homem cristão, não produzir um indivíduo abjeto. O “não” aqui, como na ética cristã generalizada (cons. Cl. 3:21), deve-se subordinar a uma “disciplina e instrução do Senhor” positivas (Ef. 6:4).
22,23. Servos – hoje, empregados devem trabalhar não só quando o chefe está olhando, e devido a motivação que esse olhar fornece, mas devem trabalhar com singeleza de coração, isto é, com dedicação honesta. Todo o serviço, para o cristão, é primariamente prestado ao Senhor, que julga com toda imparcialidade e justiça.
24. O “escravo” fiel de Cristo recebe porção de filho – a herança. Galardão (E.R.C.) (recompensa (E.R.A.) exata, Lightfoot) não é, como os críticos usam o termo, algo a ser recebido lá no céu. Antes, é o sorvete reservado para a menininha que, aconchegando-se nos braços do papai, exclama, “Viu, papai, eu arrumei o meu quarto como você mandou”. A verdadeira recompensa é a aprovação do pai; o sorvete é apenas um enfeite – mas um enfeite bem recebido. O hino-oração que pede que “possamos festejar no paraíso com eles” não é espiritual só para um platonista. Mas é preciso que haja motivação; a mente mercenária exclui a possibilidade da recompensa cristã (cons. Atos 8:18 e segs.).
25. Receberá. Isto é, na presente vida ou no dia do juízo. Deus aqui é tido como Aquele que garante a justiça (cons. Rm. 12:19; lI Co. 5:10. Sobre o “justo merecimento” como medida adequada de punição criminal, compare C.S. Lewis, “The Humanitarian Theory of Punishment”, Res Judicate, VI, 1953-54, pág. 224-230. Veja também comentário sobre Cl. 3:6). Não há acepção de pessoas refere-se tanto ao escravo quanto ao senhor, e fornece uma transição para a próxima seção (cons. Ef. 6:9; Lv. 19:15). 

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