Estudo sobre Colossenses 1

Estudo sobre Colossenses 1

Estudo sobre Colossenses 1



Índice: Colossenses 1 Colossenses 2 Colossenses 3 Colossenses 4 

I. INTRODUÇÃO: SAUDAÇÕES (1.1,2)
Na sua saudação inicial, Paulo associa Timóteo consigo mesmo, uma associação frequente demais para ser usada na identificação da procedência da carta. Ao se apresentar como um apóstolo pela vontade de Deus, ele reconhece o seu chamado como um ato de graça divina imerecida. Se ele faz questão de destacar a sua autoridade aqui, não é porque ela foi desafiada como na Galácia, mas porque ele está apresentando as suas credenciais a cristãos que não o conhecem pessoalmente, e está endossando a mensagem de Epafras. Timóteo, não tendo a comissão direta do Cristo ressurreto, é descrito como o irmão (mas cf. lTs 2.6). Enquanto cartas anteriores são endereçadas a igrejas, as posteriores, como aqui, são endereçadas antes a membros individuais. Ele escreve aos santos e fiéis irmãos ou aos dedicados homens na cidade pagã de Colossos; santos porque foram separados para Deus, irmãos no seu amor e comunhão mútuos. Em vista de Ef 1.1, é improvável que se deva destacar o título fiéis como indicação daqueles que não foram seduzidos pelos falsos ensinamentos. Ele emprega a sua saudação usual, sendo esta uma saudação hebraica e grega adaptada à mensagem cristã.
v. 2. A NIV (em inglês), seguindo a formulação de muitos dos melhores manuscritos, omite “e do Senhor Jesus Cristo” (a NVI em português coloca essa observação na nota de rodapé), o que torna essa forma de saudação singular e um tanto surpreendente à vista da ênfase dessa carta na posição de Cristo. Mas a sua singularidade sugere exatamente que ela talvez seja a formulação correta.

II. A PESSOA E A OBRA DE CRISTO (1.3—2.7)
1) Gratidão (1.3-8)
Embora a forma de Paulo agradecer a Deus, aqui descrito como Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, siga o padrão das cartas não-cristãs daquela época de render gratidão às suas deidades, essa não era uma abertura meramente convencional. O fato de ser omitida em Gála-tas e ZCoríntios indica que era incluída apenas quando o progresso dos convertidos era uma causa real de gratidão, como em cada oração pelos colossenses. Essa alegria não vinha de conhecimento de primeira mão, mas do relato de Epafras acerca da fé, da esperança e do amor deles. Essa trilogia aparece também em lTm 1, na ordem da experiência prática, e em ICo 13, na ordem de valores espirituais. Aqui a fé em Cristo, o relacionamento celestial, e o amor aos santos, sua manifestação terrena, são descritos como dependentes da esperança. Cristo é a esfera em que essa fé age, e não o seu objeto; em outras palavras, a fé deriva o seu significado da posição que eles ocupam “em Cristo”, e, por não ser autocen-trada, ela se expande em uma perspectiva mais ampla abarcando todos os que compartilham essa fé comum. A esperança que mantém essa fé e esse amor não é tanto a atitude esperançosa quanto o objeto por que se espera, o próprio Cristo (cf. 1.27). Mas a esperança necessariamente inclui algum elemento futuro, e enquanto a “escatologia realizada” destaca corretamente a alegria presente da experiência espiritual, a criação ainda espera com desejo ardente a consumação na parousia (Rm 8.19). Se, como pensa A. M. Hunter (Paul and his Predecessors, p. 33-5 e Exp. T. xlix (1937-1938), p. 428-9), essa ideia de uma tríade de elementos era pré-paulina, então aqui poderíamos ter a interpretação que Paulo dá a essa ideia. Essa esperança os havia alcançado por meio do evangelho (cf. Ef 1.13) e, bem ao contrário das falsas filosofias de que Paulo logo vai falar, que são apenas locais, essa mensagem demonstra a sua verdade por meio de sua natureza universal e sua capacidade de frutificação e desenvolvimento por onde quer que tenha se espalhado. Em Colossos, tinha sido recebida não meramente por meio de consentimento intelectual, mas havia sido profundamente compreendida e apreciada “na sua genuína simplicidade, sem falsificação”, como Light-foot expressa de forma tão feliz. Como os melhores manuscritos mostram no v. 7, trazendo para conosco em vez de “para com vocês”, Epafras, o que pregou o evangelho a eles, era o representante de Paulo, um colega amado, e em alguma época talvez companheiro de prisão de Paulo (Fm 23), desempenhando com fidelidade o seu serviço cristão. Por meio dele, Paulo recebeu um relato favorável do amor deles produzido pelo Espírito Santo, como também outros detalhes menos agradáveis omitidos de forma diplomática na sua oração de gratidão.
v. 6. Por todo o mundo\ essa expressão não deve ser interpretada como hipérbole; ele havia visitado muitas províncias e trabalhado em grandes centros representativos de onde a mensagem poderia se espalhar, e, como mostra Johannes Munck, Paulo pensava em termos de nações (J. Munck: Paul and the Salvation of Mankind, p. 52; a referência aqui é à sua obra no leste).
v. 8. Essa é a única referência explícita ao Espírito Santo na carta, mas há evidências numerosas do seu poder em ação.

2) Oração (1.9-14)
Paulo usa esse relato como ocasião para a oração contínua pelo progresso deles no domínio espiritual. Como C. F. D. Moule afirma, “todo o vocabulário cristão do conhecimento está intimamente ligado à obediência”, o que é tão diferente do resultado que era apresentado a eles como “conhecimento mais profundo”. O verdadeiro conhecimento é prático, brotando do temor do Senhor (Pv
1.7), e a conduta correta é tanto o alvo quanto a marca de qualidade do conhecimento correto. E evidente que o apóstolo não está ocupado com padrões elementares nem tem tempo para conhecimento superficial. Para ele, o conhecimento da vontade de Deus é o pré-requisito indispensável de uma vida que agrada a Deus. Na terapia divina, a transformação mental é o meio usado para atingir a renovação ética (Rm 12.1,2). Usando algumas das palavras-chave daqueles que estavam tentando desviar os colossenses, ele ora pelo completo desenvolvimento deles no conhecimento e na compreensão da vontade de Deus, com toda a sabedoria e entendimento espiritual; isso significa que ele está orando por uma mente instruída na verdade espiritual que também consegue captar a aplicação dos princípios aos problemas da vida, com vistas a uma conduta diária honrosa que vai agradar ao Senhor de todas as formas. Assim, depois da evangelização vem o cuidado pastoral, e ele ora pelo amadurecimento do caráter deles, para se envolverem em atividades frutíferas e em boas obras de todo tipo ao crescerem no (por meio do) conhecimento de Deus. Mas isso não é sabedoria humana para inflar o seu orgulho como tinha sido o perigo dos corindos. Esse caráter amadurecido e essa força aumentada para a realização da vontade de Deus ocorrem por meio do poder de Deus de acordo com a força da sua glória, não designada para exaltar a carne, mas para promover a humildade. O alvo não é a apática indiferença dos estoicos, mas a perseverança paciente com um espírito de alegria.
Aqui temos um pensamento progressivo: o conhecimento promove o serviço (v. 9,10), o serviço é retribuído com força (v. 11) e tudo é coroado com gratidão (v. 12). A gratidão é devida ao Pai por tornar os homens, gentios como eram alguns desses colossenses, competentes para compartilhar da herança dos santos no domínio da luz, isso, sem dúvida, segundo a analogia da distribuição do território a Israel em Canaã. Não há somente a libertação da autoridade e da jurisdição das trevas, aqueles poderes debaixo dos quais o Senhor sofreu quando era a “hora” deles (Lc 22.53), mas ele transportou os que crêem, um pensamento que lembra o cativeiro do AT, não para um reino de anjos ou principados, ao qual os falsos mestres os incitavam a prestar homenagem, mas para o Reino do seu Filho amado (v. 13). Aqui o retrato é levemente alterado: é libertação, agora não por meio do exercício de poder e força, mas pelo pagamento gracioso de um resgate, resultando no perdão dos pecados. Efésios 1.7 declara o preço pago, o derramamento do seu sangue, que não é explicitamente citado nos melhores manuscritos desse texto. Essa redenção, o apóstolo deixa claro, é uma experiência presente, pois o reino dele está em operação, tendo irrompido no mundo temporal, embora a sua plenitude ainda esteja no futuro reservado para quem tem esperança.
v. 12,13. luz e trevas são termos usados em diversas religiões e nos manuscritos do mar Morto. O reino de Cristo é contrastado com a presente época má.
v. 13. A libertação realizada uma vez por todas por Cristo na cruz é recebida pelos indivíduos quando se unem com ele.

3) Cristo e a criação (1.15-17)
A ideia do reino naturalmente aponta para o rei, e esse grande texto cristológico é comparável a Jo 1.1-4 e Hb 1.2-4, e está na mesma linha do próprio ensino do Senhor no evangelho de João e da literatura sapiencial do AT. Cristo é a imagem visível do Deus invisível, pois, ao passo que nenhum homem jamais viu Deus, o Filho não somente criou o homem, mas também podia afirmar: “Quem me vê, vê o Pai”. Ele é, na verdade, o esplendor da glória de Deus, a marca da natureza dele, a luz que brilha no coração dos homens (Hb 1.3; 2Co 4.6). Ele é o primogênito de toda a criação, uma frase que os arianos interpretaram como significando que Cristo era um ser criado, e não co-eterno com o Pai, mas o contexto descarta isso completamente. O título dado aqui destaca as ideias de prioridade e superioridade, declarando, como afirma Lightfoot, “a absoluta preexistência do Filho”. A referência aqui é à sua divindade, e não à sua humanidade; ao Filho em seu ser eterno, e não ao Filho encarnado.
Duas expressões significativas são empregadas: por ele e para ele (v. 16); “por ele” transmite uma riqueza de significados muito mais profunda do que o Logos de Fílon, que era praticamente a Ideia ou o Ideal. Aqui não há uma abstração, mas uma pessoa divina; Cristo é a fonte da vida, como também o agente de toda a criação, incluindo os céus, as coisas invisíveis e os poderes que os colossenses estavam sendo chamados a apaziguar e aplacar. Cristo está fora da criação, existiu antes dela, é distinto dela, e ele é soberano sobre tudo, pois tudo foi criado por ele e, de fato, para ele. Nele se encontra o propósito do Universo, nele está o seu princípio de coesão, e é ele quem “estampa na criação aquela união e solidariedade que fazem dela um cosmo, e não um caos” (Lightfoot).
v. 16. O NT aparentemente menciona cinco tipos de governantes angelicais: quatro deles aqui (também “poderes” em Ef 1.21 e Rm 8.38), mas nenhuma hierarquia definitiva pode ser deduzida desses termos.

4)    Cristo e a igreja (1.18)
Depois de lidar com o significado cósmico do filho como ser eterno, Paulo agora passa para o tópico do Filho encarnado na sua missão histórica e sua revelação. A igreja é descrita não como o corpo de cristãos, mas como o corpo de Cristo, uma união que é tão vital que perseguir os membros na terra é o mesmo que perseguir a Cabeça no céu. Aqui Paulo parece ir além da metáfora de cartas anteriores (ICo 12.12ss; Rm 12.4,5), tratando das funções de membros individuais, e esta é distintamente uma revelação paulina. Como em Efésios, somente Cristo é a cabeça. O soberano do Universo é também a cabeça da igreja, para que em tudo tenha a supremacia; esse é o seu direito, pois ele é o princípio, aqui supostamente com referência à nova criação, e o primogênito dentre os mortos, como no v. 15 ele era o “primogênito de toda a criaçao .
O corpo, a igreja: a figura escolhida ilustra de forma adequada o relacionamento e o elo vital entre Cristo e a sua igreja. Ela existe somente por meio do Espírito que habita nela, opera pelo poder dele e funciona como representante dele. Mas certamente não é bíblico pensar nela como a extensão da encarnação de Cristo, pois a encarnação dele era singular, e ele era sem pecados, o que na experiência a igreja não é.

5)    Cristo e a reconciliação (1.19-23)
Aqui mais uma vez a preeminência de Cristo é declarada, plenitude é uma ideia comum tanto no AT quanto no NT, mas se os mestres hereges já estavam empregando a palavra como um termo técnico para denotar a totalidade das emanações divinas, sob o poder das quais os homens deveriam viver, é particularmente adequado que Paulo assim descrevesse o Salvador. Foi da vontade de Deus que toda a plenitude, a completa essência da divindade, residisse em Cristo, assim minando toda a argumentação dos falsos mestres. Além disso, o seu propósito era realizar a reconciliação, encerrar a ruptura da harmonia e estabelecer a paz entre o homem pecador e Deus, por meio do sacrifício do Salvador na cruz. Percebendo a amplitude dessa discórdia cósmica (Rm 8.22), Paulo vê que essa reconciliação é tão ampla no seu escopo que abarca todas as coisas, embora isso não possa ser forçado a significar a reconciliação universal que não leva em conta a vontade do homem de aceitar a oferta de Deus. Os colossenses eram um exemplo particular dessa reconciliação, mostrando como se devem aplicar as grandes verdades. Antigamente eles agiam numa órbita de obras más resultantes da sua atitude hostil quando estavam separados de Deus, mas a morte de Cristo efetuou a sua reconciliação. Talvez era necessário destacar a realidade da encarnação dele e a sua conexão vital com a redenção e a expiação para corrigir a heresia em Colossos. Cristo, de fato, entrou na vida de um homem e efetuou a redenção como um fato histórico no corpo dele (de Cristo), e o seu propósito era apresentá-los, na parousia, santos, inculpáveis e livres de qualquer acusação, de fato “justificados pela fé”. Mas isso inclui a presente responsabilidade de continuar firmes, não sendo afastados pelos falsos ensinamentos. A certeza da promessa divina não dá nenhum espaço para a complacência humana; eles são os crentes genuínos que perseveram até o fim, e a sua fé é uma fé universal.

6) O ministério de Paulo (1.24—2.7)
Na época da conversão de Paulo, uma verdade dupla foi revelada: ele seria uma “ferramenta escolhida” para evangelizar os gentios, e isso significaria sofrimento a favor do seu Mestre. O apóstolo retoma aqui essas duas ideias. Talvez para fortalecer o elo entre ele e esses cristãos desconhecidos para ele, Paulo se alegra nos sofrimentos deles pela causa da obra do Senhor e também em parte por eles. Os sofrimentos de Cristo presentes na sua morte expiatória não estão em vista aqui, pois aquela obra estava completa e era peculiar ao próprio Senhor. Mas na proclamação do evangelho a igreja precisa sofrer, e os sofrimentos deles são dele (de Cristo) também (At 9.4). Paulo se alegra em ter uma parte nisso, a responsabilidade, por Deus a mim atribuída na economia de Deus, para que ele pregue plenamente para explicar o mistério agora revelado, para que gentios junto com os judeus possam compartilhar na riqueza da sua manifestação gloriosa, para que Cristo possa habitar no coração deles; e essa é uma promessa também de glória futura. Ele continua o trabalho de instrução mesmo depois da conversão deles, pois o seu objetivo é a sua maturidade espiritual. Por meio da ênfase repetida de que isso é para todos, cada um, Paulo rejeita a reivindicação gnóstica de conhecimento superior por parte de alguns, dos iniciados, embora provavelmente ele esteja olhando para a parousia como o tempo de sua realização. Para atingir esse alvo é que ele se esforça, como um atleta na arena, mas reconhecendo alegremente que é a força do Senhor que age nele.
v. 26. o mistério: não há razão para crermos que Paulo esteja tomando esse termo por empréstimo das religiões gregas de mistério, e não do AT (e.g., Dn 2.18ss). Um mistério não é algo que deve ser mantido em segredo, mas, antes, uma verdade oculta que Deus tem prazer em desvendar quando o tempo está maduro. Assim, os mistérios (na NVI, “segredos” ou “mistérios”) do reino foram revelados aos discípulos, mas não aos profetas que os precederam (Mt 13.11-17). Enquanto o AT revelou algo das bênçãos de Deus também para os gentios, não só para os israelitas, o método pelo qual isso seria realizado era um mistério que tinha sido revelado primeiramente a Paulo. Em Colossenses, ele mostra que Cristo habita o coração dos gentios e dos judeus; em Efésios, ele revela o fato de que em Cristo os crentes gentios são co-herdeiros dos cristãos judeus.