Estudo sobre Efésios 4


1) A manutenção e a base da unidade cristã (4.1-6)
As elevadas doutrinas eclesiásticas das seções anteriores requerem um estilo de vida que expresse a transformação imaginada nelas, e, por causa de sua natureza, isso deve ser mostrado na comunidade cristã (4.1-16), entre os homens em geral (4.17—5.20) e nos relacionamentos particulares entre mulheres e homens cristãos (5.21—6.9).
Os v. 2,3 descrevem a estrutura mental que acompanha as ações da caminhada, sendo esse o novo espírito do v. 23. Virtudes gêmeas da mente renovada são humildade (agora apresentada pela primeira vez como virtude) e mansidão (que não é fraqueza mas a eliminação da afirmação de desejos egoístas). O par seguinte mostra como essa pessoa reage em relação às ações de outras pessoas contra ela. Nessas quatro virtudes, o cristão deve mostrar o seu desejo sincero de forjar um elo feito de paz pelo qual a unidade espiritual é protegida. Os sete “uns” formam uma lista, que é introduzida sem nenhum verbo. Toda expressão de unidade é fundamentada neles. um só corpo: o novo corpo de 2.15,16. um só Espírito-, dado tanto a judeus quanto a gentios, 1.13. esperança [...] é uma só: como já foi explicado anteriormente, não há cristãos de segunda classe, um só Senhor. Cristo, a fonte de toda unidade, uma só fé: ou a fé comum dada a todos os santos (Jd 3) ou, possivelmente, a fé subjetiva que cada crente deposita em Cristo, um só batismo: geralmente uma referência ao batismo na água, mas pode com razão se referir ao batismo do Espírito. Esses sete “uns” podem ser comparados com os quatro “uns” que Paulo expõe em ICo 12.413, em que ele trata detalhadamente da unidade produzida pelo batismo do Espírito. As quatro marcas da unidade expostas lá são: um Espírito (v. 4,9,11), um Senhor (v. 5), um Deus agindo em todos (v. 6) e um corpo (v. 12,13). Seria estranho omitir toda referência à ceia do Senhor, que está tão claramente associada à unidade do corpo (ICo 10.17), e incluir o batismo na água que é uma base insegura para a unidade (At 8.13,20-23). Nos outros itens dessa lista, “um” parece significar “um só”, e não “um tipo de” (“uma fé” é incerto), e é a melhor forma de interpretar isso aqui. Os sete itens estão dispostos de tal forma que o primeiro é contraposto ao último, o segundo ao sexto, o terceiro ao quinto, assim conectando a esperança com a fé, e o Espírito com o batismo. O um só Senhor está de forma apropriada no centro de tudo. um só Deus: ele é o Pai de todos em Cristo no sentido mais real possível. Ele está acima de todos os membros, e é manifesto a todos porque age em todos. Paulo usa a palavra abstrata para “unidade” tanto aqui no v. 3, como mais tarde no v. 13. Ele está tratando de algo espiritual, e não de uma entidade concreta e organizada, pois as igrejas do NT eram autogovernadas e destituídas de qualquer escritório central de controle.

2) Os dons que desenvolvem essa vida em comunidade (4.7-16)
A unidade é acompanhada da diversidade, como a unidade do corpo natural; e, ao usar essa figura, Paulo mostra que cada um dos diversos membros contribui para o todo até que o organismo alcance a maturidade. No caso do corpo de Cristo, a maturidade é a plenitude dele, como exposto em 3.18,19.
Aqui novamente Paulo está desenvolvendo um conceito encontrado em ICo 12, dessa vez nos v. 24,25. Cada membro recebeu um dom e a graça proporcional para o uso dele. Paulo toma a sua ilustração de SI 68.18, que ele cita livremente, usando um texto encontrado principalmente na LXX mas em parte no Targum e na Peshita siríaca. O guerreiro triunfante é elevado ao trono ao retornar com multidões de prisioneiros, recebendo presentes dos povos conquistados e distribuindo presentes aos seus seguidores. Das três coisas encontradas no texto, Paulo ignora a multidão de cativos e a substitui por uma descida, (a) A ascensão é a elevação de Cristo muito acima dos céus, onde ele deve preencher tudo e todos, como foi explicado em 1.20-23. (b) A descida sugerida pode bem ser mais do que a encarnação, pois a descida para o hades é o verdadeiro paralelo com o seu ser elevado acima de todos os céus.
(c) Ele não explica o cativeiro, mas, com base nesse contexto da descida ao hades, tem-se interpretado que é uma referência ao livramento de lá daqueles que em eras anteriores haviam crido; mas a idéia certamente é mais ampla que isso, sendo os poderes espirituais incluídos entre os seus cativos (Cl 2.15; IPe 3.22) e, sem dúvida, todos os redimidos (2Co 2.14,15). Um hino antigo, provavelmente gnóstico, dizia assim:

“e levar cativo um bom cativeiro para a liberdade.
Eu fui fortalecido e feito poderoso e tomei o mundo como cativo...
E os gentios foram reunidos, os que haviam sido espalhados como estrangeiros”
(Odes de Salomão 10.3-5)

Consulte também o comentário adicional sobre as Odes de Salomão de F. F. Bruce em “O evangelho quádruplo” (p. 1485).
(d)    Os dons (v. 11) provêm do Cristo que ascendeu e são parte da promessa do Espírito. Paulo omite alguns dons listados em outros textos e cita os relacionados mais diretamente à edificação da igreja. Em primeiro lugar, apóstolos, no sentido mais restrito de 2.20, a autoridade permanente, profetas: homens inspirados que revelaram a verdade de Deus. evangelistas: missionários pregadores, por meio de quem os homens se tornavam seguidores de Cristo, pastores e mestres: em outros trechos, são chamados de anciãos e bispos, que zelavam pelos convertidos e pelo seu crescimento. Todos os pastores numa igreja local deveriam estar aptos para ensinar (alguns em particular e outros em público), como também para pastorear (v. lTm 5.17); mas havia também mestres na igreja que tinham uma missão mais itinerante do que os administradores (Rm 12.7; ICo 12.27). Os três propósitos desses dons são preparar pessoas que vão fazer o serviço que vai edificar a igreja. O terceiro propósito, que é o propósito final, é o tema recorrente da carta (1.23; 2.21; 3.19; 4.13-16; 5.27). Todas essas atividades devem continuar até que a igreja alcance a medida da plenitude de Cristo. E uma unidade a ser alcançada, enquanto a unidade de 4.3-6 é uma unidade já existente. A unidade integrada de um bebê é suficientemente real, mas não é a unidade consciente de um homem maduro. A unidade para a qual a igreja caminha é uma unidade de conhecimento pessoal do Filho de Deus. A fé é mais o que comumente queremos dizer com conhecimento; i.e., familiaridade completa com a mente de Cristo,
v. 14. O propósito é que-, esta é a conclusão: à medida que a igreja caminha para essa maturidade final, ela sai da sua infância e instabilidade que existe em virtude da doutrina inadequada e da experiência inadequada de Cristo. O novato espiritual está muito aberto para doutrinas falsas e falsos mestres, astúcia-, sugere o manuseio hábil de dados de um jogo de dados, esperteza-, ocorre novamente em 6.11, identificando aí a sua origem, v. 15. seguindo a verdade em amor. manter a verdadeira doutrina de forma compatível com o estilo de vida, não como arma para a luta, mas para manter o crescimento equilibrado em Cristo (Cl 3.16). Isso produz uma expressão madura da cabeça em cada membro do corpo. v. 16. ajustado-, uma metáfora da arquitetura indicando harmonia. unido-, assim como um corpo é unido por ligamentos e juntas, indicando solidez. Quando as partes funcionam de forma apropriada, a cabeça conduz tudo por meio do controle geral de tal forma que o corpo se desenvolva de forma correta.

V MARCAS DA NOVA VIDA (4.17—6.20)
1) No caráter pessoal (4.17-24)
v. 17-19. Como sempre, Paulo passa do dogmático para o pragmático, pois a plenitude de Cristo no presente pode ser vista em operação somente na igreja nas esferas do caráter e do serviço. Estes são estimulados pela operação da mente, e a ruína moral do mundo dos gentios está arraigada na inutilidade dos seus pensamentos. Eles estão destituídos dos reais valores de Deus e da eternidade. Essa inutilidade, Paulo ensina, se origina numa causa interior, o intelecto obscurecido; e numa causa exterior, o separar-se de Deus. Sem Deus, o homem está na escuridão, porque Deus é a sua verdadeira luz. Essas duas causas surgem da ignorância em relação a Deus em que estão, e essa ignorância, por sua vez, surge da dureza ou obstinação de coração por meio das quais os homens rejeitam a revelação de Deus. Romanos 1.18-21 desenvolve isso em mais detalhes, e ambas as seções deveriam ser estudadas em conjunto com Ef 2.2,3 para uma verdadeira compreensão das condições em que se encontra o incrédulo,
 v. 19. Tendo perdido toda a sensibilidade-, i.e., já não se importam. A alma, quando destituída de recursos espirituais, volta-se ao corpo na busca de satisfação, e até mesmo as ondas mais altas da cultura filosófica, mais cedo ou mais tarde, rebentam nessa costa estéril, v. 20-24. aprenderam de Cristo-, conhecer Cristo é tanto ouvi-lo (ouvir a respeito dele é insuficiente) quanto ser ensinado e instruído nele. Este último aspecto tem início com a instrução oral do novo convertido. Isso consistia em um esboço da vida e nos ensinos do nosso Senhor que é o cerne dos Evangelhos sinópticos (Lc 1.3,4), e foi ordenado a todos (Mt 28.19,20); é arriscado ignorar esse ensino (lTm 6.3,4). a verdade que está em Jesus-, verdade absoluta, e não um aspecto dela, como se ele fosse comparado a Confúcio. Cristo é a verdade (Jo 14.6), por isso aprender (de) Cristo é aprender a verdade. Despir-se do velho homem e vestir o novo são duas metades da mesma ação. A repetição momento a momento dessa decisão é o segredo da vida cristã transformada (Rm 6.13,14). Observe o contraste entre enganosos e verdade. A natureza humana não pode ser reformada (Rm 8.7); precisa ser regenerada. A nova (kainos, nova em gênero) criação, que substitui a antiga de Gn 1.27, restaura a semelhança de Deus, e a renovação ocorre no ser interior, no espírito da mente, justiça-, é a conduta correta em relação a Deus, e santidade, aqui, é a conduta correta em relação às outras pessoas.

(a)    4.25 falsidade
(b)    4.26,27 ressentimento
(c)    4.28 roubo
(d)    4.29,30 maledicência
(e) 4.31—5.2 malícia

2) Na comunidade cristã (4.25—5.2)
Nessa seção e na próxima, Paulo trata de oito males e virtudes que são opostos, assim contrastando o andar dos gentios com o andar dos cristãos. E uma exposição adiantada do tema dos Dois Caminhos, proeminente na Didaquê e na Epistola de Barnabé. As seções que seguem são a aplicação que Paulo faz dos v. 22-24.
vs. verdade vs. autocontrole vs. generosidade vs. edificação vs. amor
(f) 5.3-14    impureza    vs. pureza
(g) 5.15-17    imprudência    vs. sabedoria
(h) 5.18-20    libertinagem    vs. alegria
v. 25. abandonar, remover, a mesma palavra que é usada no v. 22 (“despir-se”). A ordem é citada com base em Zc 8.16, e o versículo seguinte vem de SI 4.4, na LXX. E interessante observar como Paulo cita a segunda parte do versículo do salmo e comparar Mt 5.22-24 com a frase seguinte no v. 27. A ação precipitada recebe a oportunidade das mãos do diabo {diabolos poderia significar caluniador). A ira no v. 26 é o sentimento de provocação, e não somente a expressão dela. v. 29. conforme a necessidade', é importante aproveitar a melhor oportunidade para compartilhar a graça.
 v. 30. Acerca do dia da redenção, v. Rm 8.23; o crente vive na expectativa de um corpo ressurreto na criação liberta no retorno de Cristo. Amargura, indignação e ira são três estados de espírito emocional, sendo os outros três aspectos expressões exteriores daqueles elementos.