Introdução do Livro de Gênesis


Gênesis
H. L. ELLISON (CAPÍTULOS 1—11) DAVID E PAYNE (CAPÍTULOS 12—50)
Observação: As referências a comentários e livros sobre Gênesis são feitas pelo nome do autor. Detalhes completos estão na bibliografia.
Nome
Gênesis é a primeira parte do Pentateuco, os cinco livros de Moisés. No entanto, estes são considerados pelos judeus como essencialmente um livro, sendo a divisão estabelecida originariamente por motivos de conveniência. Nos primeiros dias da escrita, teria sido muito difícil incluir os cinco livros da Lei (heb. Tôrãh, lit. instrução) em um rolo por motivos técnicos. Tradicionalmente, as cinco seções são chamadas em hebraico pela palavra de abertura, B‘restP, Gênesis é a trans-literação do nome grego usado na LXX, que significa origem.
Autoria
Algumas partes do Pentateuco são explicitamente atribuídas a Moisés, e.g., Ex 17.14; 24.3-7; Dt 31.24,25, mas como um todo ele é anônimo, e, com exceção das suas palavras de despedida em Deuteronômio (caps. 1—11), Moisés não fala na primeira pessoa. Historicamente, o uso do Pentateuco pelos samaritanos faz com que seja muito difícil situar a presente forma do livro depois da morte de Salomão, quando o Norte se separou de Judá. A não ser que a autoria mosaica seja rejeitada por motivos a priori, a posição mais simples é considerar Moisés como responsável pela escolha do material, sem ter de afirmar que ele mesmo colocou tudo por escrito. Algumas partes foram óbviamente passadas adiante de forma oral, independentemente da época em que foram escritas. Algumas poucas passagens devem ter assumido a presente forma após o tempo de Moisés.
Há estudiosos que argumentam que a maior parte do material de Gênesis já existia em forma escrita antes do tempo de Moisés. Alguns fundamentam isso na teoria de que a expressão “esta é a história...” (2.4; 5.1; 6.9; 10.1; 11.10,27; 25.12,19; 36.1,9; 37.2), traduzida de diversas maneiras na NVI, é um colofão, i.e., uma frase de identificação, do tipo encontrado nas tábuas de argila da Mesopotamia, marcando a conclusão de uma seção, e que por isso essas seções já existiam em tais tábuas de argila. Por mais atraente que seja esse ponto de vista, contém problemas sérios (cf. Kidner, p. 23-4). Há também o ponto de vista de que José produziu a primeira edição de Gênesis. Ele poderia ter feito isso, mas não há a menor evidência de que o tenha feito. De qualquer maneira, as genealogias e provavelmente o cap. 14 podem ter existido na forma escrita numa época pré-mosaica. Independentemente de como a informação foi preservada, o que parece mais sábio é considerar a escolha e ordenação do material como obra de um homem, i.e., Moisés.
A estrutura e o propósito de Gênesis
Gênesis consiste em dois livros estreitamente ligados. Nos caps. 1—11, temos o início da história do ser humano, em que lemos acerca de tudo que precisamos saber para entender os propósitos salvíficos de Deus; nos caps. 12—50, lemos acerca do início de Israel. Mas o que temos é praticamente só história da salvação (Heilsgeschickte, cf. “Teologia do Antigo Testamento”). Assim como ocorre no primeiro livro, o segundo também nos dá somente um esboço básico, que está preocupado principalmente com a importância da fé e com a reação de cada indivíduo. As genealogias servem a um propósito duplo. Elas destacam a unidade da humanidade no seu pecado e fracasso e que ninguém está fora do alcance da graça e do cuidado de Deus. Isso significa que no sentido mais verdadeiro a intenção de Gênesis é revelar o caráter e os propósitos de Deus e também o estado decaído da humanidade.
Os principais problemas de Gênesis
Mais do que qualquer outro livro da Bíblia, Gn 1—11 suscita problemas que exigem um nível elevado de conhecimento secular e uma série de tratados especiais na busca de soluções, se é que o homem com o seu conhecimento limitado pode encontrá-las. Esta contribuição para a interpretação de Gênesis foi escrita com base no ponto de vista de que a compreensão verdadeira da sua mensagem não depende de conhecimento científico. Embora o autor tenha as suas convicções acerca de uma série desses aspectos, ele tentou não impor seus pontos de vista, pois seria orgulho intolerável da sua parte fazê-lo, especialmente porque ele não é autoridade na maioria dos assuntos relacionados ao tópico. Assim, os comentários textuais serão limitados, em grande parte, à elucidação do significado do texto hebraico. Para aqueles que desejarem mais informações, mesmo que limitadas, as Notas Adicionais na obra de Kidner certamente serão muito valiosas. Além disso, Byrt recentemente nos proporcionou uma análise equilibrada e erudita das questões principais.
Uma advertência, porém, se faz necessária. E correto e adequado que as pessoas com formação científica busquem luz acerca dos segredos da natureza e do passado do ser humano nas Escrituras, como também nas evidências do Universo físico. Os dois elementos são obra do mesmo Deus, e, em última análise, não podem estar em conflito. Mas nunca se deve pressupor que essa informação, incompleta por sua própria natureza e sempre passível de modificações à medida que a ciência avança, seja a compreensão verdadeira das Escrituras e do seu propósito. Nunca devemos pensar que a sabedoria e o conhecimento deste mundo dão alguma vantagem ao cristão na compreensão da revelação divina, nem que a ignorância seja uma ajuda para a espiritualidade.
A. CRIAÇÃO
Aqui temos cinco problemas principais:
1)    A relação entre Gn 1 e 2. Este comentário segue o ponto de vista geralmente defendido de que os dois capítulos estão observando o mesmo evento, ou seja, a criação do homem, de diferentes pontos de vista. Há aqueles, no entanto, que crêem que esses capítulos devem ser lidos de maneira consecutiva com um intervalo de tempo considerável entre eles. Isso foi defendido com muita erudição recentemente por E. K. V. Pearce.
2) Gn 1 e a ciência. O comentário adota a posição de que a pesquisa científica recente fornece um retrato que se aproxima da ordem dada em Gn 1 e menciona apenas as exceções principais.
3)  Evolução. Além de chamar atenção para os diversos verbos usados para descrever a ação criativa de Deus, os meios que ele usou não são considerados, se foi por criação especial de ponta a ponta, ou por uma evolução conduzida por Deus e intercalada por atos criativos. O hebraico é compatível com os dois pontos de vista.
4) O significado de “dia”. Apesar da grande quantidade de material escrito por alguns acerca desse tópico, parece impossível estabelecer com certeza o significado de “dia” (yom) em Gn 1. Embora possa significar 24 horas, todo o ato criativo acontece em um dia em Gn 2.4 (heb.), e em diversas afirmações a respeito da atividade de Deus o significado é claramente um período (indefinido). De qualquer forma, se a teoria (que não pode ser provada) dos dias da revelação for correta (cf. comentário acerca do cap. 1), então a controvérsia deixa de ter sentido.
5) Gn 1.2 indica uma reversão ao caos? Esse ponto de vista, às vezes chamado de teoria do intervalo, de que Gn 1.2 indica um intervalo entre a criação original de Deus e a criação do que existe agora, tornou-se popular pela primeira vez no século XIX como tentativa de conciliar a perspectiva da criação em seis dias com a existência dos fósseis nas camadas geológicas, que pareciam sugerir períodos muito longos. Além de dificuldades intrínsecas (cf. Ramm, p. 119-56), o hebraico de 1.2 não vai dar apoio ao significado forçado sobre o texto por essa teoria (v. comentário). Atualmente, essa teoria está sendo aos poucos abandonada por aqueles que tentam harmonizar Gênesis com os registros geológicos em favor da tese de que as camadas e seus fósseis foram depositados aí pelo Dilúvio.
B. O DILÚVIO
Até recentemente, a questão principal dentro dessa controvérsia era se o Dilúvio tinha sido mundial ou confinado à região habitada pelo homem. Isso implicava desdobramentos sobre teorias da inspiração, pois as evidências físicas eram insuficientes para uma resposta convincente. Mais recentemente foi divulgada a tese — especialmente por Whitcomb e Morris — de que o Dilúvio teve proporções cósmicas e que as camadas e seus respectivos fósseis depositados pela água decorrem desse fato. A Bíblia não diz nada de conclusivo sobre esse tema, e os argumentos dos dois lados da discussão fundamentam-se principalmente no uso seletivo das evidências disponíveis.
C. A ANTIGUIDADE DO HOMEM
O homem, como é retratado em Gn 4, pode ser datado com certeza razoável a partir do período paleolítico, i.e., no final da última era do gelo, em torno de 8000 a.C., mas os paleontólogos afirmam ter encontrado traços do homo sapiens, i.e., do homem como o conhecemos, no período paleolítico. Sem expressar opinião alguma acerca desse tópico altamente técnico e controvertido, precisamos dizer que não foi a forma física ou talvez intelectual, mas a imagem e semelhança essencialmente espirituais que fizeram de Adão um verdadeiro homem.
D. CRONOLOGIA
Para o judeu, o ano que começou, por exemplo, em outubro de 1976 foi 5737 desde a criação, visto que no século XVII o arcebispo James Ussher calculou que a criação deve ter ocorrido em 4004 a.C. Houve outras estimativas também, fundamentando-se puramente em afirmações bíblicas. Em anos recentes, no entanto, a arqueologia foi capaz de estabelecer uma cronologia para o Antigo Oriente Médio, que é correta com uma margem de erro de apenas alguns anos, que vai até 2000 a.C. Antes disso, a margem de erro aumenta, mas quando o primeiro muro de Jerico é datado pelo método do radiocarbono de uma época anterior a 7000 a.C., a margem de erro é de alguns séculos. Há muitas evidências de que, exceto onde o texto mostra sinais de corrupção, os números apresentados são corretos, mas não podemos usá-los para construir um sistema cronológico coerente, e por isso não vamos tentar fazê-lo.
O texto de Gênesis
Assim como em todo o Pentateuco, o texto de Gênesis foi muito bem preservado. Na maioria dos casos em que a NVI e outras versões importantes diferem do TM, fica claro com base na LXX e nas edições samaritanas que algumas palavras foram acidentalmente omitidas no hebraico.
ANÁLISE
I.    OS PRIMÓRDIOS DA HUMANIDADE (1.1—11.32)
1)    a) A criação do ponto de vista de Deus (1.1—2.3)
b) A criação do ponto de vista do homem (2.4-25)
2) a) A queda do homem (3.1-24)
b) Caim e Abel (4.1-16)
c) Os descendentes de Caim (4.17-24)
d) Sete e seus descendentes (4.25—5.32)
e) O crescimento do mal (6.1-8)
f) O Dilúvio (6.9—8.19)
3) a) A aliança de Deus com o homem (8.20—9.17)
b) Noé e seus filhos (9.18-28)
c) Os descendentes de Jafé, Cam e Sem (10.1-32)
d) A torre de Babel (11.1-9)
e) Os ancestrais de Terá (11.10-32)
II.    OS PRIMÓRDIOS DE ISRAEL (12.1—50.26)
1) Abraão (12.1—25.18)
a) Chegada em Canaã (12.1-20)
b) Separação de Ló (13.1-18)
c) A batalha dos reis (14.1-24)
d) A terra prometida (15.1-21)
e) O nascimento de Ismael (16.1-15)
f) A aliança eterna (17.1-27)
g) Promessa e advertência (18.1-33)
h) A queda de Sodoma (19.1-38)
i) Sara em perigo (20.1-18)
j) O nascimento de Isaque (21.1-21)
k)  Berseba (21.22-34)
l)  Provisão e sacrifício (22.1-24)
m) A compra de Macpela (23.1-20)
n) Uma noiva para Isaque (24.1-67)
o) A morte de Abraão (25.1-18)
2) Isaque, Jacó e Esaú (25.19—36.43)
a)  O nascimento de Jacó e Esaú (25.19-34)
b) Isaque no território dos filisteus (26.1-35)
c) A perda do direito de primogenitura (27.1-45)
d) Jacó em Betei (27.46—28.22)
e) Os casamentos de Jacó (29.1-30)
f) Os filhos de Jacó (29.31—30.24)
g) À prosperidade de Jacó (30.25-43)
h) Jacó foge de Labão (31.1-55)
i) O encontro com Esaú (32.1—33.20)
j)  Conflito em Siquém (34.1-31)
k)  Retorno a Betei (35.1-15)
l)  Questões familiares (35.16-29)
m) Esaú e Edom (36.1-43)
3) A FAMÍLIA de Jacó (37.1—50.26)
a)  Os sonhos de José e suas conseqüências (37.1-36)
b) A família de Judá (38.1-30)
c) A esposa de Potifar (39.1-23)
d) Na prisão (40.1-23)
e) Os sonhos do faraó (41.1-36)
f) José é exaltado (41.37-57)
g) A primeira visita ao Egito (42.1-38)
h)    A segunda visita ao Egito (43.1-34)
i) O teste final (44.1-34)
j) Desenlace (45.1-28)
k) A família no Egito (46.1-34)
l) A administração de José (47.1-26)
m) Efraim e Manassés (47.27—48.22)
n) A bênção de Jacó (49.1-28)
o) A morte de Jacó (49.29—50.14)
p) A morte de José (50.15-26)