Estudo sobre Apocalipse 2:8-9
Estudo sobre Apocalipse 2:8-9
Apocalipse 2:8-9
Quanto à indicação do destinatário e à ordem para escrever, cf. excurso 1a. Em relação à auto-apresentação (excurso 1b) deve-se conferir com Ap 1.17,18. Sobretudo a segunda dupla de conceitos, que abrange a Sexta-Feira da Paixão até a Páscoa, orienta para o entendimento da mensagem seguinte. Até no oráculo do vencedor a missiva gira em torno do tema de morte e vida, expondo a trajetória da igreja de Esmirna com base no itinerário percorrido por Jesus. Enquanto a cidade de Esmirna, florescente centro portuário e comercial, não perdia em quase nada para Éfeso, sendo supostamente uma das mais lindas cidades da Antiguidade, a igreja de Esmirna apresentava um quadro especialmente precário. Justamente num ambiente assim, a tribulação permanente a provocava: é assim a igreja de Deus? Por essa razão, ao lhe ser anunciado que o seu aspecto coincidia intensamente com a aparência do Senhor, estava sendo consolada de um modo especial.
O inquérito judicial (excurso 1c) não contém nenhuma repreensão. Traz ela, portanto, elogio por boas obras? Ao que parece, porém, a igreja não realiza nada. Ela tão-somente existe e sofre a ação de terceiros. A lei da ação reside integralmente no adversário, que a aflige, rouba e difama. Com palavras de Rm 8.36, os cristãos em Esmirna são “considerados como ovelhas que vão para o matadouro”.
Sobre essa situação o Senhor exaltado diz: Conheço. Ele conhece essa situação a partir de sua própria experiência, motivo pelo qual compreende a sua igreja. Existe uma noite em que não se pode agir, mas somente sofrer. Durante os dias da Paixão de Cristo a lei da ação igualmente passou para os seus adversários. Ele atestou a seus perseguidores: “Esta, porém, é a vossa hora e o poder das trevas” (Lc 22.53), e a Pilatos: “Tens poder sobre mim” (Jo 19.11 [tradução do autor]). Aconteceram os momentos em que silenciou diante das pessoas e estava amarrado à cruz. Nem sequer podia unir as mãos, e muito menos impô-las a alguém. Entretanto, como foi poderoso a sua ação pelo sofrimento! Quanta ação na Paixão! Ele exclama: “Está consumado!” A igreja em Esmirna uniu-se estreitamente a esse Senhor na paixão dela. Formam-se nítidos paralelos por meio de três conceitos:
A tribulação (cf. o comentário a Ap 1,9), desdobrada nos v. 9b,10, recorda ao leitor as “aflições de Cristo” (Cl 1.24), e a pobreza, a “pobreza dele” (2Co 8.9) no NT. De acordo com o comentário seguinte: mas tu és rico!197 deve ter-se tratado de pobreza material, talvez como manifestação colateral da tribulação (cf. Hb 10.34). Com demasiada facilidade, porém, a pobreza provoca danos espirituais. O termo grego (ptocheía) praticamente desenha diante de nós a imagem do mendigo agachado. Arisco e espantado, o pobre incomoda ao seu próximo. O judaísmo o desprezava, considerando-o como amaldiçoado por Deus. Nesse ponto insere-se o terceiro conceito: blasfêmia (“difamações”, “calúnia” [bv]). A pobreza torna a igreja questionável perante os judeus. Devem ser vistas no mesmo contexto as blasfêmias que Jesus teve de suportar: Lc 22.64,65; 23.39; Mc 15.29; Mt 27.39. Como uma figura tão deplorável combina com a verdade de que é amada por Deus?
No Apocalipse, o conceito da difamação, em geral muito amplo, aparece muito aguçado (Ap 2.9; 13.1,5,6; 16.9,11,21; 17.3): a soberania do Cordeiro é recusada consciente e desdenhosamente. Dessa maneira, o conceito adquire uma coloração anticristã. Ele caracteriza o antagonista satânico e seus asseclas desde a Paixão de Cristo; no presente caso, aqueles que a si mesmos se declaram judeus. Na província da Ásia vivia um contingente judeu antigo e influente. Quando essas cidades notoriamente se tornaram região de sucesso da missão cristã, incendiou-se a inimizade. Foram judeus que causaram a primeira e talvez também a segunda prisão de Paulo pelos romanos. Acerca de um ódio singular dos judeus contra os cristãos em Esmirna informa o historiador eclesiástico Eusébio.198 Parece ter-se desencadeado uma luta acirrada em torno do verdadeiro portador do nome honorífico “judeu” (cf. Rm 2.28,29) entre a sinagoga e os cristãos. Quem é verdadeiramente “judeu”, ou seja, eleito e enviado de Deus? Quem é povo de Deus, ou quem é povo de Deus na aparência, mas na verdade instrumento de Satanás?
O posicionamento perante o Eleito, Cristo, é decisivo; quando se testemunha ou blasfema a Cristo. Quem difama Cristo ou o degrada naqueles que o confessam promove a obra de Satanás e guerreia as guerras de Satanás (Ap 12.17), faz parte dos rebeldes do Sl 2, que se insurgem contra o Ungido. Com base nesse critério é proferida aqui a sentença por parte do Senhor exaltado contra os judeus daquela localidade: eles não são, sendo, antes, sinagoga de Satanás. À negação do nome de judeu corresponde a terrível definição pelo nome de Satanás. No evangelho de João é aplicado o mesmo parâmetro. Como os judeus assassinaram Jesus (Jo 8.37) e tentam matar seus discípulos (Jo 16.2), não têm mais a Abraão como pai – nesse linguajar “ter como pai” significa “ser discípulo dele” –, mas ao diabo. Pois odiar e matar é satânico, do mesmo modo que mentir e seduzir, atitudes que estavam em primeiro plano na mensagem a Éfeso (cf. o exposto sobre Ap 2.2). Em decorrência, muda-se o nome da sinagoga com a mesma justificativa que em Ap 11.8 o de Jerusalém.
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