Significado de Eclesiastes 7
Eclesiastes 7
Eclesiastes 7 inaugura uma nova seção no livro, marcando uma transição abrupta do estilo narrativo e discursivo para um gênero mais proverbial, similar ao de Provérbios. É o capítulo mais extenso até então e apresenta uma sequência de máximas paradoxais, observações filosóficas e advertências éticas que abordam os limites da sabedoria, a inevitabilidade da morte e a corrupção moral da humanidade. Aqui, o Qohelet abandona a lógica da acumulação e se volta à crítica moral e existencial: “melhor é o dia da morte do que o dia do nascimento” (v. 1). A tensão entre o valor da sabedoria e sua insuficiência para alcançar justiça ou sentido pleno se torna o eixo temático do capítulo.
✍️ Estrutura Literária e Gênero
A estrutura do capítulo é composta de duas grandes unidades, interligadas por temas recorrentes:Máximas paradoxais e provérbios de sabedoria (vv. 1–14): esta seção contém sentenças sintéticas que contrastam valores convencionais com julgamentos contraintuitivos. Muitas são introduzidas pela fórmula ṭôḇ... min (“melhor... do que”), típica da literatura sapiencial comparativa. O uso intensivo desse padrão (sete vezes nos vv. 1–10) sugere uma reflexão que subverte as expectativas do leitor.
Discurso sapiencial reflexivo (vv. 15–29): nesta seção, o Qohelet abandona o tom aforístico e volta ao estilo introspectivo, explorando os limites da justiça, o problema da sabedoria excessiva e a corrupção moral da humanidade, encerrando com um lamento sobre a degeneração da mulher e a raridade do homem íntegro.
Apesar da aparente disjunção de temas, o capítulo mantém uma unidade profunda ao enfatizar a insuficiência da sabedoria para redimir a existência humana, ao mesmo tempo em que reconhece seu valor relativo diante da loucura, da injustiça e da morte.
🕎 Hebraico e Palavras-Chave
O capítulo emprega um vocabulário intensamente sapiencial, com destaque para as raízes:ט־ו־ב (ṭ-w-b) – “bom/melhor”: aparece 11 vezes, sendo o fio condutor da primeira metade.
חכמה (ḥoḵmāh) – “sabedoria”: recorrente nos vv. 5, 11, 12, 19, 23, 25.
הבל (heḇel) – “vaidade, absurdo”: reaparece no v. 15, reintroduzindo o motivo dominante do livro.
מות (māweṯ) – “morte”: usada nos vv. 1, 17 e 26, marca o tom sombrio e realista da sabedoria que encara o fim como critério interpretativo da vida.
יֵצֶר (yēṣer) – “intenção, inclinação”: embora não usado no texto, a ideia está implícita em 7:29, onde se diz que Deus fez o homem yāšār (“reto”), mas “eles buscaram muitas invenções” (ḥiššĕḇû ḥišbōnōṯ rābbîm).
A linguagem hebraica é rica em jogos de oposição (sabedoria vs. loucura, justiça vs. perversidade, retidão vs. impiedade), e o uso do verbo rā’îtî (“eu vi”, v. 15) retoma o estilo observacional dos capítulos anteriores. O versículo 29 é estruturado como uma conclusão teológica: Deus é justo; o homem é que se perverteu.
🗝️ Versículo-Chave
Eclesiastes 7:14 – “No dia da prosperidade, regozija-te; mas no dia da adversidade, considera: Deus fez tanto este como aquele, para que o homem nada descubra do que há de vir depois dele.”Este versículo sintetiza a visão teológica do capítulo: a alternância entre dias bons e maus é ordenada por Deus, e o ser humano é mantido em ignorância sobre o futuro. A sabedoria consiste em aceitar essa limitação com reverência e sobriedade.
🔹 Intertextualidade com o Antigo e o Novo Testamento
No Antigo Testamento, a insistência do Qohelet de que “o coração dos sábios está na casa do luto” (v. 4) se alinha com a visão de Jó, que considera o sofrimento como escola de sabedoria (Jó 3; 28). A crítica à mulher “cujo coração é redes e armadilhas” (v. 26) evoca a figura da mulher adúltera em Provérbios 5–7, embora aqui o tom seja mais generalizado e problemático. Já a referência a Deus que “fez o homem reto” (v. 29) alude diretamente a Gênesis 1:27 e 6:5, onde a bondade original é corrompida por uma inclinação má universal.No Novo Testamento, o tema da sabedoria e seus limites reaparece em 1 Coríntios 1:25, quando Paulo afirma que “a loucura de Deus é mais sábia que os homens”. A recomendação de não ser “demasiadamente justo” (v. 16) encontra paralelo na advertência de Jesus contra o legalismo farisaico (Mateus 23:4). A ideia de que “Deus fez tanto um como o outro” (v. 14) ecoa em Romanos 11:36 — “porque dele, por ele e para ele são todas as coisas”. Finalmente, o reconhecimento de que o homem “não sabe o que virá depois” (v. 14) prepara o solo para a esperança escatológica em Cristo, aquele que revela o futuro oculto e quebra o enigma da existência.
🔹 Lição Teológica Geral
Eclesiastes 7 representa um ponto alto da teologia negativa do livro. Ao invés de oferecer soluções, o Pregador desmantela as ilusões humanas: nem riqueza, nem justiça, nem sabedoria podem garantir plenitude. A vida é contraditória, o mal é real, e Deus não é domesticável. A única resposta não é a explicação, mas o temor — e, em meio à confusão, a aceitação humilde do tempo de Deus.O capítulo ensina que a sabedoria não salva, mas orienta. Não é redentora, mas é preferível à loucura. E se a morte é o ponto final inevitável, então viver com sobriedade, com temor e com equilíbrio é o que resta ao homem — até que venha Aquele que vence a morte e cumpre a justiça que a sabedoria humana só vislumbra de longe.
📝 Resumo de Eclesiastes 7
O Valor da Sabedoria e da AfliçãoEclesiastes 7 inicia com uma série de provérbios que exaltam o valor da sabedoria, da reputação e da aflição (Ec 7:1-6). É afirmado que a boa reputação é melhor do que o bom perfume, e o dia da morte é melhor do que o dia do nascimento. É melhor ir à casa onde há luto do que à casa onde há festa, pois na casa do luto se reflete sobre o fim de todos os homens. A tristeza é melhor do que o riso, pois pelo semblante triste o coração se torna melhor. O coração dos sábios está na casa do luto, mas o coração dos tolos, na casa da alegria. É melhor ouvir a repreensão do sábio do que ouvir o canto dos tolos, pois o riso do tolo é como o estalo de espinhos debaixo de uma panela, o que também é vaidade. Esta seção destaca que as experiências difíceis e a reflexão sobre a mortalidade são mais proveitosas para o desenvolvimento da sabedoria do que a busca constante por prazer.
Advertências Contra a Opressão e a Precipitação
O Pregador continua com advertências contra a opressão, a corrupção e a precipitação (Ec 7:7-10). Ele observa que a opressão pode enlouquecer o sábio e que o suborno corrompe o coração. O fim de uma coisa é melhor do que o seu princípio; e o paciente de espírito é melhor do que o altivo de espírito. Não te apresses no teu espírito a ficar irado, porque a ira repousa no seio dos tolos. Não digas: “Por que foram os dias passados melhores do que estes?”, pois essa não é uma pergunta sábia. Esta parte do capítulo aconselha paciência e cautela, alertando contra as armadilhas da injustiça e da nostalgia.
A Utilidade da Sabedoria e a Limitação Humana
A reflexão avança para a utilidade da sabedoria e a aceitação dos desígnios de Deus (Ec 7:11-14). A sabedoria é boa com uma herança, e mais proveitosa para os que veem o sol. Pois a sabedoria serve de abrigo, como o dinheiro serve de abrigo; mas a excelência do conhecimento é que a sabedoria preserva a vida de quem a tem. Considera a obra de Deus: quem poderá endireitar o que Ele torceu? No dia da prosperidade, sê feliz; mas no dia da adversidade, considera. Deus fez tanto um quanto o outro, para que o homem não possa descobrir coisa alguma que virá depois dele. Aqui, a sabedoria é apresentada como uma proteção e um guia, mas também se reconhece a incapacidade humana de controlar ou compreender totalmente os caminhos divinos.
A Inconstância da Justiça e a Busca pela Sabedoria
O Pregador aborda a inconstância da justiça e a difícil busca pela verdadeira sabedoria (Ec 7:15-22). Ele declara ter visto tudo nos seus dias de vaidade: um justo que perece na sua justiça, e um perverso que prolonga a sua vida na sua maldade. Aconselha a não ser excessivamente justo nem excessivamente sábio, para não te arruinares; mas também não ser excessivamente perverso nem excessivamente tolo, para não morreres antes do tempo. É bom que te apegues a este, e que daquele também não retires a tua mão; pois quem teme a Deus escapa de todas essas coisas. A sabedoria fortalece o sábio mais do que dez poderosos que há na cidade. Não há homem justo sobre a terra que faça o bem e nunca peque. Também não dês atenção a todas as palavras que se dizem, para que não ouças o teu servo amaldiçoar-te. Pois tu mesmo sabes que muitas vezes também tu amaldiçoaste outros. Esta seção destaca a complexidade da vida moral e a falibilidade humana, sugerindo um caminho de equilíbrio e a humildade diante dos próprios erros e dos outros.
A Dificuldade de Encontrar a Verdadeira Sabedoria
Por fim, o capítulo conclui com a profunda dificuldade de encontrar a sabedoria plena (Ec 7:23-29). O Pregador afirma ter provado tudo com sabedoria, dizendo: “Serei sábio”, mas a sabedoria ficou longe dele. O que está longe e é profundo, quem o pode achar? Ele se voltou para conhecer, para investigar e para buscar a sabedoria e a razão das coisas, e para entender a perversidade da insensatez e a loucura do erro. Descobriu algo mais amargo que a morte: a mulher cujas mãos são laços e cujo coração é armadilhas. Aquele que agrada a Deus escapa dela, mas o pecador é apanhado por ela. O Pregador diz que, buscando ainda, encontrou um homem entre mil, mas mulher entre todas essas não encontrou. Ele conclui que Deus fez o homem reto, mas eles buscam muitas invenções. Esta passagem revela a frustração do Pregador na sua busca exaustiva por sabedoria e verdade, reconhecendo as limitações humanas e a intrincada natureza da moralidade e das relações humanas.
📖 Comentário de Eclesiastes 7
Eclesiastes 7:1-6 Com Eclesiastes 7, uma nova seção começa neste livro. Podemos ver isso quando olhamos para a forma como o Pregador na primeira parte deste capítulo, Ec 7:1-14, expressa suas observações. Ele o faz na forma dos chamados provérbios “melhor… do que”, uma forma que também encontramos no livro de Provérbios (Pv 12:9; Pv 15:16-17; Pv 17:1).
Temos que aprender o que realmente importa na vida. Isso significa que sabemos distinguir as coisas melhores ou mais excelentes daquilo que pode ser bom, mas ainda é de qualidade inferior ao melhor (Fp 1:10). Esta distinção é melhor vista quando olhamos para o final de um caso. Portanto, é sábio ficar atento ao fim de tudo o que fazemos, tanto conosco quanto com os outros (Hb 13:7).
Veja, por exemplo, o fim do rico e do pobre Lázaro (Lc 16,19-31). Da mesma forma, a bela Babilônia de hoje, que é a igreja católica romana, não mostra sua verdadeira natureza. Vemos sua verdadeira natureza no final, quando o julgamento vier (Ap 17:1-18; Ap 18:1-24). Em vista disso, e também de nós mesmos, esta pode ser a nossa oração: “SENHOR, faze-me saber o meu fim, E qual é a medida dos meus dias; Mostra-me quão transitório sou” (Sl 39:4).
Em Israel, um nome significa muito mais do que um crachá ou um rótulo. Um nome expressa como uma pessoa é, sua personalidade e caráter. “Um bom nome” (Ec 7:1) é dado após um período de tempo e com base em um determinado comportamento. Esse bom nome permanece mesmo após a morte. O cheiro de “óleo bom” é apenas temporário, embora o cheiro seja agradável pelo tempo que perdura. Não se trata de bom versus ruim, mas de melhor versus bom. Melhor aqui tem o significado de mais útil, de ter mais benefícios.
O Nome do Senhor Jesus é “um unguento derramado” cuja fragrância permanece para sempre (Filho 1:3, tradução de Darby). O bom nome de Maria permanece em conexão com seu ato de ungir o Salvador (Mateus 26:13).
Que o dia da morte de uma pessoa é melhor do que o dia de seu nascimento só é verdade se Cristo não estiver envolvido. Para aqueles que conhecem a Cristo, estar com Cristo, ou partir, é “muito melhor” (Filipenses 1:23), mas a vida com e para Ele também é de grande significado. O Pregador fala dessa percepção como sendo feita sob o sol, sem olhar para trás no horizonte. Ele olha para a vida na terra sem considerar a verdade de que “aos homens está ordenado morrerem uma vez e depois disso vem o julgamento” de Deus sobre os pecados cometidos (Hb 9:27).
O confronto com a morte, que sempre traz consigo um funeral, é útil porque é precisamente aí que se manifesta a realidade da existência frágil e transitória do homem (Ec 7,2). A morte nos leva a pensar na vida. Um funeral também nos faz pensar no nosso. Podemos aprender mais com o dia da morte de uma pessoa do que com o dia de seu nascimento.
A festa de nascimento e as festas da vida não são necessariamente erradas, mas não nos tornam sérios. As ocasiões festivas não são as mais adequadas para refletir sobre a seriedade da vida. A emoção prevalece. Em eventos tristes, o humor é pensativo e a pessoa fica mais inclinada a pensar no sentido da vida. Então vamos orar com Moisés: “Ensina-nos a contar os nossos dias; Para que possamos apresentar a Ti um coração sábio” (Sl 90:12).
Em um funeral, somos determinados pela realidade inescapável de que a morte é “o fim de todo homem” em sua existência na terra. Mais cedo ou mais tarde, todo homem terá que lidar com isso de forma irrevogável. É extremamente estúpido fechar os olhos para isso. O Pregador aponta que os vivos devem levar isso a sério. Faça algo com essa realidade que um dia também afetará você. O homem não deve viver irrefletidamente como se sua vida na terra nunca fosse acabar. Enquanto ele viver, ele deve focar seus pensamentos nisso.
À casa do luto e da morte pertence a tristeza e não o riso (Ec 7:3). Aqui é sobre o estado de espírito certo ao pensar na fragilidade da existência. As pessoas não querem ficar tristes. A vida deve ser alegre. As pessoas não querem ser confrontadas com o pessimismo. Deve ser tudo maravilhoso. É o disfarce do homem que não quer dar espaço para o luto porque isso amortece o sentimento acarinhado de felicidade.
O que realmente se passa no coração é visto mais claramente com um rosto triste por causa da tristeza interior do que com a máscara do sorriso que muitas vezes esconde muita miséria. Que vai bem com o coração, significa que a dor torna a vida interior mais adequada para chegar ao julgamento correto sobre a vida. Esse é o resultado quando a morte é encarada nos olhos.
A tristeza exterior e a alegria interior podem andar de mãos dadas na vida do crente. Paulo diz: “Entristecidos, mas sempre alegres” (2Co 6:10). Ele está triste por causa das circunstâncias externas, mas sempre alegre porque o Senhor está sempre presente. Isso significa que Deus não é inimigo da alegria. Ele chama os Seus para se alegrarem, mas Nele (Fp 4:4) e diante Dele (Dt 12:12).
Sem Ele não há verdadeira alegria sob o sol, mas apenas um substituto dela. As pessoas riem com o jogo de palavras de um comediante ou também por causa de sua sátira mordaz sobre as coisas mais sagradas. Quão perverso é o coração desses homens.
O sábio entende que a dor traz consigo uma bênção (Ec 7:4). Portanto, sua mente (literalmente: coração) está “em uma casa de luto”. Ele não precisa estar lá fisicamente, mas vive na consciência da natureza finita da existência do homem na terra. O coração é o centro da existência de uma pessoa, o lugar onde as considerações acontecem. O sábio pensará na morte. Ele permite esses pensamentos e preocupações sobre isso; ele não está fugindo disso.
O tolo busca apenas prazer; é isso que seu coração busca, é isso que ele está procurando. Você pode encontrá-lo em todos os lugares onde há o que comemorar, onde é divertido estar, onde não há pessimismo, mas onde você pode dar boas risadas das piadas que são contadas. Ele é cego para assuntos espirituais. O prazer do mundo faz com que Deus seja esquecido ou mesmo rejeitado.
As observações anteriores sobre o luto pela morte e sobre a alegria que nega o luto significam na verdade a “repreensão do sábio” (Ec 7:5). O Pregador que se tornou sábio, passou adiante o que realmente importa na vida e isso é morte. Se ouvirmos suas palavras e as levarmos a sério, isso será de grande benefício para nós. É melhor nos humilharmos agora e irmos para a ‘casa do luto’ para que nossos corações possam ser exaltados a longo prazo, do que o contrário.
Se queremos levar a sério o plano de Deus em nossas vidas, temos que lidar com pessoas sábias que querem nos ajudar a viver nossas vidas da maneira mais valiosa possível. Eles não podem tirar toda a nossa dor ou resolver todas as nossas dúvidas e problemas, mas podem nos dar pistas sobre como lidar com eles.
Ouvir a canção dos tolos é feito para substituir a dor e a morte. O tolo não fala dessas coisas tristes, e se fala é para zombar delas. Os comediantes podem oferecer entretenimento e riso por um momento para esquecer a tristeza por um momento, mas sua fala não faz sentido e não dá nenhum suporte para a vida.
O que os tolos têm a oferecer é como espinheiros queimando: você ouve um estalo momentâneo, vê o fogo por um momento e sente uma rajada de calor, mas tudo é extremamente efêmero (Ec 7:6). O fogo aumenta por alguns segundos e é apagado novamente. O crepitar dos espinheiros não afeta a panela pendurada acima dele. É tolice pensar que a panela vai ferver, porque isso requer um bom e longo fogo. Espinhos nem esquentam a panela.
Assim é com o riso do tolo. É veemente e curto e desaparece rapidamente, sem deixar nenhuma impressão. Quem pensa que pode manter a morte à distância com o riso é realmente tolo. O Pregador conclui que o riso do tolo é “futilidade”, vazio, sem efeito.
Quantas pessoas existem que deveriam ser chamadas de tolas porque buscam principalmente coisas que apenas trazem algum riso externo, embora sejam cegas para o essencial da vida. O homem é um péssimo juiz do que tem valor real e duradouro.
Eclesiastes 7:7-10 Em Ec 7:7 continua o ensinamento sobre julgar o que realmente dá sentido à vida. A palavra “para” parece indicar isso. O aspecto do abuso de poder soma-se ao já mencionado. Um homem sábio que exerce poder oprimindo alguém para ganho pessoal torna-se um tolo ou um louco. Ele perde de vista a realidade e só se preocupa com a vida aqui e agora. Ele não pensa no futuro e certamente não na morte. Além da opressão, aceitar ou dar suborno também é um meio testado e comprovado de favorecer a si mesmo. O coração do sábio que se rebaixa a tal prática é corrupto. Seu coração não está na casa do luto, mas na festa da casa. O sábio que abusa do seu poder ou se deixa subornar, ou suborna os outros, age como um homem perverso (Pv 17:23). Ele julga o valor presente dos bens mortais de uma forma que o leva a usar até a injustiça para apoderar-se deles. Por isso ele sacrifica seu bom nome de sábio.
No “início” de uma questão não está claro como ela se desenvolverá (Ec 7:8). Somente no “final de um assunto” pode-se determinar qual foi sua utilidade e valor. Portanto, é importante esperar com o julgamento de uma questão até que o final seja conhecido, porque então o valor pode ser determinado.
A “paciência de espírito” esperará e verá como um assunto se desenvolve, enquanto a “soberba de espírito” cheia de presunção afirma saber seu curso exato. O altivo esquece o fim e afirma saber tudo. O primeiro é caracterizado pela paciência, o outro pela impaciência. A paciência é um aspecto da humildade; a impaciência indica a raiva orgulhosa sobre os caminhos de Deus com o homem.
Em conexão com Ec 7:7 podemos dizer que aqueles que são pacientes esperarão pacientemente pelo fim ou resultado de uma provação. Ele não se aproveitará da opressão ou usando um presente de suborno. O fim da vida apenas fornece informações confiáveis sobre o valor da vida. Se o fim da vida é bom, toda a vida é boa, mesmo que não tenha sido uma vida ‘bonita’. Se o fim for ruim, até a vida mais bem-sucedida se tornará ruim.
Ec 7:9 se conecta diretamente com Ec 7:8. O Pregador adverte contra a raiva sobre o curso de um assunto. A paciência pode ser testada e então existe o perigo da raiva no coração. Isso acontece quando culpamos os fatores humanos pelo atraso no desenvolvimento de uma matéria. Se formos oprimidos injustamente ou sentirmos que estamos sendo julgados injustamente, a raiva pode surgir em nossa mente. Talvez nem o expressemos, mas em nosso interior somos consumidos pela raiva.
O Pregador diz que o seio dos tolos é a residência da raiva. Aquele que permite que a raiva habite em seu homem interior, tornando-a parte de sua personalidade, torna-se um tolo. A raiva também pode surgir quando recebemos tratamento imerecido ou somos vítimas de comportamento inapropriado. Neste contexto, trata-se de uma opressão injusta ou de um teste.
Em Ec 7:9 uma pessoa fica com raiva porque não é paciente e também não está satisfeita com suas circunstâncias. A pergunta que ele faz em Ec 7,10 não surge por curiosidade, mas por frustração. Com ele trata-se de fazer uma comparação dos seus dias, das circunstâncias em que se encontra, com os de outrora, perguntando-se porque é que os tempos de outrora eram melhores. Na verdade, ele está chamando Deus para prestar contas, ele está exigindo uma explicação de Seu trato com ele. Essas pessoas são os “resmungões, criticando, seguindo suas próprias concupiscências” (Jd 1:16).
Não dá testemunho de sabedoria fazer tais perguntas; mostra ignorância sobre o passado e sobre o homem, que era tão pecador quanto é agora. O Pregador já disse no início deste livro o que foi é o que será, portanto não há nada de novo debaixo do sol (Ec 1:9). Os dias sempre foram maus por causa do pecado do homem (Ef 5:16). Portanto, é inútil aprofundar-se nisso também. Os israelitas desejavam voltar ao Egito por insatisfação com sua permanência no deserto. Eles preferiram sua permanência na escravidão no Egito a sua permanência no deserto com Deus. Isso porque eles assumiram que Deus queria que eles perecessem.
Quem faz a pergunta “por que isso?” esquece que o mal também existia, embora em outras manifestações. A glorificação do passado é tolice, pois então também é esquecido que Deus não muda (Ml 3:6), e que o apoio do Senhor permanece disponível para o crente em todos os momentos (Hb 13:8). Paulo esqueceu o que estava para trás e avançou para o que estava à frente porque Cristo encheu seu campo de visão (Fp 3:13). Trata-se do presente e de ouvir a voz do Senhor.
Eclesiastes 7:11-12 Em Ec 7:11 o Pregador fala sobre o uso adequado da sabedoria contra a falta de sabedoria em Ec 7:10. A “sabedoria” deve provar a si mesma, deve ser refletida. O Pregador, portanto, relaciona “uma herança” à sabedoria, pois a sabedoria faz justiça especialmente na maneira como uma herança é administrada.
À combinação “sabedoria” e “dinheiro” outro aspecto é acrescentado em Ec 7:12: ambos dão “proteção” (Sl 91:2; Is 30:2). No entanto, a posse de conhecimento inerente à sabedoria está além da posse de dinheiro. O dinheiro não traz ninguém ao favor de Deus e não dá vida a ninguém. Portanto, o conhecimento supera a posse de dinheiro, pois o conhecimento está relacionado a uma “sabedoria que preserva a vida de seus possuidores”.
Não há outro conhecimento que nos dê vida senão o conhecimento do Pai e do Filho. (João 17:3). A sabedoria, que é o Senhor Jesus, preserva a vida. Quem O encontra, encontra a vida; quem O tem, tem a vida (Pv 8:35; 1Jo 5:12).
Eclesiastes 7:13-14 Aquele que é sábio sob o sol considerará “a obra de Deus” (Ec 7:13). Ele perceberá que é impossível mudar qualquer coisa que Ele determinou. Antigamente (versículo 10) Ele agia de acordo com os mesmos princípios que Ele faz hoje. O Pregador aponta especificamente que ninguém pode endireitar o que Deus “tortou”. Tudo está submetido à vontade de Deus, até as coisas que Ele dobrou. (Veja Pau que Nasce Torto Morre Torto?)
Esta seção trata do fato de que Ele, em Sua soberania, conectou consequências ao pecado, que Ele não desfaz. É importante receber tudo da mão de Deus da forma como nos foi dado, pois não podemos mudar nada (Ec 1:15). Assim, Ele “desvia o caminho dos ímpios” (Sl 146:9). Uma pessoa perversa não é capaz de seguir o caminho certo. Um caminho de pecado é sempre um caminho tortuoso. Foi assim que Deus ordenou e veremos isso quando considerarmos com precisão a obra de Deus.
Aquele que considera a obra de Deus entenderá que Deus dá tanto o bem quanto o mal (Ec 7:14; Jó 2:10; Is 45:7). Em um “dia de prosperidade” podemos aproveitar o bem daquele dia. Mas quando somos confrontados com um “dia de adversidade”, fazemos bem em considerar que este dia também nos foi dado por Deus.
Nos versículos anteriores a este, vimos que não devemos ficar chateados quando as coisas não saem do jeito que desejávamos. Podemos encontrar descanso no pensamento de que tudo vem da mesma mão paternal de Deus e que Ele tem um propósito para isso. Tanto a prosperidade quanto a adversidade têm sua utilidade. Manter isso em mente nos impedirá de resmungar e criticar a Deus.
A mudança contínua de dias de prosperidade e de adversidade nos preserva na dependência Dele. Não sabemos que tipo de dias virão no futuro. Deus determinou assim, “para que o homem não descubra nada [que será] depois dele”, pois o homem é apenas homem e não Deus. Não conhecemos os eventos futuros e, portanto, não temos poder sobre eles.
É bom que não saibamos o que vai acontecer amanhã. A consciência e a aceitação disso estão relacionadas à nossa confiança em Deus. Se confiarmos Nele, confiaremos na palavra do Senhor Jesus, que diz que não devemos “nos preocupar com o amanhã; pois o amanhã cuidará de si mesmo. Cada dia tem bastante trabalho próprio” (Mateus 6:34).
Não adianta nada se preocupar com o que pode acontecer amanhã. Já temos problemas suficientes no dia que experimentamos agora. Não precisamos nos preocupar agora com o que poderia acontecer conosco amanhã. Quando chegar o amanhã, o problema já pode ter desaparecido. E se o problema ainda estiver lá, então Deus estará lá também.
Eclesiastes 7:15-18 Com Eclesiastes 7:15 começa uma nova seção sobre a justiça e a impiedade, ambas observadas pelo Pregador, sobre as quais ele compartilha seu testemunho conosco. O que ele viu o leva ao pronunciamento “durante a minha vida de futilidade” (Ec 7:15). Faz com que ele perceba mais uma vez o quão frágil é sua existência.
Ele fala sobre “um homem justo” a quem acontece algo que ninguém esperaria. Seria de se esperar que ele vivesse muito, mas acontece o contrário; ele perece “na sua justiça”. Ele também fala sobre um homem perverso a quem acontece algo que ninguém esperaria. Seria de esperar que ele perecesse na sua maldade, mas acontece o contrário: ele prolonga a sua vida “na sua maldade”. Isso é o que você chama de ‘dobrado’ (Ec 7:13).
O que o Pregador diz é representativo de uma série de casos semelhantes. Trata-se de perecer apesar da justiça e permanecer vivo apesar da maldade. O padrão é que a retidão corresponde à promessa de uma vida longa e que a iniquidade leva a uma vida curta. No entanto, há exceções. Isso tem a ver com a maneira como Deus reina. Em Seu governo é possível que na terra o mal vença e o bem seja punido. Mas no final os bons vencerão e os maus serão punidos. Estes são exercícios para ter paciência de espírito (Ec 7:8).
O homem justo pode lutar com essa ‘inclinação (tortura)’ (Jó 21:7; Salmo 73:3-12; Hab 1:4; Hab 1:13). Também é algo que pode deixar alguém chateado quando pessoas perversas muitas vezes conseguem se proteger contra a espada da justiça por meio de fraude e violência. Às vezes, eles até recebem proteção de seu próprio governo quando não há acordo de extradição com o país onde os crimes foram cometidos. Muitos criminosos de guerra ficaram fora da prisão dessa maneira e, portanto, atingiram uma idade avançada.
Nabote era um homem justo que foi morto, enquanto uma mulher perversa como Jezabel permaneceu viva. Vemos o mesmo com Abel e Caim. E quanto aos muitos que no curso da história da igreja foram assassinados por causa de sua fidelidade a Deus e à Sua Palavra. Acima de tudo, vemos isso com o Senhor Jesus, o Justo acima de tudo. Ele foi assassinado no meio de Seus dias, enquanto Ele não tinha feito nada além de justiça.
O crente quer aprender a tirar a vida das mãos de Deus assim como ela é. Ele tenta não resolver o mistério da vida sozinho. Ele encontra descanso ao considerar a obra de Deus. Dessa forma, ele aprende que os desastres que acontecem com ele o moldarão para o reino futuro, enquanto a prosperidade do homem perverso o torna maduro para o julgamento vindouro.
A observação de Ec 7:15 nos leva à conclusão de Ec 7:16 que vem como um conselho. Com isso temos que ter em mente que Deus não é pensado. É a conclusão do pensamento realista do homem neste mundo que quer viver de sua própria convicção. Desse ponto de vista, é inteligente não fingir ser muito justo e não se tornar um moralista, porque as pessoas só vão te odiar e é sua culpa se você perder todo o prazer da vida.
Também com pedantismo, você tem que ter cuidado. É disso que se trata, que surge da palavra “excessivamente”. Não alegue ter toda a sabedoria. As pessoas com quem você lida diariamente não aceitarão isso. Você estará fora em nenhum momento. As pessoas ao seu redor verão através de sua sabedoria imaginada e acabarão com você completamente. É devastador para o seu funcionamento e você será banido, ficará em um beco sem saída.
Em Ec 7:16 é sobre como uma pessoa se vê, como ela é aos seus próprios olhos e como ela se apresenta. Os fariseus são um modelo desse tipo de gente. Eles se apresentaram assim. Eles eram muito justos aos seus próprios olhos e também queriam parecer assim para outras pessoas. Por fingirem ser tão justos, a destruição veio sobre eles, da qual o Senhor falou sobre eles (Mateus 23:28; Mateus 5:20). Embora Ec 7:16 não seja um conselho para o justo – ele deseja ser justo e sábio, mas apenas como Deus quer que ele seja – inclui uma advertência geral para ele de que deve ter cuidado para não cair em extremos. Podemos estar tão convencidos de que estamos certos e nos deixar levar por nosso senso de justiça que nos superestimamos em nosso julgamento e, assim, nos destruímos. Isso pode significar que estaremos sozinhos, fora da comunidade. Também pode implicar que, devido às nossas concepções, chamamos a nós mesmos a destruição, que os outros trazem sobre nós porque são atormentados pela nossa arrogância (cf. Ap 17, 15-18).
Neste versículo, trata-se de ocupar um lugar inapropriado. É arrogância, uma pretensão (cf. Nm 16,18; 2Sm 13,5). É bancar o justo, é sobre alguém se vangloriar de ser alguém que não é (Mateus 23:7). Podemos fingir ser mais santos do que somos, por exemplo, jejuando e castigando a nós mesmos ou fazendo uma peregrinação. Se nosso comportamento exterior for convencer os outros de nossa piedade e se esse for nosso foco, nós nos destruímos. É um esforço excessivo provar que estamos certos em julgar as coisas.
A modéstia se encaixa em nossa atitude. Não devemos pensar além do que está escrito (Rm 12:3; Rm 12:16; 1Co 4:6). Não devemos tomar este aviso como uma relativização do que é justo e sábio. É um alerta para nossa prática em relação a uma atitude que irradia que somos o padrão do que é justo e sábio. Podemos e devemos estar convencidos do que é certo, mas devemos lidar com isso com cuidado.
Isso não significa que devemos nos tornar negligentes em nossa prática e fazer concessões às custas da verdade e da justiça. Não precisamos perseguir todo mal e ter opinião sobre tudo. Não devemos nos apresentar como críticos para desaprovar tudo o que é dito e feito e nem interferir nos assuntos alheios como se tudo soubéssemos e tudo pudéssemos. Se fizermos isso, faremos uma caricatura de retidão e sabedoria.
Ec 7:17 é o oposto de Ec 7:16. Ec 7:16 é uma advertência para a auto-exaltação, Ec 7:17 nos adverte para não nos rebaixarmos ao nível do mundo. O Pregador não diz que um pouco de maldade ou insensatez não seja problema, mas aponta para a capitulação ao mal. É a aceitação de alguma maldade e tolice, desde que esteja dentro dos limites aceitáveis para a maioria das pessoas. Se ambas as partes concordarem, deve ser aceito.
Que o que é perverso e tolo se torna cada vez mais o padrão da sociedade. Não se deve exagerar demais e não se comportar de maneira muito perversa e tola. É assim que você tira o máximo proveito disso. Essa atitude de vida se reflete na mistura de um pouco de bem com um pouco de mal e em fazer concessões. É assim que se consegue manter isso por muito tempo e ser bom amigo de todos. Isso é ter seu bolo e comê-lo também, vivendo dois estilos de vida.
Se alguém escolher o lado da maldade e da tolice, então há uma grande chance de que ele morra antes do tempo, o que significa que ele não morrerá de velhice, mas em uma idade que você não esperaria. Se permitirmos que Deus se envolva, sabemos que a hora de morrer é determinada por Ele (Jó 14:5). Não podemos prolongar nossas vidas (Mateus 6:27).
Ao mesmo tempo, Deus sabe como dar às ações tolas do homem um lugar em Seu propósito. Ele pode trazer ruína sobre nós em breve e encurtar nossa vida se vivermos perversamente e tolamente (Sl 55:23). Isso pode acontecer, por exemplo, levando um estilo de vida que afeta nossa saúde, como drogas e sexo fora do casamento, ou cometendo um assassinato resultando na pena de morte.
O conselho de Ec 7:18 corresponde aos conselhos dos dois versículos anteriores. É uma espécie de conselho resumido para fazer o que é “bom”. É bom entender “uma coisa”, que é manter o alerta para não cair em extremos. Também é bom não abrir mão do “outro”, assim diz a última linha de Ec 7,18: teme a Deus.
Temer a Deus significa viver em reverência e admiração por Ele. Quem segue este ‘bom’ conselho, “sai com os dois”. Isso significa que só somos salvos de cair em extremos se temermos a Deus. Como resultado, também somos protegidos das consequências mencionadas nos dois versículos anteriores: arruinar-nos e morrer antes do tempo.
O sábio caminha no caminho do meio entre os dois extremos: não na sua própria justiça e não na maldade. Ele sabe caminhar entre o legalismo e a indiferença. Isso só pode ser realizado se Deus for temido. O temor de Deus nos guarda dos extremos da justiça própria, por um lado, e da maldade, por outro lado (Provérbios 3:7). O temor de Deus é o princípio da sabedoria. O temor de Deus resulta em humildade e desconfiança em nossa própria sabedoria. Aquele que teme a Deus teme o pecado e evita a tolice.
Eclesiastes 7.15 Ao declarar que tem visto o justo perecer e o ímpio obter longevidade, o autor demonstra certa desilusão quanto ao que constatou, pois o contrário deveria ser o correto. No entanto, há injustiças na vida que sempre serão um mistério (Ec 3.16—4.3; 8.14).
Eclesiastes 7.16 “Não sejas demasiadamente justo.” Poucos versículos em Eclesiastes são mais suscetíveis a interpretação errada do que estes (v. 16-18). Não se trata do chamado “caminho do meio”, que aconselha: “não seja santo demais nem perverso demais; peque moderadamente”. Nesta passagem, o pregador alerta contra a falsa religiosidade e as formas exibicionistas de adoração. No hebraico, o verbo que significa “ser sábio” poderia ser traduzido como “se achar sábio”, e ser demasiadamente justo significaria ser justo a seus próprios olhos (Pv 3.7).
Eclesiastes 7.17 “Não sejas demasiadamente ímpio, nem sejas louco.” Talvez isso fosse melhor traduzido como “não expanda a sua perversidade e não seja louco; por que morrer antes de sua hora chegar?”
Eclesiastes 7.18, 19 O “isso” a que se refere Salomão e a sabedoria verdadeira, que provem de Deus. O “disso” é a insensatez dos tolos. A instrução “teme a Deus” indica que a verdadeira obediência, com adoração e respeito, é a melhor proteção contra todo tipo de loucura.
Eclesiastes 7:19-22 Após sua advertência por querer ser ‘excessivamente justo’ (Ec 7:16), o Pregador aponta o valor da verdadeira sabedoria em Ec 7:19. A sabedoria fortalece para viver na cidade, apesar de todos os problemas e perigos a que a vida na cidade pode estar exposta. A sabedoria fortalece mais do que o poder coletivo de dez governantes. Esses homens podem ter o poder, mas quando não há sabedoria eles levam a cidade à destruição, pois são homens pecadores e buscam apenas a sua própria vantagem.
O valor da sabedoria está na consciência de que Deus dirige tudo. O sábio não se deixa levar pelas circunstâncias. Claro que ele tem que lidar com as circunstâncias, mas sabe que estão nas mãos de Deus. Os governantes confiam em sua própria sabedoria e poder, a fim de proteger a cidade contra o mal – que pode vir tanto de dentro quanto de fora – tendo como motivação o próprio interesse. Portanto, eles não terão sucesso e perderão a luta. Um homem com sabedoria tem mais vantagem para a defesa de uma cidade do que dez governantes sem sabedoria (Pv 21:22; Pv 24:5).
Para o crente, Cristo é tanto a sabedoria de Deus quanto o poder de Deus (1Co 1:24). Quem vive com Ele aprende a estar “contente em qualquer circunstância” que esteja, como Paulo aprendeu (Fp 4:11-12). Como resultado disso, ele pode dizer: “Tudo posso naquele que me fortalece” (Filipenses 4:13).
Em Eclesiastes 7:20 ele diz o mesmo que Salomão disse em sua oração na dedicação do templo (1 Reis 8:46; Provérbios 20:9). Agora que aprendeu com a amarga experiência, chega à mesma conclusão. Ele enfatiza aqui, em conexão com o versículo anterior, o estado pecaminoso dos governantes, mas ao mesmo tempo ele torna isso um assunto geral ao falar sobre “não há um homem justo na terra”.
Ninguém é tão justo na prática de sua vida que faça apenas o bem sem ter nenhum pecado ligado ao que faz. A única exceção é o Senhor Jesus. Ele fez o bem sem pecar. Pedro, Paulo e João testificam em suas cartas a absoluta ausência de pecado Nele: “que não cometeu pecado”, “que não conheceu pecado”, “Nele não há pecado” (1Pe 2:22; 2Co 5:21; 1Jo 3:5).
Com esta observação, o Pregador nos lembra de não exagerar nossas realizações e não depreciar as dos outros. Precisamos considerar que não vivemos perfeitamente justos e não somos completamente altruístas. É impossível para um homem fazer qualquer coisa sem tomar algum crédito para si mesmo. Só se o crente se deixar conduzir pelo Espírito é que pode fazer o bem sem pecar.
A pecaminosidade do homem, que é declarada no versículo anterior, se manifesta principalmente no que ele diz (Ec 7:21; Tg 3:2). O Pregador aponta que não devemos levar a sério “todas as palavras que são ditas” pelo homem em geral. Ele quer dizer que não devemos querer saber tudo sobre o que as pessoas dizem sobre nós (Sl 38:13-14; 1Sm 24:10). Quando as pessoas falam bem de nós, nos tornamos arrogantes; quando alguém fala mal de nós, ficamos com raiva e possivelmente vingativos.
Também não devemos acreditar em tudo que ouvimos. Se já ouvimos, é sábio nem sempre levar a sério o que alguém diz. Quem sempre leva a sério tudo o que as pessoas falam, está pedindo decepção e desilusão. Vemos exemplos claros disso na política. Em tempo de eleição, as pessoas querem se diferenciar e dizem que é impensável governar com um determinado partido político. Quando se trata realmente de governar, dá-se uma reviravolta nessas palavras e verifica-se que ainda é possível governar com um partido que a princípio não gostou.
Por não sermos muito curiosos sobre o que pensam de nós, podemos nos proteger dos comentários das pessoas sobre nós que não são lisonjeiros. O chefe não precisa colocar microfones por toda parte para saber o que sua equipe pensa dele. Ele tem que estar ciente de que não está sem pecado e que haverá algo errado com ele. A ânsia doentia de ‘querer saber tudo’, até mesmo as coisas que você não precisa saber, é na verdade orgulho e falta de autoconhecimento. Vamos ter certeza de que temos a aprovação de Deus e da nossa consciência, então não precisamos nos preocupar com o que as pessoas dizem sobre nós.
Se outros nos amaldiçoarem, com ou sem razão, a sabedoria nos lembrará de nossos próprios erros e falhas (Ec 7:22). O que aconteceria conosco se recebêssemos o castigo que merecíamos por cada palavra ofensiva sobre outra pessoa? Temos que perceber que nós mesmos ferimos os outros por causa do que dissemos. Cometi os mesmos pecados ou pecados semelhantes que condeno nos outros (Rm 2:1; Tt 3:2-3; Mt 7:1-3; Tg 3:1-2).
Se algo nos vem à mente neste contexto, que amaldiçoamos alguém, ou seja, desejamos o mal a ele, e ainda não o confessamos, devemos confessá-lo. Isso não precisa ser para a pessoa sobre quem falamos mal a outra pessoa, mas temos que fazê-lo diante do Senhor e da outra pessoa.
Eclesiastes 7:23-25 O Pregador admite que sua sabedoria falhou com ele para se tornar sábio. Ele honestamente reconhece isso: a busca pela verdadeira sabedoria não rendeu nada. Com toda a sua sabedoria – ele é o homem mais sábio da terra – ele “provou tudo isso” (Ec 7:23; Ec 1:13). “Tudo isso” é tudo o que ele compartilhou conosco na seção anterior (Eclesiastes 2:1-7:22). Sua pesquisa visava obter uma visão do verdadeiro significado e determinar o valor permanente de todo o trabalho da humanidade na terra.
Ele só conseguiu descobrir em sua sabedoria que o mundo está cheio de vaidade e que esse conhecimento não dá paz e alegria ao seu coração. Ele não veio mais longe. A verdadeira sabedoria, ele percebe, permaneceu muito além de seu alcance. Muitas pessoas não buscam a sabedoria porque não são sábias. É por isso que eles nunca se tornam sábios. Salomão é sábio e o procurou, profundo e amplo, mas também não o encontrou. A sabedoria está muito além do conhecimento do homem.
“O que foi” (Ec 7:24), não é apenas o que existe, mas também a forma como algo foi formado por Deus. Quem estava presente na criação? Quem pode compreender o que Deus fez existir e quem pode entender como Ele sustenta todas as coisas que criou? O homem não pode entender isso por meio da pesquisa humana, pois a sabedoria que reside em todas as coisas que Deus criou é “extremamente misteriosa” ou, em outras palavras, insondavelmente profunda. Todo filósofo e cientista honesto admitirá que ninguém pode “descobri-lo”.
O Pregador não conseguiu alcançar a sabedoria. Ele chega à conclusão de que não sabe nada e que quanto mais sabe o que há para saber, mais consciente fica do pouco que sabe. Ele é confrontado com os mistérios de Deus. Eles são insondáveis (Jó 11:7-8; Jó 28:12-22).
Deus nos conta o que “foi remoto”, em um passado distante, quando Ele criou o céu e a terra. Ele nos diz isso em Sua Palavra. Lá podemos “encontrá-lo” (Gn 1:1; Hb 11:3) e não com os cientistas que querem nos fazer acreditar que encontraram a solução na teoria da evolução. Para nós é verdade que a Palavra está próxima (Dt 30:14) e que o Espírito no-la explica (1Co 2:13). No entanto, ao mesmo tempo, muitas coisas permanecem inconcebíveis para nós, pois quem pode verificar Deus (Rm 11:33)?
O Pregador não apenas desejou tornar-se sábio (Ec 7:23), mas também não negou a si mesmo nenhum esforço para isso (Ec 7:25). Ele tentou de tudo e procurou em todos os lugares. Ele já era mais sábio do que qualquer homem. No entanto, isso não o tornou preguiçoso, mas ainda mais zeloso para aprender a verdadeira sabedoria. Ele não apenas queria conhecer a essência das coisas na superfície, mas também descobrir o que está além da percepção, dos motivos. Sua dedicação é descrita de diversas formas, o que indica o quanto ele tem se ocupado dela.
A única conclusão a que toda a sua pesquisa intensiva o trouxe é que tudo está permeado de “maldade” e “loucura” com o resultado final de “loucura”. O homem, portanto, permanece afastado do plano de Deus e não produz nada de valor real e duradouro.
Nosso ‘trabalho de pesquisa’ deve ser focado em Cristo. Nossa vida deve ser olhar para Ele de todos os lados e investigá-Lo em todas as Suas ações e caminhos. Então também vemos a maldade e a loucura do homem, pois Cristo derrama Sua luz sobre todo homem, pelo que seremos guardados. Chegamos a uma conclusão totalmente diferente e é que em Cristo “todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento estão escondidos” (Cl 2:3).
Eclesiastes 7:26-29 O Pregador descobriu que a maldade é loucura e que a loucura é loucura (Ec 7:25). Ele não apenas observou isso, mas também experimentou por si mesmo fazendo relacionamentos errados com suas muitas esposas. Ele fala sobre isso com uma profunda consciência de sua amargura. A morte como salário do pecado é amarga (1Sm 15:32), mas o pecado da fornicação é ainda “mais amargo do que a morte” (Ec 7:26; Pv 5:9; Pv 5:11).
O Pregador não fala de todas as mulheres – mulheres em geral – mas da “mulher cujo coração está em armadilhas” e que procura tentar a infidelidade (cf. Ec 9,9; Pro 18,22). A partir de seu próprio exemplo, parece que não apenas as mulheres podem enganar os homens, mas também os homens podem ser capturados por suas concupiscências por meio da mulher armando armadilhas e redes para ele. Ele é acorrentado por suas concupiscências (Pv 5:22-23) e capturado por ela, porque não é mais agradável aos olhos de Deus; em outras palavras, não andando mais com Ele.
Salomão usa muitas palavras para descrever a natureza perversa de tal mulher. Ele compara o coração da mulher com “laços e redes”; “suas mãos são correntes”, o que indica que ela algema aqueles a quem agarra com as mãos, das quais não há como escapar. A tentação de relações sexuais ilícitas é a maior tentação de todos os homens, grande em extensão e grande em profundidade. Quem é capturado por ela, é o homem mais deplorável. “Fujam da imoralidade. Todo [outro] pecado que o homem comete é fora do corpo, mas o imoral peca contra o seu próprio corpo” (1 Coríntios 6:18).
“Quem agrada a Deus” significa o homem que Deus vê em Cristo e que caminha com Ele. Tal homem agrada a Deus como Enoque fez (Hb 11:5), e escapa das tentações de tal mulher. Essa é a única maneira de escapar dela. O perigo de ser vítima dessa mulher é tão grande que uma pessoa só é afastada dela pela graça e misericórdia de Deus. Quem sai da misericórdia de Deus inevitavelmente cairá em suas mãos.
Isso mostra claramente que nenhum homem deve nutrir o pensamento tolo de que isso não acontecerá com ele. O julgamento sobre a futilidade do homem é novamente confirmado aqui. Aquele que é guardado deve confessar que Deus é quem o guardou. Ao mesmo tempo, Deus só mantém aqueles que com uma intenção do coração mantêm o mal à distância. José era um homem assim (Gn 39:2-3). Ele andou em comunhão com Deus e recusou-se a pecar contra Ele (Gn 39:9).
O início de Ec 7:27 corresponde ao versículo anterior, mas também se aplica a tudo o que o Pregador pesquisou. Por meio de todo o seu trabalho de pesquisa da sabedoria, pelo qual combinava as coisas – acrescentando “uma coisa à outra” –, Salomão chegou à corrupção da natureza humana, tanto do homem quanto da mulher. Ele fez essa descoberta: “Eu descobri isso”. Ele o diz como o “Pregador”, com o que sublinha a verdade do que diz.
Ele fez de tudo “para encontrar uma explicação”, para chegar a uma conclusão final dentro do mistério de uma vida significativa. Em Ec 7:28 ele diz que ainda não chegou a essa conclusão. Não se trata do que encontrou, mas do que não encontrou e do que ainda procura.
No entanto, há algo que ele encontrou entre os homens: “um homem entre mil”. À luz da natureza corrompida do homem, que ele declarou em Ec 7:26, a interpretação deveria ser que um homem justo é uma raridade (cf. Sl 12:1). À luz do Novo Testamento, vemos que aquele Homem que é diferente, que é a exceção entre mil, não é outro senão Cristo (Jó 33:23).
A presença de mulheres entre mil é bastante miserável: ele não conseguiu encontrar uma única. Salomão não conseguiu encontrar uma única mulher entre suas mil esposas, que pudesse satisfazer seu coração. Após este julgamento que o Pregador fez sobre a raça humana em Ec 7:28, onde não encontrou o que procurava, ele acrescenta algo que encontrou (Ec 7:29). Pela palavra ‘eis’, chama-se a atenção para o que ele encontrou e convida todos a participar. Salomão chega à causa da corrupção original: o pecado surge da queda do homem e não de Deus, pois Deus “fez os homens retos”.
A culpa da corrupção geral não é de Deus, mas do homem. Deus “fez os homens retos”, mas o homem seguiu o caminho errado. ‘Reto’ não é pecaminoso ou neutro, mas descreve a condição do coração que é fiel e obediente. O homem foi criado à imagem e semelhança de Deus, mas caiu em pecado (Gn 3:1-7; Rm 5:12). O homem não quer saber disso e tem procurado muitos artifícios para desculpas para o seu pecado desde Adão e Eva. Buscar tem o significado de fabricar. Admitir não se encontra, mas buscar desculpas, culpar os outros, que já começou logo após a queda (Gn 3,12-13). Os problemas às vezes são reconhecidos, mas a solução é buscada na melhora do comportamento por meio de cursos e treinamentos e tal. Dessa forma o problema nunca será resolvido e a solução de Deus para esse problema é ignorada, que é: o dom de Seu Filho.
🙏 Devocional de Eclesiastes 7
Eclesiastes 7 mergulha em uma série de ditados e reflexões comparativas que contrastam a sabedoria com a tolice, a virtude com o erro, e a realidade da vida com as ilusões humanas. O Pregador nos guia por um caminho de discernimento, mostrando que nem tudo que parece bom é de fato benéfico, e que a dificuldade pode ser uma mestra mais eficaz que a alegria superficial. É um convite à moderação, à paciência e à busca por uma perspectiva equilibrada diante das complexidades da existência.
Eclesiastes 7:1-6 (A Realidade do Luto, a Superioridade da Dor e a Importância do Conserto)
O Pregador inicia com comparações provocativas: “Melhor é o bom nome do que o unguento precioso; e o dia da morte, do que o dia do nascimento.” Ele argumenta que é preferível ir à casa do luto do que à casa do banquete, pois a morte é o fim de todos, e os vivos devem ponderar sobre isso. A tristeza é vista como melhor que o riso, porque a tristeza do rosto pode tornar o coração melhor. Ele conclui que é melhor ouvir a repreensão do sábio do que o cântico dos tolos, pois o riso do tolo é como o crepitar de espinhos debaixo de uma panela, sem substância.
Aplicação e Devocional: Este bloco nos convida a uma avaliação profunda sobre o que realmente importa na vida e a valorizar as experiências que nos transformam, mesmo que dolorosas. Para um discípulo de Jesus, que busca a verdadeira sabedoria, o luto e a repreensão (quando justa) são oportunidades para crescimento e amadurecimento espiritual. A vida não é apenas sobre o prazer, mas sobre o propósito.
No seio familiar, um filho que aprende a lidar com a perda e a tristeza, em vez de evitá-las, desenvolve resiliência e empatia. Para aqueles que exercem a paternidade, é essencial não blindar os filhos de toda dor ou repreensão construtiva, mas ensiná-los a aprender com as dificuldades e a valorizar a correção. É sobre forjar caráter, reconhecendo que “o riso do tolo” – a superficialidade e a negação da realidade – não edifica.
No contexto de trabalho, um profissional maduro aceita críticas construtivas e aprende com os erros, em vez de rejeitá-los em busca de uma popularidade vazia. Ele entende que a repreensão do sábio colega ou líder, embora desconfortável, é mais valiosa que os elogios vazios que não trazem aperfeiçoamento. Na comunidade de fé, valorizamos a correção e a disciplina do Senhor e uns dos outros, pois elas nos moldam para a santidade (Hebreus 12:11). Ouvir a Palavra, mesmo quando confrontadora, é mais importante do que buscar apenas mensagens que agradam. Como cidadãos em comunidade, reconhecemos que o “bom nome” (integridade e reputação) é construído ao longo da vida e é muito mais valioso que bens materiais. Devemos ponderar sobre a finitude da vida para viver de forma mais significativa e responsável.
Eclesiastes 7:7-10 (A Corrupção da Sabedoria, a Virtude da Paciência e a Ilusão do Passado)
O Pregador adverte que a opressão pode levar o sábio à loucura, e o suborno corrompe o coração. Ele então compara a paciência com a arrogância: “Melhor é o fim das coisas do que o seu princípio; e melhor é o paciente de espírito do que o altivo de espírito.” Ele aconselha a não se irar rapidamente, pois a ira reside no seio dos tolos. E, de forma perspicaz, questiona a tendência humana de idealizar o passado: “Não digas: Por que foram os dias passados melhores do que estes? Porque nunca com sabedoria farás esta pergunta.”
Aplicação e Devocional: Este trecho nos chama à paciência, à temperança e a uma visão realista do tempo. Para um crente, a paciência é uma virtude que nos permite perseverar nas provações e confiar nos planos de Deus, em vez de agir impulsivamente ou com ira. A sabedoria nos guarda da corrupção, seja ela material ou moral.
No convívio familiar, um filho deve aprender a ser paciente e a controlar a ira, especialmente em discussões, e a valorizar o processo de crescimento familiar, sem ficar preso a uma nostalgia irrealista do passado. Para quem assume a parentalidade, é vital ensinar a paciência e a temperança como respostas aos desafios, além de ajudar os filhos a viver o presente com gratidão, sem idealizar um “tempo de ouro” que nunca existiu.
Quando trabalhamos, o profissional maduro entende que resultados duradouros exigem paciência e que a pressa ou a ira podem levar a decisões precipitadas. Ele não se deixa corromper por subornos ou atalhos antiéticos. Na esfera eclesiástica, a paciência é fundamental no trato com os irmãos e na espera pelo tempo de Deus para as coisas. A ira e a amargura podem destruir a comunhão, enquanto a paciência edifica. Como membros da sociedade, precisamos cultivar a paciência ao lidar com as complexidades e desafios sociais, evitando soluções simplistas baseadas em nostalgia, e atuando com sabedoria para construir um futuro melhor. Filipenses 4:6-7 nos orienta a não andarmos ansiosos, mas a apresentar a Deus nossas petições com ações de graças.
Eclesiastes 7:11-14 (A Sabedoria e a Riqueza, e a Aceitação da Provisão Divina)
O Pregador compara a sabedoria com a herança, afirmando que “boa é a sabedoria, com uma herança, e de proveito para os que veem o sol”. A sabedoria é uma defesa, assim como o dinheiro é uma defesa, mas a excelência do conhecimento reside em que a sabedoria preserva a vida de quem a possui. Ele então nos convida a considerar a obra de Deus: “Vê a obra de Deus; porque quem poderá endireitar o que ele fez torto?” Ele aconselha que, nos dias de prosperidade, devemos nos alegrar, e nos dias de adversidade, devemos refletir, pois Deus fez tanto um quanto o outro, para que o homem não descubra o que virá depois dele.
Aplicação e Devocional: Este bloco nos leva a reconhecer o valor superior da sabedoria e a aceitar a soberania divina sobre as circunstâncias da vida. Para um servo de Deus, a sabedoria que vem do alto é um guia e uma proteção mais valiosa que qualquer herança material, pois ela nos capacita a navegar pelas diversas estações da vida.
No convívio doméstico, um filho pode ser ensinado que o conhecimento e a sabedoria (seja escolar, seja de vida) são investimentos que ninguém pode tirar, e que eles o protegerão mais do que a riqueza. Para quem assume a paternidade, é vital ensinar os filhos a aceitar tanto os momentos bons quanto os ruins como parte do plano de Deus, incentivando-os a buscar a sabedoria divina em todas as situações.
No ambiente profissional, o profissional que valoriza a sabedoria será capaz de tomar decisões mais perspicazes e de se adaptar às mudanças do mercado, entendendo que nem tudo está sob seu controle. Ele celebra o sucesso, mas também reflete nas dificuldades. Na comunidade de fé, somos chamados a ver a mão de Deus em todas as circunstâncias, tanto nas bênçãos quanto nas provações, e a buscar a sabedoria do alto para discernir Seus propósitos. Isso nos leva à humildade e à dependência dEle, como em Romanos 12:12: “Alegrem-se na esperança, sejam pacientes na tribulação, perseverem na oração.” Como cidadãos atuantes, aceitamos que a vida é cheia de altos e baixos, e que nossa resposta a eles deve ser de fé e sabedoria, não de desespero ou arrogância, confiando que Deus tem um propósito em todas as coisas, mesmo naquilo que nos parece “torto”.
Eclesiastes 7:15-22 (A Complexidade da Justiça, a Sabedoria da Moderação e a Inevitabilidade do Pecado)
O Pregador observa as inconsistências da vida: o justo que perece em sua justiça e o ímpio que prolonga sua vida na sua maldade. Diante disso, ele aconselha a moderação: “Não sejas demasiadamente justo, nem demasiadamente sábio; por que te destruirias a ti mesmo? Não sejas demasiadamente ímpio, nem sejas louco; por que morrerias antes do teu tempo?” Ele reconhece que “quem teme a Deus escapará de tudo isso”. Além disso, afirma que não há homem justo sobre a terra que faça o bem e nunca peque. E para finalizar, ele aconselha a não dar atenção a todas as palavras que as pessoas falam, para não ouvir seu servo o amaldiçoando, pois ele próprio muitas vezes amaldiçoou os outros.
Aplicação e Devocional: Este trecho nos oferece uma visão realista da condição humana e a necessidade de moderação, humildade e discernimento sobre o pecado. Para um crente em Jesus, a advertência sobre a “justiça própria” e a “sabedoria excessiva” é crucial; isso não significa não buscar a justiça, mas evitar a arrogância e o legalismo. Reconhecemos nossa pecaminosidade e a necessidade da graça divina.
No convívio familiar, um filho deve aprender sobre a imperfeição humana, inclusive a sua própria, e sobre a importância de perdoar e não guardar rancor das palavras alheias. Para aqueles que assumem a parentalidade, é vital ensinar os filhos a não serem extremistas em suas convicções, mas a buscar o equilíbrio e a humildade, e a reconhecer que errar é humano.
No contexto profissional, o profissional de fé busca a excelência e a ética, mas sem cair no perfeccionismo paralisante ou no legalismo. Ele reconhece que todos erram e que a humildade para pedir e oferecer perdão é essencial nas relações de trabalho. Na comunidade de fé, esse texto nos lembra que não há “super-crentes” sem falhas; todos somos pecadores e necessitamos da graça. Não devemos julgar os outros severamente por suas palavras ou ações, pois nós mesmos temos nossas falhas. Como membros da sociedade, a moderação e a humildade nos ajudam a construir pontes e a viver em paz, evitando extremismos ideológicos e compreendendo que a complexidade humana exige discernimento e compaixão, e que todos nós, em algum momento, amaldiçoamos ou julgamos, como nos alerta Romanos 3:23: “pois todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus.”
Eclesiastes 7:23-29 (A Busca Incessante pela Sabedoria e a Natureza Perversa do Homem)
O Pregador descreve sua própria busca incansável pela sabedoria, afirmando que se dedicou a ela com todo o coração, mas ela permaneceu distante e profunda demais. Ele encontra que a “mulher má” é mais amarga que a morte, pois seus atrativos são uma armadilha. Embora tenha buscado constantemente, ele não encontrou um homem “perfeitamente justo” entre mil, mas uma mulher justa não encontrou entre todas. Ele conclui que Deus fez o homem reto, mas o homem buscou muitas invenções.
Aplicação e Devocional: Este bloco nos leva a uma profunda reflexão sobre a dificuldade de alcançar a sabedoria plena e a raiz do pecado humano, que reside na busca por “invenções” próprias, afastando-se da retidão original. Para um seguidor de Jesus, a incessante busca pela sabedoria nos leva a Cristo, a verdadeira Sabedoria de Deus (1 Coríntios 1:30), e nos lembra que a perfeição humana é inatingível sem Ele.
No convívio familiar, um filho pode aprender que a perfeição não é o objetivo, mas a busca pela retidão e o reconhecimento de suas próprias falhas. Para aqueles na posição de pais, é vital ensinar a seus filhos sobre a realidade do pecado e a tendência humana de se desviar do caminho de Deus, mas sempre apontando para a esperança e o perdão em Cristo.
No ambiente de trabalho, o profissional deve buscar o conhecimento e a sabedoria, mas com humildade, sabendo que nunca terá todas as respostas. Ele deve ser cauteloso com as “armadilhas” (metafóricas) que podem surgir, como a imoralidade ou a desonestidade. Na comunidade de fé, reconhecemos que “não há justo, nem um sequer” (Romanos 3:10), e que a justiça não é alcançada por nossos próprios esforços, mas pela fé em Jesus. Isso nos liberta do legalismo e da condenação mútua. Como membros da sociedade, compreendemos que a origem de muitos problemas sociais reside na natureza caída do homem, que buscou “muitas invenções” para si, em vez de seguir o plano de Deus. Isso nos motiva a orar e a trabalhar pela transformação, apontando para a verdadeira retidão em Cristo.
✡️✝️ Comentários de Rabinos e Pais Apostólicos
✡️ Talmude
O Talmud Bavli, Ta’anit 7a cita Eclesiastes 7:1 (“Melhor é o bom nome do que o bom ungüento, e o dia da morte do que o dia do nascimento”) para ensinar que o verdadeiro valor de uma vida se revela apenas em seu fim, quando as ações de uma pessoa podem ser plenamente avaliadas. Rabi Shimon ben Elazar afirma: “No nascimento, não se sabe como o homem viverá; mas na morte, vê-se seu nome e seu legado.”Esse versículo é citado também em Talmud Shabbat 152b, no contexto do funeral de grandes sábios. O nome, nesta leitura, representa o caráter espiritual — “shem tov” (bom nome) é o eco da alma no mundo. O “bom perfume” desaparece com o tempo; o nome justo permanece diante de Deus e dos homens.
O Talmud Berachot 60b evoca Eclesiastes 7:3 (“Melhor é a mágoa do que o riso...”) para ensinar que há valor espiritual no sofrimento. Rabi Akiva declara: “Todo sofrimento é para o bem.” A tristeza que conduz à reflexão e à t’shuvá (arrependimento) é mais benéfica do que o riso fútil. Assim, os rabinos veem o versículo como apologia à introspecção e à humildade.
Em Talmud Yoma 71b, Eclesiastes 7:5 (“Melhor é ouvir a repreensão do sábio do que ouvir a canção dos tolos”) é usado como base para elogiar os rabinos que falam verdades difíceis aos seus alunos. A correção sincera é maior demonstração de amor do que o elogio vazio. “A canção dos tolos” é associada à bajulação e ao engano espiritual.
✡️ Mishná
A Mishná Avot 4:13 expressa o espírito de Eclesiastes 7:9 (“Melhor é o fim das coisas do que o princípio delas; melhor é o paciente de espírito do que o altivo de espírito”). Diz-se:
“Não te enfureças facilmente, pois a raiva repousa no coração dos tolos.”
Essa ética da paciência e do domínio próprio se conecta diretamente com a ênfase de Eclesiastes na contenção emocional. Para os sábios da Mishná, o sábio não é o mais rápido, mas o mais paciente; não o que começa com ímpeto, mas o que persevera até o fim.
Em Avot 5:11, a descrição de quatro tipos de temperamento — o que se enfurece depressa e se acalma depressa, etc. — reflete a valorização do espírito calmo como o ideal. O homem iracundo é, na linguagem de Kohelet, “tolo” (כְּסִיל).
✡️ Zohar
O Zohar, Vayera 113a, ao comentar Eclesiastes 7:2 (“Melhor é ir à casa de luto do que à casa do banquete”), revela que o luto tem poder místico porque rebaixa as kelipot (cascas do ego) e abre o coração à luz superior. Segundo o Zohar, o sofrimento que leva o homem a refletir é um canal de tikun (retificação), enquanto o banquete pode encher, mas também obscurecer a alma.
O Zohar II, 219a, examina Eclesiastes 7:13 (“Atenta para a obra de Deus; pois quem poderá endireitar o que ele torceu?”), e explica que a obra divina inclui o juízo e a misericórdia entrelaçados. A torção aqui é lida como os caminhos ocultos da Sefirá Din (justiça) — que só a sabedoria superior pode compreender. O homem que tenta “endireitar” o juízo sem conhecer o plano divino comete violência contra a ordem sagrada.
Em Zohar, Terumah 161a, Eclesiastes 7:14 (“No dia da prosperidade, goza do bem, e no dia da adversidade, considera...”) é interpretado como ciclo das sefirot. Chesed (bondade) e Gevurah (rigor) alternam-se na vida do homem, e o segredo está em reconhecer a mão de Deus em ambos. A verdadeira sabedoria, diz o Zohar, é “ver o Eterno tanto na ascensão quanto na descida”.
Eclesiastes 7 é talvez o mais sapiencial de todos os capítulos do livro, combinando provérbios de sabedoria prática com teologia profunda sobre o destino, o sofrimento, a justiça e a humildade. O Talmud valoriza o sofrimento, a repreensão e o fim como momentos espiritualmente superiores ao prazer, à lisonja e ao começo impulsivo. A Mishná oferece respostas éticas claras: o autocontrole, a paciência, o arrependimento e o bom nome são superiores a qualquer prazer ou reputação passageira. O Zohar vê tudo isso como expressão das dinâmicas ocultas da luz divina — o sofrimento como meio de elevação, a tristeza como lapidação da alma, e o tempo como espelho da Providência.
A espiritualidade de Eclesiastes 7, segundo os sábios, não está na resignação, mas no reconhecimento: aceitar o tempo e o juízo divino como elementos de um propósito mais alto, invisível aos olhos, mas acessível ao coração sábio.
Comentário de Eclesiastes 7:1
✝️ Gregório, o Milagroso (270 d.C.)
“Pois, embora um homem não deva ser de forma alguma muito vantajoso por saber tudo nesta vida que está destinado a lhe acontecer de acordo com sua mente (suponhamos tal caso), no entanto, com a atividade oficiosa dos homens, ele cria meios para bisbilhotar e obter um conhecimento aparente das coisas que devem acontecer após a morte de uma pessoa. Além disso, um bom nome é mais agradável à mente (Provérbios 22:1) do que óleo para o corpo; e o fim da vida é melhor do que o nascimento, e chorar é mais desejável do que festejar, e estar com os tristes é melhor do que estar com os bêbados. Pois este é o fato, que aquele que chega ao fim da vida não tem mais cuidado com a luz ao seu redor. E a ira discreta é preferível ao riso; pois pela disposição severa do semblante a alma é mantida ereta. As almas dos sábios, de fato, são tristes e abatidas, mas as dos tolos são exultantes e entregues à alegria. E, no entanto, é muito mais desejável receber a censura de um sábio do que tornar-se ouvinte de um coro inteiro de homens indignos e miseráveis em suas canções.
Pois o riso dos tolos é como o crepitar de muitos espinhos queimando em um fogo feroz. Isso também é miséria, sim, o maior dos males, a saber, a opressão; pois intriga contra as almas dos sábios e tenta arruinar o nobre modo de vida que os bons seguem. Além disso, é correto elogiar não o homem que começa, mas o homem que termina um discurso; e o que é moderado deve aprovar-se à mente, e não o que é inchado e inflado. Além disso, deve-se certamente manter a ira sob controle e não se deixar levar precipitadamente pela ira, cujos escravos são os tolos. Além disso, enganam-se aqueles que afirmam que um modo de vida melhor foi dado aos nossos antepassados, e não conseguem ver que a sabedoria é muito diferente da mera abundância de bens, e que é muito mais brilhante do que estes, como a prata brilha mais intensamente do que sua sombra. Pois a vida do homem tem sua excelência não na aquisição de riquezas perecíveis, mas na sabedoria. E quem poderá, dize-me, declarar a providência de Deus, que é tão grande e tão benéfica?
Ou quem poderá recordar as coisas que parecem ter sido deixadas de lado por Deus? E nos dias anteriores da minha vaidade, considerei todas as coisas, e vi um homem justo perecendo em sua justiça, e não cessando dela até a morte, mas até sofrendo injúria por causa dela, e um homem ímpio perecendo com sua impiedade. Além disso, é apropriado que o homem justo não pareça ser tão demasiadamente, nem excessivamente sábio, a ponto de não parecer que, ao cometer algum deslize, peca muitas vezes. E não sejas audacioso e precipitado, para que uma morte prematura não te surpreenda. O maior de todos os bens é apegar-te a Deus e, permanecendo nEle, não pecar em nada. Pois tocar coisas imaculadas com mão impura é abominação. Mas aquele que se submete no temor de Deus escapa de tudo o que é contrário. A sabedoria vale mais em termos de auxílio do que um grupo dos homens mais poderosos de uma cidade, e muitas vezes também perdoa com justiça aqueles que faltam ao dever. Pois não há ninguém que não tropece. Também não te convém de modo algum atender às palavras dos ímpios, para que não te tornes testemunha ocular de palavras ditas contra ti, como a conversa tola de um servo mau, e sendo assim aguilhoado no coração, recorras depois a praguejar sucessivamente em muitas ações. E todas essas coisas eu conheci, tendo recebido sabedoria de Deus, a qual depois perdi e não pude mais ser o mesmo.
Pois a sabedoria fugiu de mim para uma distância infinita e para um abismo imensurável, de modo que não pude mais alcançá-la. Por isso, depois disso, abstive-me completamente de buscá-la; e não pensei mais em considerar as loucuras e os vãos conselhos dos ímpios, e sua vida cansativa e distraída. E estando assim disposto, fui levado às próprias coisas; e tomado por uma paixão fatal, reconheci a mulher — que ela é como uma armadilha ou algo semelhante. Pois seu coração enreda aqueles que passam por ela; e se ela apenas se une, segura o homem tão firmemente como se o arrastasse preso a correntes. E dela você só pode obter sua libertação encontrando um superintendente propício e vigilante em Deus; pois aquele que é escravizado pelo pecado não pode (de outra forma) escapar de suas garras. Além disso, entre todas as mulheres, busquei a castidade que lhes é própria, e em nenhuma a encontrei. E, em verdade, uma pessoa pode encontrar um homem casto entre mil, mas uma mulher nunca. E acima de todas as coisas observei que os homens, sendo feitos por Deus simples de mente, contraem para si mesmos múltiplos raciocínios e questionamentos infinitos, e enquanto professam buscar sabedoria, desperdiçam suas vidas em palavras vãs.”
Comentário de Eclesiastes 7:2
✝️ Ambrósio de Milão (397 d.C.)
“Se alguém quiser ascender, que não busque as alegrias do mundo, nem as coisas agradáveis, nem os deleites, mas tudo o que esteja cheio de dor e pranto; pois é melhor entrar numa casa de tristeza do que numa casa de alegria. De fato, Adão não teria descido do paraíso se não tivesse sido seduzido pelo prazer.”
✝️ Dídimo, o Cego (398 d.C.)
“Onde há luto, não há superficialidade moral. A felicidade e o riso são evitados; a calamidade os proíbe. Às vezes, evitamos parecer felizes por consideração aos que choram e aos que sofrem. Na casa do banquete, porém, acontece o oposto: danças e cânticos trazem reprovação, pois indicam uma vida desordenada. […] A “casa”, porém, significa uma condição ou uma atitude, não um local. […] Aquele que vai à casa do luto sabe que todos morrem no final. Uma vez que saiba que tem que morrer, não pensará nem dedicará seus esforços à posse de algo, se for uma posse que se perde na morte, como riqueza, reputação e honra. […] Pode-se entender “os vivos” da seguinte maneira: aquele que vive de acordo com a vontade de Deus. Essas pessoas eram Abraão e seus descendentes.”
✝️ João Crisóstomo (407 d.C.)
““É melhor”, lemos, “entrar na casa do luto do que na casa do riso”. Mas, provavelmente, você não gosta do ditado e quer evitá-lo. Vejamos, no entanto, que tipo de homem Adão era no paraíso e o que ele foi depois; que tipo de homem Caim era antes e o que ele foi depois.”
Comentário de Eclesiastes 7:3
✝️ João Crisóstomo (407 d.C.)
“É melhor ir aonde há choro, lamentação, gemidos, angústia e tanta tristeza do que onde há dança, címbalos, risos, luxo, fartura de comida e bebida? Sim, é verdade, responde [Salomão]. E diga-me por que é assim e por qual razão? Porque, no primeiro lugar, a insolência é criada; no segundo, a sobriedade. E quando uma pessoa vai ao banquete de alguém mais opulento, não mais contemplará sua própria casa com o mesmo prazer, mas retornará para sua esposa descontente. Descontente, ele participa de sua própria mesa e fica irritado com seus próprios servos, seus próprios filhos e todos em sua casa, percebendo sua própria pobreza ainda mais fortemente pela riqueza dos outros. E este não é o único mal. Mas ele também frequentemente inveja aquele que o convidou para o banquete e volta para casa sem ter recebido nenhum benefício.
Mas, quanto à casa de luto, nada disso pode ser dito. Pelo contrário, muita sabedoria espiritual pode ser adquirida ali, assim como sobriedade. Pois, quando alguém cruza a soleira de uma casa que contém um cadáver e vê o falecido deitado sem palavras, e a esposa arrancando os cabelos, desfigurando as faces e ferindo os braços, ele se abate; seu semblante fica triste. E cada um dos que se sentam juntos pode dizer ao seu vizinho apenas isto: “Não somos nada, e nossa maldade é inexprimível!”
O que pode ser mais cheio de sabedoria do que estas palavras, quando reconhecemos a insignificância de nossa natureza e acusamos nossa própria maldade e consideramos as coisas presentes como nada? Expressando, porém, com outras palavras, o próprio sentimento de Salomão — aquele sentimento tão maravilhoso e repleto de sabedoria divina — “Vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. Aquele que entra na casa de luto de fato chora pelo falecido, mesmo sendo um inimigo. Não vês como aquela casa é muito melhor que a outra? Pois lá, embora seja amigo, ele inveja; mas aqui, embora seja inimigo, ele chora.”
Comentário de Eclesiastes 7:5
✝️ Dídimo, o Cego (398 d.C.)
“Para a maioria das pessoas, parece correto evitar a crítica de um sábio, especialmente se gostam de pecar. Quem deseja diversão e pecado evita quem quer impedi-los. Quem não tem discernimento se agrada dos bajuladores, preferindo a bajulação à crítica. É característico do sábio criticar aquele a quem ama... Os bajuladores cantam de uma certa maneira. Mesmo quando fazem discursos éticos, querem agradar ao público em vez de zelar pelos seus melhores interesses. Tal canto é um discurso que traz alegria, mas uma repreensão ajuda a encontrar o caminho certo.”
Comentário de Eclesiastes 7:9
✝️ regório, o Dialogista (604 d.C.)
“Quando alguém não tolera ser desconsiderado neste mundo, tenta exibir os pontos positivos que possui. E assim a impaciência o leva à arrogância e, sendo incapaz de tolerar o desprezo, vangloria-se ostensivamente, promovendo-se. Por isso está escrito: “Melhor é o paciente do que o presunçoso”. De fato, o paciente prefere sofrer qualquer mal a que suas qualidades ocultas se tornem conhecidas através do mal da ostentação. Ao contrário, o arrogante prefere que lhe seja atribuído o bem, mesmo falsamente, a sofrer o menor mal.”
Comentário de Eclesiastes 7:13
✝️ Dídimo, o Cego (398 d.C.)
“Mesmo entre os gregos, havia muitos oponentes àqueles que afirmavam que o cosmos surgiu por si só. ...Como a providência, por necessidade, se preocupa com os detalhes e Deus é providência, sua providência diz respeito ao cosmos que ele mesmo criou. Agora, admita ainda mais uma coisa: Deus zela pelo cosmos que ele mesmo criou por providência, para que tudo corra bem. ...Deus conhece as razões de tudo o que surgiu e sabe por que elas estão ocultas. … De modo algum você tem conhecimento suficiente das criações de Deus, se se ofende com elas, porque não é razoável. Observe as criaturas de Deus! O que para os outros é motivo de ofensa será para você conhecimento do Criador e da criação.”
Comentário de Eclesiastes 7:15
✝️ Dídimo, o Cego (398 d.C.)
“Existe uma justiça absoluta e uma justiça que é justa apenas para um... Um justo pode se perder naquilo que é justo apenas para ele. Aqueles, porém, que são realmente justos... não permanecem naquilo que é justo apenas para eles e não confiam nisso como seu próprio direito. É por isso que ele não perece na justiça absoluta, como diz o salmista: “Na tua justiça viverei”. Paulo, por exemplo, que foi um grande homem que viveu em Cristo e para quem a verdade foi revelada, disse: “Não tenho conhecimento de nada contra mim mesmo, mas nem por isso estou absolvido”.”
Comentário de Eclesiastes 7:16
✝️ Gregório de Nissa (394 d.C.)
“Ninguém pode dizer que se desviou da ignorância para alguma fantasia tola de separar, localmente, o supremo daquilo que está abaixo, e atribuir ao Pai como se fosse o pico de alguma colina, enquanto ele senta o Filho mais abaixo nas cavidades. Ninguém é tão infantil a ponto de conceber diferenças no espaço, quando o intelectual e o espiritual estão em discussão. A posição local é uma propriedade do material, mas o intelectual e o imaterial são confessadamente removidos da ideia de localidade. Qual é, então, a razão pela qual ele diz que somente o Pai tem o ser supremo? Pois dificilmente se pode pensar que é por ignorância que ele se desvia para essas concepções, sendo alguém que, nas muitas demonstrações que faz, afirma ser sábio, até mesmo “se fazendo de sábio”, como a Sagrada Escritura nos proíbe de fazer.”
Comentário de Eclesiastes 7:17
✝️ Ambrósio de Milão (397 d.C.)
“É vitorioso aquele que espera pela graça de Deus, não aquele que presume de sua própria força. Pois, por que não confiais na graça, visto que tendes um Juiz misericordioso na contenda? “Porque o Senhor é misericordioso e justo, e o nosso Deus é misericordioso.” A misericórdia é mencionada duas vezes, mas a justiça uma. A justiça está no meio, cercada por um duplo muro de misericórdia. Os pecados superabundam. Portanto, que a misericórdia superabunde. Com o Senhor há abundância de todos os poderes, pois ele é o Senhor dos Exércitos. Contudo, não há justiça sem misericórdia, nem sem o exercício da misericórdia há justiça, pois está escrito: “Não sejais excessivamente injustos.” O que é acima da medida, não podeis suportar, mesmo que seja bom. Conservai a medida, para que possais receber conforme a medida.”
✝️ Atanásio, o Apostólico (373 d.C.)
“E como Deus promete àqueles que o servem verdadeiramente: “Eu cumprirei o número dos teus dias”, Abraão morre “cheio de dias”, e Davi clamou a Deus, dizendo: “Não me leves embora no meio dos meus dias”. E Elifaz, um dos amigos de Jó, estando certo desta verdade, disse: “Você irá para a sua sepultura... como um feixe de trigo chega na sua estação”. E Salomão, confirmando suas palavras, diz: “As almas dos injustos são tiradas prematuramente”. E, portanto, ele exorta no livro de Eclesiastes, dizendo: “Não sejas demasiadamente ímpios, nem sejas duros; por que morrerias antes do teu tempo?””
Comentário de Eclesiastes 7:19
✝️ Cesário de Arles (542 d.C.)
“Talvez uma pessoa não possua pão para dar como esmola aos necessitados, mas ainda maior é o que uma pessoa que tem língua é capaz de dar. É mais importante revigorar uma mente que viverá para sempre com o alimento da palavra do que saciar com alimento terreno o estômago de um corpo que vai morrer. Portanto, irmãos, não tirem do próximo a esmola da palavra. Paulo diz: “Se nós semeamos para vocês coisas espirituais, será muito que colhamos de vocês coisas carnais?” “Façam o bem ao justo, e vocês encontrarão grande recompensa; e se não for dele, certamente de Deus.” “É bom que vocês apoiem o justo e não retirem dele a mão, pois aquele que teme a Deus não negligencia nada.””
✝️ Dídimo, o Cego (398 d.C.)
“Procure o poder de um general em sua sabedoria, e não no tamanho de suas tropas. Se uma cidade tem muitos homens poderosos, mas carece de sabedoria, estes não podem ajudá-la. Em uma exegese espiritual, o mundo é chamado de cidade, isto é, o reino terreno ao nosso redor. Ninguém pode viver sem danos se não receber sabedoria divina. Se a sabedoria não ajudar, os poderosos não podem fazer nada, sejam anjos ou homens santos. Se a sabedoria não ajudar, a cidade não será salva. Também se pode ver a alma de cada ser humano como uma cidade. Mesmo que alguém tivesse mil pensamentos terrenos que pudessem ajudar uma cidade, ela não poderia ser ajudada se a sabedoria de Deus não fosse enviada para ajudar, criar e manter a ordem.”
Comentário de Eclesiastes 7:20
✝️ Agostinho de Hipona (430 d.C.)
“O seguinte é um dos muitos argumentos que Pelágio usa ao tratar deste assunto: “Mais uma vez repito: eu digo que é possível para uma pessoa estar sem pecado. E o que você diz? Que é impossível para uma pessoa estar sem pecado? Mas eu não digo”, ele acrescenta, “que haja uma pessoa sem pecado, nem você diz que não há uma pessoa sem pecado. Estamos discutindo sobre o que é possível e impossível, não sobre o que é e o que não é.” Em seguida, ele observa que várias passagens das Escrituras que são geralmente invocadas contra eles não se relacionam com a questão em disputa, a saber, se uma pessoa pode ou não estar sem pecado: “Pois não há ninguém que esteja livre de poluição”, e “Não há ninguém que não peque”, e “Não há homem justo sobre a terra”, e “Não há ninguém que faça o bem”. “Estes e outros textos semelhantes”, diz ele, “aplicam-se à inexistência, não à impossibilidade. Por meio de exemplos desse tipo, demonstra-se como algumas pessoas eram em determinado momento, não que não poderiam ter sido outra coisa. Por essa razão, são justamente consideradas culpadas. Pois, se eram como eram porque não poderiam ter sido de outra forma, então estão isentas de culpa.””
Comentário de Eclesiastes 7:23
✝️ Gregório, o Teólogo (390 d.C.)
“Ora, o tema de Deus é mais difícil de abordar, na medida em que é mais perfeito do que qualquer outro e está aberto a mais objeções, e as soluções para elas são mais trabalhosas. Pois toda objeção, por menor que seja, interrompe e dificulta o curso de nossa argumentação e interrompe seu avanço, assim como pessoas que repentinamente freiam com as rédeas os cavalos a todo galope e os fazem girar devido ao choque inesperado. Assim Salomão, que foi o mais sábio de todos, seja antes dele ou em sua época, a quem Deus concedeu amplitude de coração e uma torrente de contemplação, mais abundante que a areia, mesmo ele, quanto mais se aprofundava, mais tonto ficava. E declarou que o ponto mais distante da sabedoria era a descoberta de quão distante a sabedoria estava dele.”
Comentário de Eclesiastes 7:24
✝️ tanásio, o Apostólico (373 d.C.)
“Considera, pois, como está escrito no livro de Eclesiastes: “Eu disse: Serei sábio, mas isso estava longe de mim. O que está longe e é extremamente profundo, quem o descobrirá?” [Considera] o que está dito nos Salmos: “O teu conhecimento é maravilhoso demais para mim; é elevado, não o posso atingir.” E Salomão diz: “A glória de Deus é ocultar alguma coisa.” [Portanto] frequentemente planejei parar e cessar de escrever; acredita-me, eu o fiz. Mas, para não ser encontrado a decepcionar-te, ou com o meu silêncio a induzir à impiedade aqueles que te consultaram e são dados a disputas, obriguei-me a escrever brevemente o que agora envio à tua piedade.”
✝️ Basílio, o Grande (379 d.C.)
“Mesmo que todas as mentes, de fato, combinassem suas pesquisas e todas as línguas concordassem em sua expressão, jamais, como eu disse, alguém poderia alcançar um resultado digno neste assunto. Salomão, o mais sábio de todos, nos apresenta este pensamento claramente quando diz: “Eu disse: Serei sábio; e ele se afastou de mim”; não que ele realmente tenha fugido, mas porque a sabedoria parece inatingível, particularmente para aqueles a quem o conhecimento foi concedido em grau excepcionalmente alto pela graça de Deus.”
Comentário de Eclesiastes 7:26
✝️ Ambrósio de Milão (397 d.C.)
“Meu coração percorreu o caminho para conhecer a alegria do ímpio, para examiná-la com cuidado, para buscar sabedoria e um modo de calcular, para conhecer a alegria por meio do ímpio, da angústia e da inquietação, e descobri que ela é mais amarga que a morte” — não porque a morte seja amarga, mas porque é amarga para o ímpio. E, no entanto, a vida é mais amarga que a morte. Pois é um fardo maior viver para o pecado do que morrer em pecado, porque o ímpio aumenta seu pecado enquanto vive, mas se morre, cessa de pecar.”
✝️ Atanásio, o Apostólico (373 d.C.)
“Embora uma apreensão perfeita da verdade esteja atualmente muito distante de nós em razão da enfermidade da carne, ainda assim é possível, como disse o próprio Pregador, perceber a loucura dos ímpios e, tendo-a encontrado, dizer que ela é “mais amarga que a morte”. Portanto, por esta razão, como percebendo isso e capaz de descobri-lo, escrevi, sabendo que para os fiéis a detecção da impiedade é uma informação suficiente em que consiste a piedade. Pois, embora seja impossível compreender o que Deus é, ainda assim é possível dizer o que ele não é.”
✝️ Dídimo, o Cego (398 d.C.)
“Em muitas passagens de instrução divina, os pensamentos e as mentalidades são chamados de “mulheres” daqueles que os possuem, tanto em sentido positivo quanto negativo. Assim, diz-se, por exemplo: “Sofia dá à luz a perspicácia de um homem” e “Tua esposa é como uma videira boa, teus filhos como rebentos de oliveira”. Dessa mulher emergem rebentos masculinos, alimento para o fogo e a luz, visto que a bênção dessas plantas nutre o fogo e a luz. No sentido negativo, novamente, diz-se: “Não dê atenção a uma mulher má; mel escorre dos lábios de toda prostituta que torna sua garganta doce apenas por um breve período. Mais tarde, você o achará mais amargo que a bílis”. ...Se você quiser entendê-lo em um sentido alegórico, o pensamento mau e frívolo é uma tentação. É sofístico e herético; é como uma mulher má.”
Comentário de Eclesiastes 7:29
✝️ Atanásio, o Apostólico (373 d.C.)
“Pois [a alma] é feita para ver Deus e para ser iluminada por Ele; mas, por sua própria iniciativa, em lugar de Deus, buscou coisas corruptíveis e trevas, como o Espírito diz em algum lugar escrito: “Deus fez o homem reto, mas ele buscou muitas invenções”. Assim foi então que os homens, desde o princípio, descobriram, arquitetaram e imaginaram o mal para si mesmos. Mas agora é hora de dizer como chegaram à loucura da idolatria, para que saibais que a invenção de ídolos não se deve inteiramente ao bem, mas ao mal. Mas o que tem sua origem no mal nunca pode ser considerado bom em nenhum ponto — sendo completamente mau.”
✝️ Agostinho de Hipona (430 d.C.)
“A razão pela qual nós, sendo maus, temos um Pai bom é para que não permaneçamos maus para sempre. Nenhuma pessoa má pode fazer uma boa. Se nenhuma pessoa má pode fazer uma boa, como pode um homem mau tornar-se bom? O único que pode fazer uma boa pessoa de uma má é aquele que é sempre bom. “Cura-me, Senhor”, diz ele, “e serei curado; salva-me, e serei salvo”. Por que me dizem, pessoas tolas que dizem coisas tolas: “Você pode se salvar se quiser”? “Cura-me, Senhor, e serei curado”. Fomos criados bons pelo Deus bom, visto que “Deus fez o homem reto”. Mas, por nossa própria decisão, nos tornamos maus. Fomos capazes de mudar do bem para o mal, e seremos capazes de mudar do mal para o bem. Mas é aquele que é sempre bom que pode mudar o mal para o bem, porque o homem, por sua própria vontade, não pode curar a si mesmo. Você não procura um médico para feri-lo; mas quando você se fere, procura alguém para curá-lo.”
Obs: Os comentários foram tirados diretamente da maior referência de comentários bíblicos dos Pais Apostólicos, o site Catena Bible.
📚 Comentários Clássicos Teológicos
📖 Matthew Henry (1662–1714)Matthew Henry vê Eclesiastes 7 como um capítulo de sabedoria paradoxal, no qual o Espírito de Deus nos ensina que nem sempre o que parece bom aos olhos humanos é o melhor para a alma. Ele interpreta o versículo 1 — “Melhor é o nome do que o unguento precioso” — como uma lição sobre o valor da reputação e do caráter. O “bom nome” é, para ele, o reflexo da integridade perante Deus e os homens, muito mais duradouro do que qualquer perfume ou riqueza. A segunda metade do versículo — “e o dia da morte, melhor que o dia do nascimento” — é compreendida como uma afirmação de que a morte do justo sela uma vida de fidelidade e o conduz ao descanso eterno, enquanto o nascimento inaugura uma jornada de provações.
Nos vv.2–4, Henry enfatiza que o sofrimento tem valor pedagógico. Estar na casa do luto (v.2) leva à reflexão sobre a brevidade da vida, enquanto a casa da festa tende à frivolidade. Para ele, Deus usa a tristeza para moldar o coração (v.3), pois “pela tristeza do rosto se melhora o coração”. O contraste entre o coração dos sábios e dos tolos (v.4) indica, segundo ele, que o verdadeiro piedoso se dedica às coisas eternas, enquanto o insensato vive de modo superficial.
Do v.5 em diante, Henry oferece comentários sobre o valor da repreensão (v.5), a vaidade do riso (v.6), e a corrupção causada por presentes (v.7). Ele vê aqui uma crítica à superficialidade moral: o tolo prefere elogios vazios à repreensão sincera, e o riso é como estalo de espinhos — momentâneo e sem sustância.
Nos vv.8–10, Henry observa que o fim das coisas é melhor do que o princípio porque revela a consumação do propósito de Deus. A paciência é exaltada sobre o orgulho, e a nostalgia do passado (v.10) é criticada como sinal de ingratidão ou cegueira espiritual — “não é sábio perguntar por que os dias antigos foram melhores”.
Dos vv.13–14, Henry destaca a soberania de Deus: “Atenta para a obra de Deus, pois quem poderá endireitar o que ele fez torto?” Ele entende que devemos aceitar tanto os dias bons como os maus com espírito de reverência e submissão, pois tudo vem da mão divina.
Nos vv.15–18, ele adverte contra extremos religiosos — tanto a justiça própria quanto a libertinagem. “Não sejas demasiadamente justo” (v.16) é para ele um aviso contra a hipocrisia legalista, enquanto “não sejas demasiadamente ímpio” (v.17) condena a indulgência pecaminosa. O v.18 — “bom é que retenhas isto, e também daquilo não retires a mão” — indica equilíbrio: temer a Deus é o caminho seguro entre os excessos.
Fonte: Matthew Henry Commentary on Ecclesiastes 7
📖 John Gill (1697–1771)
John Gill analisa Eclesiastes 7 como um conjunto de máximas sapiencais que contrastam aparência e essência. O v.1 — “melhor é o nome do que o unguento precioso” — é, para ele, uma alusão ao caráter do crente regenerado, cujo bom nome diante de Deus é mais desejável do que riquezas. Ele entende o “dia da morte” como o dia em que o justo entra no repouso eterno, livre das aflições.
No v.2, Gill observa que o luto ensina mais do que a festa: ao visitar a casa do pranto, o homem é confrontado com a realidade da morte e levado à sabedoria. O v.3 é interpretado como uma defesa do sofrimento santificado: a tristeza pode ser medicinal para o espírito. Já o v.4 traça o contraste moral entre o “coração do sábio” que contempla o fim da vida e o “coração do tolo” que se entrega à diversão fútil.
No v.5, Gill nota que a repreensão de um sábio é sinal de amor e preocupação verdadeira, em contraste com o louvor tolo, que adula e não edifica. O v.6 compara o riso do insensato ao estalo de espinhos sob a panela — ruidoso, mas sem calor duradouro. Ele comenta que esse tipo de riso é superficial e inútil.
O v.7 é interpretado como uma crítica à corrupção moral: até o sábio pode se desviar por causa do suborno. Gill vê nos vv.8–9 um elogio à paciência e ao autocontrole, essenciais para a vida espiritual. Ele adverte contra o espírito de orgulho e impaciência diante da provação.
No v.10, Gill considera a nostalgia do passado como perigosa. Ele lembra que cada geração tem seus próprios males, e a comparação injusta leva à ingratidão. Do v.13 em diante, ele destaca a soberania de Deus na expressão “quem poderá endireitar o que Ele torceu?” — mostrando que o homem deve se submeter ao plano divino.
Nos vv.16–18, Gill interpreta o “ser demasiadamente justo” como um alerta contra a justiça própria e o orgulho religioso. Já “não sejas demasiadamente ímpio” é uma proibição contra o relaxamento ético. O equilíbrio, para ele, se encontra no temor de Deus, que guarda tanto do orgulho legalista quanto da libertinagem.
Fonte: John Gill's Exposition on Ecclesiastes 7
📖 Albert Barnes (1798–1870)
Albert Barnes vê Eclesiastes 7 como um compêndio de provérbios com ênfase no paradoxo: o que parece pior é muitas vezes melhor. No v.1, ele interpreta que “um bom nome” representa a reputação diante de Deus e dos homens — um bem mais precioso que qualquer tesouro. O “dia da morte” é melhor que o nascimento quando se trata de alguém que viveu com retidão, pois é quando se recebe a recompensa.
Nos vv.2–4, Barnes afirma que a casa do luto conduz à sabedoria, pois confronta o homem com a mortalidade. Ele destaca que a tristeza serve a um fim moral superior à alegria superficial. “O coração dos sábios está na casa do luto” porque busca entender a vida à luz do fim.
O v.5 exalta a repreensão do sábio como mais útil que os cânticos vazios dos tolos. Barnes entende que a crítica construtiva é instrumento de sabedoria. No v.6, ele interpreta que o riso dos tolos é fugaz e ilusório, como espinhos que queimam rápido, fazendo muito barulho e pouco calor.
No v.7, Barnes trata do “presente” (suborno) como força corruptora, capaz de perverter até os sábios. Os vv.8–9 reforçam a importância da paciência, da reflexão e da renúncia à ira precipitada.
No v.10, ele vê o desejo de reviver os “bons tempos” como expressão de ingratidão. A vida é composta de tempos bons e ruins, todos providencialmente dispostos. O v.13 reforça essa ideia: Deus fez tanto os caminhos retos quanto os tortos — e o homem não pode endireitar o que Ele quis deixar curvo.
Nos vv.14–18, Barnes chama atenção para a moderação. “Não sejas demasiadamente justo” — é, para ele, um aviso contra o perfeccionismo farisaico. Por outro lado, a impiedade consciente é um risco fatal. O v.18 ensina o equilíbrio entre temor a Deus e moderação de atitudes.
Fonte: Albert Barnes’ Notes on Ecclesiastes 7
📖 Keil (1807–1888) & Delitzsch (1813–1890)
Keil & Delitzsch tratam Eclesiastes 7 como um exemplo claro da poesia sapiencial hebraica, cheia de contrastes e reflexões éticas profundas. No v.1, eles comentam que טוֹב שֵׁם (ṭôv šēm, “bom nome”) se refere à reputação adquirida pela vida íntegra. O “dia da morte” é melhor porque representa o fim de um caminho provado e aprovado por Deus. Eles destacam que essa é uma perspectiva escatológica: a morte é a coroação da vida piedosa.
No v.2, a expressão לֵב הַחֲכָמִים (lēv haḥăkāmîm, “coração dos sábios”) é lida como consciência constante da finitude. A casa do luto, então, é uma escola de sabedoria. O v.3 — “pela tristeza do rosto se melhora o coração” — é analisado como um aforismo sobre o poder transformador da dor.
O v.4 contrasta o coração do tolo e do sábio: o primeiro busca fugir da dor, o segundo encara a realidade. Nos vv.5–6, o “riso do tolo” é comparado a קוֹל הַסִּירִים תַּחַת הַסִּיר (qôl hassîrîm taḥat hassîr, “crepitar de espinhos debaixo da panela”), imagem que evoca futilidade e superficialidade.
O v.7 menciona que “o suborno corrompe o coração” — e eles observam que o termo שֹׁחַד (šōḥad) é usado no AT em contextos jurídicos. Até o sábio pode se perder quando exposto à corrupção.
Nos vv.8–10, os comentaristas notam que o hebraico enfatiza o contraste entre orgulho e paciência (v.8), e que a nostalgia dos “dias antigos” (v.10) é sinal de falta de sabedoria — cada época tem seu propósito designado por Deus.
Do v.13 em diante, eles consideram a frase “quem poderá endireitar o que Deus torceu?” como uma expressão da limitação humana frente à soberania divina. O v.14 sugere que os dias bons e maus devem ser aceitos com humildade, pois ambos têm sua razão.
Nos vv.16–18, a construção paralela aponta para o equilíbrio. O termo תִּתְחַכָּם (titḥakkām, “te faças sábio demais”) implica exagero presunçoso. O texto ensina que o temor de Deus modera tanto o legalismo quanto a dissolução.
Fonte: Keil & Delitzsch Commentary on Ecclesiastes 7
📖 Comentário Reformado de Lutero
1. Melhor é o bom nome do que o unguento precioso; e o dia da morte, do que o dia do nascimento. 2. Melhor é ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há ofensa; porque este é o fim de todos os homens, e os vivos o levarão a sério.Esta passagem parece difícil devido à nossa ignorância da língua hebraica, que possui suas próprias figuras de linguagem que não podem ser compreendidas exceto pelo uso da língua; esta passagem não parece estar relacionada por nenhuma conexão lógica com a anterior. Para mim, este parece ser o ponto central desta passagem: Salomão quer confortar os impacientes em seus esforços infrutíferos, assim como antes, após recitar um catálogo de vaidades humanas, injetar conforto e exortação ao temor a Deus, incitando nossos corações a se elevarem em direção a Deus, encorajando-nos a ouvir a Palavra de Deus, a não sermos precipitados ao falar, etc. Portanto, aqui novamente ele insere uma exortação após ter concluído um catálogo; mais tarde, ele retornará ao catálogo.
Portanto, que esta seja uma passagem de exortação ou conforto inserida no meio do catálogo de esforços e desejos vãos dirigidos àqueles que são impacientes. Pois nesta vida o coração humano não experimenta nada além de ofensas e impaciência. Isto é especialmente verdadeiro para aqueles que são os melhores dos homens, porque, como ele disse acima (1:18): “Aquele que aumenta o conhecimento aumenta a tristeza”. Aquele que vê e ouve muito tem uma grande oportunidade para tristeza e indignação, porque [1] ele vê e experimenta as coisas que trazem dano ao coração. Veja Timon, que foi transformado em um animal selvagem e se tornou um misantropo, um inimigo da raça humana, quando, depois de realizar muitos grandes feitos de ajuda aos seus concidadãos, ele não recebeu nada em troca além de inveja e perseguição. [2] Mesmo agora esta poderia ser a reação de qualquer um se tudo o que ele obtivesse de seus trabalhos fosse extrema ingratidão.
O espírito de um homem está quebrado, de modo que ele não quer fazer mais nada. Salomão não está falando de homens tolos, que não se importam nem um pouco com a sabedoria e os assuntos humanos, mas dos melhores homens, aqueles que querem ajudar nos assuntos humanos, homens como aqueles que ocupam cargos públicos e na administração de lares. Pois aqueles que administram negócios públicos ou privados acabam experimentando a fraude e a perfídia dos homens. Esse fato tem afastado muitos homens de cargos públicos. Assim, aquele velho em Terêncio pensa que é afortunado por nunca ter se casado.[3] Em contraste, outro diz: “Casei-me — e então que miséria tive que contemplar! Nasceram crianças — ainda mais problemas!” O espírito humano se ofende com todas essas coisas, a menos que tenha sido prevenido pela Palavra de Deus. Portanto, aqueles que viram essas coisas exortam os outros da seguinte forma: “O homem que viveu obscuramente viveu bem.” [4]
Mas os cristãos devem ser exortados a viver no meio da multidão, a casar-se, a governar sua casa, etc. Além disso, quando seus esforços são impedidos pela malícia dos homens, eles devem suportar isso pacientemente e não cessar suas boas obras. Não abandone o campo de batalha, mas persista. Não se deixe abater por problemas ou impaciência, e não se deixe dominar pela raiva. Portanto, esta é uma exortação muito boa e alegre, mas que ninguém, a não ser um cristão, ouvirá.
Ele começa esta declaração de conforto com um provérbio, dizendo: Um bom nome é melhor, etc. Este é o seu estilo, pois Salomão é cheio de provérbios. Eis o que ele quer dizer: “Enumerei tantos males da vaidade humana que alguém poderia se desesperar e escolher a morte em vez de ver e suportar tantas calamidades e vaidades, ou poderia até mesmo desistir de todo esforço e trabalho e não fazer nada. Não seja assim! Não desista, mas persevere! Não seja como o homem que não terá nome nem fama. Lembre-se de que você terá essa boa fama se permanecer no trabalho que lhe foi designado, seja na vida pública ou em casa. Veja a vida preguiçosa daqueles que vivem para si mesmos. Portanto, não se deixe abater pelos infortúnios, mas resista a esses males.
Pois é melhor provar que você é um homem e se tornar um grande homem, um exemplo para os outros e uma vantagem para si mesmo, do que ser um homem roncador e preguiçoso, inútil para ninguém. Pois um bom nome não é conferido àqueles que roncam e são preguiçosos, que desprezam a coragem, mas àqueles que são vigorosos e enérgicos, que não se intimidam e seguem em frente. Ter Dizia-se dele que havia fugido do mundo. São Jerônimo fugiu de Roma e das multidões e veio para Belém. [ 5] Lá, ele pretendia permanecer escondido como um recluso, e ainda assim também queria fazer um nome para si mesmo; mas não tinha uma resolução suficientemente firme, pois era muito impaciente e tudo menos um espírito másculo. Portanto, Salomão diz: Um bom nome é melhor do que um unguento precioso. Nesta passagem, “nome” significa novamente reputação. Este provérbio deve ser entendido com base nos costumes judaicos. Somente neste reino o bálsamo, o melhor dos unguentos, cresce.6 Entre essas pessoas, o unguento era considerado uma das coisas mais preciosas do reino, como pode ser visto nos Livros dos Reis (cf. 2 Reis 20:13).
Portanto, este provérbio era apropriado entre os judeus; não seria assim entre outras nações, onde as joias são consideradas mais preciosas. Portanto, a figura de linguagem é: Assim como um aroma precioso afeta o nariz, um bom nome afeta o sentido espiritual do olfato. Paulo frequentemente emprega esta figura de discurso, como em 2 Coríntios 2:15: “Nós somos”, diz ele, “o bom perfume de Cristo”. Paulo era um bom mestre e um pregador sincero, irrepreensível em seu modo de vida. Portanto, o significado desta passagem é: “Não se deixe abater pela ira. Assim como eu lhe ensinei o temor diante de Deus, também lhe ensino a perseverança e as boas obras diante dos homens. Pois que importa se alguns se ofendem e têm inveja do seu trabalho? Continue, e o bom perfume, a boa reputação que você obterá com isso atrairá mais pessoas, que serão preservadas em suas obras.”
O dia da morte é melhor que o dia do nascimento.
Parece-me que isso também é dito proverbialmente. Ora, parece pagão e carnal alguém preferir a morte à vida. Mas ele não está falando simplesmente sobre a morte e a vida, mas sobre o que deve ser feito e tem sido feito até mesmo pelo mais prudente dos homens. Mostre-me um homem na vida pública ou na administração doméstica, alguém que lida com negócios, e deixe-o nos dizer se não é melhor escolher a morte do que viver em meio a tantos perigos e trabalhos.
Portanto, Salomão está comparando esta vida consigo mesma, não com a vida futura. Ele quer dizer: Se a vida humana for considerada, então é certamente verdade que o dia da morte é melhor do que o dia do nascimento. Pois o que pode ser pior do que aqueles que administram os assuntos públicos e desejam sinceramente servir ao Estado, e que fazem e sofrem tudo por isso, acabarem não recebendo outra recompensa senão extrema ingratidão, desprezo, condenação e exílio? Assim, o texto deve ser entendido exatamente como está. Não está falando sobre as obras de Deus ou sobre a vida que vem depois desta vida, mas sobre os assuntos do homem, as coisas que estão dentro de nosso próprio uso e administração, as coisas das quais não obtemos nada além de uma ocasião para raiva e impaciência. O dia do nascimento envolve você no mal, mas a morte o resgata dele.
Certamente, o nascimento é uma coisa boa e uma criatura de Deus. Salomão não está falando sobre isso, mas sobre o uso que se dá ao nascimento; pois há uma diferença entre o nascimento como foi criado por Deus e o nascimento como eu o uso. Nada obtemos do nosso nascimento, exceto preocupações, não por culpa do nosso nascimento, mas pela maldade, tanto nossa quanto do mundo, em nosso abuso das criaturas de Deus. Portanto, a vida, tal como foi criada por Deus, nada tem a ver com este livro. Seria extremamente perverso dizer dessa vida que a morte é melhor do que ela, visto que Deus nos fez homens e quer que vivamos. Portanto, esta é uma exortação para que não nos desesperemos, mas para que mantenhamos nossa coragem inquebrantável a fim de suportar esses males até o fim. É como se ele dissesse: “Sofra e suporte. Não ceda aos males, mas, em vez disso, avance cada vez mais ousadamente!”[7]
É melhor ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há ofensa; porque esta é o fim de todos os homens.
Isto é afirmado na forma de uma máxima, pois com base nesses dois provérbios ele formulou máximas e exortações. Um tolo diz o oposto: "Não se envolva em ocasiões tristes e não leve uma vida de luto", que é o que Jerônimo ensinou quando disse que se deve levar uma vida celibatária, isto é, uma vida agradável. Mas Salomão diz algo diferente: "É melhor carregar a cruz e ir para a casa do luto, pois em tal casa se pode ver qual é o fim de todos os homens e de todo o mundo." Na vida pública e no lar, tudo está cheio de problemas e de luto, mas é melhor carregar esta cruz do que fugir; pois aquele que vive sua vida em meio ao luto e à mortificação está se acostumando a morrer, farto de viver e preparado para morrer sem tristeza. Mas alguém que não se acostuma a esse caminho de morrer, que quer viver para sempre em meio ao prazer e sem a cruz, não está treinando seu espírito; Ele está vivendo sua vida em perigo, ameaçado por grandes problemas, e morrerá em um estado muito triste. Mas aquele que vive sua vida em meio às coisas, que se treina e que persevera em suportá-las, se tornará um homem de verdade.
Por isso, Salomão diz: “Embora um tolo deseje e faça coisas contrárias a isso, não deixe as rédeas caírem. Aceite o fato de que você tem mais problemas do que diversão. É melhor suportar até o fim do que ceder aos males. Pois com base em suportar os males você obterá um bom nome, e as pessoas dirão de você: 'Este é um homem valente, alguém que suportou em meio aos males. Ele conseguiu superar todos os insultos e maldades do mundo e de Satanás.' ” É em meio aos males que o homem aprende a desprezar o mal, como diz Ovídio: “Acostume-se ao mal que você está suportando, e você o suportará bem.” [8] Assim, aquela mulher famosa que bebeu veneno não morreu disso porque se habituou a ele, e o provérbio diz: “Os males familiares são os melhores”. [9] Portanto, não devemos fugir ou recuar tanto diante dos males, pois sabemos que o fim de todos os homens é a inveja, a calúnia, o mal e a morte. E, portanto, se você quiser perseverar apesar dessas coisas, terá que aprender como por meio de experiência contínua. Para um tolo, esses problemas sempre vêm quando ele menos está preparado; mas para um homem piedoso, eles foram eliminados pela longa experiência. Os piedosos acham esta vida vil e a morte doce; eles continuam vivendo apenas por causa de Deus, que quer que eles vivam.
E os vivos o levarão a sério. “Os vivos” significam alguém bem provido e que vive em alta estima. Os hebreus costumam chamar a vida natural de “ alma”, enquanto chamam uma vida agradável ou comum de “viver”. Esta passagem explica de forma bela o efeito da experiência do mal, a saber, que alguém que vive em alta estima o leva a sério; isto é, é compelido a deixar que seu coração seja instruído por esses males. Mas o homem[11] que se recusa a suportar o mal não aprende nada e permanece sempre um tolo.
3. A raiva é melhor que o riso, pois a tristeza no rosto torna o coração melhor.
Isto tem o mesmo significado que o anterior. Mas como se harmoniza com o que ele havia dito anteriormente (5:18), que não se deve ficar irado, mas sim encontrar prazer em todo o seu trabalho, enquanto aqui ele diz que a ira é melhor do que o riso? Minha resposta é: Ele está falando sobre tristeza e não sobre ira, não sobre a tristeza tola que as pessoas criam para si mesmas; mas, assim como ele fala sobre a casa do luto, também fala sobre ira, de modo que a ira é equivalente à tristeza ou à perturbação que traz tristeza. Assim, quando foi anunciado a Davi que todos os filhos do rei haviam sido mortos (2 Sm 13:30), “o rei ficou muito triste” (2 Sm 13:21). O mesmo termo é usado ali como nesta passagem, e ali certamente não pode significar raiva, mas tristeza.
Portanto, significa o mesmo que quando dizemos em alemão: “Ele ficou chocado e muito perturbado”. As adversidades tornam o rosto nublado e a testa triste. Se alguém ocupa um cargo público ou administra uma casa, logo se esquece de como rir. Se for um homem bom e cumprir seu dever com dignidade, será tão dominado por tais problemas que sentirá vontade de dizer: “Que o diabo seja prefeito ou governante!” . Não há nada além de aborrecimento e desprazer na vida pública ou doméstica. Tais problemas enrugam a testa daqueles que querem ajudar as coisas, até que pensem consigo mesmos: “Desista, desista! Você não está realizando nada, exceto se sobrecarregando com problemas e inveja.” Salomão se opõe a tais pensamentos aqui, aconselhando e alertando: “Não ceda, mas aguente firme. É melhor que você esteja com raiva ou triste, que você contenha o riso, que você tenha um semblante e porte graves e seja obrigado a demonstrá-los (por causa dos problemas, é claro) do que você ria.”
A razão é que, pela tristeza do semblante, o coração se torna melhor. Isso pode ser entendido de duas maneiras. Primeiro, pode significar que, pela tristeza do semblante, o coração de outras pessoas se torna melhor. Assim, Paulo requer [grego]; “gravidade” na moral e na conduta, em um bispo (1 Timóteo 3:4), para que ele não ofenda os outros com sua leviandade. Assim também Salomão deseja que o homem que administra as coisas se alegre em seu coração, mas se comporte com gravidade externamente, para que os outros possam se tornar melhores. Pois se um homem é do tipo que tem um coração alegre e um semblante grave, alguém que não é frívolo nem no vestir nem no comportamento, ele será alguém a quem as outras pessoas respeitam e cuja família não será descontrolada.
Segundo, a passagem pode ser explicada desta forma: Quando o semblante parece ruim, o coração está bem; isto é, não há nada que impeça o coração de ser feliz, mesmo que externamente o semblante possa ser grave. Então o significado seria: É melhor levar uma vida rigorosa e grave do que uma descontrolada. Os hebreus usam a palavra “riso” para o tipo de vida levado por nossos papistas, que vivem completamente sem restrições, desprezando e ridicularizando tudo o que é bom. Gosto mais desta interpretação do que da outra, segundo a qual se supõe que o coração de um homem tolo ou perverso pode ser melhorado pela tristeza ou gravidade de outra pessoa. Pode, é claro, parecer que um homem perverso respeita a gravidade de outro, mas seu coração não se torna diferente.
Portanto, aceito este significado, que você entenda como aplicável ao seu próprio coração: Quando as coisas estão difíceis, o coração se torna melhor. "Um bom coração" é uma expressão hebraica que significa um coração alegre e feliz. Salomão fala dessa maneira para direcionar seus ouvintes em direção ao seu objetivo, pois sua intenção é fazê-los felizes, independentemente de como as coisas aconteçam. Embora ele tenha dito acima que é bom ser feliz, aqui ele parece estar afirmando o oposto: a tristeza é melhor do que o riso. Essas duas coisas certamente não parecem estar em concordância. Mas questões que têm a ver com a piedade são difíceis e estão sempre sendo levadas ao extremo oposto. Se ensinamos que nada além da fé justifica, então os ímpios negligenciam todas as obras.
Por outro lado, se ensinamos que a fé deve ser atestada pelas obras, eles imediatamente atribuem justificação a estas. Um tolo sempre se inclina para um ou outro extremo. É tão difícil permanecer no caminho real, como, por exemplo, aqui: nem a tristeza sozinha, nem a felicidade sozinha, mas o meio-termo entre elas é o que se deve manter. É preciso manter o espírito feliz, livre e em paz; é preciso manter a equanimidade nos assuntos humanos, independentemente de ocorrerem coisas felizes ou tristes. Por isso, ele diz: “Na maldade ou na angústia, o coração, etc.” É como se dissesse: “Distingo entre a tristeza do semblante e a tristeza do espírito. Quero sempre ser feliz em espírito, por dentro; mas por fora isso não pode ser, porque doze coisas tristes acontecem.” Assim, o apóstolo diz em 2 Coríntios 6:10: “como entristecidos, mas sempre alegres”. Você deve referir a primeira ao exterior, a segunda ao interior.
4. O coração dos sábios está na casa do luto, mas o coração dos tolos está na casa da alegria.
Tudo isso parece entrar em conflito com o precedente, a menos que façamos distinção entre os dois tipos de felicidade, a do espírito e a felicidade exterior, bem como entre a tristeza interior e a exterior. Mas ele continua com sua declaração de consolo e exortação: “Não sigam os tolos que mudam de ideia quando as circunstâncias exteriores mudam e cujos corações estão apegados às circunstâncias. Quando coisas felizes vêm, eles ficam felizes; quando coisas tristes vêm, por outro lado, eles ficam tristes.” Na casa do luto. Os hebreus chamam de “casa” não apenas o edifício feito de pedra e madeira, mas qualquer lugar em que algo é realizado e feito. Portanto, seus gramáticos chamam cada letra de “casa” das palavras que começam com essa letra.[13] Por que o coração do sábio está na casa do luto? Porque os sábios não se despedaçam quando as coisas estão ruins, nem mudam quando as coisas mudam. Os tolos buscam a felicidade exterior e fogem da adversidade.
Eles são o tipo de pessoa mais problemática. Eles começam algo com grande fervor e energia; Mas assim que qualquer pequeno problema surge em seu caminho, eles desistem. Quando algo está dando certo, eles seguem em frente bravamente; mas quando não, eles ficam abatidos em espírito e fogem do campo de batalha. Portanto, eles são inúteis na gestão da vida pública ou privada, uma vez que é impossível viver em qualquer estilo de vida sem desconforto e problemas. O espírito ou coração corajoso do sábio, no entanto, suporta a adversidade e segue em frente. Ele fala deliberadamente do coração do sábio e do coração do tolo, pois está julgando com base na atitude e não nas coisas em si. O coração do tolo está sempre em busca de felicidade, o do sábio, de tristeza, mesmo que este último frequentemente tenha coisas felizes acontecendo com ele e o primeiro tenha coisas tristes. Portanto, estas são confirmações e exortações para homens bons.
5. É melhor para o homem ouvir a repreensão dos sábios do que ouvir a canção dos tolos. 6. Pois como o estalo dos espinhos debaixo da panela, assim é o riso dos tolos; também isso é vaidade.
Ele chama as opiniões dos tolos de canção. Essa é uma figura de linguagem impressionante. Não deve ser traduzida ou entendida como se aplicando à música, assim como o precedente não se aplica a banquetes, mas a toda a conduta desta vida, de acordo com a maneira ou figura de linguagem hebraica. A repreensão, por outro lado, é instrução e exortação sobre como administrar as coisas. Portanto, ele está dizendo: “Mesmo que você não pareça estar obtendo nenhuma vantagem para si mesmo, você deve, no entanto, fazer o que está à mão. E você não deve desistir da repreensão, mesmo que os tolos não a ouçam .” Isso é o que Paulo disse em 2 Timóteo 4:2:14 “Convença, repreenda, seja urgente a tempo e fora de tempo.” Eu ensinei e ensino que as coisas são vaidade e que os resultados não são alcançados por nossos próprios planos, etc.
Quando um tolo ouve essas repreensões, ele é levado a extremos opostos. Devemos então não fazer nada? Mas isso não é motivo para nos abstermos de agir ou de repreender a vaidade, de ensinar ou de pregar, por mais que a vejamos ser desprezada. Em vez disso, devemos prosseguir e denunciar os ímpios. Se eu, por minha vez, fosse obrigado a interromper meu ministério da Palavra por não ver resultados, exceto entre os pouquíssimos, mas apenas a extrema perversidade de quase todo o mundo e o cúmulo da ingratidão, há muito tempo eu teria que me calar. Mas Deus faz bem em não nos permitir ver tais coisas antecipadamente, antes de estarmos bem no meio delas, quando não podemos mais voltar atrás. É muito melhor continuar fazendo o seu trabalho em meio a esses males do que recuar. Portanto, ouvir a repreensão dos sábios, que querem nos dar bons conselhos, é preferível a "ouvir a canção dos tolos", isto é, as coisas que a carne gosta de ouvir e que os tolos acham agradáveis. Pois eles exigem que lhes digamos apenas coisas agradáveis. Em suma, Salomão está fazendo isso para nos impedir de usar seus ensinamentos anteriores como uma ocasião para reclamar e descontinuar nosso trabalho.
Pois como o crepitar dos espinhos debaixo de uma panela, assim é o riso dos tolos.
“Riso” refere-se a toda a vida dos tolos, que lhes dá prazer, mas é apenas uma máscara exterior de felicidade, não a verdadeira alegria do coração. A comparação do riso dos tolos com o crepitar dos espinhos é maravilhosa. Os judeus têm muitas comparações derivadas das coisas de sua vida. Eles faziam uso extensivo de cozinhar e de acender fogueiras por causa de suas constantes lavagens, sacrifícios e coisas do tipo. Seus sacerdotes eram verdadeiros açougueiros e cozinheiros. Esta foi a fonte do ditado proverbial sobre o crepitar dos espinhos aqui e nos Salmos (Sl 58:9; 118:12). Isso nos parece difícil porque está em desacordo com nossos costumes. Da mesma forma, nossos provérbios lhes pareceriam difíceis, como quando dizemos: “Um cobre de dinheiro rende um cobre de Missa de Réquiem”; embora isso seja familiar entre nós e tenha sido tirado de nossas formas de culto, eles seriam completamente incapazes de entendê-lo. Portanto, quase toda esta passagem é uma espécie de alegoria baseada num incêndio de arbustos silvestres (que são espinhos que se entrelaçaram uns aos outros). Este é um incêndio repentino e que faz muito barulho, mas acaba muito rapidamente, com mais chama do que fogo nele.
Ele ameaça uma conflagração horrível, mas logo, quando a chama e o barulho passam, o fogo se apaga. Assim diz o salmo (Sl 118:12): “Eles foram extintos como um fogo de espinhos.” E Virgílio diz no terceiro livro dos Georgies: “Como o fogo na palha ruge sem força, ele se enfurece ociosamente.” [15] Portanto, um fogo de espinhos ou de palha não emite calor e não penetra, e ainda assim dá uma maior aparência de queima do que um fogo de brasas vivas, que não têm muita chama, mas muito calor. Da mesma forma, a felicidade dos tolos dá a impressão de que durará para sempre, e pensa-se que ela tem tanta força quanto chama; mas não é nada disso, pois eles são felizes por um momento, mas logo as adversidades vêm, e eles se despedaçam e se encontram em completo desespero. Assim, penso que esta afirmação é clara e que se harmoniza perfeitamente com a anterior e com a seguinte. Isso também é vaidade, porque quando a felicidade acaba, permanece a perturbação no espírito. Pois é assim com toda a felicidade carnal: termina em confusão e deixa aguilhão maligno quando se vai.
7. Porque o caluniador perturba o sábio e destrói o coração generoso.
Isto também se refere ao tema da consolação. Mas ele diz isso como uma concessão; isto é, poderia acontecer que um caluniador perturbasse um sábio, o fizesse de bobo e destruísse um coração disposto a dar (pois é assim que se lê em hebraico), ou seja, um coração generoso e liberal. Pois quando um sábio quer ajudar o mundo e ser útil e aconselhar as coisas, e quando faz tudo com a máxima correção, ainda é coberto de imundície pelos tolos e experimenta o extremo da ingratidão. Isso é atestado pelas histórias dos gentios e dos judeus, na verdade, pela experiência diária. Assim, Antíoco assassinou horrivelmente um homem de mérito excepcional, depois de ter assassinado dois de seus filhos diante de seus próprios olhos.[16] Este foi o agradecimento pago pelo mérito! Belisário, um homem muito bom e sábio, foi assassinado da forma mais perversa pelo imperador Justiniano. [17] Tudo está cheio de tais exemplos. Portanto, que qualquer um que queira servir em assuntos públicos ou domésticos espere desperdiçar sua bondade. Assim, Deus desperdiça a bênção do sol e todas as Suas dádivas com os ingratos e perversos, como diz Mateus 5:45.
Esse tipo de calúnia deixa o coração generoso desfeito, de modo que, em sua impaciência, o homem decide parar de fazer qualquer coisa e se deixa desanimar pela ingratidão, a menos que seu coração tenha sido instruído pela Palavra de Deus. Assim acontece até mesmo com os sábios, como diz Jerônimo: “Quando sua paciência é testada muitas vezes, o homem enlouquece .” [18] Nem um ser humano pode fazer de outra forma; mas Deus pode fazer de outra forma. Deus concede o sol, reinos, principados, etc., aos perversos. O que eles fazem? O que eles dão em troca? Eles crucificam Seu Filho! Esta é a sua maneira de agradecer. Ele é capaz de suportar, mas os seres humanos não. Mas o que Salomão diz aqui é o que acontece com eles: “A calúnia perturba o sábio e destrói o coração generoso. Mas você, não se deixe vencer pelo mal, mas continue”.
8. Retter é o fim de uma coisa maior que seu começo.
Isto é, a perseverança coroa a obra;[19] espere o fim. Não é como você começa que importa, mas como você prossegue. É muito melhor ter chegado ao fim do que ter tentado o começo. Não louve ninguém antes do Último Dia.[ 20] Não aquele que começou, mas “aquele que perseverar até o fim será salvo” (Mt 10:22). O que estou dizendo sobre questões religiosas também pode ser dito sobre todas as outras questões, de acordo com o ditado comum: “O começo é quente, o meio é morno, o fim é desagradável”, de modo que jaz completamente em cinzas. Nós, alemães, estamos especialmente sujeitos a críticas por causa deste vício, de sermos ávidos por coisas novas. Começamos muitas coisas, mas não continuamos nem persistimos em nada. Isso nos afeta sobretudo na área da doutrina, onde a cada dia abraçamos coisas novas. Mas esta é a inconstância do coração humano. Portanto, não se deve pensar no começo, mas no fim. Cuide, pois, de perseverar. Você sofrerá calúnias por causa da sua sabedoria; experimentará ingratidão; as pessoas esquecerão seus atos de bondade; menosprezarão seus melhores conselhos e retribuirão o bem com o mal. Se o espírito de alguém estiver inseguro, isso o fará desistir. Mas você, continue bravamente e persevere, porque Deus finalmente lhe concederá o fruto do seu trabalho.
E o paciente de espírito é melhor do que o orgulhoso de espírito.
Ele continua com sua exortação. Nos assuntos humanos, é necessário que se considere o fim. O que é necessário para isso não é um espírito orgulhoso, que muda imediatamente porque quer que tudo seja feito de uma vez e faz tudo com certa força, mas um espírito paciente, que supera com paciência e tolerância os males que ocorrem e o impedem. É o que também ensinam os ditos dos sábios: “Apressa-te lentamente” e “Suporta e persevera”. [21]
9. Não se irrite facilmente, pois a ira se aloja no coração dos tolos.
Há uma abundância de exortações em Salomão para que perseveremos naquilo que começamos, mesmo que nossos planos não sejam executados. Ele está falando sobre a ira do espírito, assim como falou anteriormente sobre a ira exterior. "Não ", diz ele, "tenhas ira facilmente, mesmo que surjam ocasiões para a ira. Que os tolos se irritem." Os tolos têm ira no coração e exteriormente ao mesmo tempo. Mas tu, preserva um espírito feliz mesmo quando és severo por fora. A ira aloja-se no seio do tolo é um hebraísmo para o que nós, em alemão, diríamos assim: "A ira se apega aos tolos", isto é, eles gostam de se irritar.
10. Não digas: Por que os dias passados foram melhores do que estes? Pois não é com sabedoria que perguntas isto.
É assim que o coração humano costuma reclamar sempre que experimenta a ingratidão do mundo: “As coisas estão piores do que costumavam ser ”. Mas você, não fale assim, pois não está perguntando ou argumentando da maneira certa. Os velhos costumam falar assim: “Quando eu era menino, tudo era melhor”. Eles são o que o poeta chama de “glorificadores de tempos passados”.[22] Mas Salomão diz: “Isso é falso; as coisas nunca estiveram certas”. A razão pela qual você vê e entende isso apenas agora é que, à medida que crescemos, nossas experiências com as coisas e nossas ocasiões para ficar com raiva também aumentam. Um menino não se importa e não se comove quando alguém engana ou mata outra pessoa, mas continua brincando, caçando e cavalgando; para ele, o maior dos crimes é quando alguém rouba as bolinhas de gude de outra pessoa, e isso o deixa com raiva.
Mas quando ele se torna o chefe de uma família, então ele é sensível ao aborrecimento e à infidelidade de sua família, e fica com raiva se um cavalo quebra uma perna ou um boi não é engordado adequadamente. Portanto, o mundo sempre foi mau, mas nós nem sempre estivemos no mundo e não estamos agora. Quando éramos crianças, nada nos perturbava; nós mesmos, de fato, levávamos uma vida mais pacífica, mas o mundo sempre foi o mesmo. Certamente, é verdade que em uma era a maldade irrompe mais do que em outra, mas isso acontece porque existem situações diferentes e maiores oportunidades para que ela irrompa; a maldade do mundo, no entanto, permanece sempre a mesma. Júlio César abalou o mundo inteiro porque teve uma grande oportunidade de fazê-lo; se Esaú ou Absalão tivessem tido tal oportunidade, teriam feito a mesma coisa. Portanto, o mal no mundo é sempre o mesmo. Cuide, então, para que você tenha um coração pacífico e tranquilo e para que não se irrite ao ver esse mal. Você nunca mudará o mundo, mas cuide para se transformar em outro tipo de homem.
11. A sabedoria é boa com uma herança, e excede aqueles que vêem o sol. 12. Pois a proteção da sabedoria é como a proteção do dinheiro; e a vantagem do conhecimento é que a sabedoria preserva a vida daquele que a possui.
O único propósito de Salomão aqui é evitar dar a impressão de que aprova a preguiça, que é o que aqueles que ouvem o ensinamento da piedade geralmente afirmam. “Se todos os nossos esforços são condenados”, dizem eles, “não façamos nada; sejamos absolutamente preguiçosos”. Mas Salomão rejeita isso e diz: “Não condeno o trabalho nem aprovo a preguiça. De fato, aprovo tanto as riquezas quanto a sabedoria, mas prefiro a sabedoria às riquezas, porque ela dá vida ao homem. Além disso, condeno os conselhos humanos para adquirir riquezas e todas as outras coisas. Digo-vos que não sejais laboriosos nem ociosos, nem tolos nem sábios; pois nenhuma delas importa.
Isto é, não planejeis nem me esforceis para obter riquezas ou sabedoria; mas preocupai-vos com as coisas com as quais Deus quer que vos preocupeis e livrai-vos das vossas próprias preocupações, que são apenas vaidade. Pois a sabedoria de Deus não vos é proposta para que façais alguma coisa. Mas olhai para cima e vede como Deus opera a justiça e a sabedoria”. Dessa forma, portanto, ele condena o conselho humano na aquisição de qualquer coisa; e, ao mesmo tempo, também exorta as pessoas a serem ativas nas coisas, administrá-las e direcioná-las, mas no presente, e a esperarem que a mão de Deus intervenha quando virem que as coisas não estão dando certo. Pois, se você começar a insistir em seus próprios planos, não obterá nada além de vaidade e aflição.
A sabedoria com uma herança é melhor do que aqueles que veem o sol. Ver o sol significa alegrar-se e ser feliz nesta vida, viver no alto. Ele quer dizer: A sabedoria com uma herança é superior à vida mais feliz deste mundo. E acrescenta uma comparação: A sabedoria protege, e o dinheiro também protege. Como diz o ditado, “A riqueza torna a pessoa ousada”; isto é, aqueles que têm riqueza têm confiança, e aqueles que têm sabedoria têm confiança (esta é a sua concessão), mas eu faço uma distinção entre eles. A sabedoria é superior às riquezas ou ao dinheiro desta forma, que a sabedoria traz vida a quem a possui. O dinheiro não pode fazer isso; ele não preserva a vida nem liberta da morte. Ele diz isso para evitar a impressão de que está simplesmente condenando a riqueza, pois o que ele está condenando é apenas o uso que os perversos fazem dela. Além disso, ele prefere a sabedoria, porque o conhecimento da sabedoria preserva a vida de seu possuidor.
13. Considere as obras de Deus; quem poderá endireitar o que ele fez torto?
Ele conclui toda esta passagem, que começou para confortar pessoas impacientes e iradas, com um belo floreio final: [ 23] “Por que”, diz ele, “vocês estão irados? Por que estão impacientes em sua oposição a pessoas ingratas? Observem as obras de Deus. Ninguém pode endireitar alguém que Ele tornou torto. Que isso lhes dê conforto. Pois por este argumento vocês podem vir a reconhecer que Deus governa todas as coisas e que não é exigido de vocês que todos os homens sejam bons ou gratos, e que não cabe a vocês fazê-los assim. Portanto, fiquem calmos e deixem as coisas acontecerem como acontecerem, pois elas acontecerão como acontecerem.” [24] Não está em minhas mãos endireitar o que é torto. Sou gentil com muitas pessoas e vejam o que recebo em troca — calúnia e ingratidão.
Mas quando isso acontece, não é nada estranho ou novo, porque, a menos que Deus tenha concedido um coração compreensivo e grato, vocês desperdiçarão todos os seus atos de bondade. Portanto, esta passagem contém um ensinamento extraordinário, a saber, que não está no poder da vontade humana endireitar o coração humano e que é impossível que qualquer coisa problemática seja corrigida pela vontade humana. Você pode ensinar, advertir, etc., mas ninguém, exceto Deus, pode corrigir. O conhecimento disso é o nosso único remédio contra tamanha ingratidão e tanta calúnia. E assim, quando sua repreensão e instrução não tiverem ajudado, observe a regra de Paulo (Tito 3:10): "Rejeita o homem herege, depois da primeira e segunda admoestação." Quando você tiver feito a sua parte, deixe Deus fazer a parte dEle. Recusar-se a desistir a menos que tenha corrigido as coisas primeiro é colocar-se no lugar de Deus, isto é, ser obviamente insano. Portanto:
14. No dia da prosperidade, alegre-se, mas lembre-se também do dia da adversidade. Deus fez tanto um como o outro, para que o homem não descubra nada além dele.
Esta é a outra parte do seu floreio final. Se você tiver um dia de prosperidade, eis o que deve fazer: seja feliz, isto é, aproveite as coisas que estão presentes, deixe de lado suas preocupações, deixe de lado seus próprios conselhos, coloque um limite em todas as suas emoções. Deixe Deus ser sua sabedoria; entregue seu passado e seu futuro a Ele. E seja feliz no presente de tal forma que você se lembre também do dia da adversidade. Isto é, prepare-se de tal forma que você também seja capaz de se entristecer; aproveite as coisas que estão presentes de tal forma que você não baseie sua confiança nelas, como se fossem durar para sempre. Não seja presunçoso, olhando apenas para as coisas boas, mas esteja preparado também para o dia da adversidade. Seja sempre livre e equilibrado. Assim, ele tira a atitude e a confiança dos tolos que se apegam às alegrias que estão presentes e se imergem nelas como se o dia da prosperidade tivesse que perdurar. Mas devemos ser felizes de tal forma que não nos afundemos, mas reservemos parte do nosso coração para Deus, para que com ele possamos suportar o dia da adversidade. Assim, as adversidades previstas para nós nos incomodarão menos.
Pois Deus fez tanto um quanto o outro à Sua maneira.
Para que o homem não descubra nada do que virá depois dele.
Isto é, para que o homem aprenda que não pode ter mais bem do que Deus lhe deu, mesmo que o busque. O homem, de fato, busca além do que Deus fez, mas não encontra. Deus deu felicidade, e você busca por mais felicidade, mas não a encontrará. Pois ninguém pode acrescentar sequer uma partícula às obras de Deus. Se o Senhor Deus decidiu algo, você não acrescentará nada a ele. Quando o coração está cheio de felicidade, não é capaz de ficar triste, e vice-versa . Assim, Deus determina tudo, para que você aprenda a se contentar com o que Ele ofereceu e use até mesmo isso moderadamente; então sua alegria estará no Senhor.
15. Na minha vida vã eu vi de tudo; há um homem justo que perece na sua justiça, e há um homem ímpio que prolonga a sua vida na sua maldade.
Agora que suas exortações e consolações terminaram, ele olha tudo ao redor e retorna ao seu catálogo. “Enquanto eu revia tudo”, diz ele, “ocorreram-me, entre todas as outras vaidades, também aquelas que agora vou enumerar.
Há um homem justo que perece. Aqui, novamente, é necessário observar Salomão atentamente, para que não suponhamos que ele esteja falando sobre a justiça de Deus ou a justiça da fé. Mas ele está falando sobre justiça política, para que você entenda o “homem justo” como aquele que exige justiça dos outros, aquele que deseja tornar as pessoas justas; tal homem é um funcionário público ou o administrador de uma casa. “Vi um homem justo”, diz ele, “alguém que tinha leis e estatutos notáveis. Mas quando começou a aplicá-los e exigiu que tudo o que fizesse de acordo com as regras, nada realizou, exceto que tudo andou para trás.” Isso é como o que um certo idiota fez: ele estava torto sob a luz do sol e acusava sua sombra de ser torta, embora não se endireitasse enquanto isso.[ 26] Assim também somos nós. Vemos o cisco no olho do outro, mas não reparamos na trave que está no nosso próprio olho (cf. Mt 7:3). Em resumo, “A lei suprema traz a mais profunda injustiça”. [27] Quem quiser governar tudo de acordo com as regras e endireitar tudo no Estado ou na casa terá muito trabalho, mas nenhum resultado. Por outro lado, alguém que não quer fazer nada e despreza a aplicação da justiça. Nenhuma dessas duas coisas prevalece. Não se deve ser sábio nem insensato, nem justo nem perverso. Então, o que deve ser feito? Este será o caminho do meio:
16. Não sejas demasiadamente justo, nem demasiadamente sábio; por que te destruirias? 17. Não sejas demasiadamente mau, nem sejas tolo; por que morrerias antes do tempo?
Isto é, esqueça a lei suprema; meça-se com o seu próprio pé e cante: “Conhece- te a ti mesmo”. [28] Então você encontrará em seu próprio peito um longo catálogo de vícios e dirá: “Veja, eu mesmo ainda sou injusto, e ainda assim sou tolerado por Deus e não sou banido pelas pessoas. Então, por que estou tão levado pela fúria que exijo duramente dos outros o que eu mesmo não consigo?” Isso é o que significa ser “justo demais”. As coisas deste mundo não podem suportar isso. Portanto, observe as leis ensinando e pregando, e dê graças a Deus quando sua casa ou seu público reconhecer que as leis e os ensinamentos são santos e justos, mesmo que não observem tudo como está prescrito. Desta forma, você será verdadeiramente santo e sábio. Você será “excessivamente sábio” e “excessivamente justo” se em sua administração, seja de assuntos públicos ou privados, você tiver boas leis, mas insistir nelas e quiser que sejam observadas de tal forma que não haja um pingo de transgressão.
Pois é isso que significa que "a lei suprema traz a mais profunda injustiça". Um funcionário público prudente ou chefe de família deve distinguir entre a bondade da lei e a obediência de seus subordinados. É melhor tolerar e suportar uma dose moderada de rebelião do que deixar todo o Estado perecer. Isso é o que geralmente acontece com os rígidos aplicadores das leis. Portanto, as leis devem ser aplicadas e exigidas até onde a situação permitir, mas não além disso. Isso também é o que os médicos fazem. Eles não diagnosticam e curam doenças apenas com base em livros ou no que é prescrito, mas frequentemente são obrigados a fazer ajustes de acordo com o estado do corpo. Assim, também as mentes dos homens são influenciadas das mais diversas maneiras possíveis, de modo que muitas vezes é necessário modificar as próprias leis. Isso exige homens extremamente sábios, dos quais existem poucos no mundo. Portanto, todos os escolhidos como chefes de família ou funcionários públicos devem ser homens como Davi, Abraão, Salomão e Josué, se estivessem disponíveis, homens que pudessem administrar as leis adequadamente. Pois é assim que é importante administrar bem o Estado.
Não sejas mau demais.
Esta é a segunda parte da conclusão. Cuide para que, assim como você não seja justo demais, também não seja ímpio demais. Isto é, não despreze nem negligencie todos os deveres de governo confiados a você, e não permita que tudo desmorone. É bom ignorar algumas coisas, mas não negligenciar todas. Se a sabedoria não triunfar, não há razão para enlouquecer de raiva e vingança. Finalmente, não ceda à ociosidade, a ponto de não querer se importar com nada. Não se comporte como aquele servo mau que enterrou seu talento e não quis negociá-lo de forma alguma (Mt 25:24-30). Pois bem, seja justo e deixe que os outros sejam justos com você; exija retidão; persevere, independentemente do resultado. Por quê? "Por que você deveria se destruir ou morrer antes do seu tempo?" Há razão para temer que Ele venha repentinamente e o chame para o julgamento, como Ele tirou a alma do homem rico à noite, quando o homem rico não estava pensando nisso (Lc 12:20).
Se esta vida fosse celestial e angelical, nada aconteceria injustamente; mas nossa natureza pecaminosa não pode fazer nada além de pecar e ser tola. Quem não sabe disso ainda não aprendeu sobre o mundo. Deveríamos pensar que estamos aqui como se estivéssemos em um naufrágio ou em um incêndio, onde é preciso trabalhar para arrebatar pelo menos um tição do fogo quando não se pode controlar ou apagar todo o fogo. Portanto, se você está em uma casa, contente-se em arrebatar pelo menos uma pessoa do fogo público dos ímpios. Se você é um professor de crianças, trabalhe para educar pelo menos uma delas e educá-la adequadamente. Se você é um pregador do Evangelho, não pregue como se pudesse ganhar todos os homens para Cristo, pois nem todos atendem ao Evangelho (cf. Rm 10:16); mas se você converter três ou quatro almas e as conduzir a Cristo, como as pontas de tições em chamas (cf. Amós 4:11), dê graças. Pois não se deve desistir simplesmente porque tão poucos são transformados para melhor ouvir a pregação do Evangelho. Mas faça o que Cristo fez: Ele resgatou os eleitos e deixou o restante para trás. Foi o que os apóstolos também fizeram. Não será melhor para você. Você é tolo se presume que sozinho pode realizar tudo ou se desespera de tudo quando as coisas não acontecem como você quer.
18. É bom que você se apegue a isso e não retire a sua mão daquilo; pois aquele que teme a Deus escapará de todas elas.
Cristo faz uma declaração semelhante em Mateus 23:23, quando diz: “Estas coisas devíeis ter feito, sem omitir aquelas”. Assim, também aqui, ele exige ambas: justiça, e ainda assim não a mais alta justiça, para que não sejais nem negligentes nem exigentes demais. Às vezes, deveis ignorar as leis e julgar como se fôsseis ímpios, e às vezes, deveis apoderar-vos das leis e tornar-vos justos mais uma vez. Mas lembrai-vos, como também já foi dito, de que ele não está aqui falando de justiça pessoal, mas de justiça comunitária ou política; não de justiça diante de Deus, mas de justiça em governar os outros e perante o mundo. Pois na justiça pessoal não pode haver justiça demais. Aquele que teme a Deus escapará de todas elas.
Ou seja, o temor do Senhor julgará facilmente ambas. Se eu temo ao Senhor, meu coração diz: “Muitas vezes vivi assim e ainda vivo vergonhosamente. Portanto, terei compaixão desses delinquentes. Se eu puder contê-los moderando minha disciplina, o farei. Se não, os deixarei continuar até que colidam com a lei da espada. Se escaparem de tudo isso, ainda assim não escaparão do julgamento de Deus.” Assim, aquele que teme a Deus procede corretamente nessas questões; quando vê que não pode prevalecer, invoca o Senhor. Portanto, cumpra o seu dever, avise, exorte e nunca pare. Aquele que não ouvir você trará seu próprio castigo, mesmo que não seja por meio de você puni-lo; pois há Alguém que punirá. Foi o que aconteceu recentemente com nossos camponeses. Quando eles não aceitaram nossa repreensão, foram completamente punidos por outros.[29]
19. A sabedoria dá força ao sábio mais do que dez governantes que há numa cidade.
Este é um elogio ao tipo de sabedoria que acabamos de mencionar, a saber, a equidade. As coisas não se preservam pela força, mas é pela prudência que tudo se realiza e progride num reino, nas leis, na administração e nas artes. Assim, nós também fomos criados como seres humanos para que possamos agir pela razão e realizar mais por meio dela do que todos os animais com sua força. Desta forma, um homem, pela razão, doma um cavalo selvagem e um enorme leão. Portanto, independentemente de quantas leis sejam promulgadas ou de quão bem os Estados sejam organizados e estabelecidos, a menos que a prudência esteja presente, as coisas muitas vezes vão muito mal. Pois quando um homem sábio estabelece as leis, é impossível para ele ser capaz de ver todas as condições e circunstâncias. Portanto, muito resta aos administradores das leis. Assim, os especialistas jurídicos chamam o imperador de “a lei viva”,[30] porque ele foi colocado em posição de moderar as leis como um condutor faz com uma carroça e ajustar tudo de acordo com lugares, tempos, pessoas, etc. Um homem tolo causa mais danos por meio de leis que são rigidamente observadas do que um homem sábio por meio de leis que são negligenciadas. Tudo isso ainda pretende ser dito como uma exortação. Não se irrite, diz ele, quando as coisas não acontecem como você desejava. Contente-se em ter as leis observadas de tal forma que tudo não seja pisoteado. Pois a sabedoria suprema não é o conhecimento das leis e estatutos em si, mas o conhecimento de que a sabedoria não é ouvida neste mundo. Esta vida não permite que tudo seja feito corretamente. Portanto, o resumo desta passagem é: Não se deve confiar na força, mas governar pela sabedoria, que muitas vezes salva tudo no reino quando a força arruína tudo. Por que isso acontece?
20. Certamente não há homem justo sobre a terra que faça o bem e nunca peque.
Tenha sempre em mente que Salomão está falando sobre coisas que estão debaixo do sol e sobre coisas que podem ser realizadas. Ele não está, estritamente falando, instruindo consciências aqui; ao contrário, está ensinando como ter um coração em paz em meio aos assuntos difíceis e problemáticos deste mundo. Por isso, ele acrescenta expressamente “na terra”, ou seja, para mostrar que está pensando na justiça terrena e nos pecados que cometemos uns contra os outros. É como se ele estivesse dizendo: “Por que vocês tentam impor tudo exatamente de acordo com as leis? Nunca acontecerá que tudo seja feito exatamente certo. Se vocês querem viver na ordem política, devem ignorar muita coisa, suportar muito e ignorar muita coisa, a fim de preservar pelo menos um pouco de justiça. Examinem-se e verão quantas vezes vocês mesmos agem injustamente e fazem coisas que, com razão, desagradam a muitos. Portanto, não sejam justos demais, porque vocês mesmos pecam e ofendem de muitas maneiras.”
Assim também Cristo diz em Mateus. 7:3: “Tu vês o argueiro no olho do teu irmão, mas não reparas na trave que está no teu próprio olho.” Ali, porém, Ele está falando sobre a justiça celestial. Se olhássemos para nós mesmos em casa, sem dúvida encontraríamos os defeitos que, com razão, ofendem os outros. Esse fato deveria nos levar a não sermos juízes tão severos dos outros, tão justos em excesso ou tão insistentes na justiça alheia. Pois daí decorre que os mais rígidos aplicadores da lei são eles próprios os maiores criminosos. Eles desconhecem o sentimento de misericórdia e compaixão; são cruéis e intoleráveis consigo mesmos e também com os outros. Portanto, Salomão quer dizer: “Não te ires se vires comportamentos e atividades que te ofendem. Tu também nem sempre fazes o que deverias fazer.” É preciso ignorar e tolerar em muitas situações. Pois assim como pertence à justiça da fé e à justiça espiritual suportar os fracos na fé e instruí-los gentilmente, também pertence à justiça política (da qual ele está falando aqui) suportar os defeitos dos outros, para que haja uma tolerância mútua, pela qual toleramos uns aos outros e fechamos os olhos para as falhas.
Em seu livro Sobre a Amizade, Cícero quer que não negligenciemos nada em nossos amigos.[31] Em O Elogio da Loucura, Erasmo quer que corrijamos todas as falhas de nossos amigos.[32] Essas são as especulações de homens que muitas vezes foram movidos por uma paixão muito grande. Homens tolos governam o mundo de acordo com livros e não conseguem ver que ninguém é capaz de alcançar o que é prescrito lá. Assim, os estóicos, muito tolamente, descreveram o homem sábio como alguém sem sentimentos, enquanto eles próprios eram extremamente cruéis com todos. O que resta, então, é que suportemos uns aos outros e fechemos os olhos para as falhas uns dos outros; pois não há homem que não peque, que não faça o que é problemático para os outros.
21. Não dê ouvidos a tudo o que os homens dizem, para que não ouça o seu servo amaldiçoando-o; 22. seu coração sabe que muitas vezes você mesmo amaldiçoou outros.
O que eu disse sobre a experiência de olhar para si mesmo, também digo sobre ouvir os outros. A casa deve ser governada, e os ímpios devem ser punidos. Mas se, além disso, houver algo que você não possa corrigir, deixe para lá. Os ímpios não ficarão impunes, pois o provérbio é verdadeiro: "Você não escapará do carrasco, pois o próprio Deus é o carrasco." Para que você não ouça seu servo amaldiçoando você. Algumas pessoas são tão curiosas sobre sua reputação que prestam muita atenção a cada palavra e a cada aceno de cada pessoa. Elas escutam pelas janelas e pelas rachaduras nas paredes para descobrir o que alguém está dizendo sobre elas. É bem feito para essas pessoas se ouvirem algo sobre sua família que lhes cause sofrimento. Portanto, se você quiser dar ouvidos ao que todos estão dizendo, terá que esperar ouvir até mesmo seu próprio povo amaldiçoando você. Na verdade, isso pode muito bem acontecer por acidente, mesmo quando você não está pensando nisso.
Pois assim como você experimentará muitas coisas que não gosta, também ouvirá muitas coisas que não gosta. Não há necessidade de se interessar por saber o que todos estão dizendo. Nem deve perder a paciência imediatamente e pegar em armas por causa disso. Em vez disso, deve ignorar isso, pois você também cometeu muitos pecados contra os outros. Se Júpiter lançasse seus raios com a frequência que os homens merecem, diz Horácio, logo ficaria sem armas.[33] Portanto, ambos são necessários na administração dos assuntos humanos: um legislador e um moderador da lei: um legislador, para formular boas leis e dar uma base ao Estado; mas também um moderador, para aplicar as leis corretamente e empregá-las correta e prudentemente, de acordo com as condições de vários lugares, pessoas e indivíduos.[34] Um moderador da lei é mais necessário no Estado do que o próprio legislador, como pode ser visto também nos assuntos domésticos.
Um chefe de família prudente atribui a cada um seu dever, em horários e lugares específicos, e distribui comida e roupas específicas para seus servos e criadas. Mas se algum acidente ocorrer — um servo adoece, por exemplo — a lei deve ser quebrada e as condições da época devem ser observadas. Não se exige trabalho designado de um doente. Em vez disso, dá-se-lhe melhor comida e bebida e alojamentos mais confortáveis do que os outros, e o dispensa-se de sua tarefa. A menos que se faça isso, é-se tolo e perverso. E assim a prescrição da lei é deixada de lado aqui, porque a pessoa foi transformada. Portanto, se nós mesmos frequentemente falhamos na Lei e se pecamos em palavras e ações, suportemos o mesmo nos outros.
23. Tudo isso eu testei pela sabedoria; eu disse: “Serei sábio”, mas ela estava longe de mim. 24. O que é, está longe, e profundo, muito profundo; quem pode descobri-lo?
Ele se refere à sua própria experiência, contando a história do que lhe aconteceu antes, quando buscava essas coisas. “Estou instruindo vocês pelo meu exemplo”, diz ele. “Eu ensino que se deve abster-se dessa sabedoria. De fato, existe algo como sabedoria, mas não existe um homem sábio desse tipo. Fui compelido por essa experiência[35] a aprender minha lição quando quis ser excessivamente sábio e fazer com que o mundo fosse governado pelas leis mais rigorosas possíveis. Mas nada foi menos bem-sucedido do que minha tentativa.” Como eu disse, portanto, a vida humana deve ter esses dois, um legislador e um moderador, e não precisa deste último menos do que do primeiro. Assim, não basta que um cocheiro tenha bons cavalos e saiba o caminho que está percorrendo, a menos que também controle sua carroça de acordo com as condições da estrada. Portanto, ejtieixeia 36 deve ser combinada com a lei, dizendo: “Você estabeleceu bem esta ou aquela lei, e ela deve ser observada. Mas exceções devem ser feitas.”
Profundo, muito profundo.
Assim também ele disse acima (1:8): “Todas as coisas são cansativas; um homem não pode expressá- las .” Aqueles que escrevem as leis pretendem que elas sejam apenas declarações universais do que deve ser feito. Mas aqueles que estão na administração são forçados a se aprofundar em casos particulares e individuais e ver se o que deve ser feito pode ser feito. Aqui há um número infinito de casos, com um número infinito de circunstâncias diferentes. A profundidade disso é incomensurável. Portanto, o resumo do sétimo capítulo e desta exortação é: Tanto quanto puderes, sustenta a lei; e tanto quanto puderes, modera a lei. Não tentes que tudo seja observado o mais estritamente possível, e não quebres todas as leis por negligência. Teme somente ao Senhor, e Ele te ensinará todas as coisas corretamente. Pois aqueles que não têm medo são ou excessivamente justos ou excessivamente impacientes.
25. Voltei-me para saber, para investigar, para buscar sabedoria e conhecimento, e para conhecer a loucura dos maus e os erros dos estúpidos.
Trata-se de uma espécie de acréscimo à exortação e ao ensinamento que precederam, como se dissesse: “Observei com suficiente cuidado o que acontece com aqueles que desejam fazer tudo com retidão e que tudo seja feito com retidão pelos outros, e que são excessivamente justos em impor a retidão. Eles não obtêm sucesso e, por serem excessivamente sábios, tornam-se tolos. Descobri também que ser insensato pode ser o cúmulo da sabedoria. Por outro lado, investiguei todos os modos de vida para descobrir como as coisas são feitas pelos ímpios e como os tolos prosperam, para ver se é melhor abandonar todo o cuidado (como fazem os tolos) ou ser excessivamente justo.” Ele está falando novamente sobre as coisas que são feitas ou deveriam ser feitas pelos tolos e pelos ímpios, assim como antes falou sobre as coisas que são feitas pelos justos — ambos em termos políticos.
26. E achei uma coisa mais amarga do que a morte: a mulher cujo coração são laços e redes, e cujas mãos são grilhões. Aquele que agrada a Deus escapa dela, mas o pecador é preso por ela.
“Entre as coisas que notei sobre os tolos está esta, que tem a ver com as mulheres.” Pois, quando ele estava escrevendo um catálogo de vaidades, não seria bom ignorar isso. O que acontece com os tolos que tentam se manter afastados, não fazer nada e se livrar de tudo é que eles caem nas mãos de mulheres e são obrigados a servi-las. Ele está falando de uma mulher que administra as coisas e se apropria da sabedoria e do poder de governo. Ele não está falando da ira das mulheres, embora seja verdade que a mulher tem uma natureza mais tempestuosa do que a do homem. Isso não é uma condenação do sexo feminino, que é uma criação de Deus. Pois o sexo deve ser mantido distinto de suas fraquezas, assim como anteriormente ele fez uma distinção entre as obras de Deus e os conselhos dos homens.
Um ser humano é uma obra de Deus, mas, além dessa obra, ele quer seguir também seus próprios conselhos e não ser controlado apenas por Deus, por quem, no entanto, foi criado e feito. Da mesma forma, o sexo deve ser mantido distinto de suas fraquezas. Como criatura de Deus, a mulher deve ser vista com reverência. Pois ela foi criada para estar perto do homem, para cuidar dos filhos e criá-los de maneira honesta e piedosa, e para estar sujeita ao homem. Os homens, por outro lado, são ordenados a governar e a ter autoridade sobre as mulheres e o restante da casa. Mas se uma mulher abandona seu cargo e assume autoridade sobre o marido, ela não está mais fazendo seu próprio trabalho, para o qual foi criada, mas um trabalho que vem de sua própria culpa e do mal. Pois Deus não criou este sexo para governar e, portanto, eles nunca governam com sucesso.
Em oposição a isso, poder-se-ia citar as histórias sobre as Amazonas, celebradas por escritores gregos.[37] Diz-se que elas exerceram autoridade e travaram guerras. De minha parte, porém, acredito que o que se diz sobre elas é uma fábula. Os etíopes escolhem mulheres como reis e príncipes, como é seu costume; assim, Candace, a rainha da Etiópia, é mencionada no Livro de Atos (Atos 8:27). Mas isso é uma tolice, visto que príncipes tolos são frequentemente colocados no comando de um reino. Nunca houve permissão divina para uma mulher governar. É claro que pode acontecer que ela seja colocada no lugar do rei e do reino; mas então ela sempre tem um senado de líderes, por cujo conselho tudo deve ser administrado. Portanto, mesmo que uma mulher ocupe o lugar do rei, isso não confirma o direito das mulheres de governar. Pois o texto é claro (Gênesis 3:16): “Estarás sob o poder do teu marido, e ele te governará.” A mulher foi criada para seu propósito especial, a saber, usar prudência e razão na criação dos filhos. Pois cada um funciona com mais eficiência naquilo para o qual foi criado. Uma mulher pode lidar melhor com uma criança com o dedo mindinho do que um homem com os dois punhos. Portanto, que cada um permaneça na obra para a qual foi chamado e ordenado por Deus.
Portanto, a soma e a substância desta passagem são: Entre os outros obstáculos à paz que o coração humano deve ter está uma mulher, ou seja, aquela que não permite que um homem realize o que é capaz de fazer. Assim, Sansão, aquele homem excepcionalmente nobre, foi seduzido por Dalila, a mulher perversa. Pois elas não se contentam com sua roca e sua lã, mas querem prescrever aos homens até mesmo nas questões que dizem respeito à governança dos negócios públicos. “Eu digo que realmente odeio essas mulheres”, diz Salomão, “pois são mais amargas que a morte e são uma das principais causas de nossa vaidade”. Se os homens começam a ceder a essas mulheres, tudo dá errado. Foi o que aconteceu com Sansão. Salomão também foi ridicularizado pelas mulheres. Portanto, eis o que ele diz: “Assim como vi homens excessivamente justos e excessivamente perversos, também vi mulheres dominadoras. Isso é grande vaidade, não por causa do sexo, mas por causa das suas armadilhas e redes. Portanto, aqueles que são sábios na Palavra de Deus fogem dessas armadilhas, mas não do sexo feminino.”
27. Eis o que encontrei, diz o Pregador, somando uma coisa à outra para encontrar a soma. 28. que minha mente buscou repetidamente, mas não encontrei. Um homem entre mil encontrei, mas uma mulher entre todas essas não encontrei.
Isto é, pela minha própria experiência e pela minha observação dos outros, aprendi muitas coisas, nomeadamente, que todas as coisas são vaidade. Outros podem aprender isto também. Pois este é o ápice da sabedoria humana, saber que nenhuma sabedoria vale alguma coisa ou alcança alguma coisa a menos que Deus conceda sucesso. Assim disse Sócrates: “Isto eu sei, que não sei”, se ele entendeu isto corretamente.[38] Adicionando uma coisa à outra. “Uma coisa após a outra”; isto é, investiguei cada esforço individual, e em toda a parte descobri que ninguém pode viver corretamente pelo seu próprio conselho. O que a minha mente tem procurado repetidamente; isto é, vejo vaidade em mim e nos outros, e ainda assim não cesso a minha loucura nem me contenho para deixar de procurar o que sei que nunca encontrarei.
Um homem entre mil; isto é, alguém que vê que a sua sabedoria não é nada. Independentemente de quanto os homens possam ver que as coisas sempre saem de forma diferente da maneira como eles próprios planejaram, aqueles que alcançaram esta sabedoria negativa são realmente raros. Assim, Demóstenes, depois de esgotar toda a sua sabedoria, disse que a sabedoria não tinha valor. [39] Por esta razão, os filósofos diziam que tudo acontece por acaso e pela reviravolta da sorte. Eles eram incapazes de pensar que a sabedoria de Deus é maior e mais elevada do que nossos planos e esforços. Mas entre todas elas, não encontrei uma mulher. Se os homens não conseguem isso, ou, na melhor das hipóteses, apenas alguns, quanto menos as mulheres o farão!
Mais uma vez, ele está falando sobre o sexo feminino como ele é fora do estado de graça, no estado de natureza e "debaixo do sol". A natureza não faz prescrições para as obras e milagres de Deus. Entre mil homens, diz ele, pode-se encontrar em algum lugar um que, por meio de sua experiência das coisas, tenha chegado ao ponto de poder dizer: "Meus planos e esforços não dão certo e não realizam nada", e que, por isso, tenha sido tornado apto a governar. Mas entre as mulheres, nem uma sequer chegou a esse ponto, e isso por causa de uma ordenança divina. Portanto, não se deve ouvi-las nesses assuntos.
29. Eis que só isto encontrei: que Deus fez o homem reto, mas ele buscou muitas artimanhas.
Os escolásticos distorceram esta passagem até os dias atuais para provar a liberdade da vontade em oposição à graça.[40] Isso é contrário ao significado de Salomão, visto que Salomão, ao longo deste livro, fala sobre assuntos corporais. Como já foi dito anteriormente, ele não está instruindo as consciências diante de Deus, exceto que ocasionalmente se refere ao temor do Senhor, mas está instruindo o homem sobre a vida política, dizendo-lhe para controlar seu coração. O significado, portanto, é este: Deus colocou o homem em coisas, deu-lhe certas obras e uma certa tarefa. Mas o homem não permanece nessas tarefas, mas por suas concupiscências ele busca aquelas que pertencem a outra pessoa. Deus fez o homem reto, direto, para olhar para o que está à sua frente e diante de seus olhos, isto é, para as coisas que estão presentes, e para se contentar com elas.
Mas o homem, abandonando essa retidão, argumenta sobre as coisas que estão no futuro. Portanto, Salomão quer dizer: “Com base em minha investigação, descobri que ninguém vive contente com sua sorte, mas que todos têm olhos vesgos e oblíquos”. Como disse Ovídio: “As colheitas no campo de outra pessoa são sempre mais produtivas, e o gado do vizinho tem úberes maiores”.[41] E novamente: “O boi preguiçoso quer usar uma sela, e o cavalo de montaria quer arar”.[42] Pedro tinha tais olhos quando disse (João 21:21): “E este homem?” A retidão em assuntos externos, portanto, consiste em que todos olhem para frente em suas ações e em seus governos e que não olhem para outro lugar. Mas eles buscaram muitos dispositivos. Isto é, eles se ocupam com muitos planos e com pensamentos ansiosos sobre como governarão tudo no futuro, enquanto negligenciam as coisas que estão presentes e que Deus colocou diante de seus olhos. Assim, uma mulher persegue o trabalho de um homem, e um homem persegue o trabalho de uma mulher. Esta afirmação é, então, uma espécie de floreio final[43] na sua discussão sobre a vaidade humana.
Notas:
[1] O texto de Weimar tem qui, mas lemos quia.
[2] Timon de Atenas aparece em Plutarco, Vidas, “Alcibíades” e “ Antônio”.
[3] Terence, Adelphoe, 42—44.
[4] Ver p. 89, n. 20, acima.
[5] Jerônimo chegou a Belém em 386 e permaneceu lá até sua morte em 420.
[6] Parece que o “ bálsamo” ou “bálsamo” mencionado na Bíblia é o chamado Commiphora opobalsamum, que é provavelmente o que Lutero quer dizer aqui.
[7] Virgílio, Eneida, VI, 95.
[8] Ovídio, Ars amandi, II, 647.
[9] Plauto, Trinummus, Ato I, cena 2, linha 25.
[10] O texto impresso tem usuarios, mas as notas de aula acrescentam usuarios adicionais.
[11] O texto de Weimar tem quia, mas lemos qui.
[12] O texto de Weimar tem quin, mas lemos quia.
[13] Pesquisas recentes sugerem que Lutero pode ter conhecido não apenas a obra de Reuchlin (ver Luther's Works, 4, p.393, n. 79), mas também Conrad Pellicanus, De modo legendi et intelligendi Hebraeum (1504).
[14] O original tem “1 Tim.”
[15] Vergílio, Georgies, III, 99-100.
[16] Aparentemente uma referência a Antíoco IV Epifânio, da dinastia selêucida, que morreu em 163 a.C.
[17] Belisário, que morreu em 565 d.C., foi general do Império Bizantino sob Justiniano; a história de seu assassinato parece ser uma lenda medieval.
[18] A frase de Jerônimo, que aparentemente se tornou proverbial, era: Furit saepius laesa patientia.
[19] Uma adaptação do provérbio mais conhecido Finis coronat opus.
[20] Aparentemente um eco de Eclesiastes 11:28.
[21] Suetônio, Vidas dos Doze Césares, “ Augusto”, II, 2, 25; Ovídio, Amores, III, 11, 7.
[22] Horácio, De arte poetica, 173.
[23] O termo técnico retórico usado aqui é ἐπιφώνημα.
[24] Ver p. 27, n. 15, acima.
[25] Veja p. 58 acima.
[26] Isso não parece ser uma alusão literária, mas uma referência ao folclore ou à própria experiência de Lutero.
[27] Cícero, De officiis, I, cap. 10, seg. 33, que o cita como provérbio.
[28] Esta injunção, citada aqui em grego, foi atribuída a Tales de Mileto.
[29] Mais uma vez, como na p. 90 acima, uma referência à Guerra dos Camponeses de 1525.
[30] Veja também Luther's Works, 13, pp. 161–62.
[31] Cfr. Cícero, De amicitia, cap. 21.
[32] Em seu Elogio da Loucura, Erasmo escreveu: “Conivente com os vícios dos seus amigos, ignorando-os, sendo cego a eles... isso não parece loucura?... Mas é essa mesma loucura que faz amizades e as mantém depois de feitas .”
[33] As palavras não vêm de Horácio, mas de Ovídio, Tristia, II, 33; veja também Obras de Lutero, 13, p. 153.
[34] Traduzimos o latim persona pelo inglês “ person”, mas ele se refere ao papel público de alguém, ou “cargo”.
[35] O texto de Weimar tem haec, mas lemos hac.
[36] Sobre esta noção, veja também Luther's Works, 26, p. 84.
[37] Ver, por exemplo, Homero, Ilíada, VI, 186 ff.
[38] Veja, por exemplo, Platão, Mênon, 71.
[39] Ver p. 39, n. 8, acima.
[40] Veja a discussão de Lutero sobre esta passagem em Against Latomus, Luther's Works, 32, pp. 212-213.
[41] Ovídio, Tristia, V, 12, 23.
[42] Horácio, Epístolas, I, 14, 43.
[43] Ver p. 119, n. 23, acima.
✝️ Teologia de Eclesiastes 7
Sabedoria e o Temor de Deus – (Teontologia e Ética)
Eclesiastes 7 apresenta-se como um retorno ao estilo mais tradicional da literatura sapiencial, com provérbios que parecem desconexos à primeira vista, mas que compõem um mosaico ético-teológico poderoso. Qohelet aqui não se limita à observação da vaidade; ele passa a prescrever uma forma de viver que leve a sério o sofrimento, a limitação humana e a presença misteriosa de Deus. Este capítulo é, portanto, um tratado prático de ética teológica, fundado numa sólida teontologia: Deus é soberano, incompreensível, e, por isso mesmo, deve ser temido. A sabedoria é apresentada não como técnica de sucesso, mas como submissão ao divino em meio à dor, à injustiça e à incerteza.Logo nos versículos iniciais, o texto propõe máximas paradoxais: “Melhor é a mágoa do que o riso, porque com a tristeza do rosto se faz melhor o coração” (Ec 7:3). Esse é um golpe frontal na mentalidade utilitarista. Qohelet afirma que a dor, quando acolhida com sabedoria, é formativa. A sabedoria não é medida por produtividade ou prazer, mas pela capacidade de discernir o que é eterno em meio ao que é efêmero. Nesse sentido, o capítulo ecoa a afirmação de Provérbios 1:7: “O temor do Senhor é o princípio da sabedoria.” Mas aqui, o temor é vivido na ambiguidade da vida, no conflito entre o justo que perece cedo (v. 15) e o perverso que prolonga os seus dias.
A advertência central vem no v. 13: “Atenta para a obra de Deus; porque quem poderá endireitar o que ele fez torto?” Esta frase é profundamente teontológica. Qohelet não acusa Deus de injustiça, mas reconhece que há aspectos da providência que permanecem obscuros. A função da sabedoria não é explicar Deus, mas render-se a Ele com temor e humildade. O verbo “atentar” implica observar, considerar, examinar. O crente é chamado a olhar a obra de Deus mesmo quando ela parece torta aos olhos humanos, reconhecendo que há um propósito maior oculto na soberania divina.
Os versículos 14 a 18 desenvolvem essa tensão: “No dia da prosperidade goza do bem, mas no dia da adversidade considera.” Deus fez tanto um dia quanto o outro. Aqui, a sabedoria se torna resignação reverente: não há fórmula para garantir o bem, nem para evitar o mal. A ética teológica que emerge é a da confiança: viver com integridade, sem pretensão de controlar Deus por meio de rituais ou méritos. Por isso, Qohelet adverte contra o extremismo religioso: “Não sejas demasiadamente justo, nem exageradamente sábio; por que te destruirias a ti mesmo?” (v. 16). Este é um chamado à autenticidade: o temor de Deus não se expressa em legalismo, mas em honestidade diante da vida.
No v. 20, uma das afirmações mais teologicamente importantes do livro: “Na verdade, não há homem justo sobre a terra, que faça o bem e nunca peque.” Esta é uma confissão antropológica que prepara o caminho para a soteriologia bíblica. O ser humano, mesmo justo, é pecador. A sabedoria, então, é saber que se é pecador diante de um Deus santo. É um eco de Salmos 130:3: “Se tu, Senhor, observares as iniquidades, Senhor, quem subsistirá?” Qohelet reconhece que todos pecam — o que reafirma a necessidade do temor, e não da presunção.
Por fim, os vv. 23-29 revelam a limitação da sabedoria humana. “Eis aqui o que tão-somente achei: que Deus fez o homem reto, mas ele buscou muitas invenções.” A criação é boa, mas o coração humano se extraviou. A ética que vem de Deus é simples, mas o ser humano complica a existência com seus desvios. Essa é uma crítica à corrupção da moralidade e da razão humana, que rejeitam a revelação e se perdem em construções autônomas.
Eclesiastes 7, portanto, apresenta a sabedoria como temor reverente diante do mistério de Deus. Essa sabedoria não garante sucesso, mas molda o caráter. Não resolve o enigma da vida, mas ensina a viver sob ele com integridade. Deus está além da compreensão, mas é digno de confiança. A sabedoria bíblica é, em última instância, uma resposta ética ao ser de Deus.
✝️ Cristologia em Eclesiastes 7
A Sabedoria da Cruz e a Estética do Contrário
O capítulo abre com um jogo de palavras poético: “Melhor é o nome do que o bom unguento, e o dia da morte do que o dia do nascimento” (v. 1). Qohelet parte de um trocadilho hebraico — shem (nome) e shemen (óleo) — para afirmar que o caráter é mais precioso que o perfume. E ao afirmar que o dia da morte é melhor que o do nascimento, não está louvando a morte em si, mas apontando para o valor do desfecho justo. Aqui começa a cristologia do fim: em Cristo, o nome que é sobre todo nome (Filipenses 2:9) é coroado no dia da morte, não do nascimento. Seu “nome” se torna precioso porque Sua morte, como aroma sacrificial (Efésios 5:2), é o ponto culminante de Sua obediência. A sabedoria de Qohelet se inclina à sabedoria da cruz, onde o que parece ruína é redenção.
Nos versículos 2 a 4, o contraste entre casa de luto e casa de festa se aprofunda. “Melhor é ir à casa do luto do que à casa do banquete, porque aquele é o fim de todos os homens; e os vivos o aplicam ao seu coração.” Essa antropologia trágica reconhece que a morte educa. Cristo, em Seu ministério, frequenta casas de luto mais do que festas: Lázaro morto, a viúva de Naim, a menina de Jairo. E em cada uma dessas visitas, Ele não apenas conforta, mas redefine o que significa morrer. A sabedoria de Eclesiastes vê na casa do luto uma escola; Jesus faz dela um lugar de ressurreição. O que Qohelet lamenta como fim, Cristo transforma em início. Por isso, os olhos de quem crê — como os de Maria junto ao túmulo vazio — veem, no luto, a alvorada.
O versículo 5 afirma: “Melhor é ouvir a repreensão do sábio do que ouvir a canção dos tolos.” A sabedoria é austera, afiada, mas proveitosa. É a antítese da superficialidade prazerosa. Jesus, como sábio encarnado, não adula: Ele repreende Pedro, denuncia os fariseus, chora sobre Jerusalém. Sua voz é cortante como a de um profeta e reconfortante como a de um pastor. Ele é a personificação da repreensão do sábio — e quem o ouve, mesmo sob dor, vive. Na cruz, Ele repreende o ladrão impenitente, mas acolhe o outro, que soube ouvir no sofrimento o eco da salvação. Qohelet via a canção dos tolos como o riso vazio que crepita como espinhos sob a panela (v. 6); Jesus oferece, em contrapartida, a bem-aventurança dos que choram.
Ao longo dos versículos seguintes (vv. 7–12), o Pregador enumera diversas formas de corrupção da sabedoria: a opressão que enlouquece, o suborno que perverte, a impaciência que conduz ao erro. Cada provérbio aponta para uma erosão da integridade, uma fragilidade do justo. Cristo passa por cada uma dessas tentações: foi oprimido sem se corromper, recusou o suborno de Satanás no deserto (Mateus 4:9), suportou com paciência os insultos e injúrias (1 Pedro 2:23). Ele viveu a sabedoria sem desvio, e por isso se tornou para nós “sabedoria de Deus, justiça, santificação e redenção” (1 Coríntios 1:30). O que em Eclesiastes é advertência, em Cristo é encarnação.
Qohelet, em sua prudência, declara: “Não digas: Por que foram os dias passados melhores do que estes? Pois não é sábio perguntar assim” (v. 10). Essa crítica à nostalgia é profundamente cristológica: Jesus não convida ao retorno ao passado, mas à chegada do Reino. Ele diz: “O Reino de Deus está entre vós” (Lucas 17:21). A tentação de olhar para trás, como a mulher de Ló, é vencida pela urgência do hoje em Cristo. O evangelho é presente, não saudade. A sabedoria de Cristo, portanto, convida a viver o agora com os olhos fixos não no Egito de onde saímos, mas na Jerusalém celestial que se aproxima.
Nos versículos 13 e 14, Qohelet confronta a soberania divina: “Atenta para a obra de Deus; pois quem poderá endireitar o que ele torceu?” O reconhecimento da providência, tanto no dia da prosperidade quanto no da adversidade, aponta para a radical aceitação da soberania divina. Essa teologia se cumpre em Jesus, que no Getsêmani se curva ao cálice do Pai. Ele não endireita o que parece torto; Ele abraça o caminho da cruz. E assim, redime o sofrimento não negando-o, mas atravessando-o. O mistério da cruz é precisamente isso: o dia mau tornado glorioso pela obediência. Onde Qohelet se detém na contemplação da obra divina que o homem não pode alterar, Jesus entra como o Filho que confia no Pai, mesmo quando tudo parece inclinar-se ao absurdo.
O restante do capítulo (vv. 15–29) mergulha na tensão entre o justo que perece e o ímpio que prospera. “Não sejas demasiadamente justo, nem demasiadamente sábio; por que te destruirias a ti mesmo?” (v. 16). Essas palavras não são um apelo ao pecado, mas um chamado à humildade. Qohelet observa que o mundo não premia nem a justiça plena nem a impiedade extrema. Aqui, novamente, Jesus é exceção e resposta: Ele foi perfeitamente justo, e morreu. Foi plenamente sábio, e foi rejeitado. Mas sua morte não foi destruição; foi salvação. O que pareceu confirmação da tese de Qohelet — que até o justo perece — revelou-se a maior virada da história: a morte do Justo como semente da ressurreição.
O capítulo termina com um lamento: “Eis o que tão-somente achei: que Deus fez o homem reto, mas ele se meteu em muitas astúcias” (v. 29). O ser humano foi criado para a verdade, mas se perdeu no labirinto de suas invenções. É a doutrina da queda em sua forma mais densa. O Novo Testamento retoma esse diagnóstico: “Todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Romanos 3:23). Mas também oferece a solução: “o segundo homem, o último Adão, tornou-se espírito vivificante” (1 Coríntios 15:45). O homem reto foi corrompido; o Deus reto se fez homem para endireitar o caminho. Cristo é a resposta a Eclesiastes 7: não apenas o modelo da sabedoria paradoxal, mas o Redentor do homem que se perdeu nas astúcias.
🏛️ Filosofia em Eclesiastes 7
A Dialética da Sabedoria e a Melancolia do Justo: Entre Ética, Paradoxo e Finitude
Eclesiastes 7 marca uma inflexão estilística e filosófica no livro. Aqui, Qohelet adota deliberadamente o formato proverbial, mas o faz com uma intencional subversão dos valores tradicionais da sabedoria. Trata-se de um texto que articula uma filosofia da sabedoria trágica, onde o bem é preferível ao prazer, mas não garante felicidade; onde a justiça é valorizada, mas não protegida; e onde o saber pode tanto esclarecer quanto ferir. Eclesiastes 7 é, nesse sentido, um tratado existencial fragmentário sobre o limite da razão moral, a profundidade da perda e a complexidade da condição humana. O que emerge do texto é uma visão da sabedoria que não salva, mas revela; que não consola, mas desperta. Qohelet não busca oferecer um sistema, mas uma pedagogia do colapso: uma sabedoria que pensa o abismo.
O versículo 1 já apresenta essa inversão: “Melhor é o bom nome do que o unguento precioso, e o dia da morte do que o dia do nascimento.” O hebraico שֵׁם טוֹב (shem ṭov, “bom nome”) remete à reputação moral consolidada, e שֶׁמֶן טוֹב (shemen ṭov, “bom óleo”) ao prazer e à estética. A contraposição entre nome e perfume é um contraste entre o duradouro e o efêmero. E, mais radicalmente, dizer que “o dia da morte é melhor que o nascimento” (יוֹם הַמָּוֶת מִיּוֹם הִוָּלְדוֹ) é uma das sentenças mais antitéticas da sabedoria tradicional. A morte aqui não é glorificada, mas reconhecida como medida do sentido. Essa intuição ressoa em tradições estoicas e em místicas que veem no fim da vida a revelação daquilo que foi essencial. A filosofia posterior identificaria nisso uma ética da finitude: a vida é legível apenas sob a luz da morte.
Os versículos 2 a 4 insistem nessa pedagogia da dor: melhor ir à casa do luto do que à casa do banquete. O hebraico כִּי־בְזֹה קֵץ כָּל־הָאָדָם (ki-vezoh qets kol-haʾadam, “pois isso é o fim de todo homem”) articula uma antropologia do limite. O luto educa, porque confronta o homem com sua condição. Aqui, a sabedoria de Qohelet se aproxima da crítica filosófica contemporânea à distração e ao entretenimento como formas de evitar o real. Ir à casa do luto é, nesse sentido, ir ao encontro do próprio ser. Essa pedagogia da dor é parente do pensamento de Kierkegaard sobre o desespero como caminho para o autoconhecimento, e do olhar trágico que encontra na morte a única verdade incontestável do sujeito.
O v.5 afirma que é melhor ouvir a repreensão do sábio do que o canto dos tolos. A crítica ao riso e ao prazer como formas de anestesia é constante nesse trecho. O riso do tolo, diz o texto, “é como o estalo dos espinhos debaixo da panela” — barulhento, mas vazio. O hebraico כְּקוֹל הַסִּירִים תַּחַת הַסִּיר (kəqol hassirim taḥat hasir) é uma metáfora sonora e visual: os espinhos estalam, mas queimam rapidamente e não aquecem. A sabedoria que repreende é mais útil que o prazer que distrai. Essa visão se alinha a uma ética negativa que reconhece no sofrimento um lugar de verdade — um tema comum na teologia ascética e na espiritualidade da disciplina interior.
O v.7 marca um novo giro: “Verdadeiramente, a opressão enlouquece o sábio, e o suborno corrompe o coração.” Essa constatação expõe a fragilidade da própria sabedoria diante da estrutura social corrupta. O justo pode enlouquecer, e o sábio pode se perverter. Qohelet reconhece que a virtude não está blindada — ela é vulnerável à realidade. Esse ceticismo é uma crítica precoce à ideia de que o bem basta para preservar a integridade. Ele ecoa autores como Rosenzweig e Levinas, que reconhecem o mal como um evento que não se resolve conceitualmente, mas exige resposta ética que muitas vezes não encontra lugar.
A sequência de ditos paradoxais continua nos vv.8–10: o fim é melhor que o início; a paciência é melhor que o orgulho; não se deve dizer que “os dias passados foram melhores do que os de agora”. Há aqui uma desconstrução sistemática do senso comum. O hebraico אַל־תֹּאמַר מֶה־הָיָה (ʾal-tomar meh-hayah, “não digas: o que foi?”) recusa a nostalgia como forma de sabedoria. Isso ressoa com o pensamento de teólogos e filósofos que veem no saudosismo uma recusa da responsabilidade presente — um fechamento do tempo. Aqui entre em especial Epiceto (2005) quando a filosofia estoica do autocontrole, da aceitação do destino e da moderação como virtude superior se harmoniza com os provérbios sobre paciência, equilíbrio e reconhecimento do limite em Eclesiastes 7:8–10. O sabedor não vive no passado idealizado, mas na aceitação lúcida do tempo como crise e oportunidade.
Nos vv.11–12, Qohelet elogia a sabedoria como proteção, comparando-a ao dinheiro, mas ressalta que a sabedoria “preserva a vida” de quem a possui. Aqui, o autor recupera momentaneamente a confiança na sabedoria — mas não como garantia de sucesso, e sim como orientação para não sucumbir à vaidade. A sabedoria é vista como um abrigo parcial: ela não impede a morte nem a frustração, mas oferece linguagem para suportá-las. Essa concepção é próxima da filosofia prática de pensadores como Epicteto, mas também da tradição judaica rabínica que vê a sabedoria como instrumento de resistência e não como técnica de controle.
Nos vv.13–14, Qohelet adverte: “Considera as obras de Deus; quem poderá endireitar o que ele torceu?” (מִי יוּכַל לְתַקֵּן אֵת אֲשֶׁר עִוְּתֹּהוּ, mi yukhal letaqqen ʾet ʾasher ʿivvettohu). A linguagem aqui é teologicamente ousada. Deus aparece como aquele que torce — e cuja torção ninguém pode corrigir. Essa imagem do divino que não é domesticável, que desestabiliza em vez de garantir, aproxima-se da teologia apofática e da crítica da providência mecânica. A sabedoria aqui não consiste em explicar a Deus, mas em aceitar o incontrolável. Esse ponto é retomado quando se diz que tanto o dia bom quanto o mau vêm de Deus — e que o homem “nada saberá do que virá depois de si” (v.14). Essa suspensão do saber sobre o futuro é um convite à reverência e à humildade, e não à presunção da previsibilidade. Isso é algo muito presente no pensamento de Pascal (1973), ou seja, a tensão entre razão e fé, sabedoria e mistério, razão corrompida e temor de Deus como abertura à verdade — todos esses temas se condensam em Eclesiastes 7, especialmente nos vv.13–14.
A seção dos vv.15–18 entra numa das passagens mais complexas do livro: o autor afirma ter visto o justo perecer em sua justiça, e o ímpio prolongar seus dias. Em seguida, adverte: “Não sejas demasiadamente justo, nem demasiadamente sábio... não sejas demasiadamente ímpio...” (vv.16–17). Essas sentenças são desestabilizadoras, e com frequência foram mal interpretadas como apologia à mediocridade moral. Mas Qohelet não promove o relativismo: ele reconhece que a realidade é mais ambígua do que os sistemas morais admitem. O justo pode perecer, o ímpio pode prosperar. A justiça excessiva, quando usada como presunção, também se corrompe. Kierkegaard (2010) fala da ambivalência entre ética e desespero, e o papel do paradoxo na revelação da verdade existencial, aprofundam os dilemas sobre o excesso de justiça e sabedoria. Esse tipo de sabedoria é também próximo daquela encontrada em Pascal (1973), que reconhece a impossibilidade de conciliar justiça humana com justiça divina sem cair em paradoxo. Também Agostinho (1997) na contraposição entre o bem aparente e o bem verdadeiro, e a crítica à ilusão da justiça plenamente realizável no tempo, dialogam com o tema da justiça frustrada em Eclesiastes 7:15–17.
O versículo 18 encerra esse bloco com uma advertência sintética: “Aquele que teme a Deus escapa de todas estas coisas.” O temor de Deus reaparece como eixo: não como resposta, mas como limite, como consciência do abismo. A sabedoria que vale é aquela que reconhece seu próprio limite diante do mistério. Aqui se ecoa o pensamento do filósofo e escritor austríaco Buber (1999), quando afirma que visão do temor de Deus é um relação viva e não como doutrina abstrata. Tammbém o filósofo alemão Schleiermacher (2022) demonstra a ênfase na experiência do sagrado como reverência, mais que como doutrina ou moralidade, se conecta ao papel do temor de Deus como eixo de equilíbrio (v.18) em um mundo onde a moral falha. Qohelet desenha aqui uma filosofia da moderação ontológica: o homem sábio não é aquele que tudo entende, mas aquele que reconhece que viver exige equilíbrio diante da falha das categorias morais absolutas.
O restante do capítulo (vv.19–29) aprofunda esse ceticismo. A sabedoria fortalece mais que dez poderosos (v.19), mas “não há homem justo sobre a terra que faça o bem e nunca peque” (v.20). A onipresença do erro humano é afirmada sem moralismo — trata-se de uma constatação antropológica. Levinas (2000) fala sobre o reconhecimento da alteridade e da falibilidade como parte essencial da existência ética, afirmando a impossibilidade de uma justiça sem pecado. A sabedoria não é pureza, mas lucidez. E nos vv.25–29, ao buscar a sabedoria, Qohelet afirma: “Eu encontrei uma coisa entre mil homens, mas uma mulher entre todas não achei.” Embora esse trecho tenha sido lido muitas vezes como misoginia, seu sentido profundo é outro: é a frustração de toda busca por sabedoria pura. A mulher aqui representa a personificação da sabedoria ideal (como em Provérbios), mas no mundo concreto ela não é encontrada. A sabedoria buscada não se revela completamente. O final retoma o tema da corrupção humana: “Deus fez o homem reto, mas eles buscaram muitos esquemas” (v.29). A palavra חִשְּׁבוֹנוֹת (ḥishshevonot, “esquemas, invenções, maquinações”) encerra o capítulo com a imagem de um ser que, criado para a retidão, se perdeu em complexidades artificiais — na linguagem, na técnica, na religião.
No campo da exegese bíblica que explora as profundezas da psique e da literatura, a obra “The Murmurings Deep: Reflections on the Biblical Unconscious”, de Avivah Gottlieb Zornberg, oferece uma lente fascinante para a compreensão de textos desafiadores como Eclesiastes 7. Zornberg investiga as camadas inconscientes do discurso bíblico, revelando motivações, conflitos e paradoxos que residem sob a superfície narrativa. Sua leitura psicológica e literária se alinha perfeitamente à complexidade ambígua de Eclesiastes 7, um tratado que se move entre a ironia mordaz, o paradoxo da sabedoria e da loucura, e um tom existencial denso, que capta a fragilidade e as contradições da condição humana. Ao iluminar o “inconsciente bíblico”, Zornberg nos convida a uma imersão que reconhece e valoriza a profundidade e a resistência de Eclesiastes em ser simplificado, ecoando sua própria sabedoria enigmática.
No cenário de um mundo percebido como fragmentado e sem garantias absolutas, Paul Tillich (2005) desenvolve seu potente conceito de “coragem para ser”. Para Tillich, essa coragem não é a ausência de medo, mas a capacidade de afirmar a própria existência e o significado da vida apesar da ansiedade existencial e da ameaça do não-ser. Essa ideia ressoa profundamente com a tentativa de Qohelet (Eclesiastes) de sustentar uma “sabedoria trágica”. O pregador bíblico, ao declarar a futilidade (hevel) de grande parte da experiência humana, desmascara a falência de sistemas morais absolutos e a ilusão de que a razão ou o esforço podem garantir plena justiça ou satisfação. Ambos os pensadores confrontam a profundidade da perda e a complexidade da condição humana, mas enquanto Qohelet conclui com um ceticismo que ainda aponta para o temor a Deus, Tillich propõe a coragem como o próprio fundamento para manter a integridade do ser em face do absurdo e da contingência.
Índice: Eclesiastes 1 Eclesiastes 2 Eclesiastes 3 Eclesiastes 4 Eclesiastes 5 Eclesiastes 6 Eclesiastes 7 Eclesiastes 8 Eclesiastes 9 Eclesiastes 10 Eclesiastes 11 Eclesiastes 12
📚 Bibliografia:
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