Apocalipse 11 — Comentário Literário da Bíblia

Apocalipse 11

A proteção espiritual de Deus aos santos é ilustrada pela medição do santuário, em 11.1,2. O testemunho profético da igreja recebe agora expressão alegórica no ministério das duas testemunhas, cujo testemunho fiel e milagres os torna alvo da ira da besta. Após a morte e ressurreição das testemunhas, a cidade da Babilônia é devastada por um terremoto, ao soar da sétima trombeta.

Apocalipse 11.1 — A medição do santuário, em 11.1, é mais bem entendida como um cumprimento inicial da profecia do templo de Ezequiel 40—48, em que o estabelecimento seguro e a subsequente proteção do templo é metaforicamente retratada por um anjo que mede as diversas partes do templo (assim Lohmeyer 1970, p. 89-91; Ernst 1967, p. 130; Kraft 1974, p. 152; Prigent 1981, p. 159). Em Apocalipse 11, a medição (análoga à aplicação do “selo”, no cap. 7) conota a presença de Deus, que está garantida na comunidade do “templo” (a igreja) que vive na terra antes da consuma­ção. Essa segurança espiritual é contrastada com a perseguição à igreja, simbolizada pelo pisoteamento do pátio exterior (v. comentá­rio de 11.2 adiante). Essa aparente “espiritualização” do templo tem amplo precedente no NT (cf. Jo 2.21; ICo 3.16,17; 6.19; Ef 2.21; lPe 2.5) como também no judaísmo antigo (cf. 1QS V, 5-6; VIII, 4-10; IX, 3-6; XI, 7-8; CD-A III, 19-IV, 6; 4Q174 1 I, 2-9) (assim Gãrtner 1965, p. 16-44; McKelvey 1969, p. 45-53), e combina bem com a natureza geralmente simbólica das imagens de Apocalipse. Em vez de “espiritualizar” a cena, no entanto, provavelmente seja melhor adotar uma concepção literal e escatologicamente progressiva do significado essencial do Templo do AT, que é a presença de Deus expandida e arquitetonicamente ilimitada entre seu povo no final dos tempos (sobre a qual, v. Beale 2004).

Apocalipse 11.2 — A parte exterior do santuário quanto a cidade santa representam o povo de Deus que será perseguido. Esse é o momento, previsto por Daniel, em que “o lugar santo [to hagion] e o exército serão pisados [sympatêthêsetaí]” (Dn 8.13 [assim lM c 3.45,51; 4.60; 2Mc 8.2, que utilizam katapatcõ; Is 63.18 usa o mesmo vocabulário de Daniel para dizer que “os nossos adversários pisaram o teu santuá­rio”; cf. SI 79.1]). Pode haver também uma alusão parcial ao texto de Zacarias 12.3 LXX, num possível paralelo à ideia do “pisoteamento” de Daniel 8.13: “Farei de Jerusalém uma rocha pisoteada por todas as nações, todo aquele que a pisotear zombará dela categoricamente” (Bauckham 1993a, p. 270-1). O fato de as nações “pisarem a cidade” é equivalente a “pisar o altar” e o templo (assim Si. Sal. 2.2,19; 7.2; 17.22). A expressão incomum “jogar o pátio para fora do templo” pode ser uma tradução de Daniel 8.11 — “o lugar do seu santuário foi jogado por terra” — por João (Bauckham 1993a, p. 267-73). O total de “quarenta e dois meses” não é literal, mas simboliza o prolongado período escatológico de tribulação repetidamente profetizado por Daniel (7.25; 9.27; 12.7,11,12). A ocorrência de “quarenta e dois” aqui e em 13.5 também lembra o ministério de juízo de Elias (v. comentário de 11.6 adiante) e a peregrinação de Israel no deserto após o Êxodo, que totalizou 42 acampamentos (v. Nm 33.5-49; v. tb. Morris 1987, p. 147). Pode-se também contar os 42 anos de peregrinação total de Israel no deserto, pois parece que eles já estavam no deserto havia dois anos quando foram penalizados a permanecer por mais quarenta anos, até a morte da primeira geração (assim Farrer 1964, p. 132). Em 12.6, a comunidade messiânica ( = a “mulher”) é protegida contra o ataque do dragão durante três anos e meio ao buscar refúgio no deserto, “onde já havia um lugar preparado por Deus”. A cena em 12.14 é quase idêntica. O “lugar” [topos) em que os cristãos são mantidos a salvo fora do alcance das investidas do Diabo provavelmente não é outro senão o santuário invisível de Deus, uma vez que este será alvo de ataques durante os três anos e meio, segundo Daniel, e por ser essa a ideia em Apocalipse 11.1,2 e 13.5,6. Tal ideia se confirma pelo fato de que topos pode ser sinônimo de “santuário” no NT e é muitas vezes utilizado como sinônimo generalizado do “santuário” na LXX, inclusive em Daniel 8.11 (sobre o qual, v. comentário de 12.6 adiante). Os três e anos e meio, portanto, simbolizam o tempo entre a morte e ressurreição de Cristo e sua segunda vinda, considerada o cumprimento da tribulação de três anos e meio profetizada em Daniel 7 ,9 e 12.

Apocalipse 11.3 — Por que as duas testemunhas são comparadas a dois candelabros, em vez de sete, como era de esperar (v. cap. 1)1 A lei do AT exigia um mínimo de duas testemunhas para que houvesse um julgamento justo (Nm 35.30; Dt 17.6; 19.15). Assim, as duas testemunhas não são dois profetas literais, mas simbolizam o testemunho profético coletivo da igreja. As testemunhas estão “vestidas de pano de saco”. Isso mostra que sua mensagem de juízo resultará em lamentação, possivelmente com a esperança de que alguns venham a se arrepender. No AT, o pano de saco se refere principalmente ao lamento em face do juízo, embora, às vezes, o arrependimento também esteja em vista. Das aproximadamente 42 ocorrências da expressão “pano de saco” no AT, 27 se referem apenas ao lamento, e outras 13 juntam a lamentação ao arrependimento (v., e.g., Gn 37.34; 2Sm 3.31; Is 37.2; Dn 9.3).

Apocalipse 11.4 — As ilustrações das duas oliveiras e dos dois candelabros acrescentadas à expressão final de 11.4 provêm de Zacarias 4.14 (cf. 4.2,3,11-14). Na visão de Zacarias, o candelabro representa o Segundo Templo (a parte que representa o todo), do qual Zorobabel lançou os alicerces. De cada lado, havia uma oliveira, que fornecia o azeite para acender as lâmpadas. As oliveiras são interpretadas como “os dois ungidos que servem o Senhor de toda a terra” (4.14). Nesse contexto, “os dois ungidos” de 4.14 se referem necessariamente a Josué, o sumo sacerdote, e Zorobabel, o rei. O estabelecimento e a preservação do verdadeiro templo, apesar da oposição, foram introduzidos em Apocalipse 11.1,2, e Zacarias 4.14 é o clímax de uma seção sobre o mesmo assunto. Assim como o sacerdote e o rei eram instrumentos importantes utilizados pelo Espírito para o estabelecimento do Templo contra qualquer oposição, aqui as duas testemunhas são capacitadas pelo Espírito para desempenhar o mesmo papel com relação ao templo dos últimos dias, em 11.1,2. Assim, as testemunhas, como “candelabros”, exercem seu ministério luminescente no lugar santo do templo invisível, o mesmo local em que os candelabros eram posicionados no templo do AT. Nesse sentido, 11.4 continua o tema de 11.1,2: os fiéis como parte do verdadeiro templo escatológico. A imagem dos candelabros é forte indício da natureza coletiva das testemunhas, uma vez que antes disso a única menção a candelabros no livro (cap. 1—3) faz referência a igrejas (um dos motivos de se mencionarem apenas dois candelabros aqui pode ser o fato de que apenas duas igrejas nas cartas não foram repreendidas por Cristo), de modo que a igreja fiel remanescente é o foco aqui. O contexto mais amplo de Zacarias 4 mostra a riqueza da conexão com o presente contexto. 1) Em Zacarias 1.16,17 e 2.1-5 um anjo “mede” Jerusalém como sinal de que ela certamente será restabelecida, para que “o meu templo [seja] edificado ali”, e de que Deus será “a glória no meio dela” (cf. Ap 11.1,2). 2) Satanás, entretanto, junto com os poderes do mundo, opôs-se ao restabelecimento do templo de Deus em Jerusalém(Zc 3.1,2; 4.7), assim como a besta e o mundo se opõem à obra invisível da construção do templo pelas testemunhas (Ap 11.5-10), cuja tarefa é em parte aumentar o tamanho do templo, ao fazer com que outras pessoas sejam acrescentadas a ele por meio da pregação e de se viver o evangelho (cf. o papel das igrejas como “candelabros”, em Ap 2 e 3, o que inclui ser a “fiel testem unha” [2.13]).

Apocalipse 11.5 — A mensagem sobre o juízo divino pode ser comparada a um fogo na boca dos profetas do AT. Observe especialmente Jeremias 5.14: “Porque disseste tal palavra, converterei minhas palavras em fogo na tua boca, [...] e o fogo o consumirá”. O justo juízo do Messias é proferido de modo semelhante em Isaías 11.4: “ [O Senhor] ferirá a terra com palavras de juízo e matará o ímpio com o seu sopro”. O juízo messiânico é também retratado de modo simbólico em outras obras do judaísmo [ 4 Ed 13.25-39; Sal. 17.24-26; cf. l En 62.2; m . ‘'Abot 2.10). De modo semelhante, o juízo de Deus é retratado no AT como um “fogo devorador” que sai de sua boca (2Sm 22.9; Sl 18.8; cf. Sl 97.3 com Mart. Is. 4.18). Elias invocou o fogo do céu diversas vezes, que consumiu os soldados do rei Acazias e levou à morte do rei (v. 2 Rs 1.10-17: [...] kai katephagen [“desceu fogo [...] e destruiu”]; v. tb. José em Jos. Asai. 25.5-6; Abraão em T. A h . [A] 10.11-12]). Elias invocou esse fogo do céu a fim de “provar [...] que ele era um verdadeiro profeta” (Josefo, A n t. 9.23 [cf. 2Rs 1.10]). O eco do episódio de Elias aqui prenuncia a referência direta a ele no versículo seguinte. O ofício profético de Moisés foi demonstrado também por sua capacidade de invocar fogo do céu para julgar os ímpios. Moisés e Elias são, às vezes, comparados com base nessa capacidade (Filo, Moisés 2.282-284; Pesíq. Rab. Piska 4). Assim, a palavra de duas testem unhas torna-se instrumento de juízo contra os que a rejeitam (ao menos no sentido de que ela se torna um dos motivos do juízo, mas é provável que outras questões estejam envolvidas).

Apocalipse 11.6 — “Fechar o céu” é uma alusão à chuva retida por Elias em Israel (lRs 17). É digno de nota que Lucas 4.25 e Tiago 5.17 afirmam que esse período foi de três anos e meio. A água que se transforma em sangue obviamente aponta para Moisés (Êx 7.17-25). É possível que a junção de Elias (talvez simbolizando os Profetas) e Moisés (simbolizando a Lei) aponte para o testemunho fiel que as testemunhas dão de toda a mensagem do AT. É fundamental observar que os mesmos tipos de pragas infligidas à terra nos capítulos de 6 a 11 emergem neste ponto, em 11.5,6, do ministério das duas testemunhas. De acordo com o argumento defendido aqui, o entendimento simbólico das testemunhas indica que o juízo sobre os opressores é invocado pelas orações dos santos fiéis (cf. 6.9; v. esp. 8.1-5). A semelhança com o padrão do confronto entre Moisés e o faraó é evidente e reforçado pela última sentença de 11.6, em que se lê que a cidade de Deus tem poder para “ferir a terra com todo tipo de praga”. Isso segue o texto de I Samuel 4.8, que apresenta em resumo todas as pragas do Egito. Daí a concepção de que Elias e Moisés pressagiam o testemunho judicial da comunidade escatológica da aliança. Havia uma expectativa judaico-veterotestamentária, profundamente arraigada, de que os profetas Moisés e Elias voltariam antes do final da história para restaurar Israel e julgar os ímpios. (Sobre Moisés, a esse respeito, v., e.g., Dt 18.15; Jo 1.21; 6.14; 7.40; At 3.22,23; 4Q175 4-8; lM c 4.44-46; Josefo, Ant. 20.97-99; Midr. Rab . de Êx 2.4; sobre Elias, v. Ml 3.1-5; 4.1-6; Eo 48.1-10; Mt 11.10-14; 27.47,49; Mc 9.11- 13; 15.35,36; Lc 1.15-17; L.AB .4 8.1 ; m . ‘Ed . 8.7; b. Menah . 45a; sobre a expectativa de que ambos voltariam, v. Midr . Rab . de Dt 3.17; 4 Ed 6.26 [embora este possa se referir a Elias e Enoque]; v. tb. Pesiq. Rab. Piska 4,que igualmente traça extensas comparações entre os dois.)

Apocalipse 11.7-8 — A derrota dos santos é cunhada na linguagem de Daniel 7. Em Daniel 7.3, a visão diz que “quatro grandes animais [...] subiam do mar” [tessara théria megala anebainon ek tês thalassés), enquanto Apocalipse 11.7 registra uma “besta que surge do abismo” (to thêrion to anabaiuon ek tês abyssou) (v. tb. Dn 7.8,21). A passagem de Daniel 7.21 profetiza que um reino terreno do final dos tempos perseguirá e derrotará o povo de Deus. Depois disso, os próprios perseguidores serão julgados, e os santos herdarão o reino do mundo (Dn 7.22-27). Visto que Daniel 7.21 se refere a um ataque contra os santos israelitas, também aqui a besta não guerreia apenas contra dois indivíduos, mas contra a comunidade dos fiéis. Que essa visão das múltiplas testemunhas é plausível pode ser comprovado pela mesma alusão a Daniel 7.21 vista em 13.7, em que o termo “santos” é substituído por “testemunhas”: “atacar os santos e vencê-los”. A descrição futurista de Apocalipse 11.7 é um cumprimento de Daniel 7.21. A cidade em 11.8 é como Sodoma porque é perversa e será destruída em juízo (v. Dt 32.28-33; Is 1.9-15; Jr 23.14,15; Mart. Is. 3.10). A cidade é como o Egito porque persegue os santos. De acordo com Joel 3.19, o Egito é o lugar onde se comete violência “contra o povo de Judá, em cuja terra derramaram sangue inocente”. Sodoma e Egito aparecem juntos numa comparação semelhante em Sabedoria de Salomão 19.14-17 (de igual modo, com relação a Sodoma somente, Dt 29.22-26; Is 3.9). As duas nações exercem influência sedutora sobre o povo de Deus (Ez 16.26,44-57). O Egito se tornou um símbolo para todas as nações que perseguiam Israel (v. Midr. Rab. de Gn 16.4; Midr. Rab. de Lv 13.5; cf. Mek. R. Ish. Beshallah 6). Assim como Israel se tornara como Sodoma e Egito e seria punido como elas (Am 4.10,11), da mesma forma Apocalipse 11.8 equipara o mundo a Israel, Sodoma e Egito e o sujeita ao mesmo destino.

Apocalipse 11.11 — A imagem da ressurreição das testemunhas é extraída de Ezequiel 37.5,10, uma profecia da restauração divina de Israel do cativeiro babilônico. João aplica Ezequiel à igreja restaurada porque a vê por fim livre da peregrinação terrena de cativeiro e sofrimento. Isso demonstra que seus membros constituem o verdadeiro povo de Deus (cf. Ez 37.12,13), o cumprimento da profecia acerca de Israel em Ezequiel 37. “Os que viram [a libertação das testemunhas] foram tomados de grande temor”. O temor dos habitantes da terra é semelhante ao dos egípcios surpreendidos diante das pragas e da libertação dos israelitas por meio daqueles flagelos: eles “foram tomados de grande temor” (cf. Ap 11.11b com SI 105.38). A mesma descrição é aplicada aos ímpios que habitavam a Terra Prometida (cf. Êx 15.16; Jn 1.10).

Apocalipse 11.12 — A recepção das testemunhas na nuvem mostra aprovação divina. A validade da autoridade profética de Elias foi confirmada por Deus da mesma forma no final de seu ministério (2Rs 2.11). De igual modo, o NT e a tradi­ção judaica sustentavam que o ministério de Moisés foi concluído com sua “assunção” ao céu (v. Filo, Sacrifícios 8; Josefo, Ant. 4.320- 326; Midr. Rab. de Dt 9.5; Sipre de Dt Piska 357; Asc. Mois. 10.11-13; v. tb. as implicações de Jd 9, provavelmente baseados na interpretação de Dt 34.5,6; v. tb. a ascensão de Jesus em At 1.9,11).

Apocalipse 11.13 — A expressão “grande terremoto”, na verdade, deriva de Ezequiel 38.19, em que seismos megas se refere ao julgamento definitivo de Gogue, no final da história, quando este tentar destruir o Israel restaurado (v. Hughes 1990, p. 130). A referência a Ezequiel 38 é natural porque vem logo após Ezequiel 37, oque explica a restauração de Israel pela metáfora da ressurreição. O mesmo padrão é seguido em Apocalipse 11.11-13, o que indica o cumprimento futuro da profecia de Ezequiel. A última parte do versículo propõe a difícil questão sobre se os sobreviventes do terremoto se tornaram fiéis genuínos ou permaneceram em seu antagonismo, ainda que obrigados a reconhecer o poder de Deus. A reação de ficar “atemorizados” e dar “glória ao Deus do céu” pode ser entendida facilmente como uma analogia positiva de Daniel 4.34 (cf. Is 42.12; Jr 13.16; TM 5.16; cf. tb. Dn 5.21-23; Lc 7.16; 17.18; 18.43; lPe 2.12; T. Ab. 18.11), especialmente por causa da linguagem semelhante e porque ambos os contextos dizem respeito aos habitantes da Babilônia, a “grande cidade” (cf. Dn 4.27- 30; Ap 11.8). Entender em sentido figurado a “décima parte da cidade” que caiu e os “sete mil homens” que morreram está de acordo com esse ponto de vista. A décima parte que é julgada pode ser uma contrapartida irônica da décima parte que foi poupada no AT (cf. Is 6.13, que a maioria dos estudiosos vê como uma referência a um remanescente fiel), enquanto os sete mil que morreram seriam também uma contrapartida irônica dos sete mil adoradores fiéis de IReis 19.18 (cf. Rm 11.4). Além disso, a exortação às nações infiéis em 14.7 — “Temei a Deus e dai-lhe glória” — e a expressão aplicada às nações em 15.4 — “Senhor, quem não te temerá e não glorificará o teu nome?” — são as mais fortes evidências de que a linguagem semelhante de 11.13 faz alusão à fé salvadora (esp. realçado em Bauckham 1993a, p. 273-83; W. J. Harrington 1993, p. 123; Krodel 1989, p. 228; Schüssler Fiorenza 1991, p. 79). Por fim, pode ser significativo o fato de a cidade cair antes do soar da sétima e última trombeta, em contraste com o episódio da queda de Jericó, em Josué 6. Por outro lado, a resposta de Nabucodonosor em Daniel 4 pode não expressar uma verdadeira conversão à fé de Israel. Em outras passagens no AT “dar glória a Deus” nem sempre indica a resposta dos verdadeiros israelitas: por vezes, os incrédulos são obrigados a reconhecer a realidade da soberania de Deus (e.g., Js 7.19; ISm 6.5; cf. lPe 2.12; o caso de Jo 9.24 pode ser entendido das duas maneiras; v. tb. Pv 1.24-32; cf. At 12.23). É o que também indica o precedente de Daniel 2.46,47, em que o rei reconhece a soberania de Deus, mas por pouco tempo, já que em Daniel 3 ele tenta obrigar os santos a adorar um ídolo. Além disso, o paralelo de Apocalipse 14.7 — “Temei a Deus e dai-lhe glória” — pode bem ser entendido como dirigido aos que estão prestes a ser julgados, como acontece com Nabucodonosor em Daniel 4.34 LXX, passagem a que 14.7 faz alusão (sobre o qual, v. Beale 1999a, p. 750-4). A expressão “Deus do céu” que encerra o versículo 13, no AT sempre se refere à esfera celeste, onde Deus reina sobre os acontecimentos na terra (assim o texto hebraico de Gn 24. 7; 2Cr 36.23; Ed 1.2; 6.9,10; 7.23; Ne 1.4,5; 2.20; Sl 136.26; Dn 2.18,19,37,44; Jn 1.9; provavelmente também Gn 24.3; Ed 5.11; 7.12,21). O título ocorre três vezes na expansão que a LXX faz do relato do louvor de Nabucodonosor a Deus, em Daniel 4.37. Juntamente com as quatro outras ocorrências em Daniel 2, esta é mais uma evidência do contexto de Daniel 4. O contexto do AT por si só pode não ser suficiente para determinar se temos um quadro de pavorosa sujeição ou de arrependimento genuíno. Quem acredita num arrependimento verdadeiro aqui terá dificuldades para entender a passagem como uma conversão literal a Deus no último minuto antes do Juízo Final (sinalizado pelo terremoto), uma vez que tal situação não é prevista em parte alguma de Apocalipse. Pode-se também pensar num arrependimento dos incrédulos em curso ao longo da história, em face do testemunho fiel da igreja e dos atos de juízo de Deus, mas essa teoria não se encaixa na finalidade escatológica da cena.

Apocalipse 11.18 — O julgamento das nações, como em 8.8 e 19.2, sem dúvida segue o padrão do anúncio do juízo sobre a Babilônia histórica em Jeremias. A Babilônia é um tipo da comunidade escatológica mundial que será julgada no final dos tempos. Esse fato liga 11.18 à Babilônia, “a grande cidade” que foi destruída em 11.13. Em contrapartida, há bênção para “os que temem o Senhor , tanto pequenos como grandes” (SI 115.13). Isso pode ainda ser indício de que a linguagem reminiscente de Daniel 4.34 LXX em 11.13 (par. com 14.7) se refere ao juízo, não à salvação.

Apocalipse 11.19 — A aparição da arca da aliança pode ter origem no relato da queda de Jericó, onde a arca desempenha um papel de destaque junto com as trombetas. A arca também simboliza a graciosa presença de Deus em sua comunidade redimida.

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