Ezequiel 3 — Comentário Teológico

Ezequiel 3 — Comentário Teológico

Ezequiel 3 — Comentário Teológico


Os primeiros versículos deste capítulo dão continuidade ao último parágrafo do capítulo 2, portanto não há uma divisão entre os dois. Começar um novo capítulo aqui é um erro infeliz. Ver na Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia o artigo denominado Versículos, Divisão da Bíblia em.


3.1
Filho do homem. Ver as notas sobre este titulo em Eze. 2.1. Judá receberia a palavra de Yahweh. Depois do cativeiro assírio do norte (as dez tribos), Judá tornou-se Israel, e Israel, tendo voltado do cativeiro babilônico, era essencialmente composto por um pequeno remanescente de Judá. O ministério de Ezequiel começou logo depois da queda de Jerusalém. O profeta acompanhou a primeira das três deportações. Ver notas adicionais em Jer. 52.28. Sem dúvida, o profeta já tinha alguma atividade antes do ataque da Babilônia, mas seu ministério principal se realizou entre os cativos. Ver as notas expositivas em Eze. 1.1 e também os comentários em Eze. 2.7. O vs. 11 deste capítulo aplica as profecias aos cativos; determinados versículos, todavia, falam de tempos anteriores ao cativeiro, demonstrados nas notas em Eze. 4.1-3. 

Come. A ordem divina de “comer” o rolo já fora dada (Eze. 2.8) e é repetida. Assimilando a mensagem, o profeta teria capacidade de transmiti-la ao povo.

3.2
Ele me deu a comer o rolo. O ato de comer o rolo foi consumado pelo profeta obediente, que ficou preparado para a árdua tarefa de enfrentar os rebeldes de Judá. O Targum traz aqui: “Eu inclinei minha alma a ele e ele me ensinou, e me fez sábio concernente ao que foi escrito no rolo”. Filho do homem. Ver as notas sobre esta expressão em Eze. 2.1. Yahweh normalmente usava este título quando se dirigia ao profeta. O rolo comido encheu a boca, o estômago e os intestinos do homem, tomando conta dele. Assim ele ficou cheio da mensagem e preparado para entregá-la. Na boca, o rolo tinha o sabor de mel (muito doce), a substância mais doce conhecida pelos povos antigos. Mas a mensagem a ser entregue se revelaria amarga para o povo. O paralelo em Apo. 10.9-10 diz que o rolo era doce na boca, mas amargo no estômago. A mensagem era doce pelo fato de assim ser a sua fonte, mas sua realização era extremamente amarga, por causa da natureza perniciosa do povo. O maná dos céus era doce (Êxo. 16.31), mas tornou-se amargo pelos abusos dos homens. Cf. Jer. 15.16, Sal. 19.10; 119.103.

A Segunda Comissão do Profeta (3.4-9)

3.4
Ver informações sobre as cinco comissões de Ezequiel, na introdução ao capítulo 2. Este versículo talvez implique que o profeta devesse ir para Jerusalém (ainda não destruída), para ali entregar a mensagem, pessoalmente; ou as palavras se aplicam ao pequeno restante de Judá, levado cativo para a Babilônia e chamado “Israel”. O vs. 11 limita o assunto aos cativos, mas tal limitação pode não ser absoluta.

Casa de Israel. Esta expressão é usada 101 vezes, neste livro, e Judá ou o seu restante normalmente está em pauta. Ver Eze. 6.11 e 8.11-12. A palavra divina seria entregue àquele povo (Eze. 2.8-3.3), e os resultados subsequentes seriam lamentações e gritos de dor e agonia (Eze. 2.10). O julgamento de Yahweh, efetuado através dos babilônios, seria extremamente amargo, mas, ao mesmo tempo, seria um fogo refinador. Todos os julgamentos de Deus são remediais. Aquele tempo de terror seria o parto de Judá (Israel). Dali emergiria o Novo Israel, muito pequeno, mas viável para começar tudo de novo. Em Eze. 2.3-7, o profeta recebeu a primeira comissão. Aqui, ele é equipado para a árdua tarefa de entregar a mensagem de maneira efetiva.

3.5
A missão do profeta não seria obstruída por nenhuma barreira linguística ou cultural. Os recebedores da mensagem falavam a mesma língua do profeta e eram produtos da mesma cultura. “A casa de Israel” (ver as notas em Eze. 3.4) compartilhou a lei de Moisés e as palavras dos profetas com Ezequiel. Para realizar sua missão, Jonas precisou ultrapassar as barreiras de linguagem e cultura, mas venceu, embora relutantemente, por causa de seu racismo. Ezequiel escapou destes obstáculos, mas não seria fácil derrubar a apostasia. Ele enfrentou um povo obstinado, duro e apóstata (Eze. 2.3 ss.). As pessoas eram como um bando de escorpiões e cobras, com o rosto duro e arrogante, falando palavras ásperas e estúpidas.

Este versículo repete, essencialmente, as idéias dos vss. 4-5, acrescentando somente que a mensagem não seria aceita, a despeito dos esforços heroicos do profeta, embora todos entendessem perfeitamente seu conteúdo. Não houve mistério. Ironicamente, se o profeta tivesse pregado a povos estrangeiros, teria encontrado aceitação de sua pessoa e mensagem. Ver o capítulo 23, que também contém este pensamento. Mat. 11.21,23 fala algo semelhante. E experiência comum, na igreja, que pessoas criadas sob seu ministério freqüentemente sejam duras e menos receptivas do que os descrentes. Verdadeiramente, a pregação repetida revolta os ouvintes saturados, que ficam indiferentes, se não revoltados, com as muitas repetições “da palavra”, pregadas com pouca imaginação. E sempre entra o coração perverso do ouvinte, porque, no fundo, ele é um rebelde e pecador contumaz, que exibe uma conversão superficial; para ele, a igreja é um clube social ou, pior ainda, um palco de diversões.

3.7
Casa de Israel. Ver as notas sobre esta expressão no vs. 4. Esta casa do diabo já havia abandonado Yahweh e sua herança espiritual, ou não teria estado cativa na Babilônia. Mesmo assim, o Poder Divino não desistiu. Mandou o profeta fazer mais uma tentativa de reformar os reprovados. Rejeitar o profeta é, ipso tacto, rejeitar Yahweh.

Fronte obstinada e dura de coração. Isaías falou que aquele povo tinha o pescoço duro como ferro e a testa como bronze. A rebelião tomou conta do país inteiro. A casa real liderava a revolta e a apostasia. Judá se perdeu em sua idolatria-adultério-apostasia. Cf. João 15.20. “Aquele povo tinha a testa de uma prostituta, um rosto impudente, e havia perdido habilidade de sentir vergonha; tinha um coração como pedra. Houve poucas exceções” (John GUI, in loc.).

3.8
O profeta teria de enfrentar àqueles rostos duros e palavras irônicas. Precisaria, também ele, de uma testa dura, para poder enfrentar a de seus oponentes. Para efetuar o bem e entregar sua mensagem, deveria ser mais obstinado do que os reprovados na realização de suas maldades. Ver Jer. 1.18. Este versículo expressa a oposição entre o povo, porque as pessoas viviam em mundos diferentes e em conflito. Isto é ilustrado dramaticamente em Amós 7.10-17; Jer. 20.7-18 e 26.1-24. O profeta precisava da força de um herói e da determinação de um anjo poderoso, para cumprir bem sua tarefa. A maioria raramente está com a razão, e o profeta não encontraria amigos para ajudá-lo.

O nome Ezequiel significa “fortalecido por Deus”, e essa força deveria tornar-se um fato na vida dele. Ver sobre Ezequiel (Pessoa) no Dicionário. Recebendo força adicional do Espírito, o profeta não falharia, embora fosse amargamente atacado por seus inimigos. Sua força maior (divina) venceria a força menor (do demônio). 

3.9
Dureza contra Dureza. Yahweh ilustra como Ezequiel seria mais forte do que os reprovados e ganharia a batalha moral e espiritual. Temos aqui um símile que ilustra dureza superior. A esmeralda é mais dura que a pederneira. A NCV e a Atualizada definem o diamante como mais duro que pedra (ou pederneira). A testa fala de determinação ou desafio (ver Isa. 48.4; 50.7). A determinação e a dureza do profeta venceriam a resistência dos pecadores. A pederneira era a pedra mais dura conhecida na Palestina, depois do diamante (ver Joel 5.2-3); era utilizada para fabricar armas e instrumentos agrícolas e para fazer facas. Obviamente, a determinação do profeta venceria qualquer tipo de dureza dos apóstatas. Ver Jer. 1.18 e cf. Isa. 50.7 e Jer. 8.17. O símile exibe a coragem e a fortaleza de mente que o profeta havia recebido da Fonte Divina. Nenhuma arrogância ou dureza de oponentes o venceria ou anularia sua missão. Ver Eze. 2.6.

A Terceira Comissão do Profeta (3.10-11)

3.10
Os capítulos 2-3 têm cinco comissões distintas. Ver a introdução ao capítulo 2, para uma discussão. O profeta tinha de acreditar em todas as palavras da mensagem dos céus e depois transmiti-las para os homens na terra. Ele precisava receber as palavras em seu coração e ouvi-las com ouvidos espirituais, ou seja, ter absoluta recepção (vs. 11). Deus preparou o seu coração com contatos místicos. O profeta já sentia a presença divina. Cf. Pro. 16.1 e Sal. 10.17. O homem preparado recebeu e entregou uma mensagem especialmente preparada para aquela hora de crise.

3.11
As Três Deportações. Depois do ataque do exército babilônico, que quase eliminou toda a nação de Judá, houve três deportações do pequeno restante do povo para a Babilônia. Para detalhes, ver Jer. 52.18. Quando Ezequiel começou seu ministério entre os cativos, tendo participado da primeira deportação, Jerusalém ainda não havia sofrido destruição, mas isto não demoraria. As profecias de Ezequiel se aplicaram tanto ao povo de Jerusalém quanto aos cativos, já na

Babilônia. A casa de Israel (ver as notas em Eze. 3.4), isto é, Judá, era o objeto das denúncias dos céus. O presente versículo parece limitar Israel aqui às pessoas cativas na Babilônia. A despeito dos sofrimentos experimentados, eles permaneceram duros, obstinados e apóstatas. Assim, foi necessária sua purificação, como a prata se purifica no fogo. Talvez uma pequena porção fosse realmente purificada e se tornasse o Novo Israel, depois do cativeiro. Idéias. 1. 0 profeta proclamava a mensagem do Soberano, Adonai-Yahweh. 2. Ele recebeu outro aviso sobre a tarefa que tinha para cumprir (Cf. Eze. 2.4-5). 3 .0 sucesso dele seria a realização da pregação e não a reação favorável do povo; alguns o escutariam, outros não; alguns obedeceriam, outros não. 4 .0 ministério de Ezequiel seria pequeno, já que dirigido a poucas pessoas, e esta condição continuaria por alguns anos. O profeta ficaria contente com a humildade da tarefa.

Senhor Deus. Adonai-Yahweh é o nome divino geralmente utilizado por Ezequiel, sendo empregado 217 vezes neste livro, embora somente 103 vezes no restante do Antigo Testamento.

A Motivação do Trabalho (3.12-27)

3.12
Levantou-me o Espírito. O Espírito de Adonai-Yahweh (Senhor Soberano) levantou o profeta Ezequiel para um lugar de exaltação. A glória do Senhor acompanhou todo o processo. Sua voz soava como um grande terremoto (RSV), pois uma mensagem de poder estava sendo pronunciada. A voz falou: “Glória a Deus nas alturas”. Cf. Isa. 6.3. A exaltação do profeta foi mental e espiritual, e não física; ele experimentou um transporte divino, místico. Cf. Eze. 8.3 e 11.1,24 e Atos 8.39. O vs. 15 mostra que o profeta ia para Tel-Abibe, local desconhecido atualmente que, sem dúvida, ficava perto de Quebar. Ver Eze. 2.2. Ver as notas no vs. 15 para maiores detalhes. Talvez o transporte tivesse sido literal, ou poderia ter sido somente na mente do profeta. A voz falou com grande estrondo, e o profeta obedeceu, como sempre. Ele levava a sério sua missão.

3.13
Ouvi o barulho... e o barulho. O alto som registrado no vs. 12 agora é descrito como idêntico àquele feito pelo movimento do trono-carro de Yahweh, que é o tema central do capítulo 1. Ver Eze. 1.24. Este texto indica que as rodas fizeram grande barulho. Cf. Eze. 1.1 e Zac. 14.5.0 som temível lembra a marcha do exército babilónico e os sons que os pés dos soldados e cavalos faziam. O julgamento se aproximava e se anunciou com som assustador. ... que tocavam umas nas outras. O hebraico literal aqui é “beijar”, em vez de “tocar”. “As asas se beijavam umas às outras, cada uma e sua irmã”, um toque fino de poesia. Ver Eze. 1.9,11,23.

3.14
O Espírito... me levou; eu fui amargurado. O profeta foi divinamente transportado. Seu espírito ficou quente, porque estava em alto estado de agitação. A palavra hebraica utilizada é mar, que pode significar angústia, em vez de amargura, que alguns intérpretes preferem. Também pode significar raiva brava (ver II Sam. 17.8) ou descontente (I Sam. 22.2). Talvez o texto diga que os pecados do povo enfureceram o profeta. Quando ele comeu o livro (Eze. 2.8 ss.), seu sabor era doce, mas a situação logo azedou (cf. Apo. 10,10). Ezequiel estava sentindo o poder de Yahweh e estava sendo preparado mentalmente para comunicar sua mensagem amarga. mão do Senhor o guiava e impulsionava pelo fato de que sua tarefa era difícil. Ver sobre mão do Senhor, em Sal. 81.14, e sobre mão direita, em Sal. 20.6. Sem uma preparação divina, o profeta não teria tido força e determinação para cumprir sua missão. A metáfora da mão aparece 190 vezes no Antigo Testamento. Ver também Eze. 3.22; 8.1; 33.22 e 37.1.

3.15
Fui a Tel-Abibe. O transporte divino levou o profeta para Tel-Abibe, localidade desconhecida hoje, mas sem dúvida não distante de Quebariyer a respeito no Dicionário). Aparentemente, considerável porcentagem dos exilados ocupava aquela região, que foi, por algum tempo, o “lar fora do lar” do profeta. Tendo chegado literal ou espiritualmente, o profeta se sentou entre os cativos, ficou naquela posição por alguns dias, sem nada falar, o que surpreendeu grandemente os que o acompanhavam. O próprio profeta, experimentando o poder e a presença do Senhor, ficou atônito com o acontecimento. Periodicamente, experiências místicas poderosas sacudiram a vida dele. A visão passou com o tempo, mas seus efeitos continuaram, fortalecendo Ezequiel. Ele carregava consigo o poder de seu chamado. Não conhecia ainda a natureza exata da sua missão nem podia antecipar o que aconteceria com ele no meio de homens rebeldes, mas seu espírito era forte e capaz para realizar qualquer coisa.

Lugar Certo. É uma grande bênção estar no lugar certo da missão concedida por Deus. O profeta começou bem e já estava instruindo os exilados na região de Quebar. Esdras nos informa que alguns exilados moravam em Tel-Melá e Tel Harsa (Esd. 1.59). A palavra babilônica til abubi significa montículo. Embaixo desses montículos, cidades inteiras foram enterradas, e os judeus passaram a construir suas habitações sobre diversos daqueles montículos. A palavra babilônica abubu significa dilúvio, e pode ser que essas cidades perdidas pré-dataram o dilúvio de Noé.

Por sete dias, assentei-me ali, atônito. Cf. Dan. 4.19 e Esd. 9.3-4. O silêncio dos lamentadores tem paralelo em Lam. 3.28. A posição usada para a lamentação era a sentada (lsa. 3.26; Lam. 1.1). Sete dias era o tempo típico para lamentações profundas (Jó 2.13). Cf. os 40 anos da experiência de Moisés (Atos 7.23), e os 40 dias de Elias (I Reis 19.3-8). Ver também Gál. 1.17. Devemos lembrar, ainda, a história da tentação de Jesus (40 dias), narrada em Mateus capítulo 4. Períodos específicos de tempo eram dedicados às situações consideradas importantes e decisivas. Ezequiel Designado Atalaia de Israel (3.16-21)

3.16
Outra Etapa da Missão. O profeta teve sete dias de descanso e meditação. Então, o poder de Yahweh o pegou novamente. Agora chegara o tempo de agir, pois a mensagem tinha de ser entregue aos exilados. A comissão do profeta foi renovada e ele sentiu grande responsabilidade de agir como um herói. O Targum nos informa aqui que “a palavra de profecia” foi dada a Ezequiel, nesta experiência; assim, ele ficou qualificado para agir como profeta de Yahweh.

3.17
Filho do homem. Yahweh freqüentemente utilizou este título para referir-se ao profeta. Ver as notas expositivas em Eze. 2.1. Aquele fraco filho de homem seria feito o poderoso atalaia de Israel. Cf. lsa. 56.10; Jer. 6.17 e Osé. 9.8, onde o mesmo título é empregado. Os atalaias se posicionavam sobre os muros da cidade, sobre topos de colinas, às vezes sobre torres de água ou instalações militares, pois precisavam de visão panorâmica. O trabalho deles consistia em avisar o povo sobre a aproximação de qualquer perigo. Eles serviam como protetores do povo e trabalhavam em favor do seu bem-estar. Ezequiel tornou-se o atalaia espiritual do pequeno remanescente de judeus no cativeiro babilônico. Um Novo Israel estava sendo preparado por seus esforços. Seu trabalho era “pequeno”, mas tinha grandes implicações. O atalaia avisou o povo da chegada do julgamento, por causa de sua idolatria-adultério-apostasia. Ele deu instruções morais e espirituais. A figura do atalaia será repetida em Eze. 33.2-6. Ver também I Sam. 14.16; II Sam. 18.24-27; II Reis 9.17-20 e lsa. 21.6.

3.18
As advertências espirituais dos vss. 18-21 não se referem à alma e à condenação eterna em uma vida além do sepulcro, embora, comumente, intérpretes utilizem este trecho com tal aplicação. Podemos fazer essa aplicação, porque as palavras são aptas a esse fim, mas o que está em pauta é a destruição pelas mãos dos babilônios. As palavras podem incluir a ideia de desastres, pragas e revoltas da natureza, que massacram a vida humana. A vida prometida aos obedientes e convertidos seria tranquila e longa na Terra Prometida, onde os habitantes teriam o privilégio de promover o culto a Yahweh, fonte de todas as bênçãos. Em outras palavras, o texto se refere à salvação temporal, não espiritual.

Casos Específicos:
1. O primeiro caso estipulado é o do homem pecaminoso, rebelde, apóstata (coletivamente, Judá-Jerusalém); este ímpio recebe a advertência de Yahweh. Os babilônios trariam a morte, que chegaria na forma de um imenso massacre. Presumivelmente, o próprio profeta pereceria com o povo. Além dos ataques dos babilônios, haveria doenças, desastres naturais e uma variedade espantosa de calamidades. Mas nada, no trecho presente, fala sobre a alma e o julgamento do outro mundo.

É óbvio que este texto não menciona nada sobre o problema da segurança do crente, embora alguns intérpretes o utilizem desta maneira. “A referência aqui é obviamente à morte física” (Charles H. Dyer, in toe).

3.19
2. O segundo caso é o reverso do primeiro (vs. 18). Se o profeta cumprisse sua missão, mas os desobedientes permanecessem rebeldes e morressem nessa condição, ele entregaria sua vida por causas destas conseqüências. Cf. lsa. 49.4-5; Atos 20.26 e I Tim. 4.16.

3.20
3. O terceiro caso é o do homem justo (segundo os padrões do Antigo Testamento, o homem que obedece à lei mosaica e participa do culto a Yahweh). Este homem cumpre seus deveres, mas finalmente abandona sua fé (como Judá fez quando correu atrás da idolatria de seus vizinhos). Este homem, ontem justo, agora é um ímpio como o resto da Judá apóstata; contra ele Yahweh agirá; sua bondade anterior não o ajudará nem um pouco. Com a iniquidade, ele anula sua condição anterior, cai e morre. Todavia, o ministro que o advertiu fica livre de sua culpa. O texto não se refere a um homem que ontem estava salvo, mas hoje está perdido, e, se morrer nesta condição, sofrerá julgamento eterno; esta é a interpretação de alguns ansiosos que querem um texto de prova para sua doutrina arminiana. O texto fala especificamente do golpe de morte do exército babilônico, que executou uma nação inteira e obviamente dos indivíduos daquela nação. A segunda morte não está em pauta.

Tropeço. Cf. lsa. 8.14; I Cor. 1.23; Rom. 8.32-33; I Ped. 2.8. A bondade que o homem praticou no passado não pode agir como um tipo de crédito, para evitar conseqüências desastrosas de uma vida pecaminosa presente. Ele não pode tirar algum dinheiro de seu banco espiritual e pagar os débitos de uma vida atual de apostasia. A Lei Moral da Colheita segundo a Semeadura (ver a respeito no Dicionário) garantirá que esse homem pague o que deve: ele morrerá.

3.21
4. O quarto caso é o do homem bom que se tornou melhor ainda. Os ensinamentos do profeta fiel o ajudaram; ele obedeceu aos mandamentos e agiu com justiça. Esse homem será poupado das calamidades que trazidas pelos babilônios. Ele também escapará aos castigos da natureza, não ficará doente, terá uma vida longa, saudável e próspera. É bom negócio ser bom, Cf. o sentimento do Novo Testamento:

Obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles;
pois velam por vossa alma, como quem deve prestar contas,
para que façam isto com alegria e não gemendo.
(Hebreus 13.17)

Quinta Comissão (3.22-27)

3.22 
A mão do Senhor veio sobre mim. A mão do Senhor (isto é, Sua direção e poder) estava com Ezequiel. Ele tinha direção e controle divino. Naquela condi­ção, dirigiu-se a um vale. Talvez este lugar fosse o mesmo onde ele recebeu, subsequentemente, a visão dos ossos secos (Eze. 37.1). O mesmo termo deste texto é usado em Gên. 11.2, para falar do território da parte inferior da região dos rios Tigre e Eufrates. No vale, o profeta teria paz e estaria mais sujeito à revela­ção. As distrações da vida na comunidade seriam apagadas temporariamente. 

Em um lugar isolado, longe de homens incrédulos, o poder de Yahweh se manifestaria mais livremente, e o profeta receberia palavras divinas no meio de visões sobrenaturais. Cf. a experiência de Jesus descrita em Mat. 4. Ezequiel andaria com Yahweh e sentiria a Sua presença.

Levanta-te e sai. Ver sobre as cinco comissões que o profeta recebeu, na introdução ao capitulo 2. Este trecho contém certa confusão. Primeiro, o profeta (presumivelmente na sua casa, vs. 24) foi chamado para uma planície ou vale, para receber o oráculo. “Lá fora”, recebeu uma visão da glória do Senhor, enquanto descansou em um vaie de paz. Voltando imediatamente para casa, ficou amarrado em cordas e emudecido pela força do Senhor, permanecendo assim até receber ordem de abrir a boca para continuar com sua missão profética. A mudez do profeta é mencionada de novo em Eze. 24.25-27 e 33.21-22. Houve períodos em que não foi permitido a Ezequiel profetizar; sem duvida, nestes tempos, o povo afundou mais e mais nas suas corrupções. De qualquer maneira, um julgamento severo seria o resultado de tais coisas, para quase todos.

3.23
Saí para o vale, e eis que a glória do Senhor estava ali. Na Planície de paz, a glória de Yahweh iluminava tudo. Cf. esta experiência, com aquela descrita em Eze. 1.1, ocorrida perto do rio Quebar. O profeta viveu mais uma experiência mística elevada. Pelo poder divino, ele estava sendo transformado no tipo de homem necessário para a realização de uma missão especial. Como antes (Eze. 1.28), o efeito da visão foi tão poderoso, que o profeta perdeu o equilíbrio e caiu no chão.

3.24
O Espírito... me pôs em pé.
 Como antes, o Espírito de Yahweh colocou o pobre homem em pé, para que pudesse receber a mensagem. O profeta recebeu ordem para voltar para a casa que mantinha na vila, onde um grupo de exilados morava perto do rio Quebar. Na privacidade de sua própria casa, ele receberia mais instruções espirituais, inclusive a lição material de ser amarrado em cordas. Esta lição serviria de parábola ou metáfora de ensino. Primeiramente, o profeta sofreria impedimentos, antes de ser libertado para cumprir sua missão profética. Ele não poderia ter contato com os outros judeus no cativeiro. Certos líderes podiam visitá-lo para receber a palavra de Deus (ver Eze. 8.1; 20.1), mas o tempo de seu ministério público ainda não tinha chegado. O profeta passava por um período de preparação e condicionamento.

Talvez seu confinamento na casa simbolizasse o ataque dos babilônios contra Jerusalém, seguido por outras deportações que produziriam confinamento do pequeno restante do povo. Jerusalém seria colocado em uma gaiola, como um passarinho, e aqueles pobres passarinhos seriam confinados nas gaiolas da Babilônia.

3.25
Porão cordas sobre ti.
 O Primeiro impedimento. O profeta foi amarrado em cordas. Explicações. 1. Alguns intérpretes imaginam que os inimigos do profeta tivessem ido à sua casa para amarrá-lo, impedindo-lhe circular entre o povo; já estavam cansados de suas denúncias. 2. Outros acham que o ato de amarrar era figurativo e espiritual, e não literal, resultado do trabalho do Espírito de Yahweh. 3. Outros ainda acham que as cordas eram as forças da oposição, a incredulidade do povo, não cordas literais. Mas o texto deixa claro que o impedimento era de Yahweh. Seu propósito estava sendo realizado. 4. Mesmo assim, é verdade que aquele povo apóstata impediu a missão do profeta, amarrando-o com sua oposição e ameaças de violência. Cf. João 1.11: “Veio para o que era seu, e os seus não o receberam”. 5. O profeta foi amarrado; esta circunstância se referia ao fato de que os ímpios eram e continuariam sendo amarrados pelo poder da Babilônia: houve três deportações do povo. Ver as notas em Jer. 52.28.

3.26
Ficarás mudo.
 Outro Impedimento. Ezequiel foi emudecido. A missão profé­tica (pública) estava adiada. O povo apóstata seria forçado a passar sem instru­ções. Sua taça de iniquidade estava quase cheia; o julgamento era iminente. Quando o profeta começou a dar suas advertências, era tarde demais. O povo ficaria além da chamada de arrependimento. Por causa de sua idolatria-adultério-apostasia, o povo perdeu sua oportunidade, exceto por poucos que seriam transformados para constituir o Novo Israel depois do cativeiro. Aparentemente, a mudez do profeta era intermitente. Ezequiel tinha períodos de atividade profética. O vs. 27 deste capítulo bem como Eze. 33.22 demonstram este fato. Os impedimentos que o profeta sofreu eram julgamentos do povo. Aquela gente já estava sob julgamento, a cegueira judicial. Ver na Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia o verbete Julgamento que Cega (Cegueira Judicial). Eles rejeitaram Yahweh, e Ele os rejeitou de acordo com a Lex Taiionis (retribui­ção de acordo com a gravidade do crime; ver a respeito no Dicionário), isto é, pagamento “em gênero”, recebendo de acordo com o que foi feito.

3.27
Quando eu falar contigo, darei que fale a tua boca.
 Ezequiel não seria para sempre um profeta silencioso. Com o tempo, sua boca foi aberta para falar. O Espírito estava controlando a situação e operando segundo Sua vontade. Todos os elementos se harmonizavam perfeitamente. Não houve lapsos na execu­ção do plano divino.

Assim diz o Senhor Deus. Adonai-Yahweh, isto é, Soberano Eterno, o título divino comum deste livro, aparecendo 217 vezes. Aparece somente 103 vezes no restante do Antigo Testamento. A missão do profeta seria realizada de acordo com a Soberania de Deus (ver a respeito no Dicionário). Quando o profeta ficava em silêncio, era porque Yahweh não tinha falado; quando abria a boca, era inspirado por Yahweh. O ministério do profeta mesclaria períodos de silêncio com períodos de pregação. Como o atalaia de Israel (Eze. 3.16 ss.), ele se harmonizou perfeitamente com a mente divina. Sua mudez seria intermitente. Sua palavra encontraria receptividades radicalmente diversas. Alguns o escutariam; amém!

Outros não o fariam; assim seja! A grande maioria dos rebeldes não se converteria, e sofreria o devido castigo. Yahweh não esperava “sucesso de números” da parte do profeta. Cf. as palavras de Jesus em Mat. 11.15; ver também Mat. 13.9; Mar. 4.9,23; Luc. 8.8.

Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.

(Lucas 14.35)

A pregação era seu próprio sucesso. O dever do atalaia seria realizado a despeito da rebeldia dos ouvintes.