Salmo 10 — Análise Bíblica

Salmo 10: Clamor por Socorro

O salmo 10 talvez dê continuidade ao salmo 9 (cf. a introd. do Sl 9). Fica evidente que expressa um clamor semelhante por socorro. As emoções no salmo 10, contudo, mostram-se bem mais intensas, e os opressores parecem ser principalmente membros da comunidade do salmista, e não nações estrangeiras.

O salmista parece encontrar-se em estado desesperador quando contrasta sua situação como aparente sucesso dos ímpios. A mesma questão causa perplexidade nos autores de Jó e do salmo 73: Por que os ímpios prosperam enquanto os justos sofrem?

Muitos africanos hoje fazem a mesma pergunta ao testemunhar inversões de valores nas quais mentiras
e corrupção parecem ser o caminho para o sucesso e a prosperidade. O problema se agrava se aceitarmos o evangelho da prosperidade, segundo o qual a fé em Cristo resulta numa vida sem problemas. Gostaríamos de viver em um mundo no qual altos padrões morais são garantia de sucesso e felicidade. Mas, como o salmista lembra, nem sempre é o caso.

Não obstante, ao lembrar que o Senhor é Rei e mantém um registro de todo mal, o salmo 10 é uma grande fonte de ânimo para aqueles que tentam viver de acordo com os mandamentos do Senhor, mas têm consciência da presença de ímpios ao seu redor que são extremamente bem-sucedidos.

10:1 Lamentação

O salmista atravessa um período de grandes dificuldades e necessita da presença de Deus. Infelizmente, tem a impressão de que Deus abriu mão do controle da situação e está distante dele, observando-o de longe (10:1). O salmista pergunta repetidamente Por quê?, enquanto se esforça para entender o motivo de Deus ter deixado seu trono e estar ausente da vida da comunidade.

10:2-11 O sucesso dos ímpios

O salmista tem plena consciência da arrogância e do sucesso dos ímpios. O comportamento deles é exatamente o oposto do estilo de vida que a literatura sapiencial ensina em livros como Provérbios e revela ausência total de valores na vida dos ímpios. Essas pessoas oprimem o pobre, isto é, o fraco e necessitado (10:2). Não se trata de opressão acidental, mas de perseguição deliberada aos fracos com o propósito de destruí-los. Exultantes com sua aparente vitória, os ímpios se tomam tão orgulhosos que passam a afrontar Deus.

Em vez de bendizer ao Senhor, louvam os gananciosos que acumulam riqueza por meios ilícitos (10:3). Não se dão ao trabalho de refletir sobre aquilo que Deus pensa de suas ações nem temem o julgamento divino (10:4). Em vez de eliminar aqueles que o tratam desse modo, Deus permite que prosperem! Eles escarnecem da lei de Deus e permanecem impunes (10:5). Não temem inimigos humanos. O salmista e os pobres podem estar em dificuldades (10:1-2), mas o ímpio diz alegremente:

Jamais serei abalado; de geração em geração, nenhum mal me sobrevirá (10:6).

Em 10:7-11, o salmista fornece mais detalhes sobre as palavras e os atos dos ímpios. O discurso deles é caracterizado por maldições e ameaças, e espalha desgraça e maldade (10:7). São como bandidos que assaltam alde­ões inocentes, como leões à espreita de presas indefesas, e como caçadores que preparam suas redes (10:8-9). Sobrepujados por esses ataques, os fracos não têm forças para resistir (10:10). Os ímpios exultam com malignidade sobre suas vítimas e lhes garantem que Deus se esqueceu delas e não se interessa pelo que está acontecendo (10:11).

Não é de admirar que o salmista pergunte: “Por que, Senhor, te conservas longe?” (10:1). Ele fica perplexo ao ver Deus permitir o sucesso daqueles que o rejeitam arrogantemente.

10:12-15 Súplica por intervenção divina

Apesar de sua perplexidade, o salmista não deixa de confiar em Deus. Antes, faz uma súplica urgente ao Rei justo para que ele se reafirme como Rei e Juiz. Clama, novamente: Levanta-te, Senhor (a mesma súplica de 9:19). Mais uma vez, essas palavras trazem à memória a poderosa interven­ção de Deus em favor do seu povo no êxodo (Nm 10:35). O salmista deseja que o Senhor aja como rei que se levanta repentinamente do trono e ergue a mão para ordenar que se tomem as devidas providências (10:12). Deus deve intervir pessoalmente e não mais permitir que os ímpios o desprezem (10:13).

Para declarar sua fé, o salmista contradiz os insultos dos ímpios. Eles disseram de Deus: “Virou o rosto e não verá isto nunca” (10:11), mas o salmista sabe: Tu, porém, o tens visto, porque atentas aos trabalhos e à dor. Os oprimidos podem colocar-se nas mãos do Senhor, pois ele é o defensor do órfão (10:14). Os filhos que perdiam o pai eram os membros mais desamparados da sociedade israelita. Se Deus está disposto a intervir em favor deles, certamente resgatará os oprimidos e os livrará das tramas dos ímpios.

Além de salvar os necessitados, também é necessário que Deus quebrante o braço do perverso e do malvado, ou seja, que acabe com a capacidade dos ímpios de oprimir os desamparados (10:15).

10:16-18 Certeza final

O salmo 10 começou com um clamor desesperado, mas termina com uma expressão de confiança inabalável: O Senhor é rei eterno (10:16). A mesma confiança ecoa no salmo 9, que retrata Deus como um rei assentado em seu trono, de onde julga com justiça. Como Rei, o Senhor não permitirá que os inimigos (as nações) controlem a terra sobre a qual ele reina.

Deus talvez parecesse distante em 10:1, mas agora o salmista tem certeza de que o Senhor ouve a oração dos humildes e os salvará (10:17). Usará sua autoridade como Rei e justo Juiz para fazer justiça. Como em 9:19-20, o salmista nos lembra que nenhum simples mortal, que é da terra (10:18), é capaz de resistir ao poder divino que inspira reverência e terror. Devemos temer a Deus, e não aos homens.