Gênesis 4 — Comentário Teológico
Gênesis 4
Multiplicação da Raça Humana: Caim e Abel (Gên 4.1-7)
Os críticos atribuem todo o capítulo quarto à fonte J.
Ver no Dicionário o artigo J.E.D.P (S). Agora achamos o nome
divino Yahweh do começo ao fim, em contraste com o nome Elohim,
do primeiro capítulo, ou o nome composto Yahweh-
1. Inocência: Gên 1.1-3.24
2. Consciência: Gên. 3.23
3. Governo humano: Gên. 8.20
4. Promessa: Gên. 12.1
5. Lei: Êxo. 19.8
6. Graça: João 1.17
7. Reino: Efé. 1.10
A palavra dispensação vem do latim dispenso,
que significa “pesar” ou “administrar”. Este vocábulo tem sido usado de
diversos modos, porém o uso que mais chama atenção é aquele que, segundo
pensam alguns intérpretes, envolve um período de tempo no qual Deus trata
com os homens de maneira específica. Essa idéia foi popularizada pela
Bíblia Anotada de Scofield e desenvolvida por intérpretes posteriores.
Cada dispensação é uma revelação do desejo
multifacetado de Deus e nela o homem fica sujeito a testes, devendo obedecer a
certas condições e atingir determinados objetivos.
Consulte no Dicionário o artigo chamado Dispensação
(Dispensacionalismo).
O Senhor Deus, por isso, o lançou fora do Jardim
do Éden, a fim de lavrar a terra de que fora tomado.
Gênesis 3.23
REBELIÃO
Proibida (Núm. 14.9; Jos. 22.19)
Provoca a Deus (Núm. 16.30; Nee. 9.26)
Provoca a Cristo (Êxo. 23.20,21; I Cor. 10.9)
Vexa o Espírito Santo (Isa. 63.10)
EXIBIDA
Na incredulidade (Deu. 9.23; Sal. 106.24,25)
Na rejeição do governo divino (I Sam. 8.7)
No desprezo aos Seus conselhos (Sal. 107.11)
Na desconfiança quanto ao Seu poder (Eze. 17.15)
Elohim, do
segundo capítulo. Os críticos vêem vários sinais de fontes diversas neste
capítulo, como obra de editores diversos.
O homem, agora caído, começou a multiplicar-se. Em
certo sentido, conforme foi ilustrado no triste exemplo de Caim, temos aí a
multiplicação de uma sociedade ímpia. O homem, em sua rebeldia, dera início à
sua expansão geográfica. Os piedosos e os ímpios separam-se e seguem seus
próprios caminhos distintos. Mas na nossa sociedade mista eles se
entrechocam
O morcego e a coruja habitam ali;
A serpente se aninha no altar de pedra;
Os vasos sagrados mofam perto;
A imagem de Deus desapareceu!
Naquele duro mundo pagão caíram
O desgosto e o nojo secreto;
Profundo cansaço e concupiscência concentrada
Fizeram da vida humana um inferno
(Matthew Arnold)
4.1 Coabitou. No hebraico temos um eufemismo para o ato
sexual, conheceu. Há o conhecedor e o conhecido, uma curiosa mas exata
descrição. Jarchi interpreta a palavra como tinha conhecido, ou seja,
uma ação já passada, antes mesmo da queda, pois supunha que, de outra
sorte, ele não teria obedecido à ordem para multiplicar-se. Mas não há
nenhuma indicação de que Adão se havia reproduzido antes da queda no
pecado.
O homem. Assim diz nossa versão. Mas adam
tornara-se um nome próprio desde Gênesis 3.17. Ver o artigo detalhado sobre Adão,
no Dicionário.
Eva. Ver a nota detalhada sobre ela em Gênesis 3,20.
Ela era a mãe de “todos os viventes”, e agora começava a cumprir a sua função.
Deu à luz a Caim. Houve algo de terrível no fato de
que o filho primogênito, dentre toda a humanidade, de acordo com o relato
bíblico, veio a tornar-se um homicida. Mas talvez isso seja apropriado,
agora que vemos o começo da propagação do homem caído, ímpio. O nome dele
significa “trabalhador em metal”, ainda que, de acordo com a etimologia
popular, tenha obtido o sentido de “adquirido”, porquanto Eva dissera: “Adquiri
um varão com o auxílio do Senhor”. O fraseado tem perturbado alguns
intérpretes, porque a frase diz, literalmente, “com o Senhor” Por isso, a
palavra hebraica ‘eth (com) é tida por alguns como um
erro primitivo no texto (feito pelo autor sagrado, por descuido), ou por
algum escriba antigo. Daí, outros conjecturam que está em pauta o ‘oth
(marca) de Yahweh. E isso significaria que Caim já nasceu com a marca do
mal, em antecipação a seu pecado; ou, então, que ele já nasceu separado
para adorar a Yahweh, como primogênito da raça. Se é a “marca de Caim” que
está em foco, então aqui é antecipada a declaração de Gên. 4.15. E se a
adoração a Yahweh é que está destacada aqui, então fica antecipado o
trecho de Gên. 4.26. Os intérpretes que preferem o “com” no texto, fazem
isso significar “com o auxílio do Senhori, conforme se vê em nossa versão
portuguesa, ou alguma coisa similar. E uma interpretação fantástica e aquela
que diz que Eva antecipou que em Caim cumpnr-se-ia a promessa messiânica
de Gên. 3.15. Ele seria o Messias prometido.
“Os descendentes de Caim formavam uma raça ímpia e
cobiçosa, mas que, apesar disso, em muito ultrapassou os descendentes de Sete
quanto às artes da civilização. À agricultura e à vida pastoral eles
adicionaram a metalurgia e a música, o conhecimento não só do cobre e seus
usos, mas também do ferro (vs. 22)... (eles) diminuiram em muito a
maldição do labor árduo, acrescentando lazer e luxo às suas vidas”
(Ellicott, in loc.).
Caim. No hebraico, lança (?). Foi o filho mais
velho de Adão e Eva (Gên. 4.1). Tragicamente, foi o primogênito da raça humana,
de acordo com a narrativa sobre a raça adâmica; e também foi o primeiro
assassino e fratricida. Há algo de apropriado nas circunstâncias de que o
homem, de quem se diz ter sido o primeiro filho produzido pelo homem, também é
descrito como o primeiro homem a ser um assassino. Essa narrativa
simboliza a degeneração humana desde o principio. Nada havia no meio
ambiente de Caim que o tivesse levado a matar seu irmão. O ato originou-se
da maldade no íntimo. Muito erra a criminologia quando busca a causa dos
crimes no meio ambiente adverso das pessoas, mas não a busca no íntimo
pervertido do ser humano.
1. Nome. Não há certeza
alguma quanto à origem do nome “Caim”, embora pareça estar relacionado à
forja de metais, como um “ferreiro”; outros preferem dar-lhe o sentido de “lança”;
e, de acordo com a etimologia popular, ”adquirir”. Outros ainda pensam em “inveja”.
Aquisição (Gên. 4.1) é a idéia mais comum entre os intérpretes.
2.O Sacrifício. Adão e Eva
cultivavam o solo; Abel era pastor de ovelhas. Caim também cultivava o
solo. Os irmãos trouxeram suas ofertas a Deus. Caim as trouxe do fruto de
seu trabalho no solo, e elas foram rejeitadas. Abel trouxe suas ofertas do
rebanho; e elas foram aceitas por Deus. A maioria dos intérpretes vê nisso um
prenuncio dos sacrifícios cruentos, e, naturalmente, do sacrifício de
Cristo. De conformidade com isso, a oteda de Caim representa
o auto-esforço, o mérito humano, que parece bom a nossos olhos, mas não
é aceitável diante de Deus. Isso dá a entender a necessidade da
justificação, com base na expiação de Cristo. Não estão em foco apenas as
ofertas de Caim e Abel, mas as próprias pessoas deles, pois lemos: “Agradou-se
o Senhor de Abel e de sua oferta; ao passo que de Caim e de sua oferta não
se agradou” (Gên. 4.4,5). Portanto, Deus, que lê os corações, viu as
atitudes deles: a de Abel, de autodesistência e confiança na expiação de
outrem; a de Caim, de auto-suficiência e de confiança própria.
3. A ira de Caim. A ira de
Caim impeliu-o a matar, A enormidade de seu crime se vê no fato de que
matou seu próprio irmão. A ira é um dos pecados cardeais. Aparece na lista
das obras da carne, na lista de Paulo, em Gál. 5.20. A ira encontra-se na
raiz de muitos atos irracionais, e quase sempre tem o egoísmo como sua
base, e o ódio como sua motivação.
4. O Crime de Caim. Embora
repreendido por Deus, Caim resolveu dar vazão à sua maldade mediante um
ato irracional de homicídio. Desde então, os homens têm satisfeito a sua
vontade tirando a vida do próximo, o que mostra a extensão da queda.
Quando Deus perguntou a Caim onde estava seu irmão, Abel, Caim indagou: “Não
sei; acaso sou eu tutor de meu irmão?” (Gên. 4.9). Essa pergunta de Caim,
famosa desde então, usada em inúmeros contextos, mostra-nos a natureza
egoísta de seu ato homicida. Pois a lei do amor leva-nos a cuidar uns dos
outros, como cuidamos, cada um, de nós mesmos. Negar que sou guardador de
meu irmão é negar a essência da lei do amor. A voz de Abei clamava do
solo. Isso demonstra que os atos pecaminosos não podem ser ocultados, pois
apelam a Deus, pedindo vingança.
5. O Castigo de Caim. De
certo modo, Caim recebeu a primeira sentença perpétua. Ele seria objeto de
ódio, e outros haveríam de querer tirar-lhe a vida. Porém, ele escaparia.
Em lugar disso, foi pronunciada contra ele uma maldição divina. Ele tomar-se-ia
vagabundo e fugitivo à face da terra, pelo resto de seus dias, caçado e
odiado pelos outros seres humanos.
6. A Marca de Caim. Caim
seria caçado pelos outros homens. Correría o risco permanente de ser
morto. Deus, entretanto, não permitiría que ele fosse executado. Para garantir
isso, foi posta uma marca em Caim, como se dissesse: Vede este homem. Não
o mateis! Não se sabe que marca seria essa. Alguns supõem que Deus deu-lhe
coloração negra à pele, pelo que a marca seria forte carga de melanína.
Porém, essa interpretação, além de ser mera especulação, só serve para fomentar
preconceitos raciais. Esse sinal também poderia ser uma marca tribal, alguma
espécie de tatuagem ou sinal que identificasse uma pessoa dentre um grupo
particular, um costume que, mais tarde, também se viu no Oriente Médio.
Outros compreendem que o sinal era a promessa de Deus de que ele
não seria morto, em vez de suporem alguma marca física. Não há como
determinar a questão, por ausência de maiores informes bíblicos.
7. Posteriormente, Caim foi
enviado à terra de Node (vagueação), onde ele editou uma cidade e tomou-se
o progenitor de uma numerosa família, que se ocupou de muitas artes e
ofícios. De acordo com as tradições, os primeiros residentes em tendas,
metalúrgicos e músicos vieram da linhagem de Caim. Mas outras tradições
antigas dizem que os deuses foram os originadores das artes e ofícios.
8. De Onde Caim foi Buscar Sua
Esposa? Alguns críticos indagam assim, com escárnio, julgando haver
encontrado uma séria discrepância no relato bíblico. É como se dissessem: se
Adão e Eva geraram somente Caim, Abel e Sete, onde Caim encontrou esposa,
quando se retirou para a terra de Node? Esse tipo de objeção, além de
exibir uma atitude cética para com os relatos sagrados, demonstra a
ausência de um exame cuidadoso dos textos bíblicos por parte de tais críticos.
A Bíblia não diz que Adão e Eva geraram somente aqueles três filhos homens.
Caim, Abel e Sete foram apenas três dentre os muitos filhos do primeiro
casal. Seus nomes são fornecidos por causa do relato expressivo que gira
em torno deles, e nada mais. Lemos em Gênesis 5.4: “Depois que gerou a
Sete, viveu Adão oitocentos anos; e teve fi'hos e filhas”. Não há
informação quanto ao número desses filhos e filhas, mas essa informação é
suficiente para indicar que Caim levou consigo, para Node, uma de suas
irmãs. E Sete, onde quer que tenha ficado, sem dúvida, fez o mesmo. Não há
nenhuma dificuldade para sabermos onde Caim arran-|ou esposa!
9. Referências Neotestamentárias
a Caim. a, Hebreus 11.4. Pela fé, Abel ofereceu melhor sacrifício que o de
Caim. Dentro do plano de Deus, Cristo ofereceu o sacrifício final e
definitivo, que substituiu a todos os outros sacrifícios, sendo essa a
mensagem central da epístola aos Hebreus. b. I João 3.12 é trecho que nos
relembra o crime de Caim, seu ato homicida e o fato de que suas obras eram
más, e as de seu irmão, Abel, boas. c. Judas 11 alude ao caminho
de Caim. Lemos ali que os mestres gnósticos seguem esse caminho. A
literatura rabínica diz que o caminho de Caim caracteriza-se pela
concupiscência, pela cobiça, pela auto-indulgência e pela malignidade
geral. Se juntarmos a isso a inveja e o ódio, parece que é isso o que tal
caminho significa. Calm tomou-se um homem profundamente depravado. Ver
Sabedoria de Salomão 10.3; Jubileus 4.1-5; Apocalipse de Moisés 3.2.
4.2 Deu à luz a Abel, seu Irmão. Alguns pensam que está
em pauta um irmão gêmeo. Antigos escritores judeus supunham que Caim nasceu com
uma irmã gêmea, e que Abel também nasceu com uma irmã gêmea. Desse modo,
haveria esposas providas para a multiplicação. Mas tudo isso é pura
conjectura. Também não podemos dizer que Abel era irmão gêmeo de Caim
somente por causa da ausência da frase “ela concebeu”, no caso de Abel.
Vários sentidos são ligados ao nome Abel, como lamentação (em
antecipação ao seu assassinato), ou vaidade (Josefo). Ou, então, o termo
pode significar respiração, vapor fragilidade ou filho
(sendo essa a sugestão mais provável).
Abel. Vem de um termo hebraico que significa respiração.
Mas a etimologia é incerta, e outros sentidos têm sido sugeridos como “vapor”, “fragilidade”
e “filho”. É possivel que esse nome esteja associado ao termo acádico aplu,
“filho”, ou ao sumeriano ibila, “filho”.
1. História da Família. Era
o segundo filho de Adão e Eva, talvez gêmeo de Caim (Gên. 4.1,2). Foi
instruído na adoração ao Criador e trabalhava como pastor. Seu irmão,
Caim, era agricultor. Devido a essas circunstâncias, Abel ofereceu em
sacrifício um animal, ao passo que Caim trouxe dos frutos da terra (Gên. 4.3-5).
O trecho de Hebreus 11.4 mostra que Deus agradou-se do sacrifício de Abel,
mas não do de Caim. Despertou-se-lhe a inveja, e, segundo diz o
texto samaritano, ele convidou Abel para o campo, onde o matou. O
texto hebraico disponível silencia sobre o convite, embora registre o
homicídio. Seja como for, é cerfo que o ato foi premeditado.
2. Tradição Judaica. Segundo
esta, Abel foi morto na planície de Damasco, e seu túmulo é ali mostrado
aos turistas, perto da vila de Sinie ou Sineiah, a cerca de dezenove
quilômetros a noroeste de Damasco, na estrada para Baalbeque, embora tudo
isso não passe de fantasia.
3. Interpretações simbólicas,
baseadas no nome “Abel”, a. Se seu sentido é ”filho”, então o nome
simplesmente assinala o fato de seu nascimento. Visto que Caim significa “possessão”,
esse foi o nome do primogênito, porque ele foi uma possessão significativa
para seus pais. b. Se seu sentido é “fraqueza”, ”vaidade” ou “lamentação”,
seu nome predizia seu fim súbito e triste, tendo nele o primeiro quadro de
um justo sob perseguição, fisicamente impotente perante um poder físico
superior.
4. Um Homem de Fé. O trecho
de Hebreus 11.4 elogia Abel por sua fé, do que resultou um sacrifício
superior. Seu nome figura no início da grande lista dos fiéis, tendo sido
ele elogiado pelo próprio Senhor Jesus (Mat. 23.35). Presume-se que ele
obedeceu a alguma ordem especifica, acerca do sacrifício, que Caim
ignorou, embora isso não seja declarado no Antigo Testamento.
5. Simbolismo. Abel
tornou-se um tipo de Cristo porquanto ofereceu um sacrifício cruento,
superior (Heb. 9.26; 10.12). Ele tipifica Cristo como o Messias e Servo
sofredor, o Cordeiro de Deus (João 1.29; Isa. 53.7). Ele testifica sobre
a necessidade de um sacrifício de sangue (Heb. 9.22; 11.4).
6. Nos Escritos dos Pais da
Igreja. Crisóstomo chamou-o de tipo do Cordeiro de Deus, gravemente
injustiçado, em vista de sua inocência (AdStagirlB). Agostinho chamou-o de “peregrino”,
porquanto foi morto antes de poder residir em qualquer cidade terrena,
pelo que aguardava uma cidade celeste, onde pudesse habitar em justiça (De Civitate
Dei, xv.1). Caim, por sua vez, fundou uma cidade terrena e ali habitou
em meio à iniquidade. Irineu observou como Abel mostrou que os justos
sofrem às mãos dos ímpios, e como as virtudes dos justos são assim
magnificadas (Contra Haeres. iii.23).
7 Jesus referiu-se a Abel como o primeiro mártir (Mat.
23.35), conceito esse que teve prosseguimento na Igreja primitiva.
Evidentemente, Jesus o considerava um personagem histórico, O sangue de
Abel é contrastado com o sangue de Cristo, em Hebreus 12.24.
8. Ocupação. Abel atarefava-se na vida
pastoril; mas Caim era agricultor. E os descendentes deste não demoraram a
ocupar-se em várias outras profissões, segundo se vê em Gên. 4.22. Caim
seguiu o exemplo de seu pai, mas seu sacrifício não foi considerado
aceitável, por parte de Deus — em razão de sua espécie ou por
motivo da atitude com que foi oferecido? Ver no Dicionáno o
artigo Aries e Ofícios.
4.3Trouxe Caim do fruto da terra. Naturalmente, ele
trouxe parte do que produzia em sua profissão. Aqui, sem nenhuma explicação,
é-nos apresentado um primitivo sistema de oferendas. Não há razão para
duvidarmos de que os homens mais primitivos participavam desse costume,
antes mesmo que as religiões formais viessem a fazer parte da espiritualidade
oficializada. O homem, por natureza, tem pendores religiosos, como se fossem idéias
inatas. Talvez isso faça parte da imagem de Deus que ainda permanece
nele, a despeito da queda.
A questão da cultura religiosa é aqui exagerada por
alguns intérpretes, que supõem que possamos ver aqui a instituição formal do
sábado entre os homens. As palavras “no fim de uns tempos” não são
designação específica de algum período especial, seguido por um sábado ou
descanso. Nem parecem significar ”terminada a colheita”. Antes, é uma
observação casual acerca da passagem do tempo. A imaginação dos homens
tem-se mostrado ativa aqui. Alguns supõem que as oferendas tenham sido
trazidas à presença de Yahweh, que teria vindo ao encontro dos dois irmãos
na porta oriental do Éden, onde os querubins mantinham guarda.
4.4 Abel. . . trouxe das primícias do seu rebanho. Abel,
naturalmente, trouxe produtos próprios de sua ocupação. Aqui achamos pela
primeira vez o sacrifício de animais, como parte do culto religioso, Os
antropólogos têm descoberto ser esse um costume deveras antigo, que data
de muito antes das práticas formais da legislação mosaica. Sacrifícios
animais e vegetais mais tarde vieram a fazer parte do culto dos hebreus.
Alguns intérpretes vêem aqui, no sacrifício de cordeiros do rebanho de
Abel, uma prefiguração do Cordeiro de Deus.
Gordura. Depois, Abel ofereceu uma porção,
pertencente ao Senhor (ver Lev. 3.15). Os críticos pensam que a passagem
inteira foi escrita (muito tempo depois), quando o culto religioso já
estava institucionalizado. Outros supõem que tenhamos aqui formas
primitivas de culto, que, posteriormente, foram incorporadas ao culto dos
hebreus. Estão em foco as porções gordurosas dos
animais sacnficados, e não as ovelhas mais nédias e saudáveis. Josefo (Antiq.
1.1 c.2) afirmava que a oferenda foi “leite e as primícias do rebanho”.
Sabemos que os egípcios ofereciam leite a seus deuses, como sacrifício,
mas não parece que isso seja o que está em pauta aqui.
Deus Aceitou a Oferenda de Abel. Yahweh é retratado como quem ficou satisfeito com
Abel e sua oferta, algo que é negado no caso de Caim (vs. 5). Conforme
disse John Gill (in loc.), Deus olhou para a oferta de Abel com “uma fisionomia
sorridente”. Deus sorriu para Abel, mas franziu a tesla para Caim. Alguns
estudiosos incluem aqui a idéia expressa em Levítico 9.24; O fogo divino
consumiu os sacrifícios. Mas isso já é um refinamenlo exagerado do texto.
4.5 O Sacrifício Rejeitado. Deus não aceitou nem a
Caim nem a seu sacrifício, pois não se agradara dele, nem ofereceu nenhuma
palavra de aprovação, Não lemos aqui por qual razão assim sucedeu.
Nos tempos antigos, os aldeões, que possuíam parcos recursos, traziam de
seus produtos agrícolas para oferecer, porquanto não podiam fazer
oferendas de animais. Encontramos aqui uma lição. Os homens substituem o
rico pelo pobre, o muito pelo pouco. Os criticos pensam que o autor
sagrado tinha em mente, o tempo todo, os sacrifícios animais da religião
posterior dos hebreus, e que a razão da superioridade dos sacrifícios
de animais residiría nisso. O vs. 7 mostra que Caim tinha procedido
mal, e é mencionado até mesmo um oecaoo. Mas a questão fica um tanto
obscura, a menos que meditemos nela à luz de revelações posteriores.
Outros intérpretes pensam que Deus havia dado instruções acerca da
questão, mas que Caim, em sua rebeldia, não quis atender ao Senhor. Outros
eruditos aludem ao comentário do texto que se vê em Hebreus 11.4. Abel
ofereceu seu sacrifício motivado pela fé, ou seja, em resultado de
uma autêntica espiritualidade, em legitima obediência a Deus. Quanto a
Caim, esse fator se fez ausente. Isso posto, seu sacrifício realmente não
visava honrar a Deus. Ele estava apenas cumprindo um dever, e não se
estava ocupando em adoração a Deus. E foi nisso que ele pecou. Se
foi esse, realmente, o caso, então a rejeição ao seu sacrifício não foi
porque este se compunha de produtos vegetais, mas por haver sido oferecido
com uma atitude errada, com motivos distorcidos, podemos
discutir se essa interpretação está ou não com a razão. Podemos fazer grandes
obras, mas se nossos corações e nossos motivos não forem espirituais, tais
obras não agradarão a Deus. Outra lição é que cada homem deve oferecer a
Deus uma parte daquilo que ele produz em sua profissão. Ou,
melhor dizendo, a profissão de um homem, sem importar qual seja, deve ser
levada a efeito com vistas à glória de Deus. Pnmeiro sirvamos a Deus,
depois ao próximo, e, finalmente, a nós mesmos. Essa é a ordem de
precedência, segundo a lei do amor.
Irou-se, pois... Caim. Diz o original hebraico, literalmente, “Caim incendiou-se muito”. Por
muitas vezes, a ira do homem é o começo da cadeia que termina em algum ato
precipitado e pusilânime. Assim aconteceu no caso de Caim, conforme o
texto sagrado passa a demonstrar. Com frequência, os homens se iram por
causa de seus fracassos, mas não mostram nenhum interesse em se corrigirem
quanto a seus erros. Faz parte da reação natural dos homens defenderem o
seu próprio “eu” por meio de acessos de ira, como que dizendo: “Não errei.
Fui enganado. Sou vítima de alguma perseguição”.
Disse Caim a Abel, seu irmão: Vamos ao campo.
Estando eles no campo, sucedeu que se levantou Caim
contra Abel, seu irmão, e o matou.
Disse o Senhor a Caim: Onde está Abel, o teu irmão?
Eie respondeu: Não sei; acaso sou eu tutor de meu
irmão?
E disse Deus: Que fizeste? A voz do sangue de teu
irmão dama da terra a mim.
Gênesis 4.8-10
* * * * * * * * *
O ódio já é homicídio e leva o homem a praticá-lo (Mat.
5.21,22; I João 3.15).
O ódio é uma das obras da carne, de maneira que é
contrário às virtudes cultivadas pelo Espírito.
O que o amor é para Deus, o ódio é para o diabo:
Deus-amor; diabo-ódio.
Comentou John Gill [in loc.): “Ele franziu o
sobrolho e rangeu os dentes, seu rosto ficou com aspecto de indignação, e em
sua fisionomia podia-se ver todos os sinais da tristeza e do
desapontamento, e também de fúria e de cólera”. Ver no Dicionário o
artigo intitulado Ira dos Homens, quanto a um detalhado
estudo sobre esse pecado. O trecho de Gálatas 5.19 informa-nos que essa é
uma das ”obras da carne”. Sem duvida, trata-se de um dos principais vicios
humanos. Jamais pode produzir a justiça, no dizer de Tiago 1.20.
Descaiu-lhe o semblante. Expressão concreta, típica
do hebraico, neste caso para indicar ira, desapontamento, mas sem dúvida não vergonha,
como alguns estudiosos têm pensado. Caim demonstrou sua falta de fé, em
sua resposta ao Senhor. Ele não remediou a situação. Mas explodiu em
autodefesa. E visto que não podia vingar-se diretamente de Deus, não muito
depois descarregou a sua ira contra o inocente e indefeso Abel.
4.6 Por que andas irado? Assim indagou a voz divina, dando a entender que não havia razão real para tal atitude. A falta estava no próprio Caim, e não na desaprovação de Deus. Essa pergunta foi feita com uma certa medida de graça. Foi uma advertência graciosa, na tentativa de impedir um crime que em breve haveria de ser cometido.
4.7 Os estudiosos admitem a dificuldade do texto. Talvez
seja aqui sugerido que a insatisfação de Caim estava dentro dele mesmo. Ele não
estava agindo direito. Mas não é explicado especificamente por quê.
Mas havia alguma coisa em Caim que anulou a validade desse oferecimento
divino. Ver as notas no vs. 5 quanto a possíveis razões de seu sacrifício
não ter sido aceito.
O pecado jaz à porta. O pecado é como um animal
agachado que espera por uma oportunidade para atacar. A porta é
metafórica. Pode indicar a porta da vida de uma pessoa; o seu “eu”
interior; ou, simplesmente, pode indicar a idéia de algo “prestes” a
suceder. O pecado está sempre presente para perturbar e corromper. Alguns
preferem interpretar como “a porta do sepulcro” (Targuns de escn-tores judeus
posteriores). O pecado está à espreita para produzir a morte, e o dia do
juízo produzirá o resultado maligno.
Oferta pelo Pecado. Outra interpretação sugere que o que estava ‘à porta”, ou seja,
prestes a acontecer, era uma oferta pelo pecado (ou seja, um sacrifício
animal), e que tudo quanto Caim precisava fazer era tirar
vantagem desse remédio fácil para o seu pecado. E verdade que o hebraico
original pode ser assim interpretado. As ofertas pelo pecado, sob a forma
de um animal que podia ser sacrificado, estavam ali mesmo à porta (ou
cortina) da tenda. Caim, levanta-te! Oferece o sacrifício e remedia a tua
situação! Talvez já houvesse sido dada alguma instrução, agora reiterada.
Caim, faze o que deves fazer!
Declarou Jesus: “. . . não quereis vir a mim para
terdes vida” (João 5.40). Essa é, essencialmente, a atitude retratada no texto
à nossa frente.
‘Temos ai o conflito perpétuo entre o bem e o mal.
Qualquer indivíduo presa da inveja e do espirito belicoso é uma vítima do
Maligno’ (Allen P. Ross, in loc.).
O seu desejo será contra ti. Caim era o filho
primogênito, e, como tal, ele exercia uma certa medida de autoridade sobre seu
irmão mais novo, Abel. Destarte, a voz divina disse-lhe que ele estava em
uma posição privilegiada, não havendo verdadeira razão para invejar a seu
irmão. Mas outros pensam que desejo, nesse caso, indica a tentação
ao pecado, que podería ser facilmente controlada e dominada. Em outras palavras,
Deus estava dizendo a Caim que ele precisava vencer o pecado, o que
podería fazer se voltasse a ter uma atitute correta. Mas a pnmeira idéia
parece melhor.
O Primeiro Homicídio (Gn 4.8-16)
4.8 O original hebraico tem sido interpretado de vários
modos neste ponto. Algumas traduções dizem aqui: “Conversou Caim com
Abel..dando a entender que relações amistosas teriam sido estabelecidas depois
do encontro de Caim com Yahweh. Nesse caso, em uma súbita e
não-premeditada explosão de cólera, Caim matou Abel. Mas outras traduções
(como nossa versão portuguesa) dizem: “Disse Caim a Abel... Vamos ao campo’. Em
outras palavras, ele já tinha o homicídio em seu coração, e convidou
propositadamente a Abel para que fosse com ele a um lugar onde lhe
convinha executar seu maligno propósito. Nesse caso, o primeiro homicídio
foi premeditado. Ainda uma terceira tradução é possível. O termo hebraico wayyomer,
*e (ele) disse’, poderia ser uma corrupção de wayyishmor, ‘e ele
olhou’ para seu irmão. Isso significaria que Caim olhou para Abel,
com ódio e intuitos homicidas no olhar, e então passou a executar seu
terrível plano. Nesse caso, pode haver um sutil jogo de palavras com o vs.
9. Caim “fixou os olhos” em seu irmão, com intuitos assassinos.
No entanto, mais tarde, desculpou-se dizendo que não era vigia de seu
irmão, então por que teria ficado olhando para ele?
Campo. Caim teve o cuidado de assassinar a seu irmão
em um local onde não pudesse ser observado. Mas coisa alguma é feita em segredo
que não venha a ser revelada. Alguns intérpretes têm procurado identificar
o local com precisão, isto é, cerca de um quilômetro e meio distante de
Damasco, onde há uma colina que, segundo se diz, seria o lugar onde
ocorreu o fratricidio. Existe ali uma estrutura que presumivelmente
assinala o túmulo de Abel. Mas identificações dessa ordem geralmente são
fantasiosas.
Caim.., o matou. O texto não nos informa se Caim
sabia ou não o que significa morrer, e se ele, mediante um golpe ou pancada com
algum osso de animal, poderia matar um homem. Os intérpretes costumam
dramatizar o texto. Caim teria atingido Abel com uma pedra, na cabeça. Abel
caiu. Para a surpresa de Caim, ali estava Abel, imóvel. Atônito, ele
acabou percebendo que tinha acabado com uma vida humana. Foi a primeira
pessoa a ver um ser humano morrer, e isso sob as mais terríveis
circunstâncias. Não há como saber o que o autor sacro queria que
entendéssemos aqui. O drama já é grande o bastante sem nenhum vòo da
fantasia humana, conforme os intérpretes costumam fazer.
Ódio Teológico. É estranho que o primeiro assassinato tenha ocorrido por causa de um
pervertido ato de adoração. Os homens golpeiam e executam na fogueira
outros homens por motivo de teologia, e não existe ódio pior do que
o ódio religioso. Caim não se saíra bem em sua vida espiritual (o
sacrifício por ele oferecido não fora aceito); e assim, irado, matou um
homem que era seu superior espiritual. Os sistemas ensinam os homens a odiar
aqueles que são diferentes.
Ó Deus... que came e sangue fossem tão baratos!
Que os homens viessem a odiar e matar,
Que os homens viessem a silvar e decepar outros,
.. .por causa de... “Teologia.3
(Russell Champlin)
Ver no Dicionário os artigos intitulados Ódio
e Homicídio.
“Foi quando se aproximava de Deus que Caim percebeu o
quanto odiava seu irmão. Ele estava frustrado porque sentia que, de alguma
maneira, a verdade de Deus era mais preciosa para Abel do que para ele...
e então revidou... cega e amargamente, contra a superioridade que o
deixava envergonhado” (Cuthbert A. Simpson, in loc.). Os homens se
lançam contra seus semelhantes cujas realizações invejam. Nada é mais inerente
à natureza humana decaída do que isso.
Foi um irmão que Caim matou. Esse fato deveria
deixar-nos sóbrios. O ódio invadiu o próprio coração da família; e o ódio
também pode invadir o coração de membros da família de Deus.
Pensemos nos milhares de crentes que têm sido
exilados, aprisionados ou mortos por causa de disputas religiosas e de
diferenças denominacionais! Ver no Dicionário o artigo sobre a Tolerância,
o qual ilustra esse ponto. Ver especialmente a sua terceira seção.
“. . .aquele monstro de muitas cabeças, a perseguição
religiosa. . . Todo perseguidor é um filho legítimo do antigo homicida...
aquilo não foi feito por um inimigo comum... mas pela mão de um irmão’
(Adam Clarke, in loc.).
4.9 Onde está Abel...? Deus efetua outra inquisição, que
nos faz lembrar daquela de Gênesis 3.9-19,23. A voz divina volta, perscrutando
os corações dos homens: ”Que fizeste?” (Gên. 3.13 e 4.10). Deus faz
perguntas que não queremos ouvir. Caim havia eliminado seu irmão. E a
última coisa que agora Caim queria falar era sobre esse assunto. Mas não
há erro que não venha a ser desvendado (Mat. 10.26). Esse versículo fala
sobre como os homens encobrem suas maldades. Caim teve o cuidado de
cometer o seu crime onde ninguém poderia vê-lo. Tudo sucedeu no campo,
quando ele e seu irmão estavam sozinhos. Mas Deus vira tudo. A
mente perversa supõe que nenhum mal é cometido enquanto não é descoberto.
Caim repudiou a sua responsabilidade, e não se incomodou com Deus nem com
o que o juízo dvino poderia fazer. Mas isso é próprio da insensatez dos
pecadores.
Não sei. O assassino mostrou que também era um
mentiroso, tal como Jesus disse acerca de Satanás (João 8.44,45). A perversão
humana é como as raizes espinhentas que espalham os seus tentáculos por
toda parte e sobre tudo, estragando assim a personalidade inteira. A mente
criminosa quase sempre ofende em várias áreas: furtando a propriedade alheia;
violando pessoas como aqueles que ferem ou assaltam sexualmente. Dificilmente a
mente criminosa manifesta-se apenas em uma área.
Acaso sou eu tutor de meu Irmão? Muitos sermões e
lições têm sido pregados sobre essa breve declaração. A lei do amor responde
com um sonoro ”sim”. No Dicionário, ver o artigo sobre o Amor.
Tal como o mal permeia todas as áreas da atividade humana, assim também o
amor é igualmente todo-penetrante, afetando cada área da vida humana.
Jesus ensinou quem é o nosso “irmão”, a saber, qualquer pessoa em
necessidade. A parábola do bom samaritano deixou isso claro (luc. 10.33
ss.). Contraste-se isso com a limitada maneira de pensar que ele encontrou
entre os judeus. Seu irmão era um compatriota judeu, e, verdadeiramente, essa
idéia permeia todo o Antigo Testamento. Sabemos qual era a atitude dos
judeus acerca dos “de fora”, como os malditos gentios. Era um ato ético
revolucionário estender amor a Iodos os homens indistintamente. Deus
amou o “mundo”, tendo dado exemplo disso, e tomou-se o tutor de todos os
seres humanos. Não obstante, Caim falou apimentada e imprudentemente. A
providência de Deus é um fato, mas eia opera através do homem, e somente então
é que, na prática, ela se torna verdadeiramente universal.
O amor não indaga somente acerca daqueles a quem
temos ofendido. Também nos questiona a respeito daqueles a quem temos negligenciado.
As igrejas evangélicas evangelizam, mas, de modo geral, mostram-se quase
insensíveis quanto à caridade, mormente no que diz respeito aos “de fora”.
Onde está a lei do amor e aquele tipo de espiritualidade sobre o qual
Tiago falou (Tia. 2)?
Deus está com o homem; Ele o criou, mas também o
recompensa pelo bem e o pune pelo mal. Ver no Dicionário o artigo
intitulado Teismo.
4.10 Que fizeste? Ver Gên. 3.13. A voz divina fez a
pergunta vital. O dedo de Deus foi posto sobre o nervo da degradação do homem.
A pergunta não solicitava informação, pois Deus já sabia de tudo. Mas ela
apontava para a confissão e o remédio, o que será sempre a função do
Logos, a voz divina. Caim não tinha muita consciência sobre seu horrendo
crime. Foi preciso a voz divina para insuflar nele um pouco de
consciência. É admirável quão pouco a maioria dos criminosos sente a
profundeza de sua própria degradação. Nesta altura, dentro das Escrituras,
estamos dentro da Dispensação da Consciência (Gên. 3.24). Mas quão pouco disso
possui o homem caído. O bispo Butler fazia da consciência o grande
guia e o princípio moral de todos os homens, pois tinha confiança em seu
poder e atividade. A consciência é uma realidade, mas não é aquele grande
poder que o bispo Butler imaginava. Ver no Dicionário o artigo
sobre a Consciência.
A voz do sangue de teu irmão clama. O perverso
coração de Caim se endureceu; mas Deus ouvia o clamar amargo da vítima. As
vitimas silentes não estão de fato silentes, exceto para os homens. O solo
havia repudiado o ato de Caim. O sangue derramado clamava por vingança.
Testemunhas se tinham levantado contra ele. Ele tinha tido todo o cuidado para
evitar tal testemunho; mas este não pudera ser abafado.
Sangue. No hebraico lemos o plural, “sangues”, o que,
para alguns intérpretes, indica que os descendentes de Abel, ou dos justos,
continuariam a clamar contra os abusos cometidos pelos pecadores. Assim, o
Targum de Onkelos diz. ”A voz do sangue das sementes ou gerações que deveriam
vir de teu irmão”. Naturalmente, não há registro de que Abel teve filhos.
Assim, podemos entender que iodas as gerações de seres humanos,
dali por diante, haveríam de relembrar aquele horrendo crime. Jarchi
dramatizou a questão falando em muitos ferimentos, de onde o sangue
de Abel teria esguichado. Cada um daqueles ferimentos testificava contra
Caim. Como é óbvio, isso é uma fantasia, embora seja instrutivo. A justiça
divina não esquece nenhum ferimento. “Assim, juntamente com a primeira
golfada de sangue humano que foi derramado, surgiu aquele
pensamento medonho, divinamente inspirado, de que a terra não conferiría
tranquilidade para o miserável que a havia manchado de sangue” (Ellicott, in
toe).
4.11 És agora, pois, maldito. A sentença divina foi passada,
mesmo sem a presença de alguma testemunha humana. As forças policiais, em
nossas cidades violentas, resolvem somente uma pequena porcentagem dos
crimes cometidos. A maioria dos criminosos, da maior periculosidade,
caminha hoje em dia pelas ruas, buscando outras vítimas. Mas a justiça
assegura-nos de que, apesar de parecer que tudo resulta do caos moral,
ainda assim existe Um que vê tudo e que pune. Outrossim, o julgamento
divino é absolutamente completo. Caim não pôde escapar. Ele tentou esconder o seu
crime, mas Deus o descobriu. Isso posto, a justiça divina atua
sobre tudo e sobre todos. Ver no Dicionário o artigo intitulado Justiça. Emanuel
Kant baseou um argumento seu, em prol da existência de Deus, na retidão
moral. A justiça deve ser feita. Para que ela seja feita, deve haver
um Deus inteligente e poderoso o bastante para impor a justiça. De outra
sorte, precisaríamos admitir que o nosso mundo se caracteriza pelo caos e
que o pessimismo é a regra da vida, e não um justo e reto desígnio. Ver no Dicionário
o artigo acerca do Pessimismo.
Metaforicamente, o sangue de Abel havia infectado a terra, como um veneno, em
retaliação pelo homicídio cometido. O resultado foi que, quando Caim cultivasse
o solo, este produziría pouco resultado. Isso era uma parte de sua
punição. Ver ovs. 12,
4.12 O solo não te dará ele a sua força, O solo, empapado
com o sangue de Abel, perpetraria vingança contra Caim. Recusar-se-ia a
produzir com abundância. Caim haveria de trabalhar e suar, mas a terra
mostrar-se-ia relutante. Essa maldição repete aquela que fora lançada
contra Adão (ver Gên. 3.18,19, onde ofereço comentários suficientes a
respeito). A terra é aqui pintada como que dotada de força. Por
decreto divino, ela se reveste de uma fertilidade natural. Mas essa força
agora fora debilitada, exceto quanto à produção de cardos e abrolhos, que
continuam a florescer abundantemente no solo empobrecido.
Fugitivo e errante. Esse castigo não foi infligido
diretamente a Adão, mas foi o juízo especial contra Caim, Por outra parte, foi
um castigo indireto imposto a Adão, porque ele teve um filho assassinado
por outro, e seu filho assassino agora se tornaria um vagabundo pela
terra. Desse modo, Adão compartilhou do castigo de Caim, posto que
indiretamente. O relato do Gênesis ilustra sobejamente o imenso preço que
o homem precisa pagar pelo pecado. Os pecados de um homem ferem,
principalmente, a ele mesmo, e só secundariamente a outros. Ninguém é bom
sozinho, mas só pode ser bondoso com outrem, E ninguém pode ser ruim
sozinho, mas só pode ser ruim com outrem.
Pior do que um Nômade. Caim ficou reduzido a uma situação pior que a de um nômade. Um nômade
até que mostra certa lógica quanto à sua maneira de viver. Sabe o que está
fazendo. Mas o fugitivo vagueia atemorizado. O vagabundo é uma alma perdida.
Caim ficou errando, acossado pelo medo. “Quem tentaria matar-me?” Os
críticos opinam que a história de Caim originou-se em algum grupo nômade
que vivia uma vida miserável no deserto, a qual acabou registrada no livro
de Gênesis. Mas se uma tribo nômade bem poderia ler ilustrado o que
sucedeu a Caim, não há motivo para supormos algum tipo de empréstimo
primitivo aqui. Seja como for, Deus prometeu a Caim uma existência miserável e
esquálida.
Os Queneus. Ver o artigo sobre esse povo no Dicionário. Alguns supõem que Caim
teria sido o progenitor dessa tribo. Em caso contrário, a tradição que temos
no quarto capítulo do Gênesis pode estar relacionada, de alguma forma,
àquele povo. Os queneus eram um clã especíalmente abominado por Israel. Alguns
fazem retroceder esse ódio ao quarlo capítulo do Gênesis, mas isso é pura
conjectura.
Uma Sentença Perpétua. É interessante que o primeiro homicídio tenha sido punido com uma
sentença perpétua, e não com a pena de morte. De acordo com Caim, essa
punição era pesada demais: “É tamanho o meu castigo, que já não posso
suportá-lo!”. Aqueles que são encerrados em prisões, por muito
tempo, dizem-nos que tal experiência é como “um inferno em vida”.
Rixas e Vinganças Tribais. Quanta matança é descrita no Antigo Testamento, por
Israel e contra Israel! Caim também foi enviado à terra da matança e
da vingança. Ele haveria de vagabundear entre gente degenerada, sempre
matando ou sendo morta, sempre em conflito, sempre em um turbilhão. Os
historiadores ficam boquiabertos diante da extrema violência e
belicosidade das tribos antigas.
Caim tinha preferido viver esse tipo de vida, a viver
em paz na presença de Deus. Ele havia perdido seus direitos.
A Septuaginta diz aqui “gemendo e tremendo” na terra,
o que, sem dúvida, passou a ser a experiência de Caim, embora a maior parte dos
críticos textuais prefira ficar com o texto original, hebraico. Ao que
parece, a Septuaginta dá uma interpretação do texto hebraico, e não
é uma tradução de um texto diferente.
4.13 Meu castigo... já não posso suportá-lo. Caim perdeu
seu lar ordeiro e confortável, e seu trabalho relativamente ameno. Ele ampliou
o exílio de seu pai, Adão, a regiões desconhecidas, distantes do Éden. O
homem pagão agora espalhava a sua civilização. Homicidio, guerra, violência,
miséria e fome acompanharam Caim ao deserto. Ele tinha começado a pagar
sua sentença perpétua. Deus não permitiría que ele fosse morto, o que
garantiría que sua punição estivesse à altura da gravidade de seu crime.
Os homens costumam queixar-se, a exemplo de Caim, de que seu castigo é
exagerado, mas podemos estar certos de que Deus, o qual é justo e amoroso,
não pune além da medida certa. A lei da colheita segundo a semeadura
aplica-se tanto a esta vida quanto à vida futura. O que for deixado
em estado de desequilíbrio será devidamente compensado na vida por vir.
Emanuel Kant baseou um argumento em favor da idéia da sobrevivência da alma,
diante da morte biológica, sobre a necessidade de a justiça ser satisfeita.
Isso raramente acontece neste mundo. Portanto, Deus deve impor um juízo
preciso ou conferir uma recompensa precisa na outra vida. Os homens têm de
continuar existindo, para se encontrarem com o resultado de suas ações, no
outro lado da vida. Se isso não fosse verdade, então reinaria o caos,
e não a ordem e a justiça. No Dicionário, ver os artigos chamados Alma
e Julgamento de Deus dos Homens Perdidos.
Perguntou John Gill [in loc): “Se essa punição
pareceu intolerável, quais não serão os tormentos do inferno?”. John Giil
pensava que o castigo de Caim foi leve. Até mesmo homens bons têm tido
suas propriedades confiscadas e têm sido enviados ao exílio, e isso sem
nenhum motivo real. Como é claro, alguns, ao comentarem sobre o texto,
supõem que Caim esperava a segunda morte, mas o texto mesmo não indica
isso. Já pudemos notar que a antiga fé dos hebreus, antes da época dos
Salmos e dos Profetas, não incluía a doutrina da alma imaterial, nem do
céu e do inferno; nem a lei mosaica jamais ameaçou com castigos além-túmulo,
nem com bem-aventuranças além-túmulo, a quem quer que fosse. Ver as notas
sobre esse ponto, em Gên. 1.26. Uma variante do texto diz aqui:
‘Meu pecado é maior do que aquilo que pode ser perdoado”. Na realidade,
porém, não há pecado que não possa ser perdoado, exceto a blasfêmia contra
o Espírito Santo (Mat. 12.31). Ver no Dicionário o artigo Misericórdia
(Misericordioso). Os juízos de Deus não são apenas retributivos, mas
também remediais. Assim, podemos esperar que, afinal, Caim acabou achando a
vida eterna. Afinal, pessoas piores do que ele têm sido salvas. Ver II
Pedro 4.6 quanto ao juízo remedial de Deus, mesmo no caso de pessoas
ímpias. Adam Clarke (in loc) procurou mostrar que a variante
marginal é superior ao texto, mas a maioria dos críticos textuais e dos
intérpretes não concorda com essa opinião.
4.14 Hoje me
lanças da face da terra. O versículo reitera os elementos da maldição
divina (sobre o que já comentamos), adicionando apenas mais dois elementos ao
temor de Caim: ele temia vir a ser morto, por causa de sua reputação como assassino,
porquanto seria alvo do ódio de todos. Além disso, alguns homens
têm prazer em abater assassinos, como demonstram as gangues de extermínio
no Brasil. E qual o segundo elemento? Ele teria de “esconder-se” da
presença de Deus!
Quem seriam as pessoas que tentariam matar Caim? As respostas são as mais diferentes:
1. Havería raças pré-adâmicas que
ainda dominariam certas porções da terra, pois a criação de Adão teria
sido um reinicio, com uma raça superior, e não um início absoluto.
Alguns eruditos conservadores têm assumido essa posição, supondo que antes de
Adão podería ter havido muitas eras, pré-históricas e pré-bíblicas.
2. Outros pensam que Adão e Eva
tiveram muitos outros filhos, e que por esse tempo poderia já haver netos
ou mesmo bisnetos do primeiro casal. Embora o relato bíblico não forneça
tais detalhes, bem poderiamos aceitar essa suposição.
3. Ou, então, Caim estava antecipando
o que poderia vir a suceder, quando os homens viessem a multiplicar-se,
embora tal condição ainda não prevalecesse na ocasião de sua queixa.
4. Os críticos supõem que o autor
do Gênesis tenha mesclado alguns elementos de seu mito. Eie não teria
pensado, na oportunidade, em como tais pessoas poderíam ter existido, pois
também não forneceu nenhuma explicação a respeito. E assim, o registro escrito
conteria um elemento que não se coaduna com o resto.
O Segundo Elemento. A maldição divina não
havia determinado que Caim se escondería da presença de Deus, mas o próprio
Caim temia que assim sucedesse. Porém, nenhum pecador está fora do alcance da
misericórdia do Senhor. Não obstante, é verdade que a comunhão com Deus
fora rompida, e que Caim teria de se esforçar muito para reavê-la. Mas
Deus estana esperando pelo seu retomo, tal como o pai esperava pela volta
do filho pródigo (Lucas 15.11 ss.).
4.15 Qualquer que matar a Caim será vingado sete vezes.
Deus garantiu assim que Caim serviría por toda a sua sentença perpétua. Não
seria libertado de sua punição mediante uma morte súbita e violenta. O
termo vingança não é definido, nem precisamos tentar entendê-lo com
precisão. O poder divino havería de impor certa variedade de castigos
apropriados com quem quer que tentasse frustrar os Seus planos. A vingança
seria sete vezes pior do que a punição de Caim. Esse é o número
divino, e indica alguma espécie de aplicação direta divina de algum mal ou
males. “A vingança estaria visível sobre ele de alguma maneira, e isso em
alto grau” (John Gill, in loc). Os Targuns de Onkelos e de Jonathan
supõem que a expressão significa “até a sétima geração*. E se esse é o
sentido, então o castigo havería de prolongar-se por um mui longo período
de tempo. Ver os comentários sobre Gên. 4.24, um trecho que pode ser
reputado como confirmação dessa idéia.
E pôs o Senhor um sinal em Caim. Explicações
tolas, intermináveis e fabulosas têm sido dadas acerca desse sinal. Dou aqui
alguns exemplos, a fim de também não exagerar sobre algo acerca do que não
temos nenhum conhecimento:
1. Caim tomou-se um negro, uma
interpretação nitidamente racista. De acordo com essa idéia, nesse ponto,
por alguma interferência divina no seu código genético, começou a raça
negra.
2. Caim teria ficado leproso,
doença que atacou principalmente o seu rosto, tendo sido esse o inicio da
temida enfermidade.
3. Caim recebeu alguma espécie de
tatuagem, palavra impressa ou símbolo etc.
4. Caim ficou aleijado, tendo sido
a primeira pessoa aleijada do mundo.
5. Caim ficou semíparalisado, e
começou a tremer loucamente.
6. Por onde ele ia a terra ia
sofrendo terremotos!
7. Algum cão feroz o acompanhava,
guardando-o de qualquer atacante. Alguns refinam isso a ponto de dizer que
o cão era um dos guardadores do rebanho de Abel!
8. O nome ‘Yahweh* foi estampado na
testa de Caim.
9. O nome “Caim” foi estampado na
testa de Caim; ou então, “Caim, o fratricida”.
10. Caim teria sido circuncidado,
pelo que ele foi o primeiro homem a sofrer essa operação!
11. Deus fez um milagre diante de
Caim, para garantir-lhe que ele estaria a salvo do ataque de qualquer
outro ser humano. Deus lhe deu um sinal para aliviá-lo do medo de ser
atacado, garantindo-lhe também a Sua presença.
12. Deus tomou Caim invencível: ele
não podia ser queimado a fogo; uma espada não podia feri-lo; ele não podia
ser afogado na água.
13. Uma luz, como o círculo do sol,
acompanhava-o por onde ele fosse.
14 Um longo chifre cresceu em sua testa!
Chega! Quem sabe o que foi o “sinal” de Caim?
Natureza do Sinal. Sem importar qual tenha sido o sinal de Caim, visava tanto à sua
proteção quanto a mostrar o desprazer de Deus.
Extensão da Idéia. Alguns eruditos pensam que não só Caim, mas também seus descendentes,
continuariam a gozar da proteção divina. Esses descendentes formariam um povo
brutal, impondo severos danos a qualquer que quisesse prejudicar algum
membro do clã. Seja como for, e como uma interpretação ou aplicação
secundária do texto, é digno de nota que há um poder divino que nos protege
de qualquer dano físico (segundo se vê, com grande eloquência, no Salmo 91)
Fazemos bem quando pedimos a proteção divina, para nós mesmos e para
nossos familiares, todos os dias, crendo que, se uma pessoa como
Caim podia ser protegida, então nós, como crentes, certamente também
podemos.
Notemos como os péssimos efeitos do pecado de Adão
não demoraram a ir-se acumulando! Toda a história da humanidade jaz sob a
maldição de Adão. Essa maldição aumentou em Caim, e desde então nunca deixou de
agravar-se, como os cardos e abrolhos produzidos pela terra.
4.16 Da presença do Senhor,.. na terra de Node. Essa é uma bela mas triste descrição. Caim deixou a
presença de Deus e foi para a terra de Node, nome esse que significa “perambulação”.
Essa é uma verdade universal. Os homens que abandonam a presença de Deus,
automaticamente passam a vaguear, mesmo que venham a residir para sempre nas
mais belas residências, nas cidades mais avançadas e civilizadas. Pessoas
assim, mesmo que abastadas, são vagabundas. Os justos podem vaguear como peregrinos;
mas a peregrinação deles leva-os até a Cidade Celeste. Os ímpios é que
verdadeiramente vagueiam ao Iéu,
Ao oriente do Éden. À semelhança de Adão (ver Gên. 3.24), Caim afastou-se ainda mais para o
oriente do que o fizera seu pai. Logo, a alienação aprofundava-se. É
triste quando um filho ainda é mais alienado de Deus do que seu pai, O pior
erro que um pai pode fazer é transmitir a seus filhos os ensinamentos
espirituais que ele desconhece. Todo pai deve a seu filho três coisas:
Exemplo! Exemplo! Exemplo!
Node. Essa
palavra significa “vagueaçâo”, “exílio”, “vagabundagem”. Alguns estudiosos
afirmam que esse lugar ficava a leste do jardim do Éden. Não há como fazer
uma identificação. Alguns pensam na China ou na Índia, mas ninguém sabe ao
certo. E nem as tradições fomecem-nos uma informação mais segura.
4.17 Novamente, o autor sacro supôs, deliberadamente (ou,
conforme afirmam os críticos, acidentalmente), que já havia “ali” uma população
humana, além daquilo que é definitivamente afirmado no texto. A antiga
pergunta ditada pelo ceticismo: ”Onde Caim arranjou esposa?” é insensata e
esperava uma precisão detalhada que o autor do livro de Gênesis não se
incomodou em requerer de si mesmo. Ver as notas sobre Gên. 4.14 quanto a
explicações possíveis. Ver o artigo sobre Caim;m Gên. 4.1, que oferece
alguns comentários sobre a questão. A palavra incesto não teria
sentido para um homem que só tinha uma irmã com quem se casar. Ver o
artigo intitulado Incesto, em Lev. 18.6.
Deu à luz a Enoque. O “Enoque” deste texto não deve
ser confundido com um homem do mesmo nome, mencionado entre os descendentes de
Sete. Houve quatro personagens com esse nome. Ver no Dicionário o
artigo sobre Enoque. Caim chamou a cidade por ele construída de
acordo com o nome de seu filho, sem dúvida amado por ele. Ptolomeu situava
essa cidade em Hanuchta, na Susiana. A única coisa que sabemos
sobre esse homem é o que ficou registrado aqui. Não podemos dizer que ele
cresceu na iniquidade de seu pai, conforme alguns têm dito. Esse nome
significa “instruído”, “dedicado” ou “iniciado”. Oxalá isso tenha significado
que ele fora “iniciado no caminho do Senhor”. Mas talvez significasse
somente “iniciado nos conhecimentos e nas habilidades de seu pai”. E
possível que, por essa altura, Caim |á se tivesse arrependido e tivesse
restabelecido comunhão com Deus. Mas não dispomos de nenhuma informação a
esse respeito.
Uma cidade. O texto apresenta-nos Caim como o
primeiro homem a estabelecer uma comunidade urbana. Ver no Dicionário o
artigo sobre Cidade. Caim foi o primeiro arquiteto urbanista! E isso,
hoje em dia, é uma profissão de alguma consequência.
A Primeira Civilização. É um curioso fato bíblico que a primeira civilização (a qual,
finalmente, pereceu no dilúvio) teve origem cainttica. As artes e
as ciências tiveram ali os seus primórdios (ver os vss. 21 e 22 deste
quarto capítulo). A cultura dos hebreus nunca produziu muito das armadilhas da
civilização, exceto nos campos da literatura e da fé religiosa. Os povos
vizinhos a Israel sempre produziam feitos melhores e maiores nos campos
das artes e das ciências.
4.18 A Enoque nasceu-lhe Irade. Este último nome significa
“fugitivo”. Ele foi um dos filhos de Enoque, filho de Caim, o patriarca
antediluviano. Ver também Gên. 14.18. Nada se sabe sobre ele, e as
próprias tradições não acrescentam muita coisa. O fato de que o autor
sagrado importou-se em dar os nomes de algumas personagens mostra-nos que
ele lhes dava alguma importância, o que para nós se perdeu. Talvez Irade
tenha sido o primeiro prefeito de uma cidade. Isso lhe teria dado alguma
distinção.
Meujael. Nome do filho de Irade, um nome que quer
dizer “ferido por Deus”. Por sua vez, ele foi o pai de Metusael, Em outros
lugares do Gênesis, seu nome aparece com a forma de Maalaleel. Coisa
alguma se sabe sobre Meujael.
Lameque. Quanto a notas completas sobre ele, ver o Dicionário.
Ele foi uma figura que mereceu um pouco mais de comentário. Era filho de
Metusael e foi pai de Jabal e de Tubalcaim, filhos de duas mulheres
diferentes. De acordo com a Bíblia, foi o primeiro homem polígamo. A
poligamia, entre os povos primitivos, era a regra, e não a exceção. Ver no
Dicionário a nota sobre a Poligamia. Esses dois filhos de
Lameque deram inicio às artes e às ciências. Eles também tiveram uma irmã,
chamada Naamá. Damos comentários sobre essas pessoas nas notas sobre o
versículo seguinte. Em conexão com Lameque, temos o primeiro exemplo de
poesia na Biblia (Gên. 4.23,24). Exibe o paralelismo que caracterizava a poesia
dos hebreus.
“Assim, na linhagem de Caim,,. temos o começo da vida
urbana; na linhagem de Sete, o começo de uma vida de santificação; e o cainita
Lameque, regozi-jando-se nas armas inventadas por seu filho, mostrou ser o
oposto mesmo do Lameque descendente de Sete, que chamou seu filho pelo nome de
Noé, quietude, descansd’ (Ellicott, In loc.).
4.19 Duas esposas. A história do Lameque cainítico
revestia-se de algum interesse para o autor sacro. Ele tinha duas esposas, um
fato mencionado sem nenhum comentário, um exemplo que, mais tarde, se tomou a
regra universal. Ver o vs, 18 quanto ao pouco que sabemos acerca dele.
Ada. No Antigo Testamento, esse é o nome de duas
pessoas. Ver também Gên. 36.4. A primeira era uma das mulheres do Lameque da
linhagem de Caim. Nada se sabe sobre ela além daquilo que é dito aqui. Seu
nome significa “beleza” ou “adorno”. Ela teve filhos distintos, visto que
tiveram importância suficiente para serem mencionados no livro de Gênesis.
Zilá. Esse nome quer dizer sombra. Mas outros
lhe dão o sentido de “proteção” ou de “tela”. Ela foi mãe de Tubalcaim, “artífice
de todo instrumento cortante, de bronze e de ferro”. Seu filho deu inicio a
implementos de guerra, mas também a implementos agrícolas. Não há como
determinar uma data para esses povos antigos. Alguns calculam cerca de
4000 A. C. Coisa alguma se sabe sobre essa mulher, salvo aquilo que este
texto nos informa. Ver no Dicionário os artigos sobre Cobre e
Bronze. Ver também Metal, Metalurgia e Artes e Ofícios.
“O sétimo depois de Adão, através de Caim, foi Lameque
(provavelmente contemporâneo do justo Enoque, também sétimo depois de Adão, Gên.
5.3-21. Lameque alterou os planos de Deus (Gên. 2.24) e se casou com duas
mulheres” (Allen P. Ross, in loc.).
Surgimento do Nomadismo, Outro Começo (Gn 4.20-24)
4.20 Jabal. Seu nome significa mestre. Ele foi o
inventor das tendas e criava gado, uma característica das tribos nômades. Suas
invenções facilitaram a vida nômade. Ver no Dicionário o artigo
intitulado Nômades quanto a detalhes a esse respeito. Coisa alguma
se sabe sobre ele, exceto o que é sugerido no presente texto.
4.21 O nome de seu irmão era Jubal. Esse nome significa riacho.
Ele descendia de Caim através de Lameque e de Ada. Eie aparece na Bíblia como o
inventor dos instrumentos que em hebraico são chamados kinnor e ugab,
e que alguns traduzem, respectivamente, por “harpa” e “órgão*, mas que
outros dizem “lira” e ”gaita”. Nossa versão portuguesa prefere “harpa” e “flauta”.
O nome dele talvez tenha algum vínculo com o yobel, o chifre de
carneiro. Nesse caso, como músico que era, seu nome estava associado
àquele instrumento musical de sopro. Foi um artista. Seu pai nos forneceu
o primeiro poema da Biblia (Gên, 4.23,24). Assim, havia um talento
artístico na família. Achamos aqui um outro começo. A música nasceu com um
homem, e esse homem deu inicio aos instrumentos de música. Sem dúvida, o
cântico antecedeu aos instrumentos musicais, pois as cordas vocais do
homem estão adaptadas à produção de sons musicais. A cultura humana
começou a desenvolver-se a partir de invenções primitivas. É curioso
que essas invenções tivessem tido início com tribos nômades. É possível
que a “trom-beta vibrante” (Lev, 25.9) tenha sido originada por ele. O folclore
árabe preserva a tradição de que a música começou pela linhagem cainita.
Essa tradição afirma que a versatilidade e habilidade de Jubal eram tão
notáveis que as feras e as aves do campo reuniam-se em volta dele quando
ele tocava. Ver no Dicionário o artigo intitulado Musica,
Instrumentos Musicais.
4.22 Ziiá. . . deu à luz a Tubalcaim. Há outro Tubal
em Gên. 10.2. Ver no Dicionário o artigo sobre esse nome. Não se sabe o
que significa “Tubal”, mas o sufixo, cain, significa “ferreiro”
Josefo chamou-o de Thobel, tendo afirmado que ele tinha grande
habilidade militar. Criou instrumentos de matança, outro triste começo. E
claro que as suas habilidades também se destinaram a fins pacíficos, sob a
forma de instrumentos agrícolas. Ele foi o originador da metalurgia, ou,
pelo menos, deu-lhe uma nova significação. Ver no Dicionário o
artigo Metal (Metalurgia). Há outras antigas histórias sobre a questão, Vulcano
(fogo) recebia o crédito dessa invenção, por parte dos gregos e dos
romanos, trazendo assim a ajuda divina para o avanço das habilidades
humanas e para a civilização. Clemente de Alexandria creditava aos
índaeanos, ou sacerdotes de Cibele, na ilha de Chipre, as invenções
referidas neste versículo. E assim fizeram igualmente Sófocles e Estrabão (Geograph.
1.10 par, 326). A Septuaginta dá o nome com a forma de Thobel (que
Josefo seguia). Talvez a porção final do nome, cain, fosse uma
glosa antiga sobre Tubal, isto é, “Tubal, o Ferreiro”, a fim de
distingui-lo do Tubal que foi filho de Jafé (ver Gên. 10.2), Há muitas
histórias sobre como teria tido início a metalurgia.
Ferro. Ver no Dicionário o artigo intitulado Ferro.
Alguns estudiosos pensam que a menção a esse metal, neste ponto, é um
anacronismo, pois a era do ferro supostamente teria começado muito depois
do que a época de Tubalcaim sugere. A questão permanece sem solução. Ver
no Dicionário o artigo chamado Guerra.
A engenhosa mente humana tem sido empregada para
aumentar a matança, pois desde o começo houve no homem um instinto homicida.
Caim exemplificou com supremacia esse instinto. E então, um de seus
descendentes implementou essa capacidade com instrumentos de matança,
Assim, a degradação do homem foi aumentando com a passagem do tempo,
sempre encontrando alguma nova maneira de expressar-se. Deus criou o homem
na retidão, mas este muitíssimo se tem corrompido muitíssimo, E tem
inventado muitas coisas que só produzem a miséria. Então as riquezas
materiais servem somente para aumentar a deprava-ção. Aqueles que têm inventado
artes e instrumentos úteis, que melhoram a vida humana, também têm
inventado instrumentos perversos; e assim o homem é sempre o mais elevado e o
mais aviltado dos seres, dividido entre o bem e o mal, algo sobre o que Paulo
se mostrou amargo, no sétimo capítulo de Romanos.
Naamá. A primeira “filha” cujo nome nos é dado,
embora as várias esposas mencionadas antes no texto fossem filhas de alguém. O
nome dela significa ”doçura”, “deleite” ou “agradável”, Essa é a única
menção a ela na Bíblia, mas as tradições sobre ela são prolixas. De acordo
com o Targum de Jonathan, ela foi “a dama das lamentações e dos cânticos”.
E assim, seu irmão inventou instrumentos de guerra, e ela inventou as
lamentações pelos mortos! Josefo adianta que Lameque teve setenta e sete
filhos, por meio de suas duas mulheres, mas somente essa sua filha é mencionada
por nome. Autores judeus posteriores qualifica-vam-na de bela e graciosa. R. S.
Jarchi disse que ela era a esposa de Noé, e citou Bereshith Rabba em apoio
a essa noção. As lendas, porém, discordam. Outros, além de considerá-la
bela, também a consideravam justa. Mas ainda outros dizem que sua beleza
era tão notável que o mundo inteiro a desejava, e outros pensam até que
ela foi o instrumento que permitiu a entrada dos demônios neste mundo.
Toda mulher bonita é sempre associada às tentações e à maldade, mas fazer
dela a porta de entrada dos demônios no mundo não passa de um exagero. Se
pudermos acreditar nessas histórias (e é melhor não o fazermos), Naamá
foi uma espécie de Helena cainita. Dizem-nos os gregos que Helena
era tão bela que podia enviar mil navios ao mar, mediante uma mera ordem
sua. Naamá era tão bonita que podia enviar mil soldados à batalha,
usando as armas inventadas por seu irmão, naturalmente. Mas a Bíblia
diz-nos somente que ela era uma boa jovem.
4.23 E disse Lameque. Produzindo assim o primeiro poema
que achamos na Bíblia. Esse poema, concordam todos os eruditos, é de grande
antiguidade. Mas contém paralelismos, o que é típico da poesia dos
hebreus. Esse poema foi originado pela linhagem cainítica, tão criativa e
artística. E sugere que a marca de Caim persistia na sua descendência.
Aquele povo acreditava que ele tinha o direito de perpetuar terríveis
vinganças contra qualquer pessoa que ferisse a alguém de seu clã. Supõe-se
que Lameque tenha matado em autodefesa, ao passo que Caim simplesmente
cometeu fratricídio e que, assim mesmo, foi protegido divinamente por uma
marca. Lameque jactou-se de seus assassínios. Ele usara um instrumento
inventado por um de seus filhos. Linda história! Ficou de pé diante de
suas esposas e recitou o seu poema, o qual, de acordo com ele, justificava
a sua violência. Como é óbvio, a autodefesa é um direito reconhecido por
todas as legislações. Mas ninguém precisa vangloriar-se do ato. Mas
alguns eruditos pensam que Lameque havia ferido outro guerreiro em
batalha, e que, em lugar de demonstrar misericórdia, matara o adversário.
Não se interessara em fazer um prisioneiro de guerra. O texto, porém, não
nos mostra o como ou o porquê da questão. Talvez ele estivesse procurando
assegurar às suas esposas que ninguém ousaria procurá-lo para vingar-se de
seus mortos. O mais provável, todavia, é que ele simplesmente se estava
jactando de suas matanças.
As Tradições Mostram-se Ativas Aqui. Alguns supõem que o homem morto foi Caim, o qual,
agora idoso e cego, se sentara no meio de uma floresta a fim de descansar.
Lameque estaria caçando, guiado por Tubalcaim. O idoso Caim foi confundido
com um animal, e Lameque, por ordem de seu filho, matou o idoso homem, Ao
perceber o que tinha sucedido, Lameque matou seu próprio filho (o jovem do
texto). Essa história é contada com algumas variantes (ver Elmachmus, par.
7, apud Hottinger; Smegma Oriental 1.1 c. 8. pars. 224-225). Mas não
há possibilidade de essas lendas conterem alguma verdade.
Talvez tenhamos aqui uma antiga alusão à lex
talionis, o direito de vingar-se “na mesma moeda”, de acordo com a natureza
do crime cometido. A legislação mosaica, muito depois, incorporou esse
princípio, o que também se_ deu com várias legislações antigas. Ver no Dicionário
o artigo Lex Talionis. Ver Êxo. 21.23 ss., quanto a exemplos disso
nas Escrituras.
A civilização continuou à sombra de Caim. A perversão
humana chega a aterrorizar. O dia que Isaías previu para o futuro distante,
quando os homens haverão de transformar suas espadas em relhas de arado (Isa.
2.4), continua sendo visto como um mero sonho. A produtividade militar
moderna resseca os recursos humanos, mesmo quando estes são tão
desesperadoramente necessários para fins pacíficos.
4.24 De Lameque, porém, setenta vezes sete. É difícil
entender por que Lameque seria vingado com maior severidade do que no caso de
Caim, se chegasse a ser ferido por causa de alguma retaliação justificada.
Isso tão-somente fazia parte de sua jactância. Homens ímpios sempre falam
grosso demais. Os intérpretes não concordam quanto ao intuito dessa
declaração. Alguns pensam que se trata de uma lamentação. Era como se ele
tivesse dito: Caim sofreu sua punição, e agora sofrerei muito mais.
Mas o mais provável é que Lameque estivesse aqui falando de seu próprio
direito de tomar vingança contra suas vitimas impotentes, e não do direito
de alguém vingar-se dele. Ninguém ousaria vingar-se de Lameque, pois
ele era um autêntico descendente de Caim. Se alguém o ousasse, por certo
uma terrível destruição ocorrería ao tal. Isso posto, a declaração parece
conter um senso de reasseguramento para ele mesmo e para suas esposas,
confirmando diante de todos que ninguém se vingaria de Lameque. Mui
provavelmente está em pauta a Lex Talionis. Mas Lameque protestou
diante de suas mulheres que essa lei não tinha aplicação em seu caso.
“Com esse jactancioso poema, que louva a violência
armada e o derramamento de sangue, a par com indicações de uma vida de luxo e
de prazeres, o narrador encerra a história da raça de Caim” (Ellicott, in
loc.).
A Adoração ao Senhor (Gn 4.25,26)
4.25 O propósito desta breve seção é mostrar como o Senhor
proveu a substituição de Abel, o justo. O autor sacro acabara de contar a
lamentável história de um assassinato, outro crime da linhagem de Caim. Abel
foi uma vítima do iniciador dessa linhagem. A civilização ímpia
espalhara-se por meio dos descendentes de Caim. E que dizer sobre a
linhagem piedosa, desde que Abel fora assassinado? A resposta é que Sete
havia nascido para continuar a oposição ao princípio do mal. O Targum de
Jonathan diz-nos que seu nascimento teve lugar cento e trinta anos após a
morte de Abel, mas não há como confirmar isso. O bispo Usher pensa
que isso sucedeu no mesmo ano, outra conjectura que não temos como
investigar. Seja como for, isso aconteceu, e é o que importa. O
propósito de Deus foi fazer isso suceder, mais cedo ou mais tarde.
Tornou Adão a coabitar. Ver as notas sobre essa
expressão em Gên. 4.1,
Ela deu à luz um filho... Sete. Não se sabe qual a
verdadeira etimologia desse nome, mas a opinião popular é que vem do termo shith,
“nomear”, E nisso ela via uma divina nomeação para reparar o dano que
havia sido feito, Esse é um princípio verdadeiro, que opera o tempo todo,
porquanto Deus mantém este mundo de acordo com o Seu desígnio, e não sujeito ao
caos.
Sete (Filho de Adão e Eva). No hebraico, esse nome significa “compensação” ou “broto”.
Sua forma grega é Séth. Ele é mencionado nos livros de Gênesis,
I Crônicas e Lucas. Contudo, em Números 24.17 há menção a um certo Sete
que parece ter-se tratado de um rei ou de uma raça, cuja procedência e
localidade muitos estudiosos preferem dizer serem desconhecidas.
Sete foi o terceiro fiiho de Adão e Eva, depois de
Caim e Abel. Teria sido ele, realmente, o terceiro, após o qual nasceram muitos
filhos e filhas (Gên 5.4)? Ou foi Sete o terceiro filho cujo nome nos é
dado? Essa indagação é difícil de ser respondida, pois a Bíblia não nos dá
informes precisos quanto a esse particular. Ver Gên. 4,25. A piedosa
linhagem messiânica começa em Sete, e daí até Noé (Gên. 5.3,4; I Crô. 1.1;
Eclesiástico 49.16; Luc. 3.38). De conformidade com certo texto
massorético e com a recensão samaritana, Sete teve um filho de nome Enos (Gên.
5.6,7), quando estava com 105 anos (a Septuaginta diz duzentos e
cinco anos), Sete chegou aos novecentos e doze anos de idade (Gên. 4.26; 5.6-8).
Visto que as genealogias constantes em Gênesis
4,18-22 ; 5.3-32 contêm ambos os nomes de Enoque e Lameque, alguns estudiosos
pensam que uma dessas genealogias deriva-se do documento chamado “G”, e
que a outra procede do documento chamado “S”. Ver o artigo sobre Código
Sacerdotal, no Dicionário. Não obstante, outros eruditos opinam
que as diferenças sugerem duas listas inteíramente diferentes, e não
apenas uma lista confusa, por ter provindo de duas tradições diversas de
fontes informativas.
Alguns estudiosos pensam que esse terceiro filho de
Adão foi chamado Sete (Gên. 4,25) por ter tomado o lugar de seu irmão
assassinado, Abel. Pois Sete significaria “compensação”, ou, conforme
alguns, “restituição”. Todavia, essa derivação envolve certos problemas
linguísticos. Assim, de acordo com alguns especialistas, em vez de esse nome
derivar-se da raiz que significa “nomear”, “determinar” (no hebraico, shath),
teria sido selecionado por causa de sua assonância com esse verbo
hebraico.
Há uma pessoa com esse nome em Núm. 24.17; conforme a
nossa versão portuguesa e outras, mas que outras versões traduzem por “tumulto”.
Esse Sete teria sido o antepassado de um povo mencionado por Balaão, como
povo adversário de Israel, Albright (BASOR, Ixxxiii, 1941, 34) identificou esse
povo com os SWTW dos textos de execração dos egípcios. Dentro da
própria Bíblia, nada é informado que nos permita identificar esse povo.
O nascimento de Sete armou o palco para a crescente
espiritualidade do homem, de tal forma que dali por diante os homens começariam
a invocar Yahweh, em suas orações, em resultado de uma renovada
espiritualidade (ver o vs. 26).
4.26 Enos era filho de Sete. O termo hebraico por trás de Enos
é outra palavra hebraica para “homem”. Ele foi um filho varão. Mas alguns
eruditos pensam que esse nome significa “mortal” ou “decadência”. Seja como
for, ele era filho de Sete e pai de Cainâ. Morreu quando estava com 905
anos (Gên. 5.6-11). O texto diz que, com ele, os homens começaram a
invocar o nome de Yahweh, o que talvez queira dizer que foi então
estabelecida alguma espécie de adoração formal, e certamente que a
espiritualidade do homem (dentro da linhagem de Sete) estava prosperando,
tal como a impieaade do homem prosperava cada vez mais dentro da linhagem
de Caim. Seu nome aparece em Lucas 3.38 como um dos ancestrais remotos de
Jesus. Assim, Jesus veio através da linhagem de Sete, certamente algo
apropriado.
A Deus, através dos Filhos. Sete conduziu os
homens para mais perto de Deus. Seu filho deu continuação ao processo. Há uma
tremenda lição neste texto. W. R. Bowie escreveu uma composição que todo
pai deveria memorizar e recitar todos os dias:
“Ó Deus, que és nosso Pai, toma meu papel de pai e
abençoa-o com o Teu Espirito. Não me deixes decepcionar a este meu filho.
Ajuda-me a saber o que queres fazer dele, e usa-me para ajudá-lo e
abençoá-lo. Toma-me um homem amoroso e compreensivo, animado e paciente,
sensível a todas as suas necessidades, de tal modo que ele possa confiar em mim
o bastante para aproximar-se oe mim e deixar-me aproximar-me dele.
Envergonha-me quando exijo dele o que não exijo de mim mesmo; mas ajuda-me
mais e mais para tentar ser o tipo de homem que ele poderia emular. E isso
peço no nome e pela graça de Cristo. Amém”.
Há três coisas que um pai deve a seu filho: Exemplo! Exemplo! Exemplo! Os homens tinham começado a invocar o nome do Senhor,
Era chegado o tempo certo de fazer isso. Sempre será o tempo certo para tanto.
A família é sagrada. Esse deve ser um meio de promover a espiritualidade e
a visão espiritual. Esse deveria ser um lugar onde mentes jovens são ensinadas
a distinguir o certo do errado, e onde lhes é dada a visão de que devem
viver para o que é certo. Disse Ana: “Por este menino orava eu” (I Sam
1.27). Ela recebera uma resposta positiva, e dedicou a criança ao Senhor,
dando a todas as gerações uma lição. Quão triste é quando um filho amado
desvia-se do caminho do Senhor. Alguns filhos terminam em uma vida
criminosa, e passam anos na prisão. Outros chegam a se tornar homicidas.
Senhor, poupa-nos de tal sorte! Que nossos filhos se|am dedicados a Ti, e
que vivam vidas úteis que contem para o bem. Ver no Dicionário o
artigo intitulado Família.
A variante marginal diz que, nesse tempo, os homens
começavam a dar-se o nome do Senhor. Os bons separavam-se dos maus; distinções
passaram a ser feitas; a convicção espiritual se acentuava.
Nesta altura, apresento um sumário dos motivos mosaicos que emergiram do
livro de Gênesis.
Motivos Mosaicos
1. O sistema de holocaustos teve um
começo. Os homens davam os melhores animais de seus rebanhos.
2. Cada homem é guardador de seu
irmão.
3. O homicídio tinha poluído a
terra. A violência e a vingança tornaram-se características de homens ímpios.
4. Os cuidados protetores de Deus
alcançavam até mesmo Caim, e quanto mais os piedosos.
5. A punição pela culpa é uma
necessidade absoluta para qualquer pessoa, para qualquer povo.
6. A vida destituída de Deus produz
uma pessoa ou uma sociedade ímpia, segundo é ilustrado pela linhagem de Caim.
7. As artes e as ciências são boas,
mas existem paraleramente ao crime e à corrupção.
8. Deus substitui as perdas
sofridas. Abel foi morto, mas Sete tomou o seu lugar. Os propósitos de
Deus tiveram prosseguimento nele.
9. A adoração formalizada é boa. Os
homens precisam identificar-se com o Senhor.
10. Nossos filhos são herança do
Senhor, e, através deles, aproximamo-nos de Deus. Logo, grande é a nossa
responsabilidade.