Comentário de Apocalipse 13:1-18 (J. W. Scott)

Comentário de Apocalipse 13

APOCALIPSE 13, COMENTÁRIO, ESTUDO, LIVRO
No vers. 1, tanto a evidência dos manuscritos, como o contexto, favorecem a seguinte tradução: "ele ficou em pé sobre a areia do mar". O dragão, tendo falhado, ele só em esmagar a Cristo e a Seu povo, chama ao seu lado um ajudador. A besta vem subindo do mar (1), dessarte mostrando o seu caráter como um monstro marítimo (como o dragão; ver notas sobre Ap 12.3,15-16 e cfr. Dn 7.3), e demoníaco (de acordo com Ap 11.7, o mar é equivalente ao abismo). A segunda besta, por outro lado, vem subindo da terra (11). Esta diferença corresponde à existente entre behemote, o monstro terrestre (Jó 40.15 e segs.) e o leviatã, o monstro marítimo (Jó 41), criaturas que, nos livros proféticos, servem para tipificar as forças que se opõem a Deus (ver Is 27.1; Is 51.9; Ez 32.2; etc.).

Os pormenores do monstro marítimo são tirados de Dn 7. Aprendemos de Ap 17.5,9 que ele representa o poder de Roma, sendo as sete cabeças uma sucessão de imperadores, e os dez chifres, dez reis aliados (Ap 17.12); os nomes de blasfêmia são os títulos divinos que se reclamam pelos soberanos romanos. As características de leopardo, urso e leão em Dn 7.4-6 foram compartilhadas entre os três primeiros impérios. Aqui elas se combinam em uma unidade terrível de poder e malícia, o leopardo significando crueldade e astúcia, o urso força, o leão, ferocidade. Uma das cabeças foi "ferida de morte, e a sua chaga mortal foi curada" (3). Evidentemente, a referência é à morte de um dos seus imperadores. Mas de quem é dito que a chaga mortal foi curada, o Imperador em apreço, ou o Império de que ele fazia parte? Gunkel acreditava neste último, pois um monstro, sofrendo da perda de uma de suas cabeças, tem ele mesmo recebido um golpe mortal; a referência histórica podia então ser ao assassínio de Júlio César, cuja morte perigou a segurança do Império (uma de suas cabeças, no grego-hebraico de João, podia significar a primeira das cabeças). A maioria dos expositores tendem a interpretar a cura da chaga mortal como da cabeça (imperador) em apreço, que, em seguida, é identificada com a besta, ela própria (como nos vers. 12,14 e 17). Isso podia significar que um dos imperadores se ergueria da morte e assumiria em si o caráter do império inspirado pelo diabo. Precisamente isso estava sendo alegado com respeito a Nero, ao tempo da confecção deste livro; pois, se bem que ele se suicidou em 68 A. D., era largamente crido que voltaria para conduzir as forças orientais contra Roma. Ver ainda sobre 17.8,11 e note-se IXd sobre o império anticristão.

O mundo cultua tanto ao diabo como ao falso Cristo, que congrega em si as características do Império (4). A boca para proferir grandes coisas (5) é atribuída ao poder contra Deus, em Dn 7.8,20. Para os quarenta e dois meses, comp. Ap 11.2; Ap 12.14. Durante este tempo, diz-se ser dado à besta autoridade para continuar, isto é, agir perversamente; cfr. Dn 8.12; Dn 11.36. Note-se que, ainda que o dragão desse à besta a sua autoridade sobre a terra, a verdadeira permissão para os seus blasfemos ditos e feitos, e até mesmo a duração do seu reino, vêm de Deus; ver também os vers. 7,10,14-15. Nunca é a soberania de Deus mais aparente do que durante o reino do anticristo. Cfr. o vers. 6 com 2Ts 2.4 e o vers. 7 com Dn 7.21. É incerta a referência das palavras desde a fundação do mundo (8); elas podem ser ligadas com a morte do Cordeiro ou com o escrito dos nomes dos santos no livro da vida. Ambos os sentidos são igualmente verdadeiros; para aquele, cfr. 1Pe 1.19-20, para este, Ef 1.4. Resolve-se a dificuldade para quase todos quando se apela para Ap 17.8, onde se emprega linguagem quase idêntica, ligando a frase com o escrito no livro. Porém a ordem das palavras é decididamente contra esta interpretação, a não ser que fosse a verdade que o livro assim como nós o temos é uma tradução do escrito original de João. No vers. 10, assegura-se à Igreja que justiça será aplicada aos opressores e assassinos da terra. Há, contudo, uma outra tradução que diz: "Se alguém é para o cativeiro, para o cativeiro vai: se alguém deve ser morto com a espada, com a espada será morto". Deste modo, muda-se inteiramente o sentido, exprimindo a resignação que os cristãos deverão adorar em face do possível encarceramento ou martírio. Isto concorda bem com Jr 15.2; Jr 43.11, e deve talvez ser preferido. Uma segunda besta vem acudir à primeira na qualidade de seu profeta. Ela tem dois chifres semelhantes aos de um cordeiro (11), simulando o caráter de Cristo, mas foram diabólicas as suas palavras; cfr. Mt 7.15. Que a segunda besta faz que a terra... adore a primeira, besta, (12) parece indicar que esta figura representa o sacerdócio do culto ao Imperador. Mas chama-se "o falso profeta" (Ap 16.13; Ap 19.20; Ap 20.10). Contudo, como a besta de sete cabeças e dez chifres significa o império anticristão encarnado num anticristo pessoal, é provável que este sacerdócio pagão se represente também numa cabeça suprema que dirige a sua obra diabólica. Tal interpretação está de acordo com as afirmações posteriores de que o falso profeta e o anticristo são lançados "vivos" no lago de fogo (Ap 19.20; Ap 20.10), pois, duvida-se que em tais contextos uma besta represente um indivíduo e a outra um corpo de pessoas.

Essas passagens, de fato, podem sugerir que o falso profeta seja um ser demoníaco assim como o anticristo. Os sacerdotes pagãos tinham pouca compunção em valer-se de truques, tal como a produção de fogo aparentemente do céu (13), e, por ventriloquismo, fazer falar um ídolo (15). É possível, contudo, que João signifique que os milagres feitos pelo falso profeta serão genuínos. É uma característica reconhecida da profecia cristã do anticristo; cfr. Mc 13.22; 2Ts 2.9. A marca da besta (16) no povo não cristão é a contraparte do selo de Deus nos cristãos (Ap 7.1-8); ambos servem para mostrar a fidelidade, quer a Deus, quer ao diabo. Se as duas designações pretendem denotar qualidades espirituais, bem como um meio para identificação externa, elas sugerem que caráter tende a excluir as influências que não estejam de acordo com ele-no caso de crentes, influências satânicas, no caso de descrentes, as operações graciosas do Espírito Santo. Um homem se torna mais e mais semelhante à imagem do seu mestre. O efeito imediato de receber a marca da besta consiste no ostracismo social daqueles que a recusam. Envolve nada menos do que a proclamação pelo Estado de guerra econômica
contra a Igreja (17).

A marca da besta reproduziu ou o seu nome, ou o número formado, juntando os valores numéricos representados pelas letras do seu nome (em grego e hebraico não existem nomes numerais separados, as letras do alfabeto têm que servir também a esta finalidade). Seiscentos e sessenta e seis é o número. As soluções deste enigma quase alcançam esse número. Gunkel e muitos outros insistem em que ele não representa o nome de um indivíduo; a frase é o número de um homem (18) significa simplesmente "é uma computação humana", em distinção de um cálculo sobrenatural (cfr. Ap 21.17). Tais intérpretes freqüentemente consideram o número como um símbolo de ficar constantemente aquém da perfeição por parte do anticristo, posto que cada algarismo é um menos que sete; indica-se que os Oráculos Sibilinos (1.328) dizem que o número do nome de Jesus é 888, um além da perfeição. O próprio Gunkel não aceita esta sugestão, mas acha que o número serve para identificar o Imperador Romano com o monstro do caos, de que o retrato do dragão e da besta é tirado neste livro ("Caos Primordial" em hebraico dá 666). A ideia tem sido indevidamente reduzida ao mínimo no terreno em que os leitores de João mal podiam ter encontrado uma tal remota solução, posto que eles conheciam só o grego. Por conseguinte, o exegeta hodierno favorece antes a solução "Nero César", escrito defeituosamente em hebraico! Mas, se aquele seria ininteligível ao povo que fala grego, de igual modo seria este, se bem que "Nero César", transcrito em hebraico de uma grafia latina, dê o número alternativo 616, que se encontra em alguns manuscritos. A sugestão de Clemente- "O reino latino", escrito em grego, é atraente; não só dá o 666, que se requer, mas "O reino italiano" dá o alternativo 616.

Estranho como pareça, não é impossível que todas as soluções acima estejam certas. É provável que, desde que João usou uma fonte hebraica neste capítulo, o número original foi hebraico, e o número não foi inventado por ele. Como ele conhecia o mito do caos, e era um hebreu, o nome Tehom Qadmonah, "Caos Primordial", não lhe seria impróprio. Outrossim, é sugerido em nossa interpretação de Ap 17.8,11 que o profeta fundiu os mitos do monstro do caos e Nero Redivivus, para formar o seu retrato do anticristo; os adversários da Igreja encarnaram tão perfeitamente o poder antigo do mal, que ambos poderiam ser descritos sob o mesmo sumário histórico, isto é, já foram e não são, e estão para subir do abismo e ir para a perdição. Um número, portanto, que denotasse esse princípio mau, tão bem como o império e o indivíduo em que ele deva ser encarnado, era, mais do que o coração podia desejar, uma perfeita representação de bruxaria ou arte diabólica.




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