Estudo sobre Sofonias 2
IV JUDÁ É CHAMADO AO ARREPENDIMENTO (2.1-4)
v. 1. ajunte-se, nação
sem pudor. O destinatário não é mencionado, nação sem pudor. Geralmente
é uma designação aplicada a uma nação dos gentios. O v. 3 desse
capítulo muitas vezes é considerado uma interpolação, e 2.4 se refere
a quatro cidades dos fdisteus. Se 2.3 não for original, então 2.1-7 é um
oráculo contra os fdisteus, mas não há evidências nos manuscritos para essa
omissão. Se 2.3 for mantido, 2.4 se relaciona mais naturalmente com 2.5ss,
a não ser que 2.3 seja considerado um aparte relacionado a Judá
no meio de um oráculo contra a Filístia, como aliás 2.5 pode ser
também. Como um todo, parece melhor considerar 2.1-4 sendo destinado a
Judá. A luz de práticas pagãs denunciadas no cap. 1, nação sem pudor
é suficientemente adequado. Assim, 2.3 é mantido, e 2.4 forma a
base para o apelo ao arrependimento e uma cabeça-de-ponte para os oráculos
contra as nações vizinhas. Acerca das dificuldades consideráveis do texto
hebraico, v. ICC\ Hyatt; Watts. No v. 2, o texto é ainda mais
obscuro. O TM diz literalmente: “Antes de nascer um decreto, como a
palha o dia passou” (nr. da RSV). Possivelmente a LXX e a Siríaca
estão baseadas aqui numa versão anterior: “antes que vocês se tornem
palha ao vento”; cf. RSV; NEB. (BJ: “antes que sejais espalhados, como a
palha que desaparece em um dia”). O significado geral está claro: a
nação é chamada ao arrependimento antes que venha o juízo de Deus. v. 3. Busquem
o Senhor: paralelo a Busquem a justiça, inclui a busca
do conhecimento do caráter de Javé como foi revelado nos seus
majestosos atos na história, especialmente no êxodo, e levar a vida
à harmonia com as responsabilidades da aliança que isso implica, todos
vocês, os humildes da terra: aqueles que não têm poder algum
e poucos direitos, que não exigem os seus direitos diante de Deus, em
contraste com os “orgulhosos”. Esse tipo de justiça pouco
tem que ver com a observância legalista em Sl. humildade: E
mais um paralelo de justiça aqui.
Os humildes aceitam
as implicações normativas do caráter de Javé na dependência da aliança. O heb. ‘anãwim,
às vezes traduzido por “mansos”, denota a força do compromisso de fé
com Javé que rejeita a afirmação dos próprios desejos e direitos; Deus vai
vindicar a sua causa, cf. Nm 12.3. que fazem o que ele ordena:
i.e., aqueles que, em contraste com 1.4-13, cumprem o relacionamento da
aliança. talvez [...] abrigo: A raiz verbal é str c
é usada em Amós e outros textos para denotar a ideia de “escapar da
observação de Deus” (BDB), especialmente de escapar do seu juízo.
(A raiz spn, da qual deriva Sofonias, significa esconder como
tesouro com o fim de proteger). Não há a ideia de se
esconder pessoalmente (cf. 1.12,18; 3.6). v. 4. Ao meio-dia: Pode
significar que, no dia do ataque, tudo já terá passado ao meio-dia, ou que
um ataque na sesta da tarde vai causar confusão na cidade
despreparada. Esse versículo não é tanto um oráculo contra a Filístia como
uma razão para Judá prestar atenção à única possibilidade de escape.
1) O oráculo contra a
Filístia (2.5ss)
Não é dada razão específica
alguma para a inclusão da Filístia, Etiópia e Assíria no juízo. A sua
impiedade pode ter sido vívida demais na mente da nação como uma lembrança
(e.g., 1Sm 31.5,10) ou como ameaça presente (Assíria), para tornar
necessário um catálogo explícito das suas transgressões. A “suposta
tendência por parte do profeta de considerar os inimigos do seu povo
inimigos de Deus” (IB) não justifica o universalismo de Sofonias; v. tb.
o comentário de 2.8. v. 5. que vivem junto ao mar. E uma referência
aos filisteus que designa o seu território como a planície costeira, queretitas:
Lit. cretenses; alguns filisteus evidentemente invadiram Canaã de uma base em
Creta (v. NBD ). Canaã, terra dos filisteus: A extensão do
seu poder sobre Canaã depois da batalha de Gil-boa (1Sm 31) era incompleta
e foi revertida por Davi depois da sua ascensão (2Sm 5.1725; 8.1). Mesmo
assim, deram à terra o nome de Palestina. Esse versículo talvez seja
uma declaração geral de juízo sobre toda a terra de Canaã, incluindo
Judá, que foi inserida no oráculo específico contra os filisteus. Se
for esse o caso, é um ataque severo contra Judá, classificando-o na
mesma categoria dos imorais filisteus; cf. 1.4-9 e 2.1. Mas alguns
comentaristas sugerem emendas textuais; e.g., a NEB opta pelo termo ’aknfêk
em lugar do TM kena‘an, traduzindo: “Eu os subjugarei”,
que faz sentido e é um paralelo adequado, sendo as palavras semelhantes no
texto consonantal. Se se adotar essa emenda, o versículo é uma
referência aos filisteus especificamente, e a unidade de pensamento do
trecho é preservada, mas deve-se questionar se a formulação que sobreviveu é
suficientemente difícil para justificar a emenda conjecturada. v. 6. será
morada de pastores: Para Sofonias, uma referência aos habitantes da
cidade; a morada de pastores e o curral de ovelhas são
imagens de abandono. V. discussões acerca de emendas textuais em ICC, IB.
A mensagem está clara: a população e a cultura palestinas devem ser
destruídas, v. 7. remanescente da tribo de Judá: E a primeira vez
nessa profecia que aparece um futuro positivo para Judá (cf. 2.7b,9). Ele
é desenvolvido como um tema de primeira grandeza em 3.11-20. Alguns
estudiosos atribuem todas as referências à esperança à obra de redatores
posteriores, mas v. Introdução: A integridade do texto. Alt encontrarão
pastagem. V. comentário do v. 6. ao entardecer. IB sugere uma
“insignificante” emenda para “em Ecrom” (ba‘êreb para be‘eqrôn),
que, embora proporcionando um excelente paralelo, não é uma emenda tão
“insignificante” quanto se quer fazer crer e não tem apoio
nos manuscritos, cuidará deles [...] restaurará a sorte. O
verbo é traduzido por “castigar” em 1.8. Watts prefere, como a NVI em
português: “Quando o Senhor, seu Deus, os castigar, vai restaurar a
sua sorte”; cf. IB.
2) O oráculo contra Moabe e
Amom (2.8-11)
v. 8. os insultos de
Moabe e as zombarias dos amonitas-. Essa frase é com frequência considerada
um acréscimo pós-exílico, sendo o seu suposto pano de fundo histórico a
queda de Jerusalém; cf. Ez 25.3,6,8; Jr 48.26,30 e também Ez 35.12; Ob 12.
Mas a omissão de Edom aqui seria inexplicável (SL 137.7-9).
O incidente de 2Rs 24.2 em 602 a.C. é um contexto histórico mais adequado
e retém a integridade dos versículos. No entanto, isso pressupõe datar o
livro no reinado de Jeoa-quim; cf. Hyatt. A tradição e a história certamente
acumularam muitas lembranças das injúrias e hostilidades sofridas por
Israel nas mãos dos seus vizinhos orientais. Portanto, é apressado
pressupor que o oráculo deve estar relacionado a um evento registrado
em documentos insuficientes e seletivos .fizeram ameaças contra o
seu território-. Lit. “tornaram-se grandes”, pode ser uma referência
à anexação dos territórios de Israel por parte dos seus vizinhos
(NEB). A tradução preferida pelo ICC é “aumentar a boca” (“e se
vangloriavam por causa de seu território”, BJ). A expressão “meu
território” na LXX é um paralelo melhor para a expressão anterior o meu
povo. Não se deve inferir nenhuma ideia de Javé como um baal
proprietário de terras e protetor de uma região. A função representativa
singular de Israel na “história da salvação” (Heilsgeschichte)
significava que fazer zombarias de Israel era afrontar a glória de Javé.
v. 9. como Sodoma [...] como Gomorra-. A destruição dessas
cidades (Gn 19.24,25) sempre foi considerada emblemática do juízo.
A imagem das ervas daninhas, uma palavra hebraica rara e ambígua,
dos poços de sal e da desolação perpétua ofusca a destruição
cultural da Filístia; 2.5ss. O remanescente [...] os sobreviventes
[...] herdarão a terra deles-. V. comentário do v. 7. v. 11. O Senhor
será terrível. Alguns comentaristas consideram essa expressão um
acréscimo posterior, mas sem apoio nos manuscritos. A LXX traz “vão
aparecer contra eles”. Fazer a exegese desse aspecto fundamental do caráter de
Javé como sua reação pessoal e enérgica a tudo que se opõe aos
interesses mais elevados do homem, em vez de extirpá-lo do texto, iria
aumentar o nosso conhecimento do amor de Deus e poupá-lo do
sentimentalismo que forneceu a sementeira cultural para a nossa débil
sociologia. destruir, heb.: rã%ãh uma tradução melhor seria
“tornar improdutivo, escasso”, ou “desperdiçar” (BDB) “esfomear”,
ou seja, matar de fome (RSV). todos os deuses-. Os deuses da epopeia
do dilúvio dos sumérios/babilônios ficaram esfomeados no final do
período do dilúvio porque não se tinham oferecido sacrifícios a eles.
Aqui a imagem figurada indica que a conversão dos seus devotos vai fazer
esses deuses serem extintos. Aí nações de todo o mundo o adorarão, cada
uma em sua própria terra-, Pode ser traduzido por “eles [os
deuses] se curvarão diante dele, cada um de seu próprio lugar [de seu
próprio templo], todos os demônios das nações” (Watts); cf. 1Sm 5.3,4.
Por outro lado (como na NVI), pode significar a conversão dos gentios a
Javé.
3) O
oráculo contra a Etiópia (2.12)
Esse oráculo é tão breve e
indefinido que geralmente é considerado um
fragmento do original, etíopes (nr. da NVI: cuxitas): Pode
ser uma referência ao Egito cuja 25- dinastia, 712-663 a.C., havia
sido cuxita. Visto que as outras nações mencionadas estão
localizadas no Oeste, Leste e Norte, parece que Guxe foi escolhido
para representar o Sul. minha espada-. Qualquer que fosse o agente
da destruição, o juízo seria a espada de Javé.
4) O
oráculo contra a Assíria (2.13ss)
A opinião de Hyatt de que
essa seção é tão extraordinariamente
exata que certamente é “profecia após o evento”, datada logo após 612 a.C., é
uma conclusão influenciada em grande parte por suas pressuposições particulares
acerca da profecia e seu ponto de vista da data do livro. A queda
do império aparentemente invencível da Assíria e a redução da sua
capital Nínive a uma cidade tão seca como o deserto (v. 13)
destacam a insegurança da fraca, mas igualmente perversa, nação de Judá
(cf. 1.44ss; 3.1-7). A suposta “incongruência” entre os v. 13a e 14b (ICC) pode
ser diminuída se a palavra fiyyãh, “seco”, for considerada uma
condição relativa. Se absoluta, “significaria a secagem do rio Tigre, que
corria ao longo do lado sudoeste da cidade, e também do rio Khusar, que beirava
o lado noroeste da cidade. Um amplo sistema de canais trazia fartura
de água para dentro dos muros. Consequentemente, os jardins e pomares
floresciam” (ICC). A incongruência desaparece ainda mais quando
vemos (v. 14) que não somente rebanhos, mas também todo tipo
de animais selvagens se abrigavam nas ruínas; cf. o restante do contexto
(v. 14b,15). Provavelmente seja melhor não forçar os detalhes das imagens,
visto que o profeta parece usá-las por sua força, talvez à custa da
homogeneidade ou congruência, e.g., 1.3,4; cf. 2.6.14,15. todo tipo-,
heb. goy, “nação”, não pode estar correto. A NVI a trata como
uma abreviação. A NEB adota gaw, uma emenda que omite uma
letra do texto consonantal: “dos [animais] selvagens”, se empoleirarão
no topo de suas colunas, A profanação das cabeças esculpidas pelo seu
uso como poleiros ou ninhos para aves impuras e animais daninhos (ICC),
coruja do deserto, heb. kõm, uma emenda do TM qõl,
“voz”, mocho-, heb. ‘õreb, uma emenda do TM hãréb,
“desolação”. A BJ traz “corvo”. A NEB emenda para hõreb, “ave
de caça”. Aí vigas de cedro ficarão expostas-, O TM é omitido
conjecturalmente por muitos (ICC). Se for genuíno, refere-se à
retirada do paine-lamento de madeira de cedro usado em templos e palácios, v.
15. “Eu, e mais ninguém!”. Cf. Is 47.8,10. Embora a posição de
Nínive fosse inigualável no mundo, sua atitude ignorava a soberania de
Javé sobre a história e era o oposto da “humildade” (cf. 2.3). wmbam e
sacodem os punhos-, Um gesto de escárnio, expressando o desprezo intenso e
a satisfação maldosa de todos os que uma vez viveram sob sua
opressão.