Estudo sobre Gênesis 22
Gênesis 22: Deus testa Abraão
O capítulo 22 conta uma das histórias mais comoventes da Bíblia: o teste de Deus para Abraão. Em hebraico, a primeira resposta de Abraão a Deus é hinneni, uma palavra que não tem equivalente exato em inglês. Traduz-se “Aqui estou” e denota atenção, prontidão, boa vontade. A palavra aparece novamente nos versículos 7 e 11. Abraão responde antes de saber que Deus está prestes a fazer um pedido impensável. Deus descreve Isaque em três frases que intensificam a terrível ironia da instrução divina: “Toma teu filho Isaque, o teu único, a quem amas”.Depois de todas as promessas de um filho, e de todas as vezes em que a promessa foi comprometida antes de Isaque finalmente nascer, agora, antes de dar a ordem a Abraão, Deus destaca o quão precioso Isaque é para Abraão, descrevendo sua singularidade em três frases de intensidade crescente. Só então Deus dá a ordem de sacrificar Isaque na terra de Moriá, um lugar que hoje não pode ser localizado. Segunda Crônicas 3:1 refere-se ao Monte Moriá como o local do templo de Jerusalém, estabelecendo uma conexão entre o teste de Abraão e a oferta de sacrifícios no templo. Hoje, a Cúpula Muçulmana da Rocha ergue-se sobre a rocha que a tradição identifica como o local do sacrifício de Abraão.
O ritmo da narrativa assemelha-se ao do capítulo 21: fornece detalhes medidos dos preparativos de Abraão, prolongando o suspense tanto para Abraão como para Isaque, e também para o leitor. Nós nos perguntamos como Deus pode pedir esse sacrifício final a Abraão depois de todos os anos de promessas que culminaram no dom do riso que Isaque traz aos seus pais idosos. O capítulo dá continuidade ao tema do perigo da promessa que permeia toda a narrativa de Abraão mesmo após o nascimento de Isaque, como vimos no capítulo 21. Mas desta vez é o Senhor, que fez a promessa de filhos a Abraão e a repetiu inúmeras vezes. novamente através de muitas ameaças ao seu cumprimento, que parece comprometer a promessa. No capítulo anterior, Abraão hesita em banir seu filho Ismael, mas Deus insiste; agora Abraão tem apenas Isaque, e Deus o orienta a sacrificar aquele a quem ele ama. Isto será um holocausto ou holocausto. A expressão aparece seis vezes neste capítulo, destacando sua importância. No tempo de Abraão era o pai quem oferecia o sacrifício; depois que o templo foi construído e a adoração foi institucionalizada, os requisitos estipulavam que a oferta deveria ser um animal sem defeito e que o sacerdote queimaria toda a oferta no templo (ver Levítico 1:3-17).
Esses detalhes sobre a ordem divina sugerem que o episódio passou a fazer parte da narrativa no final da monarquia, quando acontecimentos políticos e militares testavam a fé de todo o povo. O alcance da ordem divina cresce em horror a cada detalhe acrescentado; aqui percebemos que Isaque é uma oferta adequada porque é imaculado. O silêncio de Abraão após seu inicial “Aqui estou!” é típico de sua aceitação silenciosa das instruções divinas ao longo de sua vida. Aqui tudo é ainda mais comovente à luz do ato terrível que lhe é pedido que realize: nenhuma palavra pode responder adequadamente a esta ordem divina. Assim como Deus ouviu o clamor de Ismael em 21:17, Abraão ouve o clamor de Isaque em 22:7; ele responde “Aqui estou” uma segunda vez. A pergunta de Isaac sobre o animal sacrificial indica que ele também espera um holocausto, mas não se imagina de forma alguma como a verdadeira vítima do sacrifício. Em 21:17 Deus se apressa em tranquilizar Hagar; aqui em 22:8 Abraão assegura a Isaque que Deus proverá.
A narrativa continua em seu ritmo infinitamente lento, contando os detalhes da preparação do sacrifício com Isaque em cima da lenha. O assunto é quase insuportável. Só quando Abraão segura a faca sobre seu filho é que o anjo impede sua mão de realizar o sacrifício e anuncia que Abraão passou no teste. A expressão “temor de Deus” conota admiração, reverência e obediência. Depois que Abraão completa o sacrifício oferecendo um carneiro, o mensageiro repete a promessa divina da descendência, desta vez relacionando-a com a obediência de Abraão a Deus. Depois disso a cena termina com a nota ambígua de que eles voltam para casa; até o narrador está exausto demais para especificar quem: apenas os criados? Isaque?
Não há menção de Sara nesta história. Só podemos nos perguntar sobre a reação dela a todo o caso. Em sua tapeçaria pendurada no saguão do Knesset, ou Parlamento, em Jerusalém, Marc Chagall retratou Sara presente no sacrifício. Sua presença na tapeçaria expressa seu amor agonizante pelo filho que lhe trouxe risos, e também intensifica a dor do acontecimento: que mãe suportaria ver seu filho se tornar um cordeiro sacrificial?
A narrativa explica que este é um teste de fidelidade de Abraão, e que ele passa com louvor. Mas a representação de Abraão, o pai, é problemática. Nos episódios anteriores, ele implora a Deus em nome dos outros. Ele implora a Deus que não destrua a cidade de Sodoma se algumas pessoas justas puderem ser encontradas lá (18:22-32). Ele se opõe quando Sara quer que Hagar e Ismael sejam banidos (21:11). Mas aqui, quando Deus lhe pede para matar o seu único filho, Isaque, o filho que lhe foi repetidamente prometido, o filho a quem ele ama, a única resposta de Abraão é “hinneni”.
Segue-se uma breve nota genealógica, informando a Abraão e ao leitor que o irmão de Abraão, Naor, tem doze filhos, incluindo um chamado Betuel, pai de Rebeca. Esta informação prenuncia as gerações futuras da família de Abraão: Isaque acabará por se casar com Rebeca, e o filho de Isaque, Jacó, se casará com as sobrinhas de Rebeca e será pai de doze filhos e uma filha.
Notas Adicionais
Alguns anos se passaram, e Isaque agora tem idade suficiente para fazer perguntas. Mesmo assim, sua obediência silenciosa ao pai é um aspecto de importância menor na história, que concentra a atenção do leitor em Abraão, para quem esse era o teste máximo de fé (cf. Hb 11.17ss). O texto diz que Deus pôs Abraão à prova (v. 1), e não que o tentou. Qualquer pai ou mãe pode entender os sentimentos de Abraão; mas é importante observar que a morte prematura de Isaque, o único filho da promessa (v. 2), anularia e invalidaria todas as promessas que Deus havia feito a Abraão. Obedecer, então, significaria tornar o futuro sem sentido; e mesmo assim ele foi, sem fazer objeções. O v. 8 pode sugerir que ele já tivesse o pressentimento de que Deus iria prover um escape. Na verdade, a palavra prover é o tema central de todo o capítulo. Esse tema torna-se bem evidente no v. 14; ele também está na raiz da palavra Moriá (v. 2), que em hebraico pode ser facilmente entendida como “lugar de provisão de Javé”. (O nome passou a ser associado com Jerusalém, cf. 2Cr 3.1, mas a referência vaga a um dos montes impede qualquer identificação segura e definitiva do local.)
22:9-14. Isaque só foi “redimido” no último momento, por meio do sacrifício de um animal; o povo de Israel não deveria esquecer nunca que o primogênito era um “sacrifício” que deviam ao Senhor (cf. Êx 13.1,15). Precisamos lembrar que Abraão, e o povo de Israel depois dele, vivia em um mundo em que se praticava sacrifício humano; e até esse ponto o Deus de Abraão ainda não lhe havia revelado a sua vontade acerca da questão. O que fica claro agora é que os padrões de Deus não são menos exigentes; mas o sacrifício de crianças foi rejeitado definitivamente. Essa lição, no entanto, é secundária, sendo subordinada aos novos aspectos do caráter de Deus revelados a Abraão. O v. 14 extrai de forma concisa toda lição possível do nome “Moriá” e dos eventos ocorridos no local: Deus vê e proverá; e, à medida que se recebe a provisão que ele dá, pode-se ver o próprio Deus. (O verbo hebraico inclui as duas idéias, ver e prover.)
22:15-19. Gomo era de esperar, visto que Isaque agora superou o perigo da morte, as promessas divinas acerca dele são renovadas e tornadas ainda mais certas a Abraão por meio de um juramento, acerca do qual Hb 6.13,14 dá explicações suficientes. Agora nada poderia impedir que Israel se tornasse uma grande nação, que conquistaria os seus inimigos e mesmo assim seria fonte de bênçãos para todos os povos. A combinação de fé e obediência por parte de Abraão (cf. Tg 2.21-24) assegurou tudo isso. 22:20-24. Essa lista genealógica pode parecer um anticlímax, mas há um claro propósito no parágrafo. Isaque deveria se tornar o progenitor de uma grande descendência; entrementes, Deus tinha “providenciado” a mãe, na pessoa de Rebeca. Os outros nomes podem parecer de importância menor, mas, junto com outras genealogias em Gênesis, ajudaram mais tarde Israel a entender sua relação com outros povos. Essa lista em particular refere-se à Síria (heb. Arã) e grupos tribais relacionados.
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