Estudo sobre Gênesis 34
Gênesis 34
Conflito em
Siquém (34.1-31)
Esse capítulo singular
corresponde de certa maneira ao cap. 14. Ali Abraão foi confrontado com uma
situação que o levou à ação militar; aqui dois dos filhos de Jacó, também em
favor de um parente, pegam a espada. Abraão, no entanto, havia atuado do
lado dos povos de Canaã e, como resultado disso, estabelecido boas
relações com eles; mas, ao contrário, os eventos em Siquém só contribuíram
para fazer da família de Jacó um “mau cheiro para os cananeus” (nota de
rodapé da NVI), como o próprio Jacó o expressou (v. 30). O capítulo
dá testemunho de relações em desenvolvimento e transformação entre
cananeus e “israelitas” (usando o termo de forma um tanto anacrônica, mas
seguindo o precedente do v. 7). A raça escolhida, embora ainda em embrião,
já era muito maior do que havia sido; já havia feito aquisições de
propriedades (33.19), e cedo ou tarde inevitavelmente surgiriam problemas
de casamentos mistos. Se Siquém (aqui o nome de um homem,
cf. v. 2) tivesse se apaixonado pela filha de Jacó (v. 3) e a tratado
com respeito, as coisas poderiam ter terminado de forma bem diferente; mas o
fato de ele ter violentado Diná (v. 2) inexoravelmente conduziu à
violência. Ele era heveu, membro de uma raça pré-cananeia da Palestina, e
parece que os seus frouxos padrões de moralidade prefiguravam os
padrões dos cananeus em épocas posteriores. O povo de Israel provavelmente
era ofendido da mesma forma ao pensar em casamentos com povos
incircuncisos; os seus comentários tinham intenções falsas e enganosas,
como afirma o texto, mas não eram necessariamente incorretos (v. 13,14). A
circuncisão já havia se tornado algo muito importante para eles, e era
impossível que considerassem a possibilidade de se tornar um só
povo (v. 16) com grupos incircuncisos, à luz de 17.9-14.
Os filhos de Jacó
determinaram então que os de Siquém deveriam se submeter à circuncisão. Os da
casa de Siquém, por seu lado, estavam dispostos a dar esse passo, visto
que estavam convictos de que um relacionamento mais próximo com o abastado
Jacó lhes traria benefícios também (v. 9,10); mas pagaram caro por
isso (v. 25-29). O capítulo termina com dois pontos de vista
opostos (v. 30,31): Jacó queria paz a qualquer preço, enquanto
Simeão e Levi mantiveram a sua posição de que a vingança tinha
sido justificada. Mais tarde, o livro de Gênesis condena a atitude deles
(49.5ss), mas nesse ponto o dilema é deixado por conta do leitor.
O cap. 34 é mais uma
narrativa para a qual não são apresentados dados cronológicos, e é
possível datá-la em época posterior à sugerida no presente contexto; muitos
eruditos defendem que Simeão e Levi a essa altura já são clãs, e não
indivíduos, em vista de seu ataque contra toda uma cidade (v. 25).
De qualquer forma, a situação é evidentemente a de Gênesis, e não
Juízes. Após o êxodo e antes da conquista de Canaã, Simeão se estabeleceu
muito mais para o sul, e Levi era uma tribo sacerdotal sem território. À
luz do número de homens que Abraão tinha capacidade de comandar (14.14),
sem falar do grande “séquito” de Jacó (33.8), seria errado insistir
em que Simeão e Levi fizeram o seu ataque totalmente desacompanhados; e
embora Diná seja indubitavelmente um indivíduo, pode ser que ela tenha sido
destacada para representar um problema muito maior e mais amplo.
Afinal, o nome do homem que a desonrou permite que ele tipifique toda
uma cidade; e o nome de seu pai, Hamor, é associado ao clã dominante dos
descendentes de Siquém ainda em Jz 9.28 (v. a NTLH). Ler Gn 34 nesses
termos mais amplos nos permite ver esse capítulo como uma lição ao
Israel posterior: a violência traiçoeira contra os seus vizinhos
seria uma reação exagerada, mas a alternativa nunca poderia ser a
aceitação despreocupada dos padrões cananeus e a prontidão de permitir
casamentos com os cananeus — essas duas reações poderiam conduzir
à submersão e conseqüente desaparecimento de Israel como um povo
separado,