Significado de Atos 27

Atos 27

Atos 27 é um capítulo dramático que narra a viagem de navio de Paulo de Cesareia a Roma, durante a qual ele enfrenta inúmeros desafios e perigos. O capítulo começa com Paulo e outros prisioneiros sendo entregues a um centurião chamado Júlio, encarregado de escoltá-los até Roma.

À medida que o navio zarpa, eles encontram ventos fortes e mar agitado, causando atrasos e dificuldades em sua jornada. Apesar do aviso de Paul de que continuar a viagem pode ser perigoso, o capitão e o proprietário do navio continuam, levando a um naufrágio desastroso na ilha de Malta.

Ao longo da jornada, Paulo continua sendo uma fonte de esperança e encorajamento, apesar das adversidades que enfrenta. Ele aconselha a tripulação e os outros passageiros, e até os conduz em oração e jejum durante a tempestade.

Apesar dos muitos desafios, o capítulo termina com uma nota esperançosa, com Paulo e seus companheiros de prisão chegando com segurança na costa de Malta e sendo recebidos pelos habitantes da ilha.

Atos 27 destaca a resiliência e a determinação de Paulo diante de circunstâncias difíceis, bem como o poder da fé para sustentar e guiar as pessoas em tempos difíceis. O capítulo também oferece um retrato vívido dos perigos enfrentados pelos antigos marinheiros e da importância de ouvir conselhos sábios e ter cautela diante do perigo.

I. Hebraísmos e o Texto Grego

Em Atos 27, o notável grego náutico do relato não apaga um substrato semita que se vê na fraseologia, na sintaxe e no léxico. Logo no v. 9, o autor ancora a cronologia na “nēsteia” já passada — um semitismo calendárico: trata-se do yôm hakkippūrîm, o Dia da Expiação (Levítico 16:29–31; Levítico 23:27), único jejum prescrito na Torá e, por isso, facilmente identificado pelos leitores judeus. A escolha de nēsteia como designação técnica judaica, no meio de uma narrativa marítima, mantém o relógio do capítulo regulado pelo calendário de Israel (Atos 27:9; Levítico 16:29–31; 23:27).

No coração do episódio, Paulo interpreta a tempestade por meio de categorias cultuais da Septuaginta: “parestē a mim, nesta noite, um angelos do Deus a quem pertenço (hou eimi) e a quem latreuō” (Atos 27:23). A dupla confissão — pertença e culto — transpõe para o grego a teologia da “propriedade” de Deus sobre Israel (ʿam segullāh), tal como vertida na LXX em laos periousios (Deuteronômio 7:6), e emprega latreuō como verbo técnico de serviço litúrgico (Êxodo 3:12 LXX: “latreuseis tō Theō”). Assim, o discurso de Paulo, ainda que em koiné, pensa com a sintaxe da aliança hebraica: ser de Deus e servi-lo.

A fala angélica prossegue com um campo lexical semita: “dei que te apresentes a César; e eis que Deus kecharistai a ti todos os que navegam contigo” (Atos 27:24). O verbo charizomai colora a salvação do grupo como dom gracioso, reativando a matriz hebraica de ḥēn (“favor”), como no refrão veterotestamentário “Noé achou ḥēn/charis diante do Senhor” (Gênesis 6:8 LXX: heuren charin). O “conceder” de Deus no meio do mar, portanto, é narrado em koiné, mas com a semântica relacional do favor bíblico.

Outro hebraísmo nítido é a contagem de pessoas como “psuchai”: “éramos... hai pasai psuchai... duzentas e setenta e seis” (Atos 27:37). Esse uso, comum na LXX para “vidas/pessoas”, reflete o hebraico nefeš como unidade de contagem (por exemplo, Gênesis 46:27 LXX: “todas as psychai da casa de Jacó”). A simples opção por psuchai — em vez de um termo civil mais “romano” para “pessoas” — deixa no grego a impressão digital do hebraico.

O capítulo preserva ainda um provérbio jurídico semita que Lucas já usa em outras cenas: “não cairá um só fio de cabelo da cabeça de vocês” (Atos 27:34). A fórmula ecoa peças clássicas do Antigo Testamento: “não cairá um só cabelo... por terra” (1 Samuel 14:45; 2 Samuel 14:11; 1 Reis 1:52). A morfologia negativa totalizante (com oute... e o substantivo “cabelo”) imita o modo hebraico de afirmar proteção absoluta, reintroduzindo no convés de um navio romano um idiomatismo forjado nos tribunais de Israel.

Quando Paulo, “eucharistēsas tō Theō enōpion pantōn”, “klasas arton”, começa a comer (Atos 27:35), a cena marinha se torna mesa israelita. Eucharisteō e enōpion (literalmente, “diante de/na presença”) são o modo lucano de verter a bênção de mesa hebraica (bārak) “na presença do Senhor” (Deuteronômio 12:7 LXX: enōpion kyriou), ao lado do idiomatismo de “partir o pão”, consagrado na LXX de Isaías 58:7 (“diaklason ton arton”). A fraseologia do v. 35, portanto, insere no fluxo da narrativa náutica uma liturgia doméstica israelita, com léxico herdado da Bíblia grega.

Mesmo verbos “comuns” são carregados de memória bíblica. Quando Paulo exorta: “isto é para a vossa sōtēria” (Atos 27:34), e em seguida promete “nenhuma apobolē psuchēs” (perda de vida; 27:22), a soteriologia do capítulo é a do êxodo — sōtēria como livramento físico, como na proclamação “vede a sōtēria do Senhor” (Êxodo 14:13 LXX). Sōzō/sōtēria aqui não é abstração filosófica, mas o antigo yešûʿâ de Israel (salvação concreta de perigo), transliterado à koiné.

Até os gestos náuticos são narrados com eco bíblico. O alijar da carga (ekbolē tou fortiou; “lançar o trigo ao mar”, Atos 27:18–19.38) atualiza o léxico de ekballō/ekbolē da LXX em narrativas de tempestade, sobretudo o paralelo clássico de Jonas 1:5, quando os marinheiros “lançam a carga ao mar” para aliviar o navio. É como se o autor dissesse: a história de Paulo passa por uma “releitura” da história de Jonas, mas com um profeta que, ao contrário, se levanta para encorajar, dar graças e salvar vidas.

Por fim, duas pinceladas sintático-fraseológicas reforçam o sotaque semita: (1) a oração dos marinheiros para “que se fizesse dia” — ēuchonto hēmeran genesthai (Atos 27:29) — preserva no grego a coloração de súplica típica da Bíblia grega (euchomai como “orar/desejar”), mesmo na boca de gentios; (2) os merismos temporais noite/dia (27:23; 27:33) e a parataxe sequencial (“e... e...”) são cadências hebraicas familiares da narrativa bíblica. Esses detalhes estilísticos fazem o capítulo “soar” como a LXX em mar aberto.

Atos 27 fala grego técnico de navegação, mas pensa com o hebraico das Escrituras: o calendário do yôm hakkippūrîm (nēsteia), a pertença cultual (hou eimi, latreuō), o dom gracioso de vidas (charizomaiḥēn), a contagem de pessoas em psuchai (nefeš), o provérbio “nem um cabelo” e a mesa “na presença” com “pão partido”, além da sōtēria como livramento êxodico e do gesto de “lançar” a carga à maneira de Jonas. É o traço semita marcando o tecido morfológico, sintático e lexical da koiné lucana.

II. Comentário de Atos 27

Atos 27:1 Lucas acompanhou Paulo nessa viagem (para outras passagens onde ele usa a primeira pessoa do plural, veja At 16.10-17; 20.5-15; 21.1-18). Entregaram Paulo e alguns outros presos a um centurião. E provável que esses outros presos também tenham apelado para César, ou talvez tenham recebido a pena de morte e estavam a caminho de Roma para lutarem como gladiadores na arena.

Atos 27:2 As palavras nós e conosco indica que Lucas também fazia parte da delegação que acompanhava Paulo.

Atos 27:3 Júlio, tratando Paulo humanamente. Os oficiais romanos tratavam seus prisioneiros com muito respeito (At 16.35-39; 18.12-16; 23.12-24).

Atos 27:4-6 Os ventos eram contrários. Não era um bom momento para navegar. Isso aconteceu alguns meses antes do inverno, quando é muito difícil navegar por causa das tempestades. Devido aos ventos contrários, o navio teve de navegar pelo o norte da ilha de Chipre, usando o continente para amenizar assim a força da tempestade. Por fim, os viajantes chegaram ao porto de Mirra, onde encontraram um grande navio que ia para a Itália.

Atos 27:7-9 Paulo e seus companheiros de viagem chegaram a Cnido, na extremidade sudoeste da Ásia Menor, cerca de 200 km de Mirra, o último porto de escala antes de navegarem pelo mar Egeu rumo à costa da Grécia. Mas o vento estava tão forte que forçou o navio a ir para o sul. Eles então navegaram ao longo da costa sul da ilha de Creta, usando a ilha novamente para diminuir a força do vento. Por fim, o navio ancorou em um pequeno porto chamado Bons Portos. E como a estação propícia para a navegação tinha chegado ao fim, continuar a viagem seria muito perigoso.

Atos 27:9-12 Paulo os admoestava. Paulo já tinha navegado muitas vezes antes. E pelo menos duas vezes já tinha passado por naufrágio (2 Co 11.25). Sendo assim, ele tinha base para o que estava dizendo. No entanto, a tripulação não ouviu seu conselho. Como Bons Portos era um porto pequeno, a tripulação resolveu tentar chegar a Fenice, o maior porto no lado oeste de Creta, a 100 km dali. E bem provável que o dono do navio quisesse levar sua carga para vender em um porto maior. Além disso, Júlio, o centurião romano, também devia estar querendo um lugar melhor para abrigar seus soldados. Em outras palavras, a ganância e o desejo de conforto podem ter cegado o bom senso.

Atos 27:13-16 Pela manhã, o mar ficou calmo e um vento suave soprou do sul, levando-os em segurança para perto da costa. Mas, de repente, uma violenta tempestade vinda do nordeste chamada Euroequilão (nome dado a todas as tempestades vindas do nordeste) atingiu o navio, impedindo-o de navegar a favor do vento. A palavra traduzida por tufão (ara) vem da mesma raiz da palavra furação. A tempestade levou o navio para o sul, a uma pequena ilha chamada Cauda, o que mais uma vez fez a força da tempestade diminuir o suficiente para que a tripulação tomasse algumas medidas para salvar o navio.

Atos 27:17, 18 Usaram de todos os meios, cingindo o navio. Já que os mastros do navio não estavam aguentando, os marinheiros recolheram as velas e as amarraram a fim de que não se perdessem. Temendo darem à costa na Sirte. Os marinheiros estavam temerosos por causa dos bancos de areia de Sirte, que ficavam ao norte da costa da África. A tripulação do navio em que Paulo estava desceu âncora então, em uma tentativa de diminuir a velocidade.

Atos 27:19 Nós mesmos, com as próprias mãos, lançamos ao mar a armação do navio. Ou seja, lançaram ao mar tudo que era um peso adicional no navio.

Atos 27:20-27 Não se perderá a vida. O Deus onipotente e onisciente deu a Paulo a garantia absoluta de que ninguém do navio se perderia. Contudo, no versículo 31, Paulo disse ao centurião que se os marinheiros saíssem do navio, seus soldados perderiam a vida. Desse modo, segundo o que Paulo havia dito, os soldados impediram os marinheiros de deixar o navio e todos chegaram a terra a salvo (v. 44). Deus cumpriu Sua palavra e Sua promessa por meio da advertência de Paulo e da escolha que os soldados fizeram.

Atos 27:28 Lançando o prumo, acharam vinte braças [...], tornando a lançar o prumo, acharam quinze braças. Uma braça equivale a aproximadamente 2m.

Atos 27:29-41 Num lugar de dois mares. Um lugar de águas rasas ao norte de Malta recebeu o nome de Baía de São Paulo. Desde a visita de Paulo, em 60 d.C, até os dias atuais os habitantes dessa ilha são cristãos.

Atos 27:42, 43 A intenção dos soldados era matar os presos porque eles conheciam a lei do exército romano. Se um prisioneiro escapasse, o soldado de guarda receberia a punição devida àquele que escapou.

Atos 27:44 E os demais, uns em tábuas e outros em coisas do navio. E assim aconteceu que todos chegaram à terra, a salvo. Talvez alguns se apoiaram em tábuas e outros destroços do navio naufragado.

Índice: Atos 1 Atos 2 Atos 3 Atos 4 Atos 5 Atos 6 Atos 7 Atos 8 Atos 9 Atos 10 Atos 11 Atos 12 Atos 13 Atos 14 Atos 15 Atos 16 Atos 17 Atos 18 Atos 19 Atos 20 Atos 21 Atos 22 Atos 23 Atos 24 Atos 25 Atos 26 Atos 27 Atos 28

Pesquisar mais estudos