Eclesiastes 3: Significado, Teologia e Exegese
Eclesiastes 3
Eclesiastes 3 é, sem dúvida, um dos capítulos mais poéticos e teologicamente densos do livro. Ele apresenta, logo em sua abertura, um hino à alternância dos tempos, cuja cadência ritmada e paralelística evoca a linguagem da sabedoria antiga, comparável aos provérbios sumérios e acádios sobre os ciclos da vida e à concepção hebraica do tempo como algo ordenado por Deus. A estrutura do capítulo se organiza em duas grandes partes: a primeira (vv. 1–8) consiste em uma lista de catorze pares de antíteses temporais que abrangem o espectro total da existência humana; a segunda (vv. 9–22) é uma reflexão teológica sobre o tempo, a limitação humana, e o papel soberano de Deus nos desígnios da vida.
O hebraico do capítulo 3 emprega formas sintéticas e paralelísticas. A construção “ʿêṯ le...” (“há tempo para...”) é repetida ritmicamente, sempre com o uso da partícula le- marcando o infinitivo: leledet, “nascer”; lamût, “morrer”; lintōaʿ, “plantar”; laʿăqōr, “arrancar” (v. 2). O estilo, portanto, é profundamente antitético e equilibrado, refletindo uma sabedoria que reconhece as tensões constitutivas da realidade. A palavra-chave do capítulo é justamente ʿêṯ (“tempo, estação, ocasião designada”), que aparece 28 vezes nos versículos 1 a 8 — um número simbólico que corresponde aos 28 tempos mencionados, como se resumisse a totalidade dos ritmos sob o sol.
Outro termo central é ʿōlām (v. 11), traduzido por “eternidade” ou “infinito”, usado na expressão “eternidade pôs ele no coração deles” (gām ’et-hāʿōlām nāṯan bĕlibbām), sugerindo que o ser humano tem um anseio intrínseco pelo que transcende os limites do tempo. Também se destacam ʿāmal (“trabalho”, v. 9), mishpāṭ e ṣeḏāqāh (“juízo e justiça”, v. 16), os quais apontam para uma inquietação ética presente na criação corrompida.
O versículo-chave que sintetiza a teologia do capítulo é o versículo 11:
“Tudo fez Deus formoso no seu tempo; também pôs a eternidade no coração deles, sem que o homem possa descobrir a obra que Deus fez desde o princípio até o fim.”
Esse versículo é o eixo hermenêutico do capítulo: ele articula a beleza da ordem divina dos tempos com a limitação epistemológica do ser humano, que mesmo tendo um senso de eternidade (ʿōlām), não consegue abarcar o todo da obra divina. Essa tensão entre transcendência e finitude é central para a teologia do livro como um todo.
Teologicamente, Eclesiastes 3 encontra eco direto no Novo Testamento, especialmente em Atos 17:26–27, onde Paulo afirma que Deus “determinou os tempos previamente estabelecidos e os lugares exatos em que cada um deveria habitar, para que buscassem a Deus”. A doutrina do tempo como algo providencial e delimitado por Deus ganha plenitude em Gálatas 4:4: “vindo a plenitude dos tempos (τὸ πλήρωμα τοῦ χρόνου), Deus enviou seu Filho”. A alternância dos tempos em Eclesiastes aponta, assim, para uma expectativa escatológica que o Novo Testamento realiza em Cristo, aquele que domina o kairós e redefine os tempos pela ressurreição.
No Antigo Testamento, a poesia de Eclesiastes 3 lembra a reflexão dos Salmos: “Os meus tempos estão nas tuas mãos” (Salmo 31:15), e também a sabedoria de Provérbios: “O coração do homem traça o seu caminho, mas o Senhor lhe dirige os passos” (Provérbios 16:9). O capítulo dialoga ainda com o livro de Jó, especialmente em sua visão de um Deus que estabelece limites e ciclos que o homem não pode ultrapassar (cf. Jó 14:5).
A lição central de Eclesiastes 3 é a de que o ser humano vive num universo ordenado por Deus, mas sem acesso pleno à lógica dessa ordem. A sabedoria verdadeira está em reconhecer a beleza do que Deus faz “em seu tempo” e em aprender a viver com reverência, humildade e gratidão diante dos ciclos da vida. O Qohelet não oferece um determinismo fatalista, mas uma espiritualidade do tempo: viver bem não é ter controle sobre os tempos, mas reconhecer que cada tempo está sob a soberania de Deus. A ética que emerge dessa visão é a da aceitação reverente — não resignada, mas cheia de temor e reconhecimento de que a eternidade só pode ser compreendida à luz do Deus eterno.
📝 Resumo de Eclesiastes 3
Eclesiastes 3 inicia com uma das passagens mais conhecidas da Bíblia, apresentando a ideia de que há um tempo determinado para todo propósito debaixo do céu (Ec 3:1-8). O Pregador lista uma série de pares opostos, ilustrando a natureza cíclica e providencial da vida e dos acontecimentos. Há tempo para nascer e tempo para morrer; tempo para plantar e tempo para arrancar o que se plantou; tempo para matar e tempo para curar; tempo para derrubar e tempo para edificar; tempo para chorar e tempo para rir; tempo para prantear e tempo para dançar; tempo para espalhar pedras e tempo para ajuntar pedras; tempo para abraçar e tempo para afastar-se de abraçar; tempo para buscar e tempo para perder; tempo para guardar e tempo para lançar fora; tempo para rasgar e tempo para costurar; tempo para calar e tempo para falar; tempo para amar e tempo para odiar; tempo para a guerra e tempo para a paz. Esta seção enfatiza a soberania divina sobre todos os eventos da vida humana, sugerindo que há um propósito maior que transcende a compreensão individual.
Em seguida, o Pregador reflete sobre o significado do trabalho humano em relação à obra de Deus (Ec 3:9-11). Ele questiona qual proveito o trabalhador tem naquilo em que se fatiga. O Pregador observa a tarefa que Deus deu aos filhos dos homens para nela se exercitarem. Ele afirma que Deus fez tudo formoso em seu tempo e colocou a eternidade no coração do homem, sem que este possa descobrir a obra que Deus faz desde o princípio até o fim.
A reflexão continua sobre o desfrute da vida como um presente divino (Ec 3:12-15). O Pregador reconhece que não há nada melhor para o homem do que alegrar-se e fazer o bem enquanto vive, e também que todo homem coma e beba e desfrute do bem de todo o seu trabalho, pois isso é um dom de Deus. Ele conclui que tudo o que Deus faz durará para sempre; nada se lhe pode acrescentar, e nada se lhe pode tirar. E Deus o faz para que os homens o temam. Ele enfatiza que o que é já foi, e o que há de ser também já foi; e Deus restaura o que passou.
A reflexão do Pregador se aprofunda na existência da injustiça e na certeza do juízo divino (Ec 3:16-22). Ele observa a maldade nos lugares de justiça e a iniquidade no lugar do direito. Então, pensa consigo mesmo que Deus julgará o justo e o perverso, pois há um tempo para todo propósito e para toda obra. Ele considera o estado dos filhos dos homens, para que Deus os prove e para que vejam que são como os animais. Pois o que sucede aos filhos dos homens, o mesmo sucede aos animais; o mesmo fôlego têm todos; e o homem não tem vantagem sobre os animais, pois tudo é vaidade. Todos vão para um mesmo lugar; todos são do pó, e todos ao pó tornarão. Quem sabe se o espírito do homem sobe e se o espírito do animal desce à terra? Diante disso, o Pregador conclui que não há nada melhor para o homem do que alegrar-se nas suas obras, pois essa é a sua porção. Quem o fará ver o que será depois dele? Esta seção destaca a mortalidade comum a todos os seres vivos e a certeza de que Deus, no tempo certo, fará justiça.
📖 Comentário de Eclesiastes 3
Eclesiastes 3.1 O seu tempo [...] e há tempo. As duas ocorrências da palavra “tempo” costumam ser interpretadas como momentos específicos, e não como um período contínuo. A expressão “debaixo do céu,” ou seja, “debaixo do sol,” refere-se a vida na terra. Não importa o que sejamos capazes, sejam quais forem as iniciativas que tomamos, na verdade somos escravos dos tempos inevitáveis e inexoráveis mencionados pelo Pregador em Ec 3,1-8. Nossa vida não é determinada apenas pelo calendário, mas também pela maré de eventos que vão e voltam. Todos os tipos de eventos nos levam de uma escolha e ação para outra. Reagimos aos eventos e, assim, determinamos o próximo curso de nossas vidas. A duração ou extensão dessa jornada depende do próximo evento que entrará em nossas vidas.
Não podemos nos colocar fora dos acontecimentos da vida. Nós fazemos parte disso, eles acontecem conosco e nós estamos no meio disso. Não podemos nos distanciar dela e depois supervisionar as coisas “do começo ao fim” (Ec 3:11). Isso só pode ser feito por Deus, Ele, “que declara o fim desde o princípio” (Is 46:10). Tudo isso coloca o homem – que se faz de dono do seu destino e pensa ter a própria vida nas mãos e poder mapeá-la – em seu lugar.
Um “horário designado” refere-se à duração de um período. Com “um tempo para cada evento” a ênfase está no conteúdo de um período, o que acontece naquele tempo. Tudo o que as pessoas fazem tem um “tempo determinado”, uma certa duração, nada mais. O homem não controla esse tempo e seu tempo não é eterno, mas medido, limitado. Portanto, não devemos dar às nossas ações um peso maior do que elas têm.
O tolo pesa as coisas do tempo como se fossem eternas (Sl 49:12-13). Por outro lado, ele considera as coisas da eternidade sem importância. Tudo ao nosso redor está em constante mudança. Que loucura é buscar a felicidade inabalável em um estágio tão mutável. É o mesmo que buscar a paz em um oceano selvagem.
Toda a seção de Ec 3:1-8 enfatiza que a vida é repleta de uma série de contrastes e que constantemente nos movemos de um estado para outro e de uma experiência para outra. Algumas são agradáveis e divertidas, e algumas são estressantes e dolorosas. Assim como os ciclos de sol, vento, nuvens e chuva continuam suas repetições incessantes, o tempo se move inexoravelmente de um evento para outro, mesmo em eventos opostos. Mas cada evento desempenha seu próprio papel no propósito de Deus.
Também há algo compulsivo nisso; não há escapatória. O tempo é um tirano que nos governa. Pouco a pouco nos sentimos mais velhos e começamos a parecer mais velhos. O tempo nos impulsiona, até o dia em que morrermos. O tempo determina a que horas fazemos qualquer coisa em nossas vidas. Tudo é ditado pelo ritmo da marcha do tempo e pelas mudanças, que não pedimos. Ninguém escolhe um momento para sofrer dor ou chorar de tristeza.
No entanto, o crente sabe que todos os eventos nada mais são do que as rodas da carroça do trono ou governo de Deus que se entrelaçam e o fazem mover (Ezequiel 1:16). Quando entendemos que Deus arranja e controla tudo, tudo parece diferente. Então somos capazes de confiar em Deus para tecer Suas intenções amorosas por nós através do tapete do tempo. Se quisermos aprender a viver a vida de acordo com o propósito de Deus, devemos trabalhar junto com o tempo de cada propósito de Deus.
O tempo na terra é preenchido com “todos os acontecimentos debaixo do céu”. Exceto que “debaixo do céu” define que tudo acontece na terra, também nos lembra que o céu tem a ver com isso. No céu está o trono de Deus, de onde emana todo o governo (Mateus 5:34). O crente pode descansar nesta consciência com respeito a todos os tipos de tempos que são descritos. Deus é o Deus de toda graça, o que significa que Ele dá a graça necessária para cada tipo de tempo na vida do crente.
Devemos aprender a “entender os tempos” (1Cr 12:32). A fé vê a mão de Deus em todas as mudanças da vida. Desta forma, o crente pode dizer com confiança: “Os meus tempos estão nas tuas mãos” (Sl 31:15). Quer sejam tempos de prosperidade ou adversidade, o crente encontra paz no pensamento de que cada período de sua vida é dirigido e governado por Deus. Todas as mudanças estão sob Seu controle absoluto. Todos esses tempos diferentes não são tempos de coincidência. O tempo é uma invenção de Deus para trazer ordem à Sua criação: “Ele fez tudo conforme o seu tempo” (Ec 3:11).
A consciência do tempo disponível para todas as coisas deve nos ensinar a ter consciência do nosso tempo. Essa consciência não deve se tornar um feitor de escravos, tornando-nos viciados em trabalho e negligenciando nossas famílias, não tendo tempo para amizades e estando ocupados demais para absorver o perfume das flores e admirar um pôr do sol.
Ser responsável com o nosso tempo também significa ter um tempo de descanso. Usamos nosso tempo com sabedoria quando, para dizer com um trocadilho, combinamos a ‘parada’ certa com o ‘passo’ certo. Trata-se de ser cuidadoso em como andamos, “não como néscios, mas como sábios, aproveitando ao máximo o seu tempo, porque os dias são maus” (Ef 5:15-16; Colossenses 4:5). Nosso lema pode ser: gaste o tempo com sabedoria, invista na eternidade.
O crente pode saber que haverá uma “plenitude dos tempos” (Ef 1:10), um período em que todos os tempos determinados por Deus encontrarão sua conclusão. Deus tem um propósito com todos os tempos que existem. Ele controla tudo de tal forma que todos os tempos terminam e se unem no reino da paz sob o governo do Senhor Jesus. A fé sabe que o que pode parecer para nós – e para o homem em geral – às vezes uma coincidência de circunstâncias, parece se encaixar no plano de Deus. Todos os tempos são uma preparação para esse tempo de mil anos de bênçãos. Tudo o que aconteceu “debaixo do céu”, isto é, na terra, aconteceu “segundo o seu propósito, que faz todas as coisas segundo o conselho da sua vontade” (Ef 1,11).
Eclesiastes 3.2 Os pares de palavras “nascer e morrer, plantar e arrancar” são apontados como acontecimentos naturais da vida, e todos estão sob o comando do Deus vivo. Na sua descrição dos acontecimentos no tempo, o Pregador começa com os dois maiores acontecimentos de uma vida humana que são ao mesmo tempo os extremos um do outro: o seu nascimento e a sua morte, ou a sua vinda ao mundo e a sua partida (Ec 3: 2). Ninguém tem qualquer influência sobre o seu nascimento. O “tempo de dar à luz” ou o “tempo de nascer” é determinado por Deus. Isso também se aplica à “hora de morrer”. Pode parecer que, por controle de natalidade e fertilização de tubo de ensaio, por um lado, e eutanásia, por outro lado, o homem determina esses dois tempos. Aqui lemos que nascimento e morte não são atos humanos, mas atos de Deus.
Entre o nascimento e a morte, para a humanidade tudo na terra acontece no período de tempo que existe então. Deus deu a tudo o seu lugar e tempo entre nascer e morrer. Com a nossa vinda ao mundo, um grande milagre acontece. Que todo ser humano nasce no próprio tempo em que nasce, é determinado por Deus em Sua infinita sabedoria. A duração da permanência de uma pessoa na terra também é fixa. Os dias e meses do homem são conhecidos por Deus e determinados por Ele (Jó 14:5). Por preocupações não podemos fazer nada sobre a duração de nossas vidas (Jó 14:5-6; Mateus 6:27). Deus pode acrescentar aos nossos dias (Is 38:1-5). Espiritualmente, podemos aplicar o tempo de nascer ao novo nascimento, nascer de Deus (Jo 3:3). Para isso é proclamado o evangelho, do qual se diz: “Eis que agora é o “tempo aceitável”, eis que é agora o “dia da salvação” (2Co 6:2). Ao mesmo tempo que nascemos de novo, sabemos que nosso velho homem foi crucificado com Cristo. A partir daquele momento nós “morremos com Cristo” (Rm 6:8).
Podemos ver um paralelo entre a primeira parte do versículo – o começo e o fim da vida humana – e o plantio e o desenraizamento do que é plantado na segunda parte dele. No tempo entre nascer e morrer, o homem “planta” (Ec 3:2). Ele começa algo com a expectativa de colher frutos disso. Chegará também o momento de “arrancar o que se plantou”. Isso também deve ser feito na hora marcada. É o caso quando nossas atividades, quando o que plantamos, não dão bons frutos. Então temos que arrancar o que está plantado.
Podemos aplicar isso a um serviço específico para o Senhor. Nós o iniciamos, mas ele também irá parar em algum momento. No meio, pode haver também uma mudança na forma como realizamos nosso serviço, ou ainda uma mudança no local onde atendemos. Estamos abertos a essas mudanças, ou seja, ao tempo de Deus plantar algo e também arrancar o que se plantou?
Devemos nos perguntar o que nós, como crentes, plantamos em nossas vidas. Essas são as boas palavras da Palavra de Deus? Se as plantarmos no ‘jardim da nossa vida’, se nos alimentarmos delas, daremos bons frutos. Por outro lado, devemos remover de nossas vidas as plantas erradas, as obras da carne (Jo 15:2). Deus faz o mesmo com as nações: Ele as derruba, mas também as planta (Jr 1:10; Jr 18:7; Jr 18:9).
Eclesiastes 3.3 A expressão tempo de matar sugere que no plano de Deus há uma época específica para executar assassinos (Gn 9.6) e para se guerrear contra inimigos indicados por Ele. Do mesmo modo, tempo de derribar significa que há um momento determinado para demolir muralhas, edificações de pedra e até mesmo nações (Is 5.5; Jr 18.7, 9). O tempo para morrer em Ec 3:2 é um ato de Deus. O “tempo de matar” (Ec 3:3) é um ato de um homem. Uma pessoa pode matar outra. Pode-se pensar em um soldado na guerra ou em um carrasco na execução de uma sentença judicial. Há também “um tempo para curar” as feridas. Então algo pode se tornar saudável novamente e ser usado. Que haja tempo para isso, é porque Deus determina o tempo para isso.
A aplicação espiritual de um tempo para matar pode ser a morte dos membros de nosso corpo terreno (Cl 3:5). Isso significa que as manifestações ameaçadoras do pecado são julgadas, para que o pecado não tenha chance de se afirmar. O pecado também pode causar feridas. Se pecamos, devemos confessá-lo. Então o pecado é perdoado. Às vezes, o pecado também tem consequências que não podem ser simplesmente removidas. Às vezes é necessário tempo para a cura. Deus dá esse tempo.
Há “tempo para derrubar” (Ec 3:3), como derrubar Jerusalém e a casa de Deus por causa da infidelidade do povo de Deus. Deus também dá restauração, de modo que para Sua cidade e Sua casa chegou “o tempo de edificação”. No futuro - agora próximo - o próprio Deus reconstruirá em Seu tempo a cabana caída de Davi, que é Seu povo Israel, “como nos dias antigos” (Am 9:11).
Do ponto de vista espiritual, “devemos destruir as especulações e toda altivez que se levanta contra o conhecimento de Deus” (2Co 10:5). Aqui se trata do nosso pensamento, dos pensamentos errados que se impõem a nós. Depois de derrubar, devemos nos edificar em nossa “fé santíssima” (Jz 1:20). Isso significa que devemos nos ocupar com a Palavra de Deus, refletir sobre ela, absorvê-la e guardá-la em nossos corações.
Paulo diz que ele “destruiu” a lei como meio de ser justificado por obras para si mesmo como cristão e não a “reconstruirá” (Gl 2:18). A lei mostrou que o homem não pode guardar a lei. É impossível estabelecer a própria justiça pela lei (Rm 10:3). Pelo contrário, o homem é condenado pela lei. Este reconhecimento significa o fim da lei como regra de vida. Sua regra de vida agora é Cristo, “porque Cristo é o fim da lei para justiça de todo aquele que crê” (Rm 10:4). Todo aquele que crê está arraigado e “edificado nele” (Cl 2:7).
Eclesiastes 3.4 Chorar [...] rir. O plano de Deus inclui tanto tristezas como alegrias. Os crentes não pranteiam do mesmo modo que os descrentes (1 Ts 4-13), mas não deixam de prantear (Mt 5.4). Dançar e saltar são formas naturais de demonstrar alegria, prazer e contentamento pela presença do Senhor (Êx 15.20; SI 149.2,3; 150.4) e pelas épocas de satisfação pessoal (Lc 15.25). Os dois pares deste versículo pertencem um ao outro. São emoções naturais e pessoais que se manifestam espontaneamente no indivíduo e mostram que a vida tem altos e baixos. Primeiro, há a expressão de tristeza, “tempo de chorar”, e depois há a expressão de alegria, “tempo de rir”.
A mesma ordem que vemos na segunda parte do versículo. Primeiro há “tempo para chorar”, depois há “tempo para dançar”. Os judeus choram quando estão na Babilônia (Sl 137:1), mas sua boca se enche de riso quando eles retornam a Sião (Sl 126:1-2). “Semear com lágrimas” precede “colhendo com júbilo” (Sl 126:5). Choramos quando observamos as consequências do pecado ao nosso redor e vemos a injustiça. Chegará um tempo em que aqueles que agora choram rirão, se alegrarão e serão consolados (João 16:20-22; Mateus 5:4; Lucas 6:21). Deus opera essa mudança nas circunstâncias e na vida dos Seus (Sl 30:11).
Pode-se lamentar a morte de um ente querido. Também pode acontecer por causa dos próprios pecados e por causa da disciplina de Deus sobre eles (Zc 12:10, 12; Jr 51:52; Ez 7:15; Jl 1:8). Dançar é uma expressão de alegria depois de receber perdão e cura (Atos 3:8). Também pode acontecer depois de uma experiência da misericórdia de Deus. Davi saltou e dançou quando a arca foi trazida para Jerusalém (2Sm 6:16).
Eclesiastes 3.5 Em tempos de paz, pedras eram tiradas dos campos, permitindo o cultivo. Durante as guerras, eram atiradas a eles para que não pudessem ser usados (2 Rs 3.19,25). Quanto ao verbo “abraçar”, neste contexto trata do envolvimento sexual. Chegou o “tempo de jogar fora as pedras” quando descobrimos que não podemos construir com o tipo de pedras que temos em nossas mãos, se não forem materiais de construção adequados. Depois de jogar fora aquelas pedras inúteis, é “hora de juntar as pedras” que podemos usar para construir. Ao jogar fora e juntar pedras, temos um exemplo na lei sobre a lepra. Há uma situação em que a lepra está presente nas pedras da parede de uma casa. Essas pedras devem ser removidas da parede da casa (Lv 14:39-40) e substituídas por pedras saudáveis (Lv 14:42).
Podemos aplicar isso aos crentes, que são chamados de pedras vivas (1Pe 2:5), mas com quem ocorreu um surto de pecado. Se tais pessoas persistirem neste pecado, devem ser removidas da igreja, que é a casa de Deus. Eles podem ser inseridos como pedras na casa de Deus novamente, uma vez que se arrependam. Vemos isso na igreja em Corinto. Em sua primeira carta a eles, Paulo escreve que eles devem remover o maligno de entre si (1Co 5:13). Em sua segunda carta a eles, ele diz que eles devem perdoá-lo e aceitá-lo novamente porque aquele que foi removido se arrependeu (2Co 2:7). O mencionado acima se conecta, mas em ordem inversa, “um tempo para abraçar”. Esse é um momento para deixar alguém se sentir aceito e seguro. Podemos literalmente fazer isso com nossos filhos. Podemos fazer isso no sentido espiritual com o pecador arrependido (Lucas 15:20).
No entanto, há também “um tempo para evitar o abraço”. Literalmente, fazemos isso com nossos filhos quando eles se comportam mal. No sentido espiritual, fazemos isso quando alguém persevera no pecado. Então não devemos dar a ele o sentimento de aceitação e segurança, caso contrário, abraçaríamos o pecado e daríamos a ele o sentimento de que seu pecado não é tão ruim assim. Então nós o afirmamos em seu pecado e ele não romperá com ele. Então a culpa será nossa.
Eclesiastes 3.6 Guardar [...] deitar fora. Há uma época da vida em que a pessoa deseja acumular coisas para desfrutar delas e de suas lembranças; um tempo depois, e necessário pensar em formas de livrar-se do que foi amontoado. Se perdemos algo e nos damos conta disso, vamos começar a buscar, então é a “hora de buscar”. Pode tratar-se de bens, mas também pode tratar-se de pessoas que vemos todos os dias, mas com quem já não temos aquele vínculo cordial de companheirismo. A distância ocorreu, perdemos a confiança um no outro. Quando vemos isso, é hora de buscar maneiras de restaurá-lo.
Também ainda é tempo de buscar a ovelha perdida, o pecador, para trazê-lo de volta ao bom Pastor. É possível que nossos esforços para encontrar os perdidos não sejam bem-sucedidos. Se percebermos que não está em nosso poder continuar nossa busca, devemos deixá-la ir. Então é “hora de desistir como perdido”. Esforços adicionais para encontrar os perdidos seriam uma perda de tempo. A segunda parte do versículo se conecta à primeira. Parece semelhante à primeira parte, mas não é igual a ela. Não se trata de algo que perdemos, mas de algo que possuímos e que devemos manter ou jogar fora. O que nos foi confiado, devemos manter. Podemos pensar naquilo que nos foi confiado, que é a verdade da Palavra de Deus (1Tm 6:20). Não devemos tirar nada disso e não devemos acrescentar nada a ele (Ap 22:18-19).O que é prejudicial para nós, devemos jogar fora ou rejeitar, como “fábulas mundanas, próprias de velhas” (1Tm 4:7), “especulações tolas e ignorantes” (2Tm 2:23) e “um homem faccioso depois de um primeiro e segunda advertência” (Tito 3:10).
Eclesiastes 3.7 Quando alguém recebia más notícias, era costume rasgar as próprias vestes para demonstrar a dor (2 Sm 13.31). Quando findava a situação desagradável, era possível coser de novo a vestimenta. No que diz respeito a estar calado e a falar, leia sobre as duas maneiras de reagir ao tolo em Provérbios 26.4, 5. Na vida pode haver uma situação em que “chegou o tempo de dilacerar” (Ec 3:7). Deus rasgou o reino de Saul. No tempo de Salomão, Ele a rasgou em duas partes. Ambas as vezes este rasgar do reino é representado simbolicamente no rasgar de um manto (1Sm 15:27-28; 1Rs 11:11-12; 1Rs 11:30-31). Chegará um momento em que a brecha no reino em duas e dez tribos será costurada novamente. Isso acontecerá quando o Senhor Jesus voltar à terra. Então as duas casas de Israel serão ‘costuradas’ novamente e formarão uma unidade (Ezequiel 37:22).
Separação ou divisões surgem nas famílias quando os membros da família aceitam o Senhor Jesus, enquanto outros membros da família não (Mateus 10:34-35). Quando os outros membros da família também se convertem, há unidade novamente e as brechas são costuradas. Na igreja, às vezes deve ocorrer divisão. Este é o caso quando a verdade da Palavra de Deus é violada e a pessoa não quer se conformar com a verdade (1Co 11:19). Se houver humildade e arrependimento, a brecha pode ser costurada novamente.
Também podemos aplicar isso a uma igreja local. Chegou a hora de separar quando na igreja, apesar da repetida insistência, não há disciplina sobre o pecado. No entanto, se a coisa errada for reconhecida, é hora de fechar a brecha novamente, ou seja, buscar e experimentar a comunhão mútua uns com os outros novamente. É dramático se o tempo não for reconhecido tanto para um como para o outro.
Em “tempo de calar e tempo de falar”, o “silêncio” vem primeiro (Ec 3:7). “O prudente se cala” no “tempo mau” (Am 5:13). “O homem de entendimento fica calado” (Provérbios 11:12) e não se junta aos escarnecedores que ridicularizam a Deus e Sua Palavra, pois ele se curva à Palavra de Deus. Também devemos permanecer calados quando Deus fala por meio do julgamento (Lv 10:3). Ezequiel teve que ficar em silêncio por um tempo para ser um sinal para o povo rebelde de Deus (Ezequiel 3:26; Ezequiel 33:22). O silêncio é o ponto de partida. Se controlarmos nossas línguas agora, não teremos que ‘comer’ nossas palavras mais tarde, ou seja, enfrentar as consequências de nossas palavras.
Devemos quebrar o silêncio se Deus nos der uma indicação de que devemos falar. O tempo de calar e o tempo de falar devem ser conhecidos e distinguidos. O sábio sabe quando calar e quando falar. Falar é falar a palavra certa na hora certa (Pv 25:11; Is 50:4). Quando solicitados, daremos conta da esperança que está dentro de nós (1Pe 3:15). Também não podemos calar a nossa fé: «Eu acreditei, por isso falei» (2Co 4,13).
Eclesiastes 3.8 Neste versículo, a primeira parte identifica o termo positivo amar antes, e o negativo aborrecer depois. A segunda parte emprega a ordem invertida, o negativo depois o positivo, para terminar em paz. O amor de Cristo nos compele a proclamar o evangelho aos perdidos. O que não está de acordo com Cristo, devemos odiar. Odiar não é apenas sobre as coisas que são simplesmente pecaminosas, mas também sobre as coisas que estão ligadas à carne e que se tornam visíveis no comportamento externo (Jz 1:23). O Senhor Jesus diz aos Seus discípulos, e a nós, que aquele que não odeia a sua própria vida não pode ser discípulo Dele (Lc 14:26). Vivemos em uma atmosfera de guerra, estamos em uma zona de guerra. É um tempo de guerra espiritual. Enquanto o Senhor Jesus ainda é rejeitado, o inimigo está empenhado em tornar nossa vida impossível para o Senhor. Mas chegará um tempo em que o Deus da paz esmagará Satanás debaixo de nossos pés (Rm 16:20). Deus fará com que o tempo de guerra chegue ao fim (Sl 46:9) e fará com que o tempo de paz chegue sob o reinado do Messias (Is 9:6).
Eclesiastes 3:9-11 Por causa da alternância de períodos de tempo com seus eventos descritos nos versículos anteriores, o lucro do trabalho em que ele labuta não é visível (Ec 3:9). Tudo acontece com ele, ele não tem influência em nada. Todos os seus esforços não mudam a natureza mutável das coisas. Ele acha que chegou a hora de plantar, mas logo percebe que o que plantou precisa ser arrancado. É assim que acontece em todos os diferentes momentos de sua vida. Uma pessoa passa inesperadamente de uma situação para outra situação.
Em Ec 3:10, o Pregador inclui Deus em suas observações. Ele olha além do sol por um momento. Não que suas observações mudem de alguma forma. Ele aponta para Deus como a origem de todos os diferentes tempos e assim confirma que nada pode influenciar o conselho imutável de Deus em relação aos tempos e eventos. Se isso ficou claro, há pelo menos alguma explicação a ser dada para a existência, embora essa explicação não seja diretamente algo para se alegrar. A atividade que Deus deu é cansativa. Esse pessimismo é desfeito pelo Pregador em Ec 3:11. Ele aponta a beleza de tudo o que Deus fez. A beleza do que Deus fez tornou-se visível no tempo que convém a essa beleza. Isso não acontece mais cedo ou mais tarde do que deveria, porque cada elemento está conectado a toda a obra de Deus.
Evidência disso pode ser encontrada no relato da criação em Gênesis 1. Cada novo dia acrescenta algo ao anterior , e quando a criação está completa, pode-se dizer: “E Deus viu tudo o que havia feito, e eis que era muito bom” (Gn 1:31). Deus deu significado e propósito a tudo. Tudo se encaixa perfeitamente em todo o Seu plano. Percebemos isso, sem considerar nem aproximadamente o alcance disso. O homem nunca pode ver tudo o que Deus fez. Ele nunca consegue se distanciar o suficiente para ver de relance “desde o começo até o fim” qual é a intenção de Deus com Sua criação. Isso deve nos humilhar, não deve nos tornar arrogantes e, portanto, não devemos julgar nada antes do tempo determinado. Temos que esperar com paciência o desenrolar completo do que ainda hoje nos parece complicado e misterioso.
O fato de Ele ter colocado “eternidade” em nossos corações significa que estamos cientes da duração de um determinado período de tempo e das características desse período de tempo específico. Temos a capacidade de aprender a ver isso à luz da eternidade. Podemos pensar sobre o curso dos eventos e procurar seu significado. Isso nos permitirá ter certeza de que as coisas devem nos servir e não devemos começar a servir as coisas. O cristão sabe que todas as coisas lhe pertencem: “Porque tudo é teu” (1Co 3,22-23). Ele ainda não tem controle real sobre isso, mas está conectado a Cristo que tem.
Eclesiastes 3:12-15 O fato de o Pregador falar em “durante a vida”, isto é, na vida dos filhos dos homens, indica ao mesmo tempo o limite (Ec 3,12). Não se estende mais. Eles só podem se alegrar e fazer o bem durante suas vidas. Então acabou. Mesmo o que os filhos dos homens desfrutam não tem valor duradouro, embora às vezes possa sobreviver a eles. O homem que está preso à terra é prisioneiro de um sistema que não pode quebrar, nem mesmo dobrá-lo. O melhor, então, é resignar-se com alegria à vontade de Deus e cumpri-la. Deus é o Doador de bênçãos terrenas e celestiais (Ec 3:13). É Seu presente para cada pessoa comer e beber e desfrutar do bem como resultado de todo o seu trabalho.
Para muitas pessoas, toda segunda-feira é o início de uma nova semana de trabalho com a repetição do trabalho monótono da semana anterior. Talvez haja uma montanha de roupa para a mulher lavar e depois passar, e para o homem pode ser colocar a mesma peça na máquina ou trabalhar com o mesmo programa de computador. Essa monotonia pode ser um terreno fértil para a insatisfação, mas também um campo de treinamento para desenvolver um caráter e uma vida de serviço. Depende se podemos ver Deus nos deveres diários que temos de cumprir. Qualquer coisa que fizermos, até mesmo comer e beber diariamente, podemos fazer para a glória de Deus, com gratidão para com Ele, pois Ele nos dá e nos permite desfrutá-lo (Ec 2:24; 1Co 10:31).
Uma mulher em Boston fez o mesmo trabalho de limpeza por 40 anos no mesmo prédio comercial. Ela foi entrevistada por um repórter que perguntou como ela conseguia manter a mesma monotonia dia após dia. A mulher disse: ‘Não fica chato. Eu uso produtos de limpeza feitos por Deus. Eu limpo coisas que pertencem a pessoas feitas por Deus e facilito a vida delas. Meu esfregão é a mão de Deus!’ Cada tarefa rotineira é importante para a obra de Deus em nós e através de nós, para o tempo e a eternidade. Tudo que é feito por amor ao Senhor Jesus, mantém seu valor e continuará existindo.
“Pois Deus fez [assim] que os homens deveriam temê-lo”. Tudo o que Ele faz deve provocar em nós temor, reverência e admiração por Ele. O temor de Deus não causa um medo paralisante, mas, ao contrário, uma confiança de todo o nosso ser a Ele, precisamente porque em suas obras Ele se deixa conhecer como o Deus protetor. O temor de Deus é a chave para a compreensão deste livro.
Existem alguns aspectos em “tudo o que Deus faz” que equilibram a pressão da monotonia de todas as coisas na natureza, na história e na vida do homem (Ec 3:14). Esses aspectos têm a ver com a perfeição de Deus e a beleza de Sua ordem e, como resultado, o temor do homem por Ele:
1. Tudo o que Deus faz não é temporário, mas permanece “para sempre”, permanente, qualquer falha é estranha para Ele. ‘Para sempre’ significa enquanto a terra existir.
2. O que Ele faz não é imperfeito, mas completo e eficaz, pois “não há nada a acrescentar e nada há a tirar”. Ele não desiste de nenhuma de Suas obras, nem nada precisa ser acrescentado para melhorar Sua obra.
3. Ele não precisa de nenhum conselheiro ou proteção para tudo o que faz (Rm 11:34-35). Tudo é perfeito em design e realização; não há necessidade de tirar nada dela. Nada disso corre o risco de ser atacado por um poder hostil, muito menos ser destruído.
Existe uma conexão entre ‘o que é’, ‘já foi’ e ‘o que será’ (Eclesiastes 3:15). Todos os eventos, tanto no tempo presente, que é “o que é”, quanto no passado, do qual se diz, “já foi”, e o futuro, “o que será”, estão conectados um ao outro pelo justiça de Deus que dirige todas as coisas. Deus determinou o curso das coisas, e porque Ele sempre age com retidão, as coisas continuam a acontecer como Ele ordenou. A imutabilidade do mutável existe desde o início da criação e continuará a existir (Ec 1:9-11).
Não é sabedoria pensar ou dizer que o mundo nunca foi tão ruim como agora e que as coisas eram melhores no passado. O contrário também não é verdade: nem tudo vai melhorar porque o homem é mais inteligente do que era no passado, ou porque passa a se comportar de maneira mais exemplar. O que vemos não é diferente do que costumava ser, é apenas uma variação disso. O mesmo vale para as variações que virão.
Deus mantém o ciclo da natureza e da história. O que desapareceu dela para o homem também está sob Sua atenção constante. Ele a “procura” (cf. Is 11,11-12). Que Ele deve procurá-lo não significa que Ele o perdeu e não saberia onde está. Significa que Ele está verificando coisas que desapareceram para o homem. Coisas que o homem perdeu de vista, Ele convoca para aparecer. Com isso, a história se repete e o passado se torna presente.
Deus também mantém o controle do passado. Ele pode nos lembrar do passado quando considera necessário fazê-lo para nos ensinar lições para o presente e para o futuro. Caim pensa que pode enganar a Deus dizendo que não sabe onde está Abel. Mas Deus diz a ele que ouve o sangue de Abel chamando por Ele (Gn 4:9-10).
Da mesma forma, todo o sangue de todos os santos que foram mortos ao longo dos séculos por causa de Seu Nome o chama. Ele atenderá o chamado e deixará transparecer os crimes cometidos. Eles estão registrados em Seu livro que Ele abrirá quando os incrédulos estiverem diante do grande trono branco, para lembrá-los do que fizeram no passado (Ap 20:12-13).
Eclesiastes 3.9 Que vantagem tem o trabalhador naquilo em que trabalha? É a mesma pergunta feita em Eclesiastes 1.3. No versículo em análise, a resposta é que tudo na vida reflete o plano de Deus. O esforço do homem e incapaz de modificar o tempo, as circunstancias e o domínio que Deus tem sobre o destino que reservou para ele.
Eclesiastes 3.10 A palavra “trabalho” pode ter uma conotação neutra, como neste versículo (ver Ec 5.3; 8.16), ou negativa (algo incomodo), como em Eclesiastes 1.13; 2.23,26; 4-8; 5.14.
Eclesiastes 3.11 “Tudo na criação de Deus é formoso.” A mensagem neste versículo e que Deus faz tudo ser assim em seu tempo. Da perspectiva divina, não há feiura nos acontecimentos de nossa vida (Ec 3.1-8). A expressão “o mundo no coração deles” se refere ao impulso profundamente enraizado e compulsivo no homem de transcender sua mortalidade e descobrir o sentido e o destino do mundo. Como somos feitos a imagem de Deus, possuímos uma vontade inquiridora inata a respeito de realidades eternas. Só encontramos a paz quando conhecemos nosso Criador. E mesmo neste momento, conhecemos Deus apenas em parte (1 Co 13.12). Tudo o que vemos é um micromomento de nossa existência frente à eternidade, ou seja, não é possível descobrirmos a obra do Senhor desde o princípio até ao fim. Neste sentido, as Escrituras conclamam o ser humano a viver firmado numa fé sólida, principalmente nos momentos de dor e tribulação; no plano existencial superior, Deus tornará tudo formoso.
Eclesiastes 3.12, 13 Não há coisa melhor. Conforme Eclesiastes 2.24, o sábio aconselha-nos a aproveitarmos o dia na alegria do Senhor. Na passagem em questão, a fé bíblica reafirma essa ideia e conclama a alegria, expressa pelos verbos “alegrar” e “gozar”, mesmo enquanto vivermos em um mundo perverso e sob enorme aflição; isto se deve ao verdadeiro contentamento que encontramos no Deus vivo.
Eclesiastes 3.14, 15 As obras de Deus são duradouras. Como aconselham os textos em Deuteronômio 4.2 e 12.32 e em Provérbios 30.6, nada se pode acrescentar e nada se pode tirar das palavras ditas pelo Senhor. Isso e exigido para que haja temor diante dele, O temor a Deus na literatura que instrui o homem se refere a legitima consagração, e não ao terror (Ec 5.7; 12.13).
Eclesiastes 3.16, 17 O termo “juízo” também pode ser traduzido como “justiça”, tornando o contraste ainda maior entre as palavras. Era ultrajante que, nos próprios estabelecimentos em que as pessoas deviam receber justiça, só encontrassem impiedade. O autor de Eclesiastes alerta os juízes ímpios de que Deus, o Juiz dos juízes, vira para retificar todo erro e trazer a verdadeira justiça. Este tema é tão proeminente no livro que Salomão o repete na conclusão (Ec 12.14) e menciona-o frequentemente no decorrer de sua argumentação (Ec 9.1; 11.9)
O Pregador continua com suas observações e vê outra coisa, um novo problema de vida. Este problema é a “maldade” que está acontecendo em todo o mundo, especialmente “no lugar da justiça” e “no lugar da justiça”, que são os lugares onde se pode esperar a manutenção da lei e da justiça (v. 16).
Ele viu exemplos concretos de distorção da justiça, como governantes opressores, juízes injustos e hipocrisia religiosa em tribunais onde a justiça deve ser feita. Ele viu o mesmo em câmaras de conselho seculares ou religiosas onde a lei da justiça divina deve ser aplicada. Nesses lugares as pessoas são egoístas e ambiciosas. A maior injustiça no lugar da justiça é o julgamento contra o Senhor Jesus.
Como gostaríamos de ter um mundo onde o mal fosse punido direta e justamente e o bem fosse recompensado direta e justamente. No entanto, devemos nos reconciliar com a realidade de que isso – até que Cristo venha à terra – é uma utopia. Isso nos leva à questão de como devemos lidar com a injustiça que está presente e como devemos reagir a ela. Gostaríamos de uma resposta para essa pergunta. A pesquisa do Preacher nos ajuda a encontrar essa resposta.
Após a injustiça que ele viu “debaixo do sol”, novamente seu comentário segue em Ec 3:17, começando com “eu disse”. É na forma de uma consideração, pois ele diz isso ‘para si mesmo’. Em sua consideração, que como que automaticamente sobe ao seu coração quando ele vê a injustiça, ele se refugia em Deus como o justo Juiz. Deus julgará a injustiça no futuro. Este julgamento diz respeito tanto à consideração, “todos os assuntos”, quanto às ações, “todos os atos”. O julgamento de Deus não se limita a pronunciar o julgamento, mas também significa a execução da sentença.
O pensamento de que a injustiça também tem um limite de tempo, e que Deus estabelece esse limite, é um consolo quando vemos toda a injustiça no mundo (Gn 18:25; Sl 73:17). Não podemos mudar essa injustiça, mas Deus estabeleceu um tempo para tudo (Ec 3:1-8). Deus também determinou um tempo, um dia, quando Ele julgará (Atos 17:31; Salmos 37:13). Qualquer julgamento injusto será reaberto e revisado perante o tribunal de Cristo. “O Juiz está à porta” (Tg 5:9), que é Cristo. Ele julgará perfeitamente.
Eclesiastes 3:18-21 O julgamento de Ec 3:17 ainda está adiado, embora ansiamos por isso. Pode nos dar uma sensação insatisfatória de que o mal pode fazer seu trabalho sem impedimentos. No entanto, isso também tem um propósito: toda injustiça com o tempo se torna um teste que torna infalivelmente claro se tememos a Deus ou não. Aprendemos a verdade sobre nós mesmos e então descobrimos que não somos apenas juízes da injustiça ao nosso redor, mas que a injustiça também está dentro de nós.
A injustiça do homem prova pelo menos um aspecto da intenção de Deus: ela fornece uma demonstração inegável na cena da história de nossa ignorância de nossa própria natureza e destino. Provavelmente não há nada mais capaz de expor o homem como pecador e perverso – e isso em todos os níveis – do que amaldiçoar a iniquidade do mundo. Qualquer um que teme a Deus pode suportar a injustiça. Quem o amaldiçoa não conhece a si mesmo.
O homem não é melhor do que os animais, desde que viva sem conexão com a eternidade. Enquanto os filhos dos homens não temerem a Deus, eles não conhecerão a Deus. E se não conhecem a Deus, se exaltam com toda a injustiça do mundo. A injustiça mostra que o homem é tão cruel e frequentemente mais cruel que os animais. Além disso, o homem tem em comum com os animais o fato de morrer como os animais. Sem envolver Deus ou a eternidade, não há diferença entre o homem e a besta. Então o homem fica no mesmo nível que a besta. Reconhecemos isso na teoria da evolução, que assim raciocina porque exclui Deus da busca da origem da criação.
Ec 3:19-21 dá uma explicação de Ec 3:18. Aos olhos, humanos e feras vão para o mesmo lugar. Todos eles têm o sopro da vida (Gn 7:22; Sl 73:22; Pv 7:22), e um homem pode ser enterrado “com a sepultura de um jumento” (Jr 22:19). Ec 3:19 mostra a mortalidade do homem como algo que ele tem em comum com todas as criaturas terrenas. Confronta-nos com a queda no pecado e com a ironia de que, embora nos imaginemos deuses, nós, humanos, morremos como os animais. O homem e os animais têm como origem comum o pó da terra (Ec 3:20). Através do pecado do homem, o homem e os animais também, retornam para lá quando morrem (Gn 3:19).
O Pregador também nota a diferença entre homem e animal no que acontece após a morte (Ec 3:21). Retornar ao pó refere-se ao corpo do homem e do animal. No entanto, o homem tem algo que a besta não tem e que é um espírito. O homem recebeu de Deus o sopro da vida, pelo qual se tornou um ser vivente (Gn 2,7). Não é assim que Deus faz com os animais. Ele os criou pelo poder de Sua palavra (Gn 1:24-25).
A diferença entre o homem e a besta que está presente na morte está além da percepção do homem. A palavra “quem”, que começa em Ec 3,21, é um grito de desespero. A visão geral do homem é que não há diferença. O Pregador sabe que existe uma diferença (Ec 12:7). Só podemos saber isso por meio da revelação de Deus. O Pregador fala das pessoas em seu esplendor (Sl 49:12; Sl 49:20) e não do crente que é recebido por Deus (Sl 49:15).
Eclesiastes 3.18 Prová-los. O sentido básico deste verbo é “escolher”, “selecionar”, “purificar”, “testar”. A morte á a grande niveladora dos seres humanos. Neste aspecto, as pessoas não são diferentes dos animais.
Eclesiastes 3.19 No hebraico, a expressão “o mesmo folego pode” ser traduzida como “o mesmo espírito” ou o mesmo vento. Neste caso, trata do folego como sinal e símbolo da vida (Ec 8.8; Gn 6.17; 7.15,22). Nisto, humanos e animais são semelhantes (mas leia o versículo 21). A palavra traduzida como “vantagem” só aparece neste versículo em Eclesiastes. Também se encontra em outras formas em Provérbios 14-23, em todo trabalho há proveito, e 21.5, os pensamentos dos diligentes tendem a abundancia.
Eclesiastes 3.20, 21 Todos vão para um lugar. Tanto homens como animais morrem e são sepultados. Mas, para os seres humanos, não é o fim – eles hão de deparar-se com a vida ou a morte eterna (Ec 12.7). A pergunta retórica quem adverte aparece seis vezes na Bíblia em hebraico em outros livros (2 Sm 12.22; Et 4.14; Sl 90.11; Pv 24.22; J1 2.14; Jo 3.9) e quatro vezes em Eclesiastes (2.19; 3.21; 6.12; 8.1). Pessoas e animais diferem entre si; seus corpos voltam ao pó de que vieram, mas o espírito humano e imortal.
Eclesiastes 3.22 A expressão “coisa melhor”, como também ocorre no versículo 12 e em Eclesiastes 2.24, refere-se a benção dos prazeres cotidianos concedida a humanidade. Deus separou uma provisão que pode conter bens materiais (Ec 2.21; 11.2) ou a satisfação que deles provem (Ec 2.10; 3.22; 5.17,18; 9.9), caracterizada nesta passagem como sua porção.
Este versículo é a conclusão. Deus é soberano em Seu controle de todos os eventos terrenos (Ec 3:1-15), Ele tem uma intenção mesmo ao admitir a iniquidade humana (Ec 3:16-20) e tem nosso destino final em Suas mãos (Ec 3:21 ). O Pregador, portanto, entendeu algo, chegou a um certo entendimento, a saber: “Nada é melhor do que o homem ser feliz em suas atividades, pois esse é o seu quinhão”.
Quem pode olhar para a vida desta forma pode experimentar a vida com um certo grau de satisfação e contentamento. Você não anda mal-humorado e não fica de mau humor com o seu trabalho, mas “se alegra” com suas “atividades”. Fique feliz por ter saúde e por ter trabalho. Você tem um uso significativo do tempo. Aceite isso como a “sorte” que você recebe de Deus.
O ponto é, que você aproveite a vida agora. O que acontece depois de você não tem nenhuma utilidade para você, porque você não tem parte nisso. Perceba que uma pessoa não recebe mais neste mundo do que suas atividades. A consciência disso o tornará modesto e o manterá longe de ideias pomposas. Com isso, você alcançou uma fonte de grande satisfação (1Tm 6:6-7).
🙏 Devocional de Eclesiastes 3
Eclesiastes 3 é, sem dúvida, um dos capítulos mais conhecidos e citados das Escrituras, célebre por sua meditação poética sobre o tempo e a natureza cíclica da existência. Sob a pena do Pregador (Coélet), este texto não apenas observa os ritmos da vida, mas também convida à reflexão sobre a soberania divina e o verdadeiro propósito humano em meio à transitoriedade. Longe de ser um convite ao fatalismo, Eclesiastes 3 é um chamado ao discernimento e à valorização do presente.
Eclesiastes 3:1-8 (O Ciclo Imutável da Vida: Para Tudo Há um Tempo)
Este bloco de versículos é a essência do capítulo, apresentando a famosa lista de “tempos” para cada atividade humana: “Para tudo há uma ocasião certa; há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu”. O Pregador enumera pares de opostos – nascer e morrer, plantar e colher, chorar e rir, guerrear e fazer a paz – para ilustrar a universalidade e a inevitabilidade dos ciclos da vida. A mensagem principal é que cada evento tem seu tempo predeterminado, escapando ao controle humano. Há uma ordem e um propósito para tudo o que acontece, mesmo que não os compreendamos plenamente no momento.
Aplicação Pessoal: Este trecho nos convida a uma profunda aceitação da soberania divina sobre o tempo e os eventos da vida. Para um seguidor de Cristo, isso significa confiar que Deus tem um plano e um tempo para cada fase, mesmo nas transições mais difíceis. Devemos aprender a “abraçar” cada estação, sem tentar forçar o que não é da vontade de Deus.
No âmbito familiar, um filho que compreende esses ciclos estará mais apto a aceitar as mudanças, como a perda de um ente querido (tempo de chorar) ou a chegada de um novo membro (tempo de nascer). Para quem exerce a paternidade, é um lembrete para ensinar os filhos a navegar pelas diferentes estações da vida com resiliência e fé, valorizando cada momento. Por exemplo, pode haver um “tempo de calar” quando é melhor ouvir um filho, e um “tempo de falar” para oferecer conselhos.
No ambiente profissional, o profissional que internaliza esses versículos entende que há momentos para inovar e momentos para consolidar, tempos de expansão e tempos de retração. A flexibilidade e a paciência são chaves para o sucesso. Na comunidade de fé, isso nos lembra que há tempo para edificação e tempo para correção, tempo para o louvor e tempo para a reflexão profunda. Não devemos nos apressar ou resistir aos processos que Deus permite em nossas vidas e na vida da igreja. Como membros da sociedade, reconhecemos que há um tempo para a paz e um tempo para a luta pela justiça, e que nossa ação deve ser guiada pelo discernimento do momento certo, em vez de impulsos precipitados. Como diz Romanos 8:28: “Sabemos que em todas as coisas Deus trabalha para o bem daqueles que o amam, dos que foram chamados de acordo com o seu propósito.”
Eclesiastes 3:9-15 (O Trabalho, a Eternidade e a Obra de Deus)
Após a reflexão sobre os ciclos, o Pregador questiona o “proveito” do trabalho humano diante de tanta transitoriedade. Contudo, ele rapidamente eleva a perspectiva, afirmando que Deus “fez tudo apropriado ao seu tempo” e “também pôs no coração do homem o anseio pela eternidade”. Isso revela a busca intrínseca do ser humano por algo que transcenda o aqui e agora. A conclusão é que o melhor que podemos fazer é “alegrar-nos e fazer o bem enquanto vivermos”, pois “comer, beber e desfrutar o fruto de todo o seu trabalho” é um dom de Deus. Além disso, a obra de Deus é perfeita e eterna, e nada pode ser acrescentado ou tirado dela.
Aplicação Pessoal: Este bloco oferece uma profunda perspectiva sobre o significado do nosso esforço e da nossa existência. Para um seguidor de Cristo, o anseio pela eternidade (Eclesiastes 3:11) aponta para o Criador, em quem a vida encontra seu verdadeiro propósito. Isso nos lembra que nosso trabalho e nossos gozos diários, quando vividos em gratidão, são presentes divinos, não um fim em si mesmos.
No contexto familiar, um filho pode aprender a valorizar o esforço de seus pais e a encontrar alegria nas pequenas coisas da vida doméstica, reconhecendo que a felicidade não está apenas em grandes conquistas. Para quem exerce a paternidade, isso significa ensinar os filhos a desfrutar do presente e a encontrar satisfação em seu trabalho, sem se perder na busca incessante por mais. É sobre mostrar que a verdadeira alegria vem de Deus e da capacidade de desfrutar os dons que Ele oferece.
No local de trabalho, o profissional que compreende que o trabalho é um dom de Deus (Pv 3:13) realizará suas tarefas com mais alegria e gratidão, buscando a excelência não por vaidade, mas como uma forma de honrar a Deus. Ele se esforça, mas também sabe que o sucesso final depende da bênção divina. Na comunidade de fé, essa passagem nos motiva a servir com alegria, sabendo que nosso serviço a Deus, embora temporário na terra, tem implicações eternas. Isso nos impede de nos apegar demasiadamente aos resultados visíveis e nos lembra de que a obra de Deus é perfeita. Como membros da sociedade, isso nos impele a buscar o bem-estar coletivo e a usufruir da vida com gratidão, entendendo que cada momento é uma dádiva. Como Cristo nos ensina em Mateus 6:33: “Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas lhes serão acrescentadas.”
Eclesiastes 3:16-22 (Justiça Divina, Morte e a Limitação Humana)
O Pregador então se volta para a dura realidade da injustiça no mundo (“sob o sol, no lugar da justiça, ali estava a impiedade; e no lugar da retidão, ali estava a iniquidade”). Ele, no entanto, afirma a certeza de que Deus julgará tanto o justo quanto o ímpio, pois há “um tempo para todo propósito e para toda obra”. Há uma reflexão sombria sobre a igualdade da morte para humanos e animais, levantando a questão do “fôlego de vida” e do destino final. A conclusão do Pregador é que o melhor para o homem é “alegrar-se nas suas obras”, pois ninguém pode saber o que virá depois da morte ou “quem o fará ver o que será depois dele”.
Aplicação Pessoal: Este bloco nos confronta com a realidade da injustiça e da mortalidade, apontando para a justiça final de Deus e a humildade diante da morte. Para um seguidor de Cristo, isso fortalece a esperança no juízo divino, onde toda injustiça será corrigida, e nos motiva a viver retamente agora, aguardando a intervenção de Deus (Romanos 12:19). A mortalidade nos lembra da urgência de viver para o que é eterno.
No ambiente familiar, um filho pode ser ensinado sobre a inevitabilidade da morte, o que pode encorajá-lo a valorizar mais os relacionamentos e o tempo presente com a família. Para quem exerce a paternidade, este trecho serve como um lembrete para ensinar os filhos sobre a justiça de Deus e a importância de viver uma vida que O honre, pois não sabemos o dia de amanhã. Ajude-os a enfrentar a perda com fé e a valorizar a vida.
No ambiente profissional, o profissional deve buscar a justiça e a retidão, mesmo que a impiedade pareça prosperar temporariamente, confiando que Deus julgará. Isso significa não se deixar levar por práticas desonestas, por exemplo. Na comunidade de fé, esse texto nos encoraja a não nos desesperarmos diante das injustiças terrenas, mas a ter fé na soberania de Deus e em Seu julgamento final, vivendo com integridade e proclamando a esperança da vida eterna. Como membros da sociedade, somos chamados a ser agentes de justiça e a não nos conformarmos com a iniquidade, trabalhando para um mundo mais justo, ao mesmo tempo em que reconhecemos nossas limitações e a soberania de Deus. Vivemos com a certeza de que, como afirma 2 Coríntios 5:10, “todos teremos de comparecer diante do tribunal de Cristo, para que cada um receba o que fez por meio do corpo, quer seja bom ou mau.” Isso nos impulsiona a viver o presente com sabedoria e gozo, mas com a perspectiva da eternidade.
✡️✝️ Comentários de Rabinos e Pais Apostólicos
✡️ Talmude
No Talmud Bavli, Berachot 61b, ao refletir sobre Eclesiastes 3:1 (“Para tudo há um tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu”), os rabinos ensinam que cada evento da vida tem sua hora exata, decretada pelos céus. Esse versículo é citado para confortar aqueles que sofrem injustiças, pois a providência divina atua em ritmos que ultrapassam a lógica humana. É dito que “ninguém fere seu dedo na terra sem que tenha sido decretado no céu”.
No Talmud Moed Katan 28a, quando se discute o luto e o tempo da morte dos justos, Eclesiastes 3:2 é citado: “Há tempo de nascer e tempo de morrer”. Rabi Eleazar observa que mesmo a morte de Rabi, um dos maiores sábios, ocorreu em seu tempo certo — reforçando a visão que o controle do tempo pertence unicamente a Deus, não ao mérito humano.
Em Talmud Ta'anit 11a, o trecho “tempo de chorar e tempo de rir” (Ec 3:4) é interpretado moralmente: há tempos em que o jejum é apropriado, e tempos em que a celebração é mitzvá. O texto é usado para justificar a alternância litúrgica entre luto (Tishá BeAv) e alegria (Purim), ambos integrados no ciclo sagrado.
✡️ Mishná
A Mishná Avot 3:1 ecoa o espírito de Eclesiastes 3 ao declarar:
“Considera três coisas e não cairás em pecado: de onde vieste, para onde vais, e perante Quem darás contas… vieste de uma gota fétida, vais para o pó, e prestarás contas perante o Rei dos reis.”
Essa reflexão conecta-se diretamente com Eclesiastes 3:20 (“Todos vão para um lugar; todos são pó, e todos ao pó tornarão”), oferecendo uma leitura moral da transitoriedade: não é apenas constatação de finitude, mas chamada à responsabilidade ética.
Em Avot 4:23, Ben Azzai afirma: “Não desprezes ninguém e não desprezes coisa alguma, pois não há homem que não tenha seu tempo.” É um comentário quase direto de Eclesiastes 3:1, sugerindo que até os momentos de fraqueza ou aparente insignificância têm sua razão no plano divino.
✡️ Zohar
O Zohar, Shemot 202a, lê Eclesiastes 3:1 como um segredo cósmico: cada instante no mundo inferior é espelho de realidades nas sefirot superiores. O tempo, portanto, é expressão do ritmo da luz divina descendo pelos canais da criação. Assim, “há tempo de plantar e tempo de arrancar” significa que há momentos em que a Shechiná desce para nutrir o mundo, e momentos em que se oculta — provocando julgamento ou silêncio divino.
No Zohar, Vayikra 25b, ao comentar Eclesiastes 3:11 (“Tudo fez formoso no seu tempo; também pôs o mundo no coração deles, sem que o homem possa descobrir a obra que Deus faz”), interpreta-se que o “coração” (לִבָּם) é o centro espiritual onde se inscreve o mistério da existência. Mas o homem, por estar limitado ao tempo linear, não compreende os ciclos da eternidade (olam – עוֹלָם), pois lhe falta a visão do Ain Sof.
O Zohar II, 176a, tratando de Eclesiastes 3:17 (“Deus julgará o justo e o perverso, pois há tempo para todo intento e para toda obra”), revela que o julgamento não ocorre apenas no final da vida, mas em momentos definidos, conhecidos apenas por Deus e pelos tribunais celestes. Aqui o “tempo do julgamento” é ligado ao Sefirat haDin (medida da justiça divina), que não age segundo o imediatismo humano, mas segundo a retidão das esferas superiores.
“O tempo do julgamento está oculto nas câmaras superiores. O homem julga com os olhos; o Eterno julga com balança que não inclina nem por mérito nem por súplica — apenas por verdade.”
O capítulo 3 de Eclesiastes é uma meditação sobre a cadência invisível do universo. O Talmud vê nele o reconhecimento de que tudo — nascimento, morte, alegria, tristeza — está sob o decreto do céu. A Mishná transforma essa verdade numa convocação à vigilância moral e ao respeito pelo próximo. O Zohar, por sua vez, mergulha nas dimensões místicas do tempo, vendo-o como manifestação das emanações divinas, onde o visível e o invisível se entrelaçam.
A tradição rabínica, assim, não lê Eclesiastes 3 como resignação, mas como convite à reverência e ao alinhamento com o mistério dos tempos sagrados. O tempo não é apenas algo a ser suportado, mas um palco onde a vontade de Deus se revela em silêncio, como sopro, como segredo.
Basílio, o Grande (379 d.C) sobre Eclesiastes 1:1:
É necessário ter em mente que para certas outras tarefas é reservado um tempo específico, de acordo com as palavras de Eclesiastes: "Todas as coisas têm o seu tempo". Para a oração e a salmodia, no entanto, como também, de fato, para alguns outros deveres, cada hora é adequada, para que, enquanto nossas mãos estão ocupadas com suas tarefas, possamos louvar a Deus às vezes com a língua (quando isso for possível, ou melhor, quando for propício à edificação); ou, se não, com o coração, pelo menos, em salmos, hinos e cânticos espirituais, como está escrito. Assim, em meio ao nosso trabalho, podemos cumprir o dever da oração, dando graças àquele que concedeu força às nossas mãos para executar nossas tarefas e inteligência às nossas mentes para adquirir conhecimento, e por ter fornecido os materiais, tanto os que estão nos instrumentos que usamos quanto os que constituem a matéria das artes nas quais podemos nos dedicar, orando para que o trabalho de nossas mãos seja direcionado ao seu objetivo, a boa vontade de Deus.
Cirilo de Jerusalém (386 d.C) sobre Eclesiastes 3:2:
“Pois, assim como nosso Salvador passou três dias e três noites nas entranhas da terra, assim também vós, com a vossa primeira saída da água, representastes o primeiro dia de Cristo na terra, e com a vossa descida, a noite. Pois, assim como de noite não se vê mais, enquanto de dia se está na luz, assim também vós, durante a vossa imersão, como numa noite, nada vistes, mas ao subirdes, encontrastes-vos no dia. No mesmo instante, morríeis e nascêreis, e aquela água salvadora era ao mesmo tempo o vosso sepulcro e a vossa mãe. O que Salomão disse em outro contexto aplica-se a vós: “Tempo de dar à luz, tempo de morrer”, embora para vós, ao contrário, seja um caso de “tempo de morrer e tempo de nascer”. Um tempo trouxe ambos, e a vossa morte coincidiu com o vosso nascimento.”
Atanásio sobre Eclesiastes 3:2:
Isto está escrito nas Escrituras e é manifesto a todos. Pois, embora seja oculto e desconhecido de todos, qual o período de tempo concedido a cada um e como é concedido, todos sabem que, assim como há um tempo para a primavera e um tempo para o verão, e um tempo para o outono e um tempo para o inverno, assim, como está escrito, há um tempo para morrer e um tempo para viver. (Defesa de Sua Fuga 14.)
Cesário de Arles (542 d.C) sobre Eclesiastes 3:4:
“Que ninguém acredite possuir qualquer felicidade ou verdadeira alegria neste mundo. A felicidade pode ser preparada, mas não pode ser possuída aqui. Dois tempos se sucedem em sua própria ordem: “tempo de chorar e tempo de rir”. Que ninguém se engane, irmãos; não há tempo para rir neste mundo. Eu sei, de fato, que todos desejam se alegrar, mas nem todos procuram a alegria onde ela deveria ser buscada. A verdadeira alegria nunca existiu neste mundo, não existe agora e nunca existirá. Pois assim o próprio Senhor advertiu seus discípulos no Evangelho, quando disse: “Vocês sofrerão no mundo”, e novamente: “Enquanto o mundo se alegra, vocês sofrerão por um tempo, mas a sua tristeza se transformará em alegria”. Por isso, com a ajuda do Senhor, façamos o bem nesta vida, através do trabalho e da dor, para que na vida futura possamos colher os frutos das nossas boas ações com alegria e exultação, de acordo com a frase: “Aqueles que semeiam em lágrimas colherão com alegria”.”
Agostinho de Hipona (430 d.C.) sobre Eclesiastes 3:5:
Quanto a vocês, ambos têm filhos e vivem naquele fim do mundo, quando já chegou o tempo não de “espalhar pedras, mas de ajuntar; não de abraçar, mas de abster-se de abraços”. [Este é um tempo] em que o apóstolo clama: “Mas digo isto, irmãos: o tempo é curto; o que resta é que os que têm esposas sejam como se não as tivessem”. Certamente, se vocês tivessem buscado um segundo casamento, não teria sido em obediência a uma profecia ou lei, ou mesmo ao desejo da carne por filhos, mas apenas um sinal de incontinência. Vocês teriam seguido o conselho do apóstolo, quando, depois de ter dito: “É bom para eles que permaneçam assim, como eu”, ele imediatamente acrescentou: “Mas, se não se dominam, que se casem; pois prefiro que se casem a se queimarem”.
Gregório de Elvira (392 d.C.) sobre Eclesiastes 3:6:
“Jerusalém, portanto, foi abandonada “como uma cabana na vinha” porque os anjos da guarda a deixaram junto com o Senhor quando Cristo sofreu. Uma colheita no campo é guardada pelo Senhor não por si mesma, mas apenas pelo grão que produz, de modo que o caule pode ser destruído após a colheita do fruto. Assim também, não foi principalmente por si mesma que Jerusalém foi guardada temporariamente, mas por causa de Jesus Cristo, nosso Senhor, que nasceu segundo a carne dentro de suas fronteiras. Mas quando seu fruto foi colhido, isto é, o corpo de Cristo, de onde veio o pão celestial da vida, então Jerusalém foi abandonada como um campo após a colheita, como uma cabana na vinha após a colheita das uvas. É por isso, então, que foi dito aqui nas Escrituras divinas: “Há um tempo para guardar e um tempo para lançar fora”, pois houve um tempo em que Jerusalém era guardada e um tempo em que estava sendo lançada fora.” (Exposição de Eclesiastes, Fragmento)
Gregório de Nissa Eclesiastes sobre 3:6:
Você deseja aprender o momento oportuno para buscar o Senhor? Deixe-me afirmar brevemente que toda a sua vida é o único tempo para isso. Buscar o Senhor não é definido por limite ou tempo; ao contrário, o tempo verdadeiramente oportuno para isso consiste em nunca pôr fim à nossa busca. (Homilias sobre Eclesiastes 7)
Sobre 3:7:
Quando se trata de palavras sobre Deus e da busca de sua essência, há tempo para o silêncio, mas quando se trata de alguma boa operação da qual temos conhecimento, é hora de falar do poder, dos milagres e das obras de Deus que necessitam de palavras. Uma criatura não deve ultrapassar seus limites em relação a assuntos transcendentes, mas contentar-se com o conhecimento de si mesma. (Ibid.)
Gregório, o Dialogista (604 d.C.) Eclesiastes 3:7:
“A língua, portanto, deve ser discretamente refreada, não reprimida. Pois está escrito: "O sábio guardará a língua até o momento oportuno", a fim de, com certeza, quando considerar oportuno, abandonar a censura do silêncio e se dedicar ao serviço da utilidade, falando o que for conveniente. E também está escrito: "Tempo de calar e tempo de falar". Pois, de fato, os tempos para mudanças devem ser ponderados discretamente, para que, quando a língua deveria ser refreada, não se desprenda das palavras sem proveito, ou, quando poderia falar com proveito, se contenha preguiçosamente. Considerando bem isso, o salmista diz: "Põe, Senhor, uma guarda à minha boca e uma porta ao redor dos meus lábios".”
Gregório de Nissa (394 d.C.) sobre Eclesiastes 3:7
“Em palavras sobre coisas concernentes a Deus, quando a discussão é sobre o seu ser, esse é o “momento de silenciar”. Mas quando se trata de alguma boa atividade [de Deus], cujo conhecimento chega até nós, então é o momento de falar dos poderes, de proclamar as maravilhas, de relatar as obras, de usar a linguagem até aqui. Em questões que estão além, é o momento de não permitir que a criação ultrapasse seus limites, mas de se contentar em conhecer a si mesma.”
Jerônimo (420 d.C.) sobre Eclesiastes 3:7:
“Acredito que os pitagóricos, cuja disciplina era permanecer em silêncio por cinco anos e falar com erudição depois, extraíam sua prática desse princípio. Nós também devemos aprender a ficar em silêncio antes de abrir a boca para falar. Permaneçamos em silêncio por um tempo determinado, meditando nas palavras do Mestre, pois nada nos deve parecer certo, exceto o que aprendemos. Dessa forma, somente após muito silêncio seremos feitos mestres pelos discípulos. Como acontece atualmente, em benefício daqueles que estão caindo na pior maldade do mundo, ensinamos diariamente nas igrejas o que não sabemos. E se provocamos o aplauso do povo por nossa escolha de palavras ou pela instigação do diabo, que é o patrono dos erros, testemunhamos contra nossa própria consciência que estamos fazendo exatamente aquilo contra o qual somos capazes de alertar os outros.”
Agostinho de Hipona (430 d.C.) sobre Eclesiastes 3:7:
Pergunto-lhe, então, se devemos supor que o único decreto de Deus que não se cumprirá, o único decreto de Deus, será aquele que lemos nesses mesmos escritos como sendo para julgar entre crentes e descrentes, quando tudo o mais que lemos aconteceu como foi predito? Pelo contrário, acontecerá como todas as outras profecias se cumpriram. Então não haverá pessoa de nossos tempos que seja capaz, naquele julgamento, de encontrar uma desculpa para a descrença, quando todos invocarem a Cristo: o justo para a justiça, o perjuro para o engano, o rei para o poder e o soldado para a batalha, o marido para manter sua autoridade e a esposa para mostrar sua submissão, o pai para o comando e o filho para a obediência, o senhor para seu direito de governar e o servo para sua sujeição, o humilde para a piedade e o orgulhoso para a ambição, o rico para distribuir e o pobre para receber, o bêbado para suas taças de vinho e o mendigo para o portão, a pessoa boa para que se destaque na virtude e a má para que trapaceie, o adorador cristão e o bajulador pagão. Todos têm o nome de Cristo em seus lábios e, com qualquer intenção e fórmula com que o invocam, sem dúvida prestarão contas disso àquele a quem invocam.
Dídimo, o Cego (398 d.C.) sobre Eclesiastes 3:8:
“Toda alma tem um companheiro repreensível e um louvável: o noivo, que é o Logos, e o adúltero, que é o diabo. Se o diabo estiver presente, não se deve dar-lhe espaço; não se deve deixá-lo entrar, como fez Judas. Esse tipo de companheiro precisa ser odiado. Mas chegou o “tempo de amar” quando o verdadeiro noivo está presente. Ele é digno de amor, tanto que um dos santos disse: “Meu amor foi crucificado”. Mas o amor é desejo intensificado. Além disso, temos o mandamento de amar nossos inimigos e nos aproximar daqueles que nos odeiam de tal maneira que até enviamos uma oração ao céu por eles. Na medida em que desejamos que eles sejam ajudados e não queremos ser perturbados pela hostilidade, amamos nossos inimigos; mas na medida em que não os imitamos e não aceitamos as mesmas coisas ou queremos ser inimigos como eles querem ser, nós os odiamos.”
Evágrio Pôntico (399 d.C.) sobre Eclesiastes 3:11:
“Eu vi, diz ele, o mundo material que preocupa as mentes humanas, aquilo que Deus deu à raça humana antes de sua purificação para que ela se ocupasse. Ele quer dizer aqui que a beleza do mundo material é temporal, não eterna. Pois, após a purificação, aquele que é puro não precisa mais ver as coisas materiais apenas como uma diversão da mente. Em vez disso, ele também pode usá-las na contemplação espiritual.”
Dídimo, o Cego Eclesiastes sobre 3:14:
Deus fez a criação para que os seres humanos, por meio de uma imagem externa da grandeza e beleza das coisas criadas, pudessem [entender] que Deus existe. Ele mesmo administra o cosmos e cuida dele para que nós — enquanto todo o cosmos é guiado ordenadamente por um comandante, provedor, governante, cocheiro e rei — tenhamos a imagem externa de que há alguém que governa o cosmos. Quando você vê um navio que é pilotado e mantém seu curso, você percebe a ideia de um timoneiro, mesmo que ele não esteja visível. E se você vir uma carruagem que viaja ordenadamente, terá a ideia de um cocheiro. Da mesma forma, o Criador é conhecido por suas obras e pela ordem de sua providência. (Comentário sobre Eclesiastes 88.29)
Pedro Crisólogo (450 d.C.) sobre Eclesiastes 3:15:
“Pai Nosso”. Ninguém deve se surpreender que alguém que ainda não nasceu chame Deus de Pai. Com Deus, os seres que nascerão já nasceram; com Deus, os seres futuros foram feitos. “As coisas que hão de ser”, diz a Escritura, “já foram”. [Assim] é que, enquanto João ainda estava no útero, ele percebeu seu criador, e aquele que desconhecia sua própria vida serviu como mensageiro para sua mãe. [Assim] também lemos que Jacó travou uma guerra antes de nascer e triunfou antes de viver. [Assim] também, aqueles que ainda não existem são existentes para Deus, isto é, aqueles que foram escolhidos antes da fundação do mundo.
Beda (735 d.C.) sobre Eclesiastes 3:16
“A forma deste mundo passa”, não a sua substância; assim como acontece com nossos corpos, a forma também será alterada. A substância não perece quando “o que é semeado como corpo físico ressuscita como corpo espiritual”. Mas não lemos nada parecido sobre o fogo e a água. Em vez disso, temos no livro do Apocalipse: “E o mar já não existe”, e nos profetas: “E a luz da lâmpada não brilhará mais para vocês”. “Aguardamos as suas promessas”, diz ele, “nas quais habita a justiça”. A justiça habita na era futura, porque então a coroa da justiça será dada a cada um dos fiéis de acordo com a medida de sua luta. Isso é algo que não pode acontecer de forma alguma nesta vida, de acordo com o dito de Salomão: “Vi debaixo do sol a impiedade em lugar do juízo e a iniquidade em lugar da justiça, e disse em meu coração: ‘Deus julgará o justo e o ímpio, e haverá um tempo para tudo.’” E novamente ele diz: “Eu vi o engano que acontece sob o sol e as lágrimas dos inocentes e que não havia consolador, nem aqueles privados da ajuda de todos eram capazes de resistir ao seu poder, e eu louvei os mortos em vez dos vivos.”
Dídimo, o Cego (398 d.C.) sobre Eclesiastes 3:18:
“Os animais são seres mortais sem razão, os anjos são seres imortais com razão, os seres humanos são seres mortais com razão. Em relação à mortalidade, o ser humano é agrupado com os seres sem razão. Em relação à razão, [o ser humano] é agrupado com os seres imortais, visto que os anjos também têm razão. Em relação aos seus sentidos... o ser humano é da mesma espécie que os seres sem razão. Mas o ser humano é receptivo a algo a que nenhum outro ser mortal é receptivo: sua alma pode se tornar perfeita, na medida em que isso pode ser alcançado, e se tornar semelhante a Deus, na medida em que for possível... Assim, quando ele diz que “o destino dos humanos e o destino dos animais é o mesmo”, ele não se refere ao que acontece com a razão, mas ao que acontece com o corpo exterior... O julgamento geral que promulga promessas e punições não julga o que os seres humanos têm em comum com os animais, mas o que os humanos têm em comum com os anjos. Assim como os humanos podem ser conduzidos ao reino dos céus e permanecer no céu, o mesmo ocorre com os anjos; e assim como os humanos podem ser julgados, os anjos também podem ser julgados... Se alguém investigar a natureza da morte, então a morte dos animais não é como a morte dos humanos. A morte humana separa a alma do corpo, e após a divisão, a alma permanece. Mas a morte dos animais destrói a alma e o corpo, visto que foram criados simultaneamente.”
Gregório, o Dialogista (604 d.C.) sobre Eclesiastes 3:19:
Ao descrever os prazeres da carne, ele afasta todas as preocupações de sua mente e afirma que é bom comer e beber. Mais tarde, ele critica essa visão do ponto de vista da razão e diz que é melhor ir à casa do luto do que à casa do banquete. Da mesma forma, a partir de considerações puramente carnais, ele aconselha o jovem a encontrar prazer na juventude e, mais tarde, modificando essa afirmação, acusa a juventude e seus prazeres de serem passageiros. Assim, também, quando fala da mente dos enfermos, nosso Pregador expressa uma opinião baseada na suspeita. “Pois a sorte do homem e dos animais”, diz ele, “é uma só; um morre tanto quanto o outro. Ambos têm o mesmo fôlego de vida, e o homem não tem vantagem sobre os animais”. Mais tarde, porém, ele apresenta conclusões tiradas da razão e diz: “O que tem o sábio mais do que o tolo? E o que tem o pobre, senão ir para onde há vida?” Então, depois de dizer: “O homem não tem vantagem sobre o animal”, ele novamente especifica que o sábio tem uma vantagem não apenas sobre o animal, mas também sobre o tolo, ou seja, sua capacidade de ir “onde há vida”.
Agostinho de Hipona (430 d.C.) sobre Eclesiastes 3:20:
“Para que você tenha a mais plena e clara certeza de que o que é a alma, no uso das Sagradas Escrituras, também é chamado de espírito, a alma de um animal irracional tem a designação de espírito. E, claro, o gado não tem aquele espírito que você, meu amado irmão, definiu como distinto da alma. Portanto, é bastante evidente que a alma de um animal irracional poderia ser corretamente chamada de “espírito” no sentido geral do termo; como lemos no livro de Eclesiastes: “Quem sabe o espírito dos filhos dos homens se vai para cima? E o espírito dos animais se desce para a terra?” Da mesma forma, a respeito da devastação do dilúvio, a Escritura testifica: “Morreu toda a carne que se movia sobre a terra, tanto de aves como de gado, e de animais selvagens, e de todo réptil que se move sobre a terra, e de todo homem, e de todas as coisas que têm o espírito da vida.” Aqui, se removermos todos os meandros da disputa duvidosa, entendemos que o termo espírito é sinônimo de alma em seu sentido geral. Este termo tem um significado tão amplo que até mesmo Deus é chamado de “espírito”; e uma rajada tempestuosa de ar, embora tenha substância material, é chamada pelo salmista de “espírito” de uma tempestade. Por todas essas razões, portanto, você não mais negará que o que é a alma também é chamado de espírito. Creio que já aduzi o suficiente das páginas da Sagrada Escritura para garantir sua concordância em passagens onde a alma da própria besta bruta, que não tem entendimento, é designada espírito.”
Obs: Os lugares onde são foi apontada a fonte direta do comentário, são comentários tirados diretamente da maior referência de comentários bíblicos dos Pais Apostólicos, o site Catena Bible.
✝️ Comentário Reformado
A Sabedoria de Compreender o Tempo e a Vontade Divina
Em Eclesiastes 3:1, Salomão introduz um poema que se segue (vv. 2–8), conectando-o com o que já foi exposto anteriormente ao descrever as mutáveis questões humanas e a imutável vontade de Deus. Ao longo do livro, ele frequentemente altera seu tom, descrevendo tanto as frustrações da vida quanto a firmeza da Palavra e da bênção de Deus. Lutero, ao comentar essa passagem, enfatiza que “Todas as obras e esforços humanos têm um tempo certo e definido de atuação, de começo e de fim, além do controle humano. Assim, isso é falado em oposição ao livre-arbítrio. Não nos cabe prescrever o tempo, a maneira ou o efeito das coisas que devem ser feitas; e assim é óbvio que aqui nossos esforços e tentativas são incertos. Tudo vem e vai no tempo que Deus designou. Ele prova isso com base em exemplos de obras humanas cujos tempos estão fora da escolha do homem” (Luther’s Works, vol. 15, p. 49).Os versículos 3:2–8 apresentam uma sequência quiástica, indicando que os sábios compreendem os ritmos da vida e vivem em acordo com eles. Gregório Nazianzeno, ao falar sobre Basílio, reflete essa ideia: “Quem era tão agradável ao encontrá-lo... [Basílio]? Quem era mais gentil em suas histórias, mais refinado em seu humor, mais terno em suas repreensões? Suas repreensões não davam margem à arrogância, seu relaxamento à dissipação, mas, evitando o excesso em ambos, ele fazia uso de ambos com razão e na estação certa, de acordo com as regras de Salomão, que atribui a cada tarefa uma estação” (NPNF2 7:417). O termo “um tempo” ressalta que estamos sujeitos a tempos e mudanças sobre os quais temos pouco controle, contrastando com a eternidade de Deus. A LXX (Septuaginta) usa a palavra grega kairos, que significa “uma estação apropriada”.
A brevidade da vida é destacada em 3:2, com a referência a “nascer... morrer”, indicando que o tempo designado é dolorosamente curto. As vidas humanas são tão efêmeras quanto a estação agrícola: “plantar... arrancar”. Além disso, em 3:3, a menção a “matar” reconhece que Deus concede aos governantes a autoridade para se engajar em guerras justas, para dissipar o caos, punir malfeitores e proteger os cidadãos de danos (cf. Rm 13:4).
O versículo 3:4 contrasta o lamento em um funeral com a atividade despreocupada. Enquanto no Egito a dança fazia parte das cerimônias fúnebres, isso não parecia ser o caso em Israel, onde a dança expressava alegria (Sl 30:11). Em 3:5, as ações de “lançar fora... ajuntar” referem-se à destruição de fortificações em guerra, desastres, etc., e sua posterior reconstrução. A ideia de “abraçar... abster-se” pode ser entendida como o ato de abraçar o próximo em amizade ou de se distanciar de uma pessoa suspeita de um crime.
Os versículos 3:7 discorrem sobre “rasgar... costurar”, o que sugere um tempo para desfazer o que foi feito e reparar o que foi desfeito (cf. Gn 3:7). Similarmente, o “silêncio... falar” remete à importância de ser lento para falar e rápido para ouvir. Há um tempo para ficar em silêncio quando as palavras violam o Oitavo Mandamento, e um tempo para falar o bálsamo curador da Palavra de Deus. Gregório Magno observa: “Os tempos para as mudanças devem ser discretamente ponderados, para que a língua não se solte inutilmente em palavras quando deveria ser refreada, ou não se refreie preguiçosamente quando poderia falar com proveito” (NPNF2 12:38). O versículo 3:8, por sua vez, nos lembra que a guerra não dura para sempre, nem a paz. A verdadeira paz é encontrada somente no Senhor, nosso pacificador, em contraste com o ódio e a morte que são encontrados em toda parte.
Em suma, de Eclesiastes 3:1–8, percebemos que a vontade de Deus é inescrutável. Ele julgará os vivos e os mortos no Último Dia, e as coisas temporais não podem satisfazer o povo de Deus. A eternidade e a consumação da salvação residem somente em Cristo (cf. Rm 8:18). Por isso, podemos orar: • Querido Pai celestial, dá-nos o pão de cada dia, boas estações e saúde. Protege-nos da guerra, da fome, das doenças e da seca, por Jesus Cristo. Amém.
A Busca Humana, a Sabedoria Divina e a Realidade da Existência
Os versículos 3:9–10 sugerem que o trabalho, embora muitas vezes um esforço árduo, pode desviar nossa atenção das angústias e lutas da vida (cf. Fp 4:11–13). A Queda exigiu que Adão e Eva trabalhassem fora do Jardim do Éden, com o suor de suas testas. Produzimos para consumir, e essa é uma realidade da condição humana.
Em 3:11, o termo hebraico yapheh, traduzido como “belo”, é usado aqui no sentido de “certo” ou “adequado”. Todas as coisas vivas têm seu desenvolvimento e beleza próprios. Contudo, “em seu tempo”, elas amadurecem, e o tempo também lhes tira a beleza. A expressão “pôs a eternidade” no coração humano indica que a Lei (escrita no coração de todas as pessoas [Rm 2:15] e dada a Israel por meio de Moisés) confessa a verdade duradoura de que existe um único Deus verdadeiro. No entanto, a razão humana “não pode descobrir” (ou “compreender”) a Deus e Seus propósitos. Por exemplo, ao construir uma casa, pode-se apenas antecipar a beleza do produto final ou seu eventual colapso, mas não o processo em si.
Os versículos 3:12-13 nos exortam a “nos alegrarmos e a fazer o bem”, o que implica confortar uns aos outros, receber alegremente os dons de Deus e beneficiar o próximo com generosidade. A alegria e o propósito genuínos provêm do auto sacrifício, um estilo de vida que imita os caminhos de Deus. Regozijar-se no bem do próprio trabalho deve ser encarado como um dom de Deus e uma expressão de Seu amor para com Seus filhos. Deve-se retornar a Ele com ações de graças, pois Ele é a fonte de toda alegria.
Em Eclesiastes 3:14, é afirmado que, assim como a Palavra de Deus, Suas obras são perfeitas, e nenhum esforço humano pode adicionar ou subtrair dessa perfeição. Não somos parceiros iguais nesse processo. Este versículo resume a mensagem central de Eclesiastes (cf. 12:13). Ademais, em 3:15, “Deus busca o que foi disperso”, o que significa que a Palavra de Deus e Sua renovação da criação sempre permanecerão constantes em um mundo em constante mudança.
Os versículos 3:16-17 trazem uma dura crítica àqueles em posições de poder. Muitos reis e sacerdotes do Antigo Testamento eram perversos e idólatras, e aqueles que deveriam servir como defensores do povo, na verdade, os oprimiam. Aqueles que julgam com iniquidade serão julgados retamente (como nos julgamentos simulados de Cristo pelo Sinédrio; Mt 26:57–68). Em última instância, “Deus julgará” (3:17), tanto neste mundo temporal quanto no Último Dia, perante seres humanos e anjos (cf. 12:14). O passado não é insignificante para Deus como muitas vezes é para as pessoas, nem o pecado passará despercebido.
No versículo 3:18, é declarado que “Deus os está testando”. A Palavra de Deus permite que o crente julgue o caráter e aprenda onde, pela graça de Deus, a emenda de vida deve ser feita. Em contraste, os “animais” representam o descrente, que é tão mortal quanto qualquer animal. O “mesmo sopro” (3:19) faz alusão ao fato de que Deus insufla vida em Suas criaturas e a retira de acordo com Sua vontade divina (cf. Sl 104:27–30). Não há “nenhuma vantagem” entre pessoas e animais no que diz respeito à morte, pois ambos morrem de maneira muito semelhante (ver nota, 9:1).
A ideia de que “todos são do pó” (3:20) ressalta que, aos nossos olhos, as pessoas morrem como os animais. E, de fato, “ao pó todos retornam”, pois todos foram criados do pó da terra e a ele voltarão. Isso não é uma referência ao céu e ao inferno, mas à morte corporal e à sepultura como niveladoras (cf. Gn 3:19; Sl 103:14). Lutero, ao comentar essa passagem, afirma: “Deus, diz ele, permite que homens e gado andem e vivam da mesma maneira e forma. Mas Deus permite isso para testar os homens, se eles olham apenas para essas coisas externas, e se são persuadidos por esses argumentos, aos quais os ímpios prestam atenção sem crer de outra forma. Mas os piedosos são exercitados dessa maneira para que possam adquirir mais fé. Eles seguem o mesmo caminho que os ímpios e as feras, mas interiormente, no espírito, recebem conforto e paz” (Ibid., vol. 15, p. 60).
A questão “Quem sabe se o espírito” (3:21) pode ser traduzida também como “Quem conhece o espírito?”. A resposta é: o Senhor sabe quem. Ele redime a humanidade pecadora. A vida eterna é considerada em 12:7 e plenamente realizada em Cristo. Finalmente, o questionamento “o que virá depois dele?” (3:22) sugere que, independentemente da revelação de Deus, não podemos conhecer o futuro. Mesmo quando somos chamados à majestade do céu, é improvável que veremos o que virá depois de nós (cf. Jó 14:21), mas em meio à bem-aventurança eterna, realmente nos importaríamos? Somente quando o trabalho e o labor são recebidos como dons de Deus, eles podem ter um valor duradouro.
Em síntese, os versículos 3:9–22 de Eclesiastes nos mostram que, como seres humanos, somos muito pressionados a responder a perguntas eternas. No entanto, a verdade é que “Deus julgará o justo e o ímpio, pois há um tempo para toda questão e para toda obra” (3:17). Os fiéis em Cristo estarão em Sua gloriosa e imediata presença na majestade do céu. Diante dessa perspectiva, podemos orar: • Querido Senhor, nunca cumprimos Tua Lei. Pecamos continuamente e tememos a morte. Sabemos, através do Teu Santo Evangelho pela fé, que todos os Teus méritos são nossos livremente por meio de Cristo. A morte não pode nos prejudicar, pois será tragada pela vitória. Louvado sejas, ó Senhor! Amém.
📚 Comentários Clássicos Teológicos
📖 Matthew Henry (1662–1714)Matthew Henry interpreta Eclesiastes 3 como um dos capítulos mais poéticos e teológicos do livro, revelando que a vida humana está sujeita a tempos e estações designadas por Deus. O versículo 1 — “Tudo tem o seu tempo determinado” — é, para ele, uma chave para compreender a providência divina. Henry vê a lista de “tempos” (vv.2–8) como um retrato abrangente da experiência humana sob o governo soberano de Deus. Ele destaca que cada par de ações opostas (nascer/morrer, plantar/arrancar, etc.) não são meros eventos fortuitos, mas estão dentro de um plano maior ordenado por Deus.
Henry observa que esses tempos não estão no controle humano, e por isso o homem deve viver com humildade, contentamento e confiança. O v.11 — “Tudo fez Deus formoso em seu tempo” — é, em sua leitura, um dos mais belos versículos das Escrituras. Henry o entende como uma afirmação da harmonia da criação divina, mesmo quando o ser humano, com sua visão limitada, não consegue perceber o sentido. A menção de que Deus pôs “a eternidade no coração do homem” é, para ele, evidência de que o ser humano anseia por algo além da existência terrena.
Nos vv.14–15, Henry ressalta que as obras de Deus são permanentes, enquanto as obras humanas são transitórias. A doutrina da imutabilidade divina, que “tudo quanto Deus faz durará eternamente”, serve de consolo e de temor. Ele conclui que a resposta do homem à soberania de Deus deve ser a reverência.
Ao comentar os vv.16–22, Henry vê um lamento pela injustiça na terra — “no lugar do juízo, ali há impiedade” — mas nota que o Pregador aponta para um juízo final. Ele reconhece que o homem é, em parte, como os animais (v.18), mas ressalta que o espírito humano sobe (v.21), indicando uma distinção essencial. Henry vê nestes versículos a tensão entre a transitoriedade do corpo e a esperança da eternidade da alma.
Fonte: Matthew Henry Commentary on Ecclesiastes 3
📖 John Gill (1697–1771)
John Gill vê Eclesiastes 3 como um tratado sobre a soberania de Deus na administração dos tempos e eventos. Ele começa destacando que o versículo 1 — “para tudo há uma ocasião” — estabelece que não há acidentes no universo: tudo acontece segundo o conselho eterno de Deus.
A sequência de opostos nos vv.2–8 é, para Gill, uma descrição da totalidade da vida humana. Ele comenta que o verbo hebraico לָשׁוּב (lāšûv, “voltar”) no v.3, referente a “tempo de matar e tempo de curar”, mostra que Deus governa tanto a desgraça quanto a restauração. O equilíbrio entre as antíteses reflete a sabedoria providencial divina, e Gill observa que o homem não escolhe esses tempos — apenas os vive.
No v.11, ele dá destaque à expressão עָשָׂה יָפֶה בְּעִתּוֹ (ʿāsāh yāfēh beʿittô, “fez formoso em seu tempo”), interpretando que Deus não apenas age com perfeição, mas no tempo certo. Gill conecta a “eternidade no coração” (v.11) com a consciência do homem sobre Deus e o desejo por algo que transcenda o efêmero. O termo הָעֹלָם (hāʿōlām) é analisado por ele como tendo nuances de “tempo indefinido” ou “eternidade”, e ele observa que isso causa inquietação espiritual: o homem percebe que existe algo maior, mas não o alcança.
Nos vv.14–15, Gill vê a afirmação de que “tudo quanto Deus faz durará eternamente” como expressão da imutabilidade divina. Nada pode ser acrescentado ou tirado — uma doutrina que reforça o temor do Senhor.
Ao abordar os vv.16–22, ele identifica uma tensão escatológica: o clamor por justiça é respondido com a promessa de que “Deus julgará o justo e o ímpio” (v.17). No v.18, o termo hebraico בְּנֵי הָאָדָם (bĕnē haʾādām, “filhos dos homens”) é, para Gill, uma referência à humanidade em sua fraqueza. Ele observa que, embora o corpo do homem volte ao pó como os dos animais, o espírito humano tem destino distinto (v.21), e essa distinção é fundamental para entender o ensino do livro.
Fonte: John Gill's Exposition of the Entire Bible on Ecclesiastes 3
📖 Albert Barnes (1798–1870)
Albert Barnes começa sua análise de Eclesiastes 3 destacando a beleza poética da seção de abertura. Ele observa que os 14 pares de antíteses dos vv.2–8 representam a totalidade da experiência humana. A estrutura hebraica é construída com precisão, e cada “tempo” é apresentado como inevitável e soberanamente ordenado.
No v.11, Barnes oferece uma leitura cuidadosa da palavra הָעֹלָם (hāʿōlām), interpretando-a como “eternidade” ou “infinito”. Ele nota que Deus colocou no coração humano uma intuição de algo eterno, mas sem permitir ao homem compreender completamente Suas obras. Essa tensão entre o que se percebe e o que se entende é para ele um elemento central da sabedoria bíblica.
Ao comentar o v.14 — “tudo quanto Deus faz é duradouro” — Barnes destaca a diferença entre a ação humana (transitória) e a divina (permanente). Isso leva ao temor reverente (v.14b), pois o homem reconhece que não pode competir com o agir eterno de Deus.
Nos vv.16–17, ele vê um grito contra a corrupção institucional — onde deveria haver justiça, há maldade. Barnes observa que, apesar disso, o texto não é niilista: há um tempo para o juízo, e Deus o trará. No v.18, ele nota que o Pregador “testa os filhos dos homens” — ou seja, Deus os deixa ver sua fragilidade, como os animais, para que reconheçam sua dependência.
Sobre o v.21, Barnes rejeita a leitura cética de que não há diferença entre homens e animais. Ele entende que a linguagem é retórica, construída para provocar reflexão. O espírito humano “sobe”, e há aqui, segundo ele, uma alusão à esperança da imortalidade, que se desenvolve progressivamente na revelação bíblica.
Fonte: Albert Barnes' Notes on the Whole Bible on Ecclesiastes 3
📖 Keil (1807–1888) & Delitzsch (1813–1890)
Keil & Delitzsch realizam uma análise linguística e estrutural profunda de Eclesiastes 3, começando pela afirmação solene do v.1: לַכֹּל זְמָן (lakōl zemān, “para tudo há um tempo”). Eles observam que o termo זְמָן (zemān) aparece com frequência na literatura persa tardia e implica tempo oportuno, não simplesmente cronologia.
Nos vv.2–8, eles analisam o paralelismo sintético da poesia hebraica. Cada par representa extremos que se equilibram dentro da ordem divina. O tempo de nascer e o de morrer, por exemplo, não são acidentais: são regulados pelo plano de Deus. A lista inclui atos pessoais e sociais, e os verbos são todos no infinitivo — sugerindo que não estão sob controle humano direto.
No v.11, o verbo עָשָׂה (ʿāsāh, “fez”) combinado com יָפֶה (yāfēh, “formoso”) indica que tudo é esteticamente adequado em seu tempo. O termo הָעֹלָם (hāʿōlām) é debatido: eles o interpretam como “eternidade” e explicam que Deus implantou no homem uma consciência do eterno, mas sem revelar o todo — criando um senso de mistério teológico.
No v.14, eles notam que a construção hebraica é enfática: מִן־כָּל אֲשֶׁר עָשָׂה הָאֱלֹהִים יִהְיֶה לְעוֹלָם (min-kol ʾăšer ʿāsāh hāʾĕlōhîm yihyeh leʿōlām) — “tudo quanto Deus fez será para sempre”. Essa permanência contrasta com a instabilidade do agir humano.
Ao abordar os vv.18–21, Keil & Delitzsch observam que a frase “como acontece aos animais, assim é com o homem” não nega a distinção espiritual, mas mostra que no aspecto físico ambos estão sujeitos à morte. No v.21, o verbo עֹלֶה (ʿōlēh, “sobe”) é interpretado como um sinal de esperança: o espírito humano vai a Deus — antecipando Eclesiastes 12:7. Eles concluem que o Pregador não é cético, mas realista, e que sua teologia é profundamente marcada pela reverência e consciência da soberania divina.
Fonte: Keil & Delitzsch Commentary on Ecclesiastes 3
✝️ Teologia de Eclesiastes 3
O Tempo e a Soberania Divina
Eclesiastes 3 é, talvez, o trecho mais conhecido e poeticamente celebrado de todo o livro, e ainda assim frequentemente mal compreendido. Seu célebre poema sobre o tempo — “Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu” (Ec 3:1) — é mais do que uma reflexão literária sobre a alternância das estações da vida. É uma profunda confissão teológica sobre o governo de Deus sobre a história e a limitação da criatura diante do fluxo do tempo. O capítulo é um convite à humildade diante da providência divina e uma exortação à confiança escatológica mesmo quando o presente parece não revelar sentido.
Logo nos primeiros versículos (Ec 3:1-8), a alternância dos eventos — nascer e morrer, plantar e arrancar, chorar e rir, matar e curar — apresenta um panorama da experiência humana em sua totalidade. Mas a chave hermenêutica do poema está no v. 11: “Tudo fez Deus formoso no seu tempo; também pôs a eternidade no coração do homem, sem que este possa descobrir as obras que Deus fez desde o princípio até o fim.” Aqui se entrelaçam três pilares da teologia: a Teontologia, pois afirma que Deus é o Autor soberano da história; a Providência, pois cada tempo é obra de Sua mão; e a Escatologia, pois o anseio pela eternidade reside no coração humano, mas sua plenitude escapa ao nosso domínio.
Ao dizer que Deus fez tudo “formoso” (hebraico: yāphêh) em seu tempo, o texto não afirma que tudo é esteticamente belo, mas que tudo está devidamente ordenado segundo o desígnio divino. Trata-se de uma afirmação sobre o propósito divino da história. Qohelet não romantiza o sofrimento ou a morte, mas reconhece que até esses elementos obedecem a uma soberania superior. Assim, mesmo os tempos “inapropriados” para o homem — tempo de guerra, tempo de chorar, tempo de perder — são parte de um mosaico que só pode ser compreendido à luz da eternidade divina.
No entanto, há uma tensão: Deus é soberano e o homem é finito. O ser humano percebe que existe um plano, mas não pode compreendê-lo por inteiro. O v. 11b afirma que Deus “pôs a eternidade no coração do homem, sem que este possa descobrir as obras que Deus fez desde o princípio até o fim.” Aqui se revela a frustração da razão humana frente ao mistério de Deus — uma teontologia negativa, mas não desesperada. O homem sabe que há um sentido, mas este permanece velado. Essa estrutura ecoa o apóstolo Paulo: “agora vemos como em espelho, em enigma” (1 Co 13:12).
A resposta de Qohelet a esse dilema é viver com temor e alegria. “Sei que tudo quanto Deus faz durará eternamente; nada se lhe deve acrescentar, e nada se lhe deve tirar” (Ec 3:14). É uma das mais belas confissões de confiança na providência em toda a Bíblia. Deus é imutável, Sua obra é firme, e Seu propósito é digno de reverência. O temor do Senhor, longe de ser pavor, é a resposta reverente à majestade de um Deus que rege os tempos.
Finalmente, os vv. 16-22 introduzem uma reflexão escatológica incipiente. A injustiça presente nos tribunais (v. 16) leva Qohelet a afirmar: “Deus julgará o justo e o ímpio; porque há um tempo para todo propósito e para toda obra” (v. 17). A justiça, ainda que ausente agora, será revelada no tempo de Deus. Embora o autor não desenvolva uma escatologia plena, ele pressente que o juízo final é o horizonte necessário para se crer em um Deus justo. Esse “tempo do juízo” se torna, na teologia bíblica, o clímax escatológico em que o Cordeiro reinará em justiça (cf. Ap 20:11-15).
O capítulo se encerra com a humildade de quem reconhece sua limitação ontológica: “quem sabe se o espírito do homem vai para cima e o do animal para baixo?” (v. 21). Não é ceticismo absoluto, mas reverência pela transcendência divina. Deus está nos céus e nós na terra. Entre o tempo e a eternidade, a tarefa do crente é confiar, temer e viver com responsabilidade, sem a pretensão de decifrar todos os mistérios. Eclesiastes 3 é um tratado sapiencial sobre a soberania de Deus no tempo, escrito com tinta escatológica.
✝️ Cristologia de Eclesiastes 3
A Insatisfação Humana e a Busca por SentidoA busca incessante por prazer, sabedoria e realização no trabalho é uma constante na experiência humana. No entanto, o livro bíblico de Eclesiastes, especialmente em seu terceiro capítulo, oferece uma perspectiva contundente sobre a futilidade dessas buscas quando desassociadas de uma dimensão espiritual profunda. O Rei Salomão, em sua vasta experimentação e riqueza inigualável, chega a uma conclusão desanimadora: tudo “debaixo do sol” é sem sentido. Contudo, essa aparente desesperança serve como um trampolim para a compreensão da centralidade de Jesus Cristo na busca por uma vida plena e com propósito.
A Futilidade das Buscas Terrenas Segundo Salomão
Salomão, em Eclesiastes 3, age como um “cientista” da existência, testando exaustivamente as principais fontes de satisfação que a humanidade persegue. Sua conclusão é clara:
A Justiça é Sem Sentido (Eclesiastes 3:16-17)
Salomão inicia sua reflexão em Eclesiastes 3:16-17, observando que, mesmo nos locais designados para a justiça — os tribunais —, a iniquidade prevalece. Inocentes são condenados e culpados são absolvidos. Os direitos dos pobres e indefesos não são protegidos (o que era uma função fundamental das autoridades no Antigo Testamento). O texto original aponta que Isaías 5:23 já reconhecia que este era um problema em Israel. A realidade de que “os ricos podem escapar impunes de um assassinato se puderem pagar a equipe de defesa certa” e de que “nosso sistema muitas vezes é menos sobre justiça e mais sobre ter o advogado certo e ter o dinheiro certo” é destacada.
Essa realidade distorcida gera um profundo clamor por retribuição. A pergunta “Quando Deus fará algo a respeito? Quando as coisas serão acertadas? Quando o ISIS pagará por crucificar crianças? Decapitar inocentes? Quando os traficantes de sexo receberão o que merecem?” reflete o anseio humano por uma justiça final e última responsabilidade. Como os mártires em Apocalipse 6 clamam: “Até quando, Soberano Senhor, santo e verdadeiro, não julgas e vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra?”.
Salomão, então, oferece uma resposta que serve de ponte para a Cristologia: há “um tempo determinado para Deus julgar o justo e o ímpio” (Eclesiastes 3:17), ecoando Eclesiastes 3:1. Embora o tempo exato desse julgamento seja desconhecido para nós — o próprio Jesus, em Sua encarnação, admitiu que “o Filho do Homem não sabia o tempo e a hora” (Mateus 24:36) — a certeza é que Deus agirá. Ele “busca os perseguidos” (Garrett, Proverbs, Ecclesiastes, Song of Songs, pp. 300–301), o que significa que responsabilizará os perseguidores. Salomão “confia que Deus acertará as coisas e que a injustiça será finalmente revertida. Os ímpios não escaparão impunes” (Greidanus, Preaching Christ, p. 99). Contudo, essa espera entre a crença na justiça divina e a realidade da injustiça presente é uma “realidade difícil para todos nós — presos entre a confiança na crença e a preocupação com a realidade” (Webb, Five Festal Garments, p. 94).
A Morte Universal e a Nossa Parte no Pecado (Eclesiastes 3:18-22)
Salomão muda o foco para a dura verdade de que “somos como animais” e, no fim, “todos morremos”. O cerne da questão é que, embora busquemos justiça para os outros, falhamos em reconhecer nossa própria injustiça. Quando alguém nos faz mal, queremos justiça. Mas quando somos parados por excesso de velocidade, queremos misericórdia. Essa hipocrisia revela que “não queremos exatamente a justiça” (Keller, “Problem of History”).
Salomão afirma em Eclesiastes 3 que “o salário pela nossa parte na injustiça do mundo é a morte!”. Nossa opressão mútua nos torna “como animais” (Murphy, Proverbs, Ecclesiastes, Song of Songs, p. 189), e Deus nos testa para “mostrar que somos apenas bestas” (Eclesiastes 3:18). O atraso no juízo divino, conforme Eclesiastes 8:11 aponta, revela nossa inclinação para atos perversos: “Porque a sentença contra uma má obra não se executa logo, por isso o coração dos filhos dos homens está cheio de fazer o mal.”
Há ecos do Gênesis 3, da queda da humanidade, em palavras como “filhos de Adão”, “bestas” e “pó”. A humanidade, criada para governar sobre as feras (Gênesis 1:28), submeteu-se a uma delas (a serpente) e, como resultado da maldição, agora age como as bestas em sua barbárie. As nações más que atacam Israel são chamadas de “bestas” (Salmo 80:13; Daniel 7:3), e o anticristo e o falso profeta são igualmente denominados “bestas” (Apocalipse 13).
Salomão estabelece a semelhança entre homens e bestas, pois “ambos morremos”. A mesma “respiração” (que pode ser traduzida como “alma” ou “vida”) é dada a ambos (Eclesiastes 3:19). Isso remete a Gênesis 1–3, onde Deus sopra vida na criação. O pecado, no entanto, rouba essa vida e traz a morte. A vida é fugaz para ambos. O “polegar opositor” do ser humano não oferece “nenhuma vantagem” porque “apodrecerá como a garra” (Matt Chandler, “Out of Breath”). A humanidade foi destinada à vida eterna pela Árvore da Vida, mas a morte universal é consequência do pecado. “Somos do pó, e ao pó voltaremos” (Eclesiastes 3:20).
As grandes perguntas em Eclesiastes 3:21-22 (“Quem sabe se o espírito do homem sobe para cima, e se o espírito do animal desce para baixo, para a terra? ... Pois quem o fará ver o que há de ser depois dele?”) têm uma resposta esperada: “Ninguém” (Murphy, Proverbs, Ecclesiastes, Song of Songs, p. 189). A sabedoria de Salomão aqui é que o conhecimento humano é limitado à experiência presente. Ele não comenta diretamente sobre a alma dos animais ou se eles vão para o céu, mas sim sobre a incerteza humana sobre o que acontece após a morte, o que nos iguala aos animais em termos de conhecimento limitado sobre o além-túmulo.
A Bíblia, no entanto, é clara que Deus dá o sopro de vida tanto a humanos quanto a animais (Gênesis 2:7 para humanos e Salmo 104:29-30 para animais). A Cristandade contemporânea, segundo o texto, por vezes “compartimenta alma e corpo”, mas a Bíblia “mostra que o você inteiro, alma e corpo, é o mais importante.” Deus não se preocupou apenas com a alma humana; Ele ama o mundo, incluindo o reino animal, e está “fazendo todas as coisas novas, incluindo árvores, cães e nuvens.” O estado final da humanidade é “corpos ressuscitados onde não há dor, tristeza ou morte” (Apocalipse 21:4).
Sem o conhecimento certo sobre o que acontece após a morte, a vida se torna uma “incógnita”. Livros sobre experiências de quase morte são populares porque as pessoas buscam respostas. Contudo, “nunca houve uma pessoa que definitivamente morreu, permaneceu morta por vários dias e depois voltou à vida e escreveu sobre isso.” A melhor opção sem essa certeza é “adivinhar e esperar”. Por isso, a instrução de Salomão é aproveitar os dons de Deus enquanto se pode. Eclesiastes 3 termina com outra passagem carpe diem, que nos convida a viver a vida ao máximo. Embora não negue a vida após a morte, o livro nos exorta a levar a morte a sério, assim como o salmista nos ensina a “contar os nossos dias” (Salmo 90:10-12), pois a vida é curta e precisa ser vivida plenamente (Garrett, Proverbs, Ecclesiastes, Song of Songs, p. 305).
O Clamor de Eclesiastes por Cristo
Salomão expõe sua exasperação com as falhas de liderança (talvez até convicto de suas próprias falhas), a morte e a falta de justiça no mundo. O Pregador clama por soluções para esses problemas, e Jesus é a resposta para cada um deles!
Um Rei Maior
O problema de líderes que oprimem e não melhoram o mundo clama por um Rei “maior que Salomão e Roboão e os outros”. Nossa ânsia por líderes políticos justos que acertem as coisas é, em última instância, uma ânsia pelo Rei Jesus. Em Seu reino, não há opressão nem desigualdade. Vemos isso, agora, em forma de semente na igreja — o “posto avançado do reino” — onde ricos e pobres, escravos e livres, se sentam juntos (Atos 4). Almejamos o dia em que Jesus estabelecerá Seu reino “de mar a mar” para que toda opressão cesse (Salmo 72)!A Ressurreição da Morte
Enfrentamos o reinado da morte, morrendo e nos decompondo como animais, sem certeza do que há além. Frustrantemente, ansiamos pela ressurreição, e o Novo Testamento revela aquilo que desejamos. Não sabemos o que nos acontecerá depois de morrermos porque “ninguém entrou na morte e voltou, exceto um Homem” (Atos 13:30). Jesus não se decompôs em pó, e pela fé Nele, você também será ressuscitado dos mortos. A ressurreição de Cristo não apenas possibilitou que fôssemos ressuscitados para a vida eterna, mas também nos mostrou como será a ressurreição. Aqueles que estão unidos a Cristo viverão para sempre não como almas sem corpo que voam, mas sim em corpos glorificados onde não há dor, tristeza ou morte (Apocalipse 21:4)!
O Juízo Final e a Justiça da Cruz
Finalmente, a Bíblia afirma que haverá um juízo final onde os ímpios são ressuscitados para a punição eterna e os justos para a vida eterna (Daniel 12). Haverá um acerto de contas final onde “todas as coisas são acertadas”, e Eclesiastes também deixa isso claro (Eclesiastes 11:9; 12:13-14). A boa notícia é que Deus trouxe o juízo final para o meio da história humana e julgou o pecado no corpo de Seu Filho na cruz. Jesus tomou o juízo que a humanidade merecia na cruz, para que, pelo arrependimento e pela fé, pudéssemos ser declarados justos aos olhos de Deus. Ele “tomou a injustiça sobre Si”. Ele sabe o que os oprimidos estão passando porque “a maior injustiça na história da humanidade é o Filho de Deus sendo assassinado por homens maus”. Cristo suportou a injustiça para que pudesse, em última instância, acabar com a injustiça para sempre!Conclusão
A narrativa de que “tudo o que precisa acontecer para mudar o Brasil é eleger os políticos certos e aprovar as leis certas” tem se mostrado falsa. Construir uma nação sobre as leis de Deus não mudará o país, assim como não mudou a antiga Israel, porque as leis não mudam o coração humano. Somente Jesus pode fazer isso. Vivemos em um mundo de opressão e injustiça, e “somente o evangelho pode mudar as coisas”. Afinal, como a canção de Natal nos lembra, “Em Seu Nome, toda opressão cessará.” Assim seja, vem depressa, Rei Jesus!
📜 Contexto Histórico de Eclesiastes 3
O Tempo para Tudo
Eclesiastes, em suas reflexões adicionais sobre a mortalidade humana, afirma que, como somos criaturas de tempo e ocasião, devemos viver em harmonia com o fluxo e refluxo da vida (3:1–8). Apesar de termos a eternidade em nossos corações (3:11), a bem-aventurança atemporal não nos pertence neste mundo, e, portanto, devemos aprender a viver apropriadamente tanto nos bons quanto nos maus momentos. Qualquer tentativa de encontrar uma filosofia do tempo ou da história nesses versículos deve ser abandonada; este texto trata de aceitar as realidades da vida, e não de discutir tempo cíclico versus linear ou noções semelhantes.
A passagem do tempo, como se media antigamente, era exemplificada por instrumentos como o relógio de água do século III a.C., que trazia inscrições externas com cenas relacionadas a divindades conectadas aos meses do calendário, e um relevo de Thoth em forma de babuíno, que media o tempo. A passagem do tempo era mensurada pelo nível da água em relação às doze fileiras de furos.
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Inscrição de tumba egípcia (c. 1250 AEC) com harpa, destacando as ‘Canções dos Harpes’como paralelas literárias às reflexões de Eclesiastes sobre a existência. |
O termo “destino” (do hebraico miqreh) em Eclesiastes 3:19, que afirma que o destino do homem é como o dos animais, tem intrigado alguns estudiosos. Eles sugerem uma comparabilidade com os termos gregos moira (“destino”) e tychē (“sorte”), implicando que Eclesiastes teria sido influenciado pelo pensamento helenístico. Contudo, miqreh não demonstra influência da cultura helenística. As Moiras gregas (“Destinos”) são deusas, enquanto miqreh não o é, e é usado em Eclesiastes não para sorte ou mesmo para um destino predestinado, mas simplesmente para o destino final, ou seja, a morte (ver 2:14, 15; 3:19–20; 9:2, 3, 11).
A rejeição da imortalidade nesses versículos ecoa nas Canções da Harpa do Egito. As “Canções dos Harpistas”, um gênero de música egípcia antiga, eram executadas em banquetes funerários. Essas canções foram encontradas em inscrições em túmulos egípcios e geralmente são colocadas ao lado de um retrato de um homem tocando harpa ou alaúde. Na religião egípcia ortodoxa, o harpista canta a bem-aventurança do falecido, que agora reside no reino de Osíris. Várias Canções dos Harpistas “heréticas”, no entanto, questionam a ideia de uma vida após a morte feliz e exortam as pessoas a aproveitarem a vida que agora têm, antes que seja tarde demais. Existem 13 Canções dos Harpistas heréticos conhecidos, sendo 12 de Tebas. Juntamente com a Epopeia de Gilgamesh, essas canções nos oferecem os paralelos literários mais próximos de Eclesiastes. É relevante adicionar que Eclesiastes aqui desafia o tipo de vida após a morte imaginado na teologia egípcia oficial, que, na prática, negava o significado da morte. Eclesiastes não se opõe ao conceito bíblico de ressurreição, que reconhece plenamente a finalidade da morte, mas afirma que ela é superada pelo poder de Deus.
Filosofia Helenística e Eclesiastes
Diversos estudiosos tentam demonstrar que Eclesiastes foi influenciado pela literatura grega. Por exemplo, o foco na vontade de Deus em Eclesiastes é tido como um reflexo de ensinamentos sobre o determinismo do filósofo estoico Cleantes. Contudo, essas comparações com textos gregos são sempre abstratas por natureza, uma vez que não existem paralelos literários convincentes com Eclesiastes. Ou seja, só se pode argumentar que Eclesiastes possui algumas ideias semelhantes às de certos pensadores helenísticos, o que dificilmente sustenta a tese de que o autor de Eclesiastes conhecia os textos estoicos. Uma obra grega que de fato lida com a mortalidade e o sofrimento humanos é Os Trabalho e os Dias de Hesíodo, mas este livro é tão distinto de Eclesiastes que qualquer tentativa de ligar os dois é forçada. Não há, portanto, razão convincente para crer que Eclesiastes seja influenciado pela literatura grega.
Termos e Conceitos Chave em Eclesiastes
Em Eclesiastes 1:1, a designação de “filho” de Davi é empregada, um termo que pode denotar tanto uma relação política quanto de parentesco. Nesse contexto, ele associa o Pregador a um dos descendentes reais de Davi, sendo Salomão o candidato mais evidente.
A temática da “inutilidade” (Eclesiastes 1:2) é um conceito antigo, reconhecido desde a literatura suméria e ao longo das tradições do Antigo Oriente Próximo. A ideia de que a existência, e particularmente a condição humana, é desprovida de sentido, remonta aos tempos antigos, afirmando que desde sempre há vaidade, que é como o vento.
Em Eclesiastes 1:9, a afirmação de que “não há nada de novo debaixo do sol” encontra um contraponto interessante nas inscrições reais assírias. Por exemplo, os reis assírios estavam constantemente buscando realizações para poderem se vangloriar de terem feito algo que nunca havia sido feito ou alcançado antes. Dessa forma, o rei podia se incluir entre os “criadores” ou “fundadores” – aqueles que haviam estabelecido precedentes. Tais realizações incluíam a busca ou a conquista; a construção de uma estrada, palácio, templo ou cidade; ou a introdução de uma nova técnica ou celebração.
No que tange ao “papel do sábio” (Eclesiastes 1:13), os sábios parecem ter constituído uma guilda diferente dos escribas, embora sua função e natureza exatas sejam obscuras. Certamente eram professores, mas não se sabe se tinham treinamento formal ou ensinavam formalmente. Sábios eram conhecidos em outras culturas do Antigo Oriente Próximo e, às vezes, atuavam como conselheiros da realeza. Para mais informações, pode-se consultar o comentário em Proverbs 1:1.
Índice: Eclesiastes 1 Eclesiastes 2 Eclesiastes 3 Eclesiastes 4 Eclesiastes 5 Eclesiastes 6 Eclesiastes 7 Eclesiastes 8 Eclesiastes 9 Eclesiastes 10 Eclesiastes 11 Eclesiastes 12
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