Tipos de Apócrifos do Novo Testamento
APÓCRIFOS DO NOVO TESTAMENTO. Título coletivo dado a uma quantidade de documentos, cujas datas são dos
primeiros séculos da Era Cristã, passando pela Idade Média, e chegando mesmo
até os tempos modernos. Todos esses documentos são semelhantes na sua forma aos
livros do NT (evangelhos, Atos, epístolas, apocalipses), porém, jamais foram
recebidos dentro do cânon das Escrituras (para os títulos apresentados a
seguir, veja os artigos separados). O Apocalipse de Pedro e os Atos de Paulo
chegaram a receber alguma medida de canonicidade temporal ou local (o primeiro é
mencionado, com alguma reserva, no Cânon Muratoriano; ambos são incluídos no
catálogo do Códice Claramontano), mas nenhum outro chegou nem mesmo a esse
nível de reconhecimento. A lista dos apócrifos conhecidos foi recentemente bastante
ampliada com a descoberta de uma biblioteca gnóstica em Nag Hammadi, no Egito,
mas nem todas as obras que ela apresenta pertencem realmente a esse contexto. A
palavra grega απόκρυφα
significa “oculto” ou “secreto” (cp. Mc 4.22; Cl 2.3), e era usada pelos
gnósticos ao se referir às obras esotéricas, cujo conteúdo era demasiadamente
sagrado para ser compartilhado com pessoas ainda não iniciadas (cp. Oepke, TDNT
III, 996ss.). Assim os livros cópticos de Jeu e o Apócrifo de João contêm severas
recomendações para que eles não sejam transmitidos a alguma pessoa não
autorizada. A Igreja, por outro lado, reconheceu apenas aqueles livros que eram
abertamente lidos na adoração pública, e, visto que muitas das obras apócrifas
eram francamente heréticas, o termo caiu em descrédito. A palavra é assim
utilizada com diversos sentidos, (a) no sentido original de “oculto, secreto”;
(b) de livros não apropriados para leitura na adoração pública, (embora
pudessem ser lidos em privado, cp. o Cânon Muratoriano sobre Hermas); (c) de livros
rejeitados como falsos e heréticos. O uso moderno do adjetivo “apócrifo”, com
sentido de “espúrio” ou “mítico”, “indigno de crédito”, é mais uma extensão de
significado. O uso técnico moderno do termo parece ter se desenvolvido em
analogia com os apócrifos do AT e é, em certos aspectos, infeliz porque alguns
dos apócrifos do AT possuem realmente elementos de reconhecimento e têm
efetivamente sido aceitos em ramos da Igreja. Com os apócrifos do NT este não é
o caso. Afora as exceções acima registradas, nenhuma destas obras jamais recebeu
reconhecimento ou autoridade por parte de qualquer um dos ramos da tradição
cristã. E importante enfatizar isto, já que, de vez em quando, tem sido
sugerido que o NT canônico é o resultado de uma seleção arbitrária feita pela Igreja,
partindo de uma grande quantidade de documentos que possuíam o mesmo direito de
reivindicar esse reconhecimento. A comparação entre os apócrifos do NT e os
livros canônicos é por si só suficiente para revelar a inferioridade daqueles
primeiros (cp. os comentários de Tiago, ANT. xivss., na edição de Hone). Como
Tiago coloca (xiss.) “não há o que se discutir sobre alguém os haver excluído
do NT; eles próprios fizeram por merecer essa exclusão.” Outro ponto a ser
notado é que, ao longo de sua história, o termo, às vezes, tem sido aplicado a
documentos que não são estritamente do NT ou absolutamente apócrifos, como, por
exemplo, aos Pais Apostólicos. E aconselhável que seu uso seja restrito apenas
àqueles escritos que não foram recebidos no cânon, mas que, pela sua forma e
conteúdo, apresentam alguma reivindicação de estarem na mesma classe das
Escrituras canônicas. Falando de maneira mais ampla, a Apócrifa do NT pode ser
dividida em dois grupos: aqueles cuja intenção é propagar uma espécie
particular de ensino, normalmente, herético; e aqueles cuja intenção é
consertar as deficiências, como elas se mostravam a uma época posterior, nos
registros canônicos da atividade de Jesus e de seus apóstolos. A importância
dessa literatura não repousa sobre o seu conteúdo, frequentemente apenas
lendário e fictício, mas no discernimento que ela permite fazer do Cristianismo
popular dos primeiros séculos, que, muitas vezes, existia num nível
completamente diferente especulação e teorização teológicas dos primeiros Pais.
Dificilmente consegue-se encontrar uma autêntica tradição histórica dos primeiros
tempos e, quando ela é encontrada, se o for, está nos documentos muito antigos.
Estes escritos oferecem um padrão muito útil de comparação com os livros
canônicos e apresentam a diferença entre os documentos que foram compostos a
partir de uma lembrança autêntica dos acontecimentos e aqueles nos quais a imaginação
inventiva teria estado completamente livre para reinar. Talvez o melhor caminho
para se formar uma estimativa do caráter desses escritos seja classificá-los de
acordo com a sua forma literária e, então, compará-los com as correspondentes obras
canônicas. Deve ser ressaltado que o título de um livro não é necessariamente
uma descrição acurada de seu caráter e conteúdo. A Epístola dos Apóstolos, por
exemplo, começa como uma carta, mas, rapidamente se transforma no relato de um
diálogo entre o Cristo ressuscitado e seus discípulos, semelhante quanto à
forma a diversos “evangelhos” gnósticos. O mesmo é verdade em relação à
Epístola de Tiago, que se encontrou no Nag Hammadi.
A. As ágrafas.
Antes de tudo, deve-se fazer referência à ágrafa — declarações atribuídas a Jesus,
que não foram registradas nos Evangelhos. Estas são, na sua maior parte,
declarações isoladas citadas ou no NT (At 20.35; lTs 4:1-5ss.), ou por algum dos
primeiros Pais da Igreja, embora apenas compilações sejam conhecidas,
incluindo-se a famosa Oxyrhynchus Logia
(POx.l, 654, 655), preservada também em cóptico no Evangelho de Tomé. Das
numerosas ágrafas conhecidas, algumas são pura invenção, outras resultam da transferência
feita a Jesus de material provindo de outra fonte (a passagem citada por Papias
ap. Iren.V, 33.3 é do Apocalipse de Baruque; o logion 17 do Evangelho de Tomé atribui 1 Coríntios 2.9 a Jesus),
outras são modificações ou adaptações de declarações genuínas; apenas algumas
poucas das ágrafas têm qualquer direito de serem consideradas autênticas (veja
Jeremias, Unknown Sayings of Jesus,
2° ed. [1964]).
B. Os evangelhos apócrifos.
Estes podem ser classificados em três categoria: (a) os textos antigos,
infelizmente, fragmentados na sua maior parte, que são os únicos nos quais poderíamos
ter a oportunidade real de encontrar o que sobreviveu da genuína tradição
antiga; (b) os evangelhos gnósticos e documentos relacionados; e (c) os evangelhos
da infância e outros textos posteriores. 1. Os textos antigos. Ao primeiro
grupo pertence uma quantidade de fragmentos de papiros, sendo os mais
importantes deles POx. 840, que registra a discussão, no pátio interno do
Templo, entre Jesus e um “fariseu chefe dos sacerdotes”, chamado Levi, e P
Egerton 2, que é de especial interesse porque data de antes de 150 d.C. e
apresenta elementos joaninos. Com o Papiro Rylands 457, este oferece evidência
importante para se estabelecer a data do quarto evangelho. Os Evangelhos
judaico-cristãos apresentam um problema, uma vez que as fontes patrísticas
citam três diferentes títulos, o Evangelho dos Hebreus, o Evangelho dos
Ebionitas, e o Evangelho dos Nazarenos, e não é certo se esses se referem a um,
dois, ou três documentos, nem a qual dos documentos os fragmentos citados
realmente pertencem (Vielhauer em NTAp I, 117ss. decide-se pelos três, e sempre
recoloca os fragmentos entre eles). Como existem apenas fragmentos, é difícil
formar uma estimativa sólida sobre o caráter desses livros e é perigoso
construir teorias muito abrangentes sobre eles. Pode, entretanto, ser
acrescentado que o Evangelho dos Hebreus é sempre mencionado pelos Pais com um
certo respeito (Lietzmann, Kleine Shriften II, 71). Um Evangelho dos Egípcios é
mencionado por Clemente da Alexandria, que não o desaprovava inteiramente;
porém, visto que apenas suas citações estão disponíveis, é difícil avaliar seu
caráter. Ele pode ter sido o evangelho dos cristãos gentios no Egito, enquanto
que o Evangelho dos Hebreus foi o dos judeus-cristãos; parece ter sido mais
gnóstico em seu caráter, e certamente foi utilizado por algumas seitas
gnósticas. Uma obra completamente diferente com o mesmo título foi encontrada
em Nag Hammadi. Um fragmento do Evangelho de Pedro, antigamente conhecido
apenas por intermédio de referências em Eusébio, foi encontrado em 1886; ele é
de interesse por causa de seu relato original e não-ortodoxo da paixão e
ressurreição de Jesus. Finalmente, a. Epístola dos Apóstolos, já mencionada, é
semelhante em alguns detalhes a alguns dos evangelhos gnósticos.
2. Os evangelhos gnósticos.
Uma característica comum a muitos evangelhos gnósticos e documentos
relacionados é a sua apresentação de revelações dadas aos discípulos pelo
Cristo ressuscitado, no período entre a Ressurreição e a Ascenção, um período
estendido de quarenta para 550 dias ou dezoito meses pelos gnósticos. A cena é
normalmente uma montanha, em geral o Monte das Oliveiras; um ou mais dos
discípulos se encontra com Jesus, fazendo-lhe muitas perguntas, e recebendo
suas respostas. Os assuntos discutidos incluem cosmologia, geralmente na forma
de uma reinterpretação gnóstica da história da criação registrada no livro de
Gênesis; a natureza e o destino do homem, e a sorte futura das várias classes da
humanidade. Ocasionalmente, existe alguma espécie de experiência visionária.
Algumas dessas obras estão associadas a nomes de discípulos em particular, como
acontece com o Apócrifo de João; outros, como Sofia Jesu Christi ou Pistis
Sofia, têm títulos mais gerais. Com relação à forma, e ocasionalmente mesmo de
conteúdo, é bastante difícil traçar uma distinção rígida entre estes textos e
algumas das últimas obras no grupo anterior. Um segundo tipo consiste dos
escritos atribuí dos aos fundadores de escolas heréticas, Cerinto, Basilides e
Marcião, Mani; mas, na maioria dos casos, existem apenas os títulos, e nem
sempre é certo que eles representem obras separadas e independentes (por
exemplo, o “evangelho” de Marcião parece ter sido uma versão expurgada de Lucas).
Um terceiro grupo é formado pelos três “evangelhos” encontrados em Nag Hammadi,
o Evangelho da Verdade, o Evangelho de Tomé, e o Evangelho de Filipe. Nenhum
desses é estritamente um evangelho: o Evangelho da Verdade é uma meditação
sobre o tema da mensagem do evangelho, o Evangelho de Tomé uma coleção de
declarações, enquanto que o Evangelho de Filipe parece ter sido composto de
declarações e meditações basicamente enfileirados sob um princípio de chamada,
sem muita preocupação com a coerência ou apresentação sistemática. Disto
toma-se claro que, conforme foi ressaltado, o título “evangelho” não representa
a garantia da natureza ou do conteúdo desses documentos; e, também o contrário
acontece, alguns dos documentos gnósticos que não trazem esse título podem ser
formalmente classificados como “evangelhos” de um tipo gnóstico.
3. Os evangelhos da infância.
Estes devem sua origem ao desejo, já mencionado, de preencher as aparentes
deficiências dos evangelhos canônicos e de ver preenchidas as lacunas na
história. Na mais antiga tradição do evangelho, foram registrados apenas os
eventos dos quais os apóstolos eram ou poderiam ter sido testemunhas (cp. At l.22ss., “começando no batismo de João”); mesmo no quarto evangelho, embora o
Prólogo retome ao começo absoluto das coisas, a verdadeira história de Jesus e
sua missão começa com João Batista. Mateus e Lucas, entretanto, colocam no
prefácio de seus relatos do ministério as narrativas do nascimento e da
infância de Jesus. Significativamente, eles diferem até ao ponto em que eles
começam a se basear em Marcos e Q, mostrando, dessa maneira, que eles
utilizaram coleções diferentes e separadas da tradição. Alguns assuntos possuem
paralelos em fontes não-bíblicas, porém, o interesse principal não é o da
narrativa ou da imaginação, e sim o teológico e o apologético (veja Cullmann, NTAp
I, 364s.), e, em comparação com desenvolvimentos posteriores, estas narrativas
revelam uma sobriedade e prudência marcantes. Os evangelhos da infância são
muito mais extravagantes. Jesus é retratado como possuindo forças miraculosas, mesmo
durante a sua meninice, e no Evangelho da Infância segundo Tomé, algumas vezes
ele faz uso delas de uma forma completamente incompatível com o caráter
apresentado na tradição canônica (essa obra não tem ligação com o Evangelho Cóptico
de Tomé). O Protoevangelho de Tiago é muito menos grosseiro, e, na verdade, seu
uso do material lendário é comparativamente mais comedido. Essa obra foi
escrita principalmente para a glorificação de Maria, e leva a história de
volta, além do nascimento de Jesus, até o nascimento miraculoso da própria
Maria e sua educação dentro do Templo. Com base nesses dois documentos, foi desenvolvida
uma extensa literatura nos séculos posteriores, apesar de sua condenação pelos
papas, e gozou de ampla popularidade. Pode-se fazer referência aos evangelhos
da infância Arábico e Armênio, á literatura cóptica relacionada ao nascimento
de Maria, e aos Milagres de Jesus Etíope. Uma importância especial tem sido
atribuída ao Evangelho de Pseudo-Mateus, datado do 8° ou 9° século d.C., no
qual muito desse material foi apresentado de maneira mais refinada. Seu valor repousa
no fato de que essas lendas se tomaram propriedade pública e que elas puderam
exercer uma influência na arte e na literatura cristãs. Na verdade, tem sido
afirmado que na Antiguidade, na Idade Média e na Renascença, esses escritos tiveram
mais influência na literatura e na arte do que a própria Bíblia (Cullmann,
NTAp. I, 368). Os relatos apócrifos sobre a paixão e a ressurreição de Jesus
Cristo são menos comuns. A parte do Evangelho de Pedro, já mencionado, o
interesse maior prende-se ao Evangelho de Nicodemos, também conhecido como os
Atos de Pilatos, que incorpora uma narrativa da descida de Cristo ao inferno e
seu triunfo sobre as forças do submundo. A literatura relacionada a Pilatos
teve uma ampla circulação em várias línguas. Também deve ser mencionado aqui um
texto árabe examinado pelo Prof. S. Pines (Proc. Israel Acad. o f Science and Humanities,
vol. II, n.13 [1966]), que afirma que ele provém de uma fonte judaico-cristã
(contraste com S. M. Stem. JTS 18 [1967], 34ss.). Em todos os acontecimentos
ele demonstra intimidade com os temas apócrifos. A importância primária de
todos esses documentos é que eles servem como um contraste para demonstrar a
comparativa sobriedade e prudência dos evangelhos canônicos, e para revelar o
que pode acontecer quando se permite excessiva liberdade à imaginação e à
ornamentação lendária. Normalmente, esses documentos se apossam do material
canônico e o expandem ou modificam, porém, quando eles são originais e
independentes, dificilmente são confiáveis. Existe, portanto, muito pouca
(talvez nenhuma) tradição autêntica sobre Jesus que não tenha sido incluída nos
evangelhos.
C. As epístolas apócrifas.
Comparativamente falando, estas são poucas e algumas nem são realmente
epístolas. O Cânon Muratoriano menciona uma carta aos Laodicenses e outra aos Alexandrinos,
“forjadas em nome de Paulo pela seita de Marcião”. Embora ela seja encontrada em
alguns manuscritos da Bíblia, a subsistente Epístola aos Laodicenses, escrita
em latim, é uma “colcha de retalhos” de frases paulinas; e existe alguma dúvida
quanto à sua identidade com a carta mencionada no Cânon Muratoriano. As Cartas
de Paulo e Sêneca, já conhecidas desde o tempo de Jerônimo, possuem claramente a
intenção de utilizar o prestígio e a autoridade do filósofo romano para dar
suporte à fé cristã. Uma carta de Corinto a Paulo, e sua resposta (3 aos
Coríntios) são agora conhecidas como parte dos Atos de Paulo, embora elas
tenham circulado independentemente. A Epístola do Pseudo-Tito é um longo
tratado escrito em louvor ao celibato, que faz uso liberal não apenas do
material bíblico, mas também de material apócrifo (veja NTAp. II, 141 ss.).
Finalmente, existe a correspondência entre Cristo e Abgar, rei de Edessa, pela
primeira vez mencionada por Eusébio (veja Abgaro).
D. Os atos apócrifos.
Mais extensas e mais importantes são os Atos Apócrifos, especialmente as cinco
maiores obras do 2° e 3° séculos d.C.: os Atos de André, João, Paulo, Pedro, e Tomé
(veja artigos separados). Em geral, pode ser dito que eles estavam mais
interessados em suplementar do que em substituir o Atos canônico, ao fornecerem
informações mais completas a respeito das ações dos apóstolos e, em particular,
a respeito de seus martírios. Essas obras testificam da alta consideração que
os apóstolos gozavam, como guardiães da autêntica mensagem do evangelho e como
pioneiros da missão cristã; mas, ao mesmo tempo, seu uso de temas lendários e
seu gosto por milagres, pelo simples fato de serem milagres como uma forma de
glorificar os apóstolos, colocam-nos na categoria de romances ao invés de
história. As tendências ascéticas que eles frequentemente apresentam, refletem
os ideais de uma era posterior. Os elementos de autêntica tradição antiga, como
eles contêm, são normalmente emprestados do Atos canônico ou de outras fontes do
NT. Eles pertencem à esfera da literatura popular e mostram certas afinidades
com os romances helenistas; pode-se observar, por exemplo, o lugar dado às
jornadas dos apóstolos, as maravilhas que eles enfrentam (ex. canibais, animais
que falam, até mesmo insetos obedientes), e a ênfase sobre seus poderes
miraculosos. Aqui os apóstolos estão mais próximos do “fazedor-de-prodígios”
helenista, do que do apóstolo do NT. O estado de conservação dessas obras
varia; os Atos de Paulo, por exemplo, teve que ser completamente reconstruído a
partir dos fragmentos sobreviventes. Na maioria dos casos, algumas partes,
especialmente as dos martírios, circularam de forma separada, o que, muitas
vezes, propiciou sua modificação e sua expansão. Às vezes, existem versões em
diferentes línguas, que variam consideravelmente de uma para a outra. O ponto importante,
entretanto, é sua popularidade e sua influência nos escritos posteriores. Eles
próprios são a base e, frequentemente, uma copiosa fonte de numerosas obras
posteriores (veja NTAp. II, 572ss.); mais tarde, foram também compostos Atos
para outros apóstolos: Filipe, Mateus, Bartolomeu, Simão e Judas, Tadeu, Barnabé.
E. Apocalipses apócrifos.
O único livro apocalíptico no NT canônico é o Apocalipse de João, embora
elementos apocalípticos possam ser encontrados em outras obras (ex. Marcos 13 e
paralelos; 2Ts 1:2-12). A Igreja Primitiva compartilhava abundantemente do
temperamento e do mundo do pensamento do apocalíptico judaico e, com isso, apropriou-se
e adaptou vários de seus documentos (veja Vielhauer, NTAp. II, 581 ss.), mas há
uma alteração na ênfase, o interesse agora centraliza-se no retomo de Cristo, e
depois, na demora da Parousia, no
mundo por vir, “o céu e a sua bênção, o inferno e a sua desgraça.” A Ascensão
de Isaías, por exemplo, recebe seu título a partir de uma visão que descreve a
subida do profeta através de sete céus, o que pode datar do 2° século d.C. Também
deste século, visto que já era conhecido de Clemente da Alexandria, é o
Apocalipse de Pedro, que é importante tanto pela forma como ele incorpora as ideias
do céu e do inferno existentes em fontes não-cristãs, como pela sua influência sobre
escritos posteriores, passando pelo Apocalipse de Paulo e outras obras e
chegando à Divina Comédia, de Dante. Deve, ainda, ser acrescentado que nem
todas as obras que contém “Apocalipse” ou “Revelação” em seus títulos são
necessariamente apocalípticas em seu sentido completo; assim como,
contrariamente, revelações de caráter apocalíptico, às vezes, ocorrem em
escritos que não trazem esse título. Também devem ser mencionados uns poucos
livros de profecia (algumas vezes, nem neotestamentários nem apócrifos no
sentido estrito), notadamente as porções cristãs dos Oráculos Sibilinos, o
Quinto e o Sexto Livros de Esdras, e os fragmentos do Livro de Elchasai. De
acordo com Schneemelcher (NTAp. II, 688ss.), o Montanismo dá continuidade aos
primeiros profetas cristãos do período do NT, e não aos apocalípticos daquele período;
porém a hostilidade levantada pelo Montanismo pode ter trazido consigo uma
oposição aos apocalípticos e a outras formas de profecia.
F. A apócrifa moderna.
Como anteriormente observado, a produção dos apócrifos continuou não apenas na
Igreja Primitiva, mas também durante a Idade Média, e até mesmo dentro dos tempos
modernos. Aqui é preciso diferenciar entre os romances e obras semelhantes de
ficção, nos quais o autor, escrevendo de sua própria imaginação, fazia uso de
eventos e figuras do período neotestamentário, e os documentos que
pretensamente se apresentam como textos autênticos dos tempos antigos,
recentemente descobertos, restaurados ou reconstruídos. Os primeiros não são
apócrifos, mas aberta e honestamente fictícios; os últimos são apócrifos e
podem ser perigosos e desorientadores (para uma lista, veja IDB I., 168, 169).
BIBLIOGRAFIA. Uma coleção bastante útil da Apócrifa do Novo Testamento, traduzidos em Inglês, pode ser encontrada em James, ANT (Oxford 1924, sempre reimpresso). Para as descobertas mais recentes e uma discussão extensiva da literatura, veja Hennecke Shneemelcher, NTAp. (2 volumes, ET [1963, 1965]). Quatro apocalipses gnósticos do Nag Hammadi foram publicados por A. Bohlig e R Labib, Koptisch-gnostische Apokalypsen aus Kodex V von Nag Hammadi, Helle-Wittenberg (1963). Para mais recente informação sobre a publicação dos textos do Nag Hammadi, veja D. M. Scholer, Nag Hammad Bibliography (1949, 1969, 1971), 92ss.