Teologia de Lamentações 3
Teologia de Lamentações 3
Por David W. Smith
Lamentações 3 consiste em três
poemas acrósticos que introduzem uma nota de esperança no livro. Penosas admissões
de culpa ocorrem continuamente (3.1-18,40-54), contudo, o orador não acredita
que a ira de Yahweh seja definitiva. Em meio a terrível dor, o remanescente de
Israel pode descobrir novamente a graça do Senhor. Porém, só é possível fazê-lo
por “uma atitude de humilde perseverança no sofrimento, reconhecendo seus pecados
e retornando a Yahweh”. Seu retorno depende, de qualquer modo, da fidelidade do
Senhor, que perdoa e restabelece os penitentes. Para a cura, exige-se a fé em
Deus. Dois textos expressam tal esperança muito claramente. Após confessar seu
pecado e o pecado do povo (3.1-18), o orador declara que a essência do caráter
do Senhor indica que nem tudo está perdido. Deus é misericordioso, por isso o
povo não foi totalmente consumido (3.22). A misericórdia do Senhor é
inesgotável (3.22). A fidelidade de Deus é auto-renovada a cada dia (3.23), e Yahweh
sempre amparou os que crêem nele (3.24). Portanto, é aconselhável esperar
tranquilamente, suportar sempre com paciência as consequências do pecado
pessoal e nacional, pois Deus salva (3.25-30). Afinal de contas, Deus não
deseja castigar, mas abençoar (3.31-36).
O escritor tem certeza de que a mesma
palavra infalível que trouxe a morte pode resultar mais uma vez em vida (3.37- 39).
Se a natureza de Deus fosse diferente, então as conclusões do autor teriam de
mudar drasticamente. Assim, o Senhor soberano da história permanece o mesmo. Síntese canônica: a boa vontade de Deus para
perdoar A graça e a fidelidade paciente de Deus fazem parte tanto da teologia deuteronômica
quanto a ira de Deus. A disposição de Yahweh para curar e perdoar está
claramente declarada em Deuteronômio 30.1-10. Deus resgatará o povo de Israel
do cativeiro quando ele se voltar para o Senhor (Dt 30.1-3). O livro de Juízes
ilustra repetidamente o espírito perdoador de Deus, assim como a obra divina a
favor de Davi em 1 e 2Samuel. O desfecho feliz de Joaquim demonstra a bondade
divina em 2Reis 25.27- 30. Jeremias 31.31-34 e Ezequiel 36.26,27 falam de uma
nova aliança, um novo espírito e um novo coração para Israel ao fim do
julgamento. A ira sempre possui um propósito redentor e restaurador. Tais convicções sobre a fidelidade de Deus
para com o remanescente também embasam os salmos de lamento. Esses textos se recusam
a acreditar que Deus permitirá que a maldade continue incontrolada.
Eles louvam
o Senhor, pois esperam que, no final, a retidão inerente de Deus triunfe. Seus
autores rogam honestamente acerca dos próprios pecados, pois acreditam que
nenhum sacrifício pode eliminar a falta de integridade, e porque eles sabem que
Deus é santo. A qualquer tempo, os lamentos admitem que o desejo de Yahweh de
perdoar, renovar e curar nunca enfraquece. Novamente, a questão é o caráter de
Deus. Se Deus não é fiel, nem coerentemente santo, então o povo está perdido e
condenado à miséria e à morte. Uma vez que Deus é fiel, o desolado tem
esperança. Brevard S. Childs observa que Lamentações oferece a renovação a cada
geração sucessiva do povo de fé. Ele escreve que pelo texto a comunidade é “chamada
a retomar a fé em Deus, mas ao mesmo tempo a lamentar sua devastação e destruição
numa oração coletiva”. Quando a comunidade procede assim, a confissão e a
esperança substituem o canto fúnebre e o desespero. A presença desse texto no
cânon dá a cada sucessivo leitor remanescente a chance de empregar a fidelidade
de Deus numa situação nova. Os israelitas no exílio, particularmente,
necessitavam saber que poderiam ser o novo remanescente fiel sob qualquer
circunstância, pois eles nunca permaneceriam fora da esfera da graça divina.