Interpretação de Daniel 1

Daniel 1

Daniel 1 prepara o cenário para todo o livro, apresentando os personagens e temas principais. Aqui está uma interpretação dos pontos-chave em Daniel 1:

1. Exílio de Judá (Daniel 1:1-2): O capítulo começa com um contexto histórico. Conta-nos que o rei Nabucodonosor da Babilônia sitiou Jerusalém e a capturou. Ele então levou alguns israelitas, especificamente da família real e da nobreza, como cativos para a Babilônia. Este evento marcou o início do exílio babilônico do povo judeu.

2. Seleção de Jovens (Daniel 1:3-4): Nabucodonosor ordenou que alguns dos jovens dos israelitas exilados fossem selecionados para servir em seu palácio. Esses jovens deveriam ser de ascendência nobre, bem-educados e fisicamente aptos. O objetivo era treiná-los para servir na corte do rei.

3. Mudanças de Nome (Daniel 1:5-7): Entre os jovens selecionados estavam Daniel, Hananias, Misael e Azarias. Seus nomes foram mudados para Belteshazzar, Sadraque, Mesaque e Abednego, respectivamente, como parte de um esforço para assimilá-los na cultura e religião babilônicas. Mudar seus nomes foi uma forma simbólica de romper os laços com a herança judaica.

4. A Fidelidade de Daniel (Daniel 1:8-16): Apesar da pressão cultural e da comida e vinho abundantes fornecidos pelo rei, Daniel resolveu não se contaminar comendo a comida do rei, que pode ter sido sacrificada aos ídolos. Em vez disso, ele e seus amigos solicitaram uma dieta de vegetais e água. Eles fizeram isso para permanecerem fiéis às leis dietéticas da sua fé judaica. Deus os abençoou e eles pareciam mais saudáveis do que aqueles que comiam a comida do rei.

5. O Favor de Deus (Daniel 1:17-21): Deus concedeu a Daniel e seus amigos conhecimento e compreensão em todos os tipos de literatura e aprendizado. Eles se destacaram em seu treinamento e foram levados perante o rei para servir. Em todas as questões de sabedoria e entendimento, o rei os considerou dez vezes melhores do que todos os mágicos e encantadores de seu reino. Isto demonstrou o favor e a providência de Deus para com Daniel e seus companheiros.

Em Daniel 1, o capítulo prepara o cenário para a narrativa mais ampla do livro. Apresenta o exílio babilônico, a seleção de jovens israelitas para servir na corte babilônica e os desafios culturais que enfrentavam. A história também destaca o compromisso de Daniel e seus amigos em manter a fé e as práticas alimentares, que Deus abençoou com sabedoria e favor. Este capítulo estabelece a base para os relatos subsequentes das interpretações de sonhos e visões de Daniel e de sua fé inabalável em Deus durante sua vida na Babilônia.

Nesta seção os personagens principais do livro são apresentados, junto com as circunstâncias que os colocaram nas posições que mais tarde virão a ocupar.

Interpretação

1:1. No ano terceiro do reinado de Jeoaquim. De acordo com Jr. 25:1, o quarto ano de Jeoaquim foi o primeiro ano de Nabucodonosor. Contudo o caldeu é chamado de “rei da Babilônia” aqui no terceiro ano de Jeoaquim. Isto constitui uma “prolepse” (C.F. Keil, Biblical Commentary on the Book of Daniel) ou “antecipação” (Rose, The Bible Commentary), por meio da qual um título posterior é aplicado à pessoa ao se falar de um período ainda anterior ao que o título foi realmente conferido. Um pouco depois o pai de Nabucodonosor, o rei da Babilônia, morreu, e Nabucodonosor, apressando-se em voltar para a Babilônia à frente dos exércitos, recebeu o trono (Jos. Antiquities x, 11 , 1.). Veio Nabucodonosor. Veja Introdução, Antecedentes Históricos. Se o ba’ hebraico deveria ser traduzido para “foi” ou “partiu” (isto é, deixou a Babilônia), ou “veio”, ou “chegou” é fato incerto. O lugar de onde Daniel falava era a Babilônia; por isso, “foi” é aceitável.

A palavra hebraica é capaz de conter qualquer um desses significados. Até pouco tempo este versículo foi a única informação disponível relativa a esta tomada de Jerusalém, exceto por um pequeno comentário de Josefo. Contudo, II Reis 24:1, como II Crônicas 36:6, 7, talvez se refira ao acontecimento. Na ausência de mais provas tem-se tornado quase axiomático entre os modernos críticos irreverentes negar que tal acontecimento tenha realmente tido lugar, citando o caso como o primeiro “erro crasso histórico” do autor. Em fevereiro de 1956, foram publicados antigos documentos que agora fornecem todo o apoio histórico para a presença de Nabucodonosor em Judá exatamente nessa época (veja JBL, Dez. 1956, Vol. LXXV, Pt. IV, pág. 277).

É desesperador ver que estes novos dados são ignorados por escritores recentes (veja B.W. Anderson, Understanding the Old Testament, 1957, pág. 355; N.K. Gottwald, A Light to the Nations, 1959, pág. 618; John Bright, A History of Israel, 1959, pág. 569). Os crentes, entretanto, não precisam esperar pelas confirmações arqueológicas para aceitarem a palavra de Daniel.

1:2. Esta é a verdadeira interpretação da história. O Senhor lhe entregou... Jeoaquim. “Para o Senhor nenhum impedimento há de livrar com muitos ou com poucos” (I Sm. 14:6). Como também não há nenhum impedimento para destruir com muitos ou com poucos. Mais tarde o governo divino sobre a história torna-se mais enfático (Dn. 4:17). Nabucodonosor era “servo” de Deus (Jr. 25:9). Do mesmo modo, Deus usou ditadores que a si mesmo se exaltaram neste nosso século para castigar terras e povos, e mais tarde os destruiu (cons. Jr. 25:12-14). Como alguém já disse de maneira singular, suas proezas de auto-exaltação nada mais são que “exercícios para mantê-los saudáveis para a execução”. Utensílios da casa de Deus. Com os pecados da nação provocaram o empobrecimento gradual do magnífico templo de Salomão vê-se em I Rs. 14:25, 26; lI Rs. 14:8-14; 16:8;18:13-16; 24:8-13; Jr. 27:16-22; 52:17-23. Quanto à profanação dos utensílios do templo, veja Dn. 5; e quanto ao seu retorno a Jerusalém, veja Esdras 1:7-11.

1:3. Chefe dos seus eunucos. Eunuco (heb. sarîs), um macho castrado. Por motivos óbvios, os eunucos eram frequentemente encarregados dos haréns reais. Às vezes a palavra, por metáfora, era usada simplesmente com referência a um oficial. Há uma grande possibilidade de que Daniel e seus amigos tenham sido desvirilizados. Veja novamente a predição sinistra de Isaías (II Rs. 20:18). Dos filhos de Israel (heb. Mib-benê-yis-ra-el, lit, tirados dos filhos de Israel). Esses eram originalmente todos os descendentes de Jacó ou Israel. Mais tarde, Israel passou a ser o nome das dez tribos que se separaram e se juntaram a Jeroboão (I Rs. 11:13; cons. 12:19). Mas depois da destruição do “Reino do Norte”, o nome Israel voltou ao seu primitivo significado. Da linhagem real (lit, semente da reato). Isto se refere à família de Davi (cons. Is. 7:2, 13). Quanto a um exemplo da degeneração espiritual de certos membros da linhagem real mais ou menos nesse período, veja II Rs. 25:25; Jr. 41:1 e segs. Como dos nobres. A palavra nobres (Heb, partemîm) é um termo persa aparentemente cognata de palavras usadas com referência a pessoas importantes em diversas línguas indo-europeias. Talvez fosse de uso comum na corte. Refere-se a importantes famílias, não à casa de Davi. O sentido dos três termos, Israel... linhagem real... nobres, indica que a seleção tinha de ser feita entre os hebreus, tanto da família real como de outras famílias da nobreza.

1:4. Jovens sem nenhum defeito. Esta é a primeira de uma série de qualificações estipuladas para a seleção de homens a serem treinados na corte da Babilônia. Jovens. No hebraico, yeladîm é uma palavra de significado indefinido, dependendo da idade da pessoa que fala. Em uma narrativa objetiva como esta, a estimativa comum de quatorze ou quinze anos de idade é o que parece certo. Ausência de defeito não elimina a possibilidade de sua castração. Ao serem selecionados, naturalmente não tinham essa mutilação. De boa aparência. O rei devia olhar para pessoas e coisas perfeitas e lindas. A mesma combinação de palavras se usou em relação à beleza de Raquel (Gn. 24:16; 26:7), Bate-Seba (II Sm. 11:3), da Rainha Vasti (Ester 1:11) e de Ester (Ester 2:2, 3,7). Instruídos em toda a sabedoria, doutos em ciência, e versados no conhecimento. Essas três expressões cumulativas enfatizam a capacidade natural e a instrução prévia. A redundância da expressão hebraica é para dar ênfase e não para estabelecer distinções. Referia-se mais ao que os jovens já eram e não ao que iriam se tornar. Geralmente, a capacidade intelectual se revela em pessoas que não eram muito brilhantes na infância. Que fossem competentes para assistirem no palácio do rei. Talentos naturais e adquiridos que capacitassem esses homens a servirem um rei esplêndido em um edifício magnífico é o que se quis dizer. Os rapazes deviam ser humildes mas não tímidos, nem obtusos.

E lhes ensinasse a cultura e a língua dos caldeus. O aprendizado (Heb. livro) dos conhecimentos dos caldeus refere-se à literatura do povo da Mesopotâmia inferior. Desde que as descobertas arqueológicas do século passado trouxeram à luz e forneceram a chave para a tradução desta literatura, sabemos como era vasto o conhecimento dos caldeus. Recentes descobertas nas regiões mais próximas do Egeu Oriental demonstraram que um grande acúmulo de intercâmbio cultural aconteceu entre as duas áreas. E os vizinhos filisteus de Israel eram, ao que parece, de origem grega. Com eles, prova o Livro de Juízes, houve intercâmbio cultural. (Veja G. Bonfante, “Quem Eram os Filisteus?” American Journal of Archaeology, 1, 2, abril/junho, 1946, págs, 251.262.) A língua dos caldeus deve-se referir ao acadiano (babilônio, assírio), a língua da época. Caldeus aqui foi aparentemente usado em um sentido mais extenso, para designar os habitantes da região da Caldeia, que no seu significado mais amplo incluía toda a Babilônia. As diversas línguas da região, incluindo a muito antiga língua ritual, eram escritas sobre o barro com caracteres cuneiformes. Era um sistema ideográfico e silábico, muito diferente da escrita alfabética dos papiros feita com tinta e pena a que o povo da Palestina e Síria estava acostumado. Os fundamentos da astronomia, a matemática, as leis e uma dúzia de outras disciplinas eram registradas nessa antiga escrita cuneiforme, ao lado de uma grande quantidade de falsidades mágicas. Se tudo isso tinha de ser ensinado a esses jovens, então três anos (com. v. 5) não era demais para a sua educação.

1:5. A ração diária, das finas iguarias da mesa real, e do vinho que ele bebia. Nem guloseimas (ASV) nem alimentos nutritivos (RSV) substitui bem as finas iguarias. A palavra assim traduzida (patbag) é uma palavra emprestada do antigo persa pelo hebraico, significando “apropriação” ou “concessão” (Montgomery, ICC, págs. 122-124). Refere-se ao fato desses jovens serem sustentados pelo governo, partilhando da “ménage” dos outros oficiais do rei. Não há nem sequer a mais leve indicação no texto hebraico de que havia algo física ou moralmente prejudicial na comida ou na bebida. O vinho era comum à dieta dos judeus (veja Sl. 104:15; Is. 55:1; Ne. 5:18, onde a mesma palavra yayin foi usada). Muitas insinuações contra o uso excessivo do vinho aparecem, contudo, no V.T. (Pv. 20:1; 23: 20,30, 31); e certas ordens religiosas estavam proibidas do uso do vinho (Nm. 6:1-20; Jz. 13:1-7; Jr. 35:1-14). Os sacerdotes estavam proibidos de usarem vinho imediatamente antes de servirem no Templo (Lv. 10:1-9), e os reis eram desencorajados a beberem vinho (Pv. 31:4, 5).

1:5-7 Daniel, apresentado pelo nome, é alguém que através de todo o livro, além de fazer a narrativa, é também o personagem da maior parte dela em diversas circunstâncias: intérprete de sonhos (caps. 2; 4; 5), amigo dos sofredores (cap. 3), receptor de visões e sonhos reveladores de Deus (caps. 6-12). Em diversos incidentes três amigos judeus associam-se a ele. Aqui todos são apresentados por nome. A mudança dos nomes dos jovens é muito significativa. Sua educação dentro da história da mais desenvolvida cultura pagã que já tinha existido devia se completar com a substituição dos nomes honrando as vis divindades da Babilônia em lugar daqueles que honravam o Santo de Israel. Eles deviam ser afastados da antiga religião e cultura e totalmente transformados, até na identidade, em Babilônios. Pois entre os antigos o nome de um homem era ainda mais parte de sua identidade e caráter que entre os homens da atualidade.

1:7. Outros nomes, a saber: a Daniel o de Beltessazar. Daniel significa em hebraico príncipe (ou juiz) de Deus, enquanto que o novo nome Beltessazar, na língua da Babilônia, significa príncipe de Bel. Este nome Beltessazar (uma variante do nome do Rei Belsazar, cap. 5),homenageia Uma das principais divindades da Babilônia (veja Is. 46:1; Jr. 50:2; 51: 44). Hananias significa misericórdia de Jeová (sendo uma variação do original do nome do apóstolo amado, João), enquanto que Sadraque possivelmente significa “ordem de Aku”, o deus da lua (HDB) uma forma mais ou menos disfarçada d Marduque (Montgomery, ICC, pág. 123), um dos principais deuses da Babilônia. Misael Com muita certeza significa Quem é como Deus? enquanto que Mesaque (de acordo com Fred. Delitzch, uma competente autoridade) significa Quem é como Aku? Lamentavelmente não podemos ter certeza porque o nome não aparece em nenhum outro lugar e sua origem é incerta. Azarias significa A quem Jeová ajuda, ou Jeová ajudará, enquanto que Abede-Nego muito provavelmente significa Servo de Nebo.

“Um costume..., de impor novos nomes quando as pessoas passavam para novas condições de vida ou adquiriam novos relacionamentos”, destaca Moses Stuart, “é muito comum no V.T. : veja Abrão e Abraão, Gn. 17:5; José e Zafenate-Paneia, Gn. 41:45; comp. II Sm. 12:24, 25; lI Rs. 23:34; 24:17; também Ester 2:7; Esdras 5:14 comp. com Ageu 1:14; 2:2, 21. Do mesmo modo no N.T., Mc. 3:16, 17. Esses nomes, assim impostos, geralmente designavam alguma coisa para honra dá pessoa que os recebia, ou uma homenagem ao deus adorado por quem os impôs, ou para comemorar algum acontecimento interessante, etc.” (A Commentary on the Book of Daniel, pág. 9). Um comentário mais extenso sobre esses nomes poderá ser encontrado nas enciclopédias e dicionários bíblicos, como também nos léxicos hebraicos.

1:8a. Uma Decisão pela Justiça. Resolveu Daniel firmemente. Inteligência inata e comportamento nobre eram complementados neste homem por uma firme lealdade aos princípios. Não contaminar-se. A contaminação (v. 5) nada tinha a ver com qualquer elemento prejudicial que houvesse no alimento ou na bebida. Era antes por ser “do rei”. A palavra traduzida por contaminar-se (ga’al, uma palavra heb. antiga) pode significar contaminação física (Is. 63:3, “mancha”), contaminação moral (Sf. 3:1), ou, mais frequentemente, contaminação cerimonial (por exemplo, Esdras 2:62; cons. Ne. 7:64). Quanto à relação entre o alimento e a bebida com a contaminação cerimonial, veja Mt. 15:11. Embora recomende moderação, a Bíblia em lugar nenhum ordena abstinência de qualquer alimento ou bebida com base moral; o problema era cerimonial ou religioso. A religião afetava toda a vida dos antigos, como ainda nos povos primitivos da atualidade – e como deveria para todos os homens. Até mesmo o comer e o beber tinha um ritual e significado místico. O matar de um animal era um ato religioso que deveria ser executado com solenidades próprias. A carne da mesa do rei era sem dúvida morta de acordo com o ritual pagão e oferecida a um deus. Os judeus estavam proibidos de comer carne sacrificada a um deus pagão (veja Êx. 34:15), pois era “servir a outros deuses” aos olhos públicos. Os judeus sempre enfrentaram este problema ao comer fora de sua terra (Oseias 9:3, 4; Ez. 4:13, 14). Uma situação semelhante prevalecia quanto ao vinho. Outro problema era que os procedimentos levíticos não eram considerados, isto é, a comida e a bebida do rei não eram “Kosher” (veja Lv. 3:17; 6:26; 17:10-14; 19:26).

1:8b. Então pediu, etc. Em caso de necessidade, as leis cerimoniais podiam ser postas de lado (Mt. 12:3-5; I Sm. 21:6; Nm. 28:8, 9). Foi porque Daniel tinha o discernimento de perceber o propósito real nestas coisas de afastá-lo de sua santa fé, que ele então resolveu não se submeter sem lutar. Ele “simplesmente determinou ... através do alimento manter viva a lembrança de sua pátria. Ele queria viver na Caldeia como um exilado e cativo, mas como procedente da sagrada família de Abraão” (Calvino, Commentaries on the Book of Daniel the Prophet, in loco.) A palavra pediu (biqesh, “buscou”) não se pode usar com referência a uma solicitação desprovida de energia. Sendo um piel (ou intensivo ativo) na forma, sempre é uma palavra incisiva (usada em II Sm. 2:17; 12:16).

1:9. Ora Deus concedeu. A A.V. dá a impressão de que Daniel já tinha previamente obtido o favor do chefe eunuco. O sentido hebraico é mais naturalmente traduzido como consecutivo, isto é, Daniel fez o pedido e consequentemente Deus lhe concedeu o favor do chefe dos eunucos. Observe que bons motivos e sentimentos admiráveis não se encontram ausentes dos corações pagãos (cons. Js. 2:1 e segs.; contraste com Pv. 12:10; veja Gl. 5:22). Deus chama os defensores para o Seu povo de maneiras estranhas.

1:10. Faz lembrar o copeiro e o parteiro, amigos de José (Gn. 40). Parece que, embora o eunuco chefe desejasse ajudar Daniel, não via possibilidades isso (veja Tiago 2:14-18).

1:11. Daniel, Hananias, Misael e Azarias. Orientado só pelo ponto de vista do Espírito santo, o autor não condescende em reconhecer os novos nomes homenageando deuses pagãos da Babilônia conferidos por um burocrata pagão oportunista, mas prefere usar os nomes que honram a Deus e lhes foram conferidos por piedosas mães judias.

1:12. Experimenta, peço-te, os teus servos dez dias. A palavra experimenta (nasâ) é uma forma intensiva (piel) e junto com o coortativo na’ expressa forte pedido. Para Daniel e seus amigos, como também para o camareiro, o limite de dez dias era um teste da vontade de Deus. Se a experiência fracassasse, os jovens hebreus estavam preparados para vencer seus próprios escrúpulos cerimoniais, conforme veremos no próximo versículo. Não há evidência de que Daniel soubesse o resultado final. Nenhuma presunção estava envolvida, como supõe Young (Edward J. Young, The Prophecy of Daniel, in loco), pois as Escrituras nos fornecem um bom número de exemplos aprovados de tais testes. Dez dias. Um número redondo favorito (1:20; cons. Amós 5:3; Zc. 8:23). Legumes a comer (lit., do zero’îm e nós comeremos). Embora usado apenas aqui e em 1:16 em toda a Bíblia, e em nenhuma outra obra literária conhecida, a palavra aparentemente significa vegetais, pois origina-se de uma palavra que significa “semear” (semente). Portanto legumes eram coisas que cresciam de sementes plantadas no solo. Nenhum ritual religioso de dedicação a algum deus estava diretamente envolvido no preparo de vegetais, como acontecia com a carne; e os vegetais não eram usados no ritual pagão como as libações com o vinho. Esta passagem não constitui uma aprovação do vegetarianismo (veja Rm. 14:1-4).

1:14. Ele atendeu o pedido. O hebraico indica que ele deu consideração atenta ao pedido de Daniel.

1:15, 16. Recompensa da Justiça. A prova teve sucesso e assim Daniel e seus amigos foram poupados do embaraço e tensão emocional que a ofensa aos seus próprios padrões teriam lhes causado.

1:17. A estes quatro jovens. Antes, aos moços, aos quatro. Isto enfatiza que todos os quatro recebiam cedas coisas, enquanto que Daniel tinha ainda dons naturais especiais. Deus deu. Todos os talentos e dons naturais ou adquiridos, vêm dEle e devem ser usados para Ele. Conhecimento. O hebraico madda’, uma palavra rara e antiga. Embora relacionada com o comuníssimo verbo “conhecer”, prece significar “pensamento”, no sentido de um processo racional secreto, como o seu uso em Ec. 10:12 claramente indica. Talvez “mente em boas condições” ou “bom senso” transmitem a ideia. Inteligência. De haskel (um hiph. inf. abs.), aparentemente significando “visão interior” ou “compreensão”. Cultura. O seper hebraico geralmente com o significado de “livro”, mas aqui, como em 1:4, designando o mundo das letras, a literatura. E sabedoria. O hebraico hakmâ. Embora geralmente designando o proverbial conhecimento do antigo Oriente Próximo, tem o significado mais amplo de qualquer “corpo de princípios inteligentemente arrumado”, ou, como diríamos agora, “ciência” (S.R. Driver, Daniel, em Cambridge Bible for Schools and Colleges). Observe que a palavra “toda” qualifica esta sabedoria, mostrando que era mais que o conhecimento supersticioso dos sacerdotes pagãos que se pretendia mencionar.

Pesquisadores têm demonstrado que além da astronomia (um acessório aos cultos pagãos), também a arquitetura, a linguística, a agricultura, a meteorologia, a agronomia e muitas outras ciências já estavam em desenvolvimento na terra dos dois rios. A Daniel deu inteligência de todas as visões e sonhos, ou melhor, em todo tipo de visão e em sonhos. Isto apenas aponta, antecipando-se à narrativa que vem a seguir, O destaque de Daniel como agente da revelação divina.

1:19. Então o rei falou com eles; e entre todos... Todo o grupo, incluindo muitos além dos quatro moços especiais, participaram dos três anos de educação e todos foram apresentados a Nabucodonosor. A pergunta se faz insistente: o que aconteceu aos outros jovens judeus educados na verdadeira religião? É óbvio que foram por água abaixo no compromisso com a apostasia. Nenhum como Daniel... por isso passaram a assistir diante do rei. “O rei, através de um exame pessoal, escolheu exatamente aqueles indivíduos que a Providência premiara com dons especiais que os colocaram em situação superior aos outros jovens” (Stuart, Commentary).

1:20. Dez vezes mais doutos do que todos os magos. “Provavelmente..., homens conhecedores do ocultismo em geral” (Driver). A obscura palavra hartummim, também usada em 2:2, 10, 27; 4:7, 9; 5:11, pensa-se ser, segundo autoridades, de origem egípcia. Fora do livro de Daniel só é usado com referência aos “mágicos” egípcios (Gn. 41:8, 24; Êx. 7:11, 22; 8:7, 18, 19; 9:11). Há quem sugira que a palavra, aparentemente derivada de heret, “um estilete”, poderia ser traduzida para escribas, isto é, os escribas dos antigos textos de rituais religiosos na língua arcaica dos antigos habitantes da Babilônia, uma língua desconhecida para o povo em geral no período de Daniel. E encantadores. No hebraico não há a conjunção e, portanto encantadores foi usado como aposto. É uma palavra babilônia, encontrada em ambas as porções hebraicas e aramaica de Daniel, mas em nenhuma outra porção das Escrituras. Fica melhor traduzir assim (ou enfeitiçadores) do que astrólogos. Aquelas palavras indicam que falsidades supersticiosas viciavam o conhecimento da verdade científica na Babilônia.

1:21. Até ao primeiro ano do rei Ciro. Uma contradição de 10:1 frequentemente imaginada. É mais provável que considerando-se que a época em que o cativeiro foi oficialmente eliminado coincidiu com o primeiro ano de Ciro (Esdras 1:1 e segs.), o versículo esteja apontando para o notável fato de que o jovem Daniel, que se encontrava no primeiro destacamento de judeus que foram levados cativos de Jerusalém para Babilônia (605 A.C), atravessou vivo o longo e melancólico período do cativeiro para ver o primeiro destacamento de exilados retornando. Esta é a explicação mais natural para o versículo.

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