Lamentações 5 — Comentário Teológico
Lamentações 5 — Comentário Teológico
Lamentações 5
Quinta Lamentação: A Resposta do Remanescente.
Confiança na Fidelidade de Deus (Lm 5.1-22)
Lamentações 1.1-3.22 se encerram com uma oração, o
que não acontece Lm 4. E Lm 5 pode ser visto então como essa oração de
encerramento. De fato, este capítulo é mais uma oração que um lamento, embora
tenha muitos elementos de lamentação. Essa oração descreve que tipo de
respostas o povo tem de dar para ganhar o favor de Yahweh. Em primeiro
lugar, o povo, em humildade e arrependimento, deve buscar a Deus e
pedir-Lhe que considere a miserável condição deles, a fim de que, na Sua
piedade, Ele a reverta (vss. 1-18). Além disso, há a chamada de Deus para
restaurar Judá (vss, 19-22). As bênçãos do pacto deveriam cumprir-se (Deu.
30.1-10).
“Neste poema, encontramos a oração da nação pedindo
compaixão, e não uma lamentação autêntica. Na Vulgata Latina, o capítulo tem o
título: ‘Uma oração do profeta Jeremias’. O vs. 3 indica que o autor
estava vivendo na Palestina, entre o remanescente que ficara na região.
Ele se demorou nas suas condições miseráveis como base da compaixão” (Theophile
J. Meek, in loc.). Este poema final não emprega o método
acróstico como os outros. Quanto a isso, ver a introdução ao Salmo 34.
Lm 5.1-18
Lembra-te, Senhor, do que nos tem sucedido. Se Yahweh lembrasse o Seu povo e visse sua condição de
miséria, poderia deixar de lado Sua indiferença (ver Sal 10.1; 28.1; 15.3) e
aliviar-lhe os sofrimentos. Esse é o tema principal dos vss. 1-18. Diriamos: “Isso
já seria punição suficiente para seus pecados, e agora que se pense como eles
seriam restaurados. O profeta já tinha observado que o Senhor nota tais
atrocidades (Lam. 3.34-36). O Deus que vê e simpatiza também seria um Deus
que age para mudar as coisas. Cf. o versículo com Sal. 89,50,51. Este capítulo
repete os “ais” de Judá, à espera do remédio da compaixão de Deus.
5.2 A nossa herança passou a estranhos. Parte da herança dos judeus era a Terra
Prometida, o lugar onde eles deviam viver. Mas era também o
próprio Yahweh, a herança espiritual, o templo e seu culto que unia Judá e
a tornava uma nação única. Naturalmente, Judá abandonou essa herança,
tendo-se voltado para a idolatria-adultério-apostasia. Ver Sal. 79.1, onde
Israel é a herança de Deus. Está em vista aqui, particularmente, a
herança física de Judá, o território, bem como suas casas, que eles tinham
construído na Terra Prometida. Cf. Êxo. 23.30 e Lev. 20.24. Mas os
babilônios tomaram essa herança. Eles são chamados de estrangeiros,
destituído do direito de fazer o que fizeram, e certamente a Palestina não
lhes pertencia, em sentido algum. Mas os pecados de Judá fizeram os
judeus ser deserdados. A maioria das casas dos príncipes e dos oficiais
foi incendiada (Jer. 52.13), mas mesmo assim havia edificações em número
suficiente para abrigar os invasores. A herança da Terra Prometida era uma
importante provisão do pacto abraâmico (ver Gên. 15.18). Os apóstatas
haviam abandonado o pacto, pelo que foram abandonados e sua terra foi
entregue a estrangeiros.
5.3 Somos órfãos, já não temos pai. Os poucos sobreviventes judeus perderam,
literalmente, seus pais, pelo que agora eram órfãos, e os poucos pais que
sobreviveram perderam seus preciosos filhos. Poucas mulheres continuaram
casadas, pois seus maridos foram mortos, e a maioria das mulheres casadas
agora eram viúvas. As mulheres mais bonitas foram levadas para engrossar
os haréns da Babilônia, e as mulheres não tão bonitas foram submetidas a
trabalho escravo. Ademais, o Marido de Judá abandonou, desgostoso, o Seu
povo, pelo que, espiritualmente falando, Judá foi deixada na viuvez. Em Israel,
os membros da sociedade mais carentes eram os órfãos e as viúvas (ver os
comentários sobre Lam. 1.1). Mas aquele versículo salienta,
principalmente, a viuvez espiritual, que acabo de mencionar. Ver também
Jer. 3.19 quanto a esse tema.
5.4,5 A nossa água por dinheiro a bebemos. O pescoço dos vencidos foi pisado
pelas botas dos babilônios. (Vs. 5). Alguns pensam que a metáfora é o jugo adicionado
pela Revised Standard Version. Perseguições e labor forçado macularam a
vida dos poucos sobreviventes. “O poeta estava frisando a
completa vassalagem e degradação do povo” (Theophile J. Meek, in loc.).
Essa servidão aumentou devido ao fato de que eles tinham de pagar pela
água e pela lenha (vs. 4). Eles pagavam essas coisas com o trabalho, e
vendendo ou negociando qualquer item de valor que tivesse restado, em troca de
alimentos, água e lenha. “A perseguição e o medo seguiam-lhes os
calcanhares (cf. Deu. 28.65-67; Eze. 5.2,12)” (Charles H. Dyer, in
loc.).
Cf. estes versículos com Sal. 66.12; Isa. 51.23 e
Jos. 10.24. Essa questão de pagarem pelas necessidades básicas pode referir-se
ao tributo forçado que foi imposto aos poucos judeus que restauram em
Judá. Ou então tudo passou a ser taxado. Aben Ezra mistura as ideias dos
vss. 4 e 5: “Se carregamos água ou lenha em nossas costas, o inimigo nos
persegue; eles nos tomam os nossos haveres”. Seja como for, os judeus
foram forçados a trabalhar dia e noite, e não tinham descanso, nem mesmo
nos dias de sábado. Portanto, o trabalho de uma semana deixava-os
literalmente exaustos. Uma servidão do tipo egípcio tornou-se a maneira de
vida dos sobreviventes.
Eles nos fazem trabalhar duro como se fôssemos
animais, com jugo no pescoço. Ficamos cansados e não
temos descanso.
(NCV)
5.6,7 Submetemo-nos aos egípcios e aos assírios. Os pais, que haviam pecado, “não mais existiam”.
Tinham deixado o palco da vida, mas seus descendentes eram pecadores ativos,
como haviam sido seus pais, na época deles. A idolatria, naturalmente,
é o principal pecado destacado, quer dos pais, quer de seus descendentes. Os
que viveram no passado distante receberam formas de juízo da parte de
Yahweh, e agora os que viviam nos dias de Jeremias deviam suportar
o látego babilônico (vs. 6). Alguns deles escaparam e foram para o Egito
ou para o território da antiga Assíria. É possivel que os dois nomes
locativos (vs. 6) visem somente dar direções gerais: o Ocidente e o Oriente. Os
que escaparam tiveram de trabalhar arduamente naqueles lugares, somente para
sobreviver. Assim, não tinham uma vida fácil e satisfatória. Mas o vs. 6 é
entendido por alguns eruditos como as alianças feitas com
potências estrangeiras para garantir o simples suprimento de pão.
Além disso, a Assiria podia apontar para a Babilônia,
pois esta ocupou os territórios essenciais da potência anterior, Nesse caso, está
em foco a servidão. Os judeus trabalhavam como escravos
apenas para continuar comendo e vivendo. Cf, este versículo com Jer. 50.15. Mas
a referência ao Egito quase certamente diz respeito aos fugitivos judeus
que se dirigiram ao local para escapar dos babilônios. Ver Jer. 52.14. O sentido
geral é que os vários sobreviventes sofreram sortes variegadas,
embora todas más. Desse modo, foram severamente julgados, por
continuarem no pecado (especíalmente a idolatria) de seus antepassados.
5.8 Escravos dominam sobre nós. Que o leitor acompanhe
estes pontos:
1. É provável que aqui os escravos
sejam os oficiais do governo babiiônico, por serem apenas servos de
Nabucodonosor. Alguns deles podiam ter sido escravos anos antes, pois não era
incomum que os servos se elevassem a altas posições, caso mostrassem ser
pessoas habilidosas. Cf. sobre Tobias, o escravo, em Nee. 2.10,19.
2. Alguns creem que esses escravos
não eram os oficiais, mas os escravos literais dos oficiais, que foram
delegados para dirigir os judeus escravizados. ”Escravos sob os
governadores caldeus governavam os judeus (Nee. 5.15). Israel, que tinha
sido um reino de sacerdotes (Êxo. 19.6), tomou-se um escravo de escravos,
de acordo com a maldição de Gên. 9.25” (Fausset, in loc.).
3. Outra ideia aqui é que o
restante dos judeus, em Judá, passou a ser governado por baixos oficiais de
nenhuma potência especial, enviados pelos babilônios àquele lugar, que não
merecia receber grane atenção.
4. Adam Clarke (in loc.) pensa
que os soldados babilônios estão em vista, pois eles não eram muito mais
que escravos do império.
5.9 Com perigo de nossas vidas providenciamos o nosso
pão. Que o leitor acompanhe os seguintes pontos
enumerados:
1. Quando Jerusalém caiu, alguns
judeus fugiram para o deserto e tentaram manter a vida ali. Mas foram
atacados pelas tribos beduínas, que se ressentiam da presença deles.
2. Ou então, ladrões, sabendo que
havia fugitivos estabelecidos naquelas paragens solitárias, resolveram
atacá-los, já que eles eram totalmente incapazes de defender-se. O simples
fato de ficar vivo e comer tinha-se tornado uma aventura perigosa, tal era
a turbulência daqueles dias.
3. Ou então os poucos sobreviventes
que permaneceram em Judá (por não terem fugido) foram atacados por gangues
errantes, tanto nos lugares onde viviam como nos lugares aonde iam em
busca de suprimentos básicos. A expressão ”espada do deserto”
provavelmente refere-se aos assaltantes árabes, bandidos sanguinários do
deserto que viviam errantes procurando qualquer oportunidade de mostrar-se
maléficos. Cf. Jer. 40.14. Ver também Deu. 28.31.
1. O trio terrível,
espada-fome-pestilência, quase aniquilou os judeus. Ver Jer. 14.12;
21.9; 24.10; 29.17; 38.2; 42.17 e 44.13. Aqui a fome é enfatizada.
A agricultura do país foi destruída, tal como foram destruídos os
agricultores, pelo que não havia suprimentos alimentares nas cidades. Os
desnutridos judeus foram vítimas de várias enfermidades; e talvez a febre
tenha sido destacada aqui como um dos miseráveis resultados da febre e da
fome.
2. O forno aqui
referido é o corpo, e não os ventos quentes que varriam a desolação, ideia
que alguns estudiosos têm apresentado.
3. Ou então os ventos requeimantes
devem ser entendidos como uma metáfora do forno. Condições
climáticas agravavam a fome e faziam os famintos sofrer ainda mais.
Concordando com a segunda dessas ideias, Charles H. Dyer (in loc.)
disse: “A pele dos judeus era febril, devido à ausência de
alimentos adequados (cf. Lam. 4.8)”. “A fome resseca os poros, e a pele
torna-se como se fosse sabrecada pelo sol (Jó 30.30; Sal. 119.83)”
(Fausset, in loc.).
5.11 Forçaram as mulheres em Sião. O estupro sempre foi e
continua sendo um procedimento padrão na guerra. Ter acesso fácil às mulheres
de uma cidade capturada fazia parte do salário dos soldados. O saque é
outra porção do pagamento dos que arriscam a vida. Homero diz-nos
que os gregos, quando foram a Tróia para recuperar Helena, que tinha sido
sequestrada, entraram em um pacto de que não retornariam à sua terra
nativa sem terem estuprado alguma esposa troiana. Como é claro, eies
fizeram isso por vingança, mas tal coisa poderia ter sido feita mesmo que
a “causa” da guerra não fosse o sequestro de Helena. Uma vez consumado o
estupro, as mulheres selecionadas foram enviadas para engrossar os haréns da
Babilônia. E as mulheres de beleza secundária tornaram-se escravas das
damas babilônicas. A última parte do versículo mostra que as virgens não escaparam
do estupro em massa. “Esse mal foi predito por Moisés (ver Deu. 28.30,32)
e também por Jeremias (Jr 6.12)” (Adam Clarke, in loc.). Ver
também Zac. 14.2.
5.12 Os príncipes foram por eles enforcados. Que o leitor
acompanhe os pontos seguintes:
1. Os que tinham liderado a
rebelião contra a Babilônia receberam um tratamento destituído de misericórdia,
como ser pendurados pelas mãos e ali ficar até morrer de fome ou de
exposição às condições atmosféricas. Até os líderes mais velhos receberam
tão desumano tratamento, pois a idade avançada deles não foi respeitada.
2. A crucificação não está em vista
aqui, embora alguns tenham pensado nisso. Nem a impalação parece estar em
vista, embora essa fosse uma forma comum de execução na época.
3. Alguns reduzem a desgraça a ter
o corpo pendurado, para ficar expostos na presença de outros e para que as
aves dos céus o comessem. Cf. I Sam. 31.10-12. Sabe-se que esse era um ato
comum de humilhação aplicado por assírios e babilônios.
4. Se as mãos que
figuram em algumas versões são as mãos dos babilônios, então estão em foco
as atrocidades que eles praticaram contra os judeus. O enforcamento
pode estar então em vista, “Era costume dos persas, depois de executar
um homem, decapitá-lo e pendurar o corpo em um poste... (Heródoto, Hist.,
lib.ví, cap. 30, lib. vii.c.238)” (Adam Clarke, in loc.).
5.13 Os jovens levaram a mó. Os jovens, e até mesmo meros
meninos, foram submetidos a trabalho escravo, sendo postos a fazer funcionar a
pedra de moinho ou a carregar pesadas cargas de lenha ou coisas parecidas.
As guerras antigas eram sempre a principal fonte de trabalho escravo, uma
importante atividade internacional. Hoje em dia as pessoas são reduzidas a
“escravidão do salário”, e não têm vida melhor que os escravos antigos. De
fato, muitos assalariados vivem em piores condições que os escravos, pois pelo
menos a maioria dos escravos antigos tinha o bastante para comer, o que
não é o caso de muitos “escravos do salário”. Ver no Dicionário os
verbetes chamados Escravidão e também Escravo, Escravidão,
quanto a descrições dessa prática desumana, que nunca morreu, embora tenha
tido sua forma modificada. “Quanto à indignidade de moer, o trabalho de
escravos e escravas, ver Juí. 16.21 e Isa. 47.2. A colheita de lenha
também era trabalho de escravos e de mulheres” (Theophile J. Meek, in
loc.). Cf. Jó 31.10.
5.14 Os anciãos já não se assentam na porta. Terminaram todas as funções sociais
normais. Não havia mais comércio nem julgamentos nas portas da
cidade, onde os anciãos eram proeminentes. Nem a música e a dança eram
mais ouvidas e testemunhadas. Os lugares de assembleia, com qualquer
propósito, foram obliterados, e não havia número suficiente de pessoas
para reunir-se. Não existiam mais tribunais nas portas da cidade, onde um homem
poderia apresentar suas queixas e ver corrigidas as injustiças. Além
disso, já não havia número suficiente de pessoas para entrar em litígio.
Nada havia para celebrar com música e danças, nem havia músicos que
tocassem instrumentos musicais ou dançarinos que enfeitassem ocasiões festivas.
Ver Jó 29.7,8.
Embora Satanás esbofeteie, embora venham provações,
Que esta bendita segurança controle:
Cristo considerou nosso estado de impotência.
(H. G. Spafford)
5.15 Cessou o júbilo de nosso coração. A alegria se azedou, e a dança perdeu o
sentido, visto que quem dança exprime alegria. As lamentações eram a
única atividade dos sobreviventes. “Não resta alegria em nossos corações.
Nossa dança transformou-se em tristeza” (NCV). Cf. Juí. 21.21. O próprio
contexto da sociedade judaica foi despedaçado. Toda atividade cessou. Os poucos
sobreviventes que restaram lutavam desesperadamente apenas para
sobreviver, mas a vida não era digna de ser vivida.
5.16 Caiu a coroa da nossa cabeça. Esta frase significa a
perda da condição de nação. Uma nação inteira havia morrido. Os restos dela
estavam sujeitos a um governo estrangeiro. Ver Jer. 13.18. Judá tinha
deixado de ser uma nação. Os babilônios eram especializados no genocídio.
O pequeno restante veria um Novo Dia, e a minúscula comunidade criaria uma
pequena cidade-estado, que se transformaria novamente em nação. Mas isso só
ocorreria no futuro. O presente nada era senão sofrimentos de um
remanescente minúsculo e sem privilégios. Cf. este versículo com Jó 19.9 e
Sal. 89.39,44. Tudo isso sucedeu por causa da idolatria-adultério-apostasia que
Yahweh precisou julgar a fim de purificar o povo de Judá.
5.17 Por isso caiu doente o nosso coração. Corações
desmaiavam no meio da melancolia, e os olhos tiveram sua acuidade visual
diminuída pelo choro constante. Era uma situação desesperadora, e a maioria dos
atingidos morreu desse modo. Alguns poucos de seus filhos viram a
restauração da nação, Cf. Lam. 1.22 ; 2.11. Este versículo é um lembrete
dos horrores listados e descritos nos vss. 8-15. Ver também Lam. 3.48,49.
5.18 Pelo monte Sião que está assolado. O coração deles
estava desmaiado e os olhos estavam turvos de chorar (vs. 17), especialmente em
vista da destruição e incêndio do templo, e do fim da glória do culto em Sião.
Onde Yahweh era antes honrado, e onde peregrinos vinham para celebrar
alegremente as festas anuais, agora somente feras, como os chacais,
estavam presentes. Eles se tinham mudado, uma vez que o povo que podia
lutar estava morto. Cf. esta declaração com Lam. 4.3. Ver também Isa.
35.7; Jer. 9.11; 10.22; 49.33; Sal. 63.10 e Mal. 1.3. Os animais passam a
ocupar os lugares de onde o temor do homem foi removido.
5.19 Tu, Senhor, reinas eternamente. Encontramos aqui a segunda parte do poema. Os capítulos
do livro de Lamentação terminam com uma oração. É apropriado que o livro
termine com uma nota de esperança, baseada na eterna soberania de Deus. Yahweh
tinha feito um pacto com Seu povo, o que lhes dava a esperança de que o Seu
poder eventualmente revertería aquela calamidade.
Yahweh é tanto soberano quanto eterno. Ele permanece
o mesmo e continua poderoso. Seu trono nunca perde os privilégios, como
aconteceu ao trono de Judá (vs. 16). O poder e o governo de Deus continuam
de geração em geração, nunca sofrendo uma perda. Judá baseou suas
esperanças na restauração dos fatos divinos. Como um povo em pacto
com Deus, eles esperavam que sua apostasia não tivesse anulado as
promessas de Yahweh a Abraão (ver sobre Pacto Abraâmico, em Gên.
15.18). “O Deus de Judá é o único verdadeiro Deus. Ele é quem havia
causado suas calamidades (Lam. 1.12-17; 2.1-8; 4.11). No entanto, esse
mesmo Deus tinha poder de produzir restauração de Judá, se
assim preferisse fazê-lo” (Charles H. Dyer, in loc). “A lamentação
aproximava-se do fim, e o lamentador consolava-se no pensamento sobre a
eternidade de Deus (Sal. 102.12); e, portanto, sobre a imutabilidade de
Seu propósito de amor para com o povo” (Ellicott, in loc.). Diz o
Targum: “A casa da Tua habitação está nos altos céus. O trono da Tua
glória continua de geração em geração. Antes Tu nos amavas. Oh, que o Teu
amor se renove para conosco!” (Adam Clarke, in loc.).
5.20 Por que te
esquecerias de nós para sempre? Os sucessos do ataque babilônico e
do cativeiro subsequente indicariam que Yahweh não permanecia indiferente,
mas, antes, estava brutalmente presente para danificar e destruir.
Por quanto tempo isso sucederia? Alguma coisa restaria? Yahweh golpeou
furiosamente e então se afastou. E nada fez para curar o ferimento. Ele
esqueceu Judá, deixando-o em sua miséria. Ele abandonou Sua herança.
Moisés falou sobre Deus a lembrar-se de Seu pacto, caso o povo
confessasse os seus pecados (Lev. 26.40-42). Isso aconteceria nessa
situação desesperada? Haveria restauração após os 70 anos de miséria,
conforme o profeta disse que sucederia (Jer. 25.11,12)? Nesse caso,
somente os filhos dos lamentadores veriam o Novo Dia.
5.21 Converte-nos a ti, Senhor, e seremos convertidos. A
esperança de restauração inspira o apelo final: “Restaura-nos para Ti, ó
Yahweh, para que sejamos restaurados” (Revised Standard Version). O povo
esperava pelas bênçãos prometidas dos antigos pactos e ansiava por ver os dias
antigos restaurados. Eles anelavam abandonar sua idolatria-adultério-apostasia,
que tão caro lhes havia custado. Cf. Lev. 26.40-45 e Deu. 3.1-10. Ver no Dicionário
o artigo chamado Pactos. Poderiam as promessas do pacto reverter a
melancolia? “Vamos recuperar nosso pais, nosso templo, e todos os ofícios
divinos de nossa fé. E o mais importante é que recuperemos o Teu favor”
(Adam Clarke, in loc.). O Targum relembra-nos do arrependimento
que deve acompanhar tal esperança e adiciona que o retomo deve ser para o “bem”.
Cf. o versículo com Sal. 80.3 e Jer. 31.18.
5.22 Por que nos rejeitarias totalmente? O clamor do povo
judeu, que tinha subido aos céus, pedindo restauração, agora desce de novo ao
vale do desespero. Ali estava sendo experimentada a rejeição de Yahweh, e
a esperança começava a dissipar-se. A ira de Deus é vista a operar, e
aparentemente continuará para sempre, A presente realidade obscurece as
esperanças relativas ao futuro. O livro termina de maneira sombria. Os judeus,
em tempos posteriores, quando liam este capitulo final, sempre revertiam os
vss. 21 e 22, a fim de que a leitura terminasse com uma nota de esperança.
O mesmo tratamento era dado à leitura das porções finais de Isaías,
Malaquias e Eclesiastes, e pela mesma razão. A esperança é uma das três
grandes realidades espirituais (ver I Cor. 13.13), pelo que continuemos
esperando.
O ocaso de uma grande esperança é como o ocaso do
sol. O brilho de nossa vida desaparece.
(Henry W. Longfellow)
A esperança surge eterna no peito humano.
(Alexander Pope)
“Que podemos dizer sobre a fácil vida religiosa que
levamos, neste nosso terrível mundo? Deus seja louvado que a agonia temível
deste íivro não seja nossa” (William Pierson Merrill, in loc).
Assim termina uma das mais sombrias composições
literárias de todos os tempos. A esperança, porém, não tinha morrido. Recebeu
glorioso e novo poder no evangelho de Cristo.
... lançando sobre ele toda a vossa ansiedade,
porque ele tem cuidado de vós.
(I Pedro 5.7)
A Fonte
O desespero, a dor, a chaga aberta,
Para as angústias todas deste mundo!
Vem, alma aflita, de sentido alerta;
Vem, peito triste, em seu sofrer profundo.
Tragas as misérias, a tua fé incerta.
Em tuas mágoas, á que me confundo,
Porque minha alma de sofrer desperta.
Vem, coração magoado, vem buscar comigo O lenitivo de
um suave abrigo.
Que impressivo, eu também supus.
Alguma coisa há que tal sofrer isola.
Vem, vem que verás que tudo o que consola Vem da
fonte divina, que é Jesus.
(Camilo Flamarion Pires - Guaratinguetá, SP, Brasil, 17/06/1973)